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21O Conceito de trabalho História 1 RELAÇÕES DE TRABALHO: O conceito de trabalho Altair Bonini1n 1Colégio de Aplicação Pedagógico da Universidade Estadual de Maringá – Maringá – UEM ertamente você já ouviu essa música sendo canta- rolada por aí, ela expressa uma opinião sobre o traba- lho. Por que será que o au- tor diz que não quer saber de emprego, conseqüente- mente, de um trabalho ou ocupação? O que significa o trabalho para ele? Acreditamos que a realidade hoje seja diferente. Talvez uma questão importante que ocupa gran- de parte do tempo dos jovens na atualidade seja a busca por um emprego, para, através deste, poder conquistar dignidade e respeito entre seus familiares e/ou comunida- de, adquirir mercadorias e produtos que julgue necessário, entre tantas outras coisas que o trabalho proporciona. Para tanto, empenha-se em um longo período de preparação. Entretanto, os seres humanos vivem uma contradição, tan- to podem satisfazer-se pelo trabalho conquistando seus objetivos, quanto o trabalho pode significar sofrimento, cansaço, a monotonia das atividades repetitivas ou a ex- ploração de suas capacidades físicas e intelectuais. Podemos pensar o que se entende por trabalho? Sem- pre foi da forma como é realizado hoje? Quais os significados que o trabalho vem adquirindo no decorrer da história? Para as sociedades atuais, qual a importância do trabalho? Ora bolas Não me amole Com esse papo De emprego, uuuuu Não tá vendo Não tô nessa E o que eu quero é Sossego... Sossego (Composição: Tim Maia [1942-1998], 1978).n 22 Relações de trabalho Ensino Médio O que é o trabalho? Parece tarefa fácil definir o que significa o termo trabalho. Entretan- to, quando nós iniciamos essa atividade, percebemos a complexidade do conceito, que pode ser visto sob vários prismas e adquirir significa- dos diversos, desde o uso cotidiano, quando se fala “o trabalho da má- quina escavadeira” ou “a mulher entrou em trabalho de parto,” até ex- plicações filosóficas, que procuram entender as dimensões do trabalho para o homem e para a vida em sociedade. A própria palavra trabalho não é algo que tenha uma definição cla- ra. Em quase todas as línguas européias existem mais de uma defini- ção, em grego tem uma denominação para esforço e outra para fabri- cação. Em latim existe a separação entre labore, a ação, e operare, que corresponde à obra. Em outras línguas existem pelo menos duas deno- minações ligadas à realização de um trabalho, por exemplo, em fran- cês existe a diferença entre travaillere e ouvrer; trabajar e obrar em espanhol como no inglês labour e work. Em nossa língua, a palavra trabalho originou-se do latim tripalium, que era um instrumento agrícola utilizado pelos romanos para bater o trigo, as espigas de milho ou o linho. Com o tempo, tripalium foi re- lacionado com instrumento de tortura, juntamente com o verbo Tri- paliare, que significa torturar. Desta forma, em português, a palavra originou-se vinculada às idéias de padecimento, sofrimento, esforço, laborar e obrar. Na Filosofia, o conceito de trabalho é visto como a expressão das forças espirituais ou corporais em atividade, tendo em vista um fim que deve ser alcançado. Mesmo que não se produza nada imediata- mente visível (trabalho intelectual) como um resultado exteriormente perceptível, um produto ou uma mudança de estado (trabalho corpo- ral), pode existir uma separação entre o trabalho intelectual e o braçal, e essas duas formas de trabalho encaixam-se nesta definição. Mas será que podemos separar trabalho intelectual e trabalho cor- poral? O pedreiro não utiliza inteligência e raciocínio para erguer uma parede de tijolos? O escritor não tem desgaste físico ao escrever um li- vro? Para pensadores, como Karl Marx (1818-1883), é por meio do tra- balho que o homem modifica a natureza e o mundo para satisfazer as necessidades humanas (pessoais ou sociais) e assim transformar a na- tureza em objetos de cultura, ou seja, ao mesmo tempo em que a