Prévia do material em texto
inflação substancial. Mas muito mais penosas foram as consequências sociais e políticas da hiperinflação alemã. Em 1913, o economista inglês John Maynard Keynes teorizara que a “eutanásia dos rentiers” através da inflação era preferível ao desemprego em massa através da deflação – “porque, num mundo empobrecido, é pior provocar o desemprego do que desapontar o rentier”.61 Ainda assim, quatro anos antes, ele mesmo fizera um relato vívido das consequências negativas da inflação: Num processo contínuo de inflação, o governo pode confiscar, secretamente e despercebido, uma parte importante da riqueza dos seus cidadãos. Por esse método, ele não apenas confisca, mas confisca arbitrariamente; e, enquanto o processo empobrece muitos, na verdade enriquece alguns. A visão desse arranjo arbitrário de ricos atinge não apenas a segurança, mas a confiança na equidade da distribuição existente de renda. Aqueles para os quais o sistema traz uma sorte inesperada... se tornam “aproveitadores”, e são objeto do ódio da burguesia, a quem a inflação empobreceu não menos do que o proletariado. Enquanto a inflação procede... todas as relações permanentes entre devedores e credores, que formam o fundamente definitivo do capitalismo, se tornam tão completamente desordenadas que passam a ser insignificantes...62 Foi a Lênin que Keynes atribuiu a percepção de que: “Não existem meios mais sutis e mais seguros de virar a base existente da sociedade do que corromper sua moeda”. Nenhum registro dessa afirmação de Lênin sobreviveu, mas seu companheiro bolchevique Yevgeni Preobrajenski****** descreveu a máquina de imprimir dinheiro como “a metralhadora do Comissariado de Finanças, que despejou fogo na retaguarda do sistema burguês”.63 O exemplo russo é um lembrete de que a Alemanha não foi o único país derrotado a sofrer hiperinflação depois da I Guerra Mundial. A Áustria – como também a Hungria e a Polônia, havia pouco independentes – também sofreram colapsos comparavelmente ruins da sua moeda entre 1917 e 1924. No caso russo, a hiperinflação veio depois que os bolcheviques deixaram de pagar completamente toda a dívida tsarista. Donos de títulos sofreriam destinos similares no restolho da II Guerra Mundial, quando a Alemanha, a Hungria e a Grécia viram suas moedas e seus mercados de títulos despencarem por completo.******* Se a hiperinflação fosse exclusivamente associada com os custos de perder guerras mundiais, seria relativamente fácil de compreender. Ainda assim, existe um quebra-cabeça. Em tempos mais recentes, numerosos países têm sido levados a não pagar suas dívidas – ou diretamente pela suspensão do pagamento de juros, ou indiretamente, pela degradação da moeda na qual suas dívidas são nominadas – como resultado de desastres muito menos sérios. Por que o espectro da hiperinflação não foi banido junto com o espectro do conflito global? O chefe da PIMCO, Bill Gross, começou sua carreira de fazedor de dinheiro como jogador de blackjack, em Las Vegas. Na sua opinião, sempre existe um elemento de aposta envolvido quando um investidor compra um título. Parte daquela aposta é que um crescimento na inflação não consumirá o valor dos pagamentos dos juros anuais do título. Como Gross explica: “Se a inflação sobe até 10%, e o valor do índice fixo de juros é de somente 5%, então isso basicamente significa que o dono do título está caindo 5% atrás da inflação”. Como já vimos,