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instalações caracteristicamente luxuosas de Lyford Clay, nas Bahamas. O tema da minha palestra foi que não se precisaria de muito para causar um declínio drástico na liquidez – que, então, estava cascateando através do sistema financeiro global – e que deveríamos ser cautelosos sobre as expectativas de os bons tempos durarem indefinidamente. Nitidamente, minha plateia não ficou impressionada. Fui tratado sumariamente como um alarmista. Um dos mais experientes investidores chegou até mesmo a sugerir aos organizadores que, “no ano seguinte, eles dispensassem o palestrante de fora e, em vez disso, oferecesse a exibição do filme Mary Poppins”.6 E a menção a Mary Poppins chacoalhou uma das minhas memórias infantis. Os fãs de Julie Andrews podem lembrar que o enredo do perene musical gira em torno de um evento financeiro que, quando o filme foi realizado nos anos 1960, já parecia graciosamente antiquado: uma corrida bancária – ou seja, uma corrida de investidores para sacar seu dinheiro –, algo que não se via em Londres desde 1866. A família que emprega Mary Poppins se chama, não acidentalmente, Banks. O senhor Banks é, de fato, banqueiro, um funcionário graduado do Dawes, Tomes Mousley, Grubbs, Fidelity Fiduciary Bank. Por sua insistência, um dia as crianças da família Banks são levadas por seu pai a uma visita ao seu banco, onde o senhor Dawes Sr. recomenda a Michael, filho do senhor Banks, que deposite seu dinheirinho. Lamentavelmente, o jovem Michael prefere gastar o dinheiro para alimentar os pombos fora do banco e exige que o senhor Dawes “Devolva! Devolva o meu dinheiro!”. Ainda mais lamentavelmente, alguns dos clientes do banco escutam a exigência de Michael. O resultado é que eles começam a retirar seu dinheiro do banco. De imediato, uma multidão de correntistas está fazendo a mesma coisa, forçando o banco a suspender os pagamentos. O senhor Banks é devidamente demitido, provocando o trágico lamento de que “ele foi levado à destruição e à ruína no auge da sua vida”. Essas palavras poderiam legitimamente ser ecoadas por Adam Applegarth, o antigo CEO do banco inglês Northern Rock, que passou por destino similar em setembro de 2007, quando clientes fizeram uma fila fora das agências do banco para retirar seu dinheiro. Depois disso, foi feito um anúncio de que o Northern Rock havia pedido um “aporte de liquidez” ao Banco da Inglaterra. A crise financeira que desabou sobre o mundo ocidental no verão de 2007 ofereceu um lembrete oportuno de uma das verdades perenes da história financeira. Mais cedo ou mais tarde, todas as bolhas explodem. Mais cedo ou mais tarde, os vendedores pessimistas são mais numerosos do que os compradores otimistas. Mais cedo ou mais tarde, a ganância se transforma em medo. Enquanto eu completava minha pesquisa para este livro nos primeiros meses de 2008, já havia uma clara possibilidade de que a economia dos Estados Unidos pudesse sofrer uma recessão. Seria porque as empresas americanas ficaram piores no design dos seus produtos? O ritmo da inovação tecnológica teria repentinamente afrouxado o passo? Não. A causa imediata da incerteza econômica de 2008 era financeira: para ser preciso, um espasmo nos mercados de crédito, causado por atrasos avultados de pagamentos sobre um tipo de dívida conhecida eufemisticamente como hipotecas subprime. De tal modo nosso sistema financeiro globalizado se tornou intricado, que famílias relativamente pobres nos estados