na- tureza é transformada, o mesmo ocorre com o homem. Saibamos que, para os filósofos que compartilham do pensamen- to de Marx, o que distingue o trabalho humano do dos animais é que naquele há consciência e intencionalidade, enquanto os animais tra- balham por instinto, sem consciência. Outra característica do trabalho humano é que ele expressa a liberdade humana, visto que não pode- mos ser programáveis como um robô, podemos realizar as tarefas de formas variáveis e até nos realizarmos nelas. No dicionário Auré- lio, a palavra “Trabalho” está relacionado à aplica- ção das forças e faculda- des humanas para alcan- çar um determinado fim. Atividade coordenada, de caráter e/ou intelectual, necessária à realização de qualquer tarefa, serviço ou empreendimento. O exer- cício dessa atividade co- mo ocupação, ofício, pro- fissão, etc. (Adaptado de Novo di- cionário Aurélio da Língua Portuguesa, 1986, p. 1695.) 23O Conceito de trabalho História Karl Marx – 1818-1883.n Fo nt e: w ww .h ar le y.c om n Karl Marx nasceu em 05 de maio de 1818, na anti- ga Prússia Renana – compõe a atual Alemanha. De família abastada e culta, estudou na Universidade de Bona e de- pois na de Berlim, formou-se em Direito. Em 1841 termi- nou o doutorado em Filosofia. Tentou a carreira universitária, mas grande parte de sua vi- da desenvolveu a função de jornalista. Contava sempre com a ajuda do amigo ale- mão F. Engels, com quem es- creveu obras como O mani- festo comunista (1848) e A ideologia alemã (1845- 46). Faleceu em 14 de março de 1883. Dentre suas obras, podemos destacar: A misé- ria da filosofia (1847), O capital (1867), Sobre a crítica da economia po- lítica (1859). Desta forma, na linguagem diária não parece haver diferenças quan- do utilizamos este termo ou conceito, é na linguagem científica que os significados tornam-se mais complexos. É isto que vamos buscar en- tender neste Folhas. Documento 1 Antes de tudo é um processo entre o homem e a Natureza, um pro- cesso em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a Natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais perten- centes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apro- priar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a Natureza externa a ele, ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. Ele desenvolve as po- tências nela adormecidas e sujeita o jogo de suas forças a seu próprio domí- nio. Não se trata aqui das primeiras formas instintivas, animais, de trabalho. O estado em que o trabalhador se apresenta no mercado como vendedor de sua própria força de trabalho deixou para o fundo dos tempos primitivos o estado em que o trabalho humano não se desfez ainda de sua primeira for- ma instintiva. Pressupomos o trabalho numa forma em que pertence exclu- sivamente ao homem. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a cons- trução dos favos de suas colméias. Mas, o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador, e, por- tanto, idealmente. Ele não apenas efetua uma transformação da forma da matéria natural: realiza, ao mesmo tempo, na matéria natural seu objetivo, que ele sabe que determina, como lei, a espécie e o modo de sua atividade e ao qual tem que subordinar sua vontade. E essa subordinação não é um acontecimento isolado. Além dos órgãos que trabalham, é exigida a vonta- de orientada a um fim, que se manifesta com atenção durante todo o tempo de trabalho, pelo próprio conteúdo e pela espécie e modo de sua execução, atrai o trabalhador, portanto, quanto menos ele aproveita, como jogo de su- as própriasforças físicas e espirituais. (MARX, 1985 [1867], pp. 149-150). 1. Comente os aspectos do pensamento de Marx, presentes no documento 1, que contribuem para entendermos melhor o que é o trabalho. Quais as características do trabalho humano que este pen- sador destaca? ATIVIDADE 24 Relações de trabalho Ensino Médio Outra visão Na linguagem bíblica, a idéia de trabalho está relacionada à maldi- ção divina, como castigo decorrente do pecado original, “Ganharás o teu pão com o suor do teu rosto” (Gênesis III, 19), também se relacio- na com o pensamento de que aquele que não contribui com seu tra- balho não tem direitos, uma vez que, “se alguém não quiser trabalhar não coma também.” (II Tessal, 3, 8-10). É por meio de um esforço do- loroso que o homem sobrevive na natureza. Mesmo assim, o homem continua totalmente dependente de Deus, “pois sem ele todo esforço não dá nenhum resultado” (Sl. 127, 1). O trabalho realizado neste es- pírito sempre é recompensado por Deus “que um dia dará ao homem o descanso por seus esforços” (Apc.14,13). Então, pela Bíblia, o traba- lho pode significar o sofrimento, mas também a salvação. O trabalho e sua valorização Durante boa parte da História, o trabalho foi visto como atividade desvalorizada, considera- do, pelos gregos antigos, como a expressão da miséria humana. Para Platão (428 - 347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.), o trabalho era aqui- lo que estava ligado à necessidade: de alimen- tar-se, de cobrir-se, entre outras. Dessa forma, a necessidade limita a liberdade do homem e, assim, tudo que se destinava ao produzir e co- mercializar, ficava a cargo dos escravos. Para os romanos, que também era uma so- ciedade escravista, o trabalho era algo vil, oposto ao lazer e às ativida- des intelectuais. Durante a Idade Média (séculos V a XV), seguiu-se o referencial re- ligioso católico do trabalho como castigo, sofrimento e penitência do homem, ou seja, dos servos, já que o nobre não deveria trabalhar, pois a sociedade estava dividida em três ordens com funções bem defini- das: aos nobres cabia guerrear, ao clero orar e aos servos trabalhar. Somente na modernidade (séculos XV ao XVIII), com mudanças profundas pela qual a sociedade européia passou com o revigoramen- to comercial e urbano, que o trabalho passou a ser valorizado. Neste período, o trabalho foi idealizado como um símbolo de liberdade do homem, de transformação da natureza, das coisas e da sociedade, as- sumindo os anseios da burguesia nascente. Documento 2 Servos trabalhando, c. séculos XII a XIV. ht tp :// pa gi na s.t er ra .c om .b r n 25O Conceito de trabalho História A valorização do trabalho se deu, principalmente, com a difusão das idéias renascentistas e iluministas. No Renascimento (séculos XV ao XVI), o trabalho passa a ser visto como um estímulo para o desen- volvimento dos seres humanos, e como expressão da personalidade humana ao se tornar um criador por sua atividade. Assim, é por meio do trabalho que os seres humanos preenchem suas vidas e podem re- alizar qualquer coisa. Mas, foi no Iluminismo, no século XVIII, que o trabalho foi exalta- do ao lado da técnica, quando o capitalismo se consolidava e surgiam as primeiras fábricas. Com os estudos de economistas e filósofos, co- mo John Locke (1632-1704), Adam Smith (1723-1790) e David Ricardo (1779-1823), o trabalho passou a ser exaltado como fonte de toda a ri- queza e valor sociais. Leia as frases de pensadores posteriores a Locke e Smith e discuta as semelhanças e diferenças sobre o conceito de trabalho apresentado até esse momento. Escreva suas conclusões e apresente- as para sala. • “O trabalho positivo, isto é, nossa ação real e útil sobre o mundo exterior, constitui necessariamente a fonte inicial de toda riqueza material”. (Augusto Comte [1798-1857]: filósofo francês) • “Produzindo seus meios de subsistência, os homens produzem indiretamente sua própria vida ma- terial”. (Karl Marx [1818-1883]: filosófo alemão) • “É exatamente por meio do trabalho que o homem se torna livre, o trabalho domina a natureza: com o trabalho ele mostra que está acima da natureza”. (KierKegaard [1813-1855]: filosofo dinamarquês) DEBATE • Leia os documentos 3 e 4. Depois, escreva uma narrativa histórica sobre como estes pensadores entendiam o trabalho considerando a sua importância para as sociedades em que viviam? • Após análise dos documentos 3 e 4 e das frases presentes no debate, elabore uma definição de trabalho articulada com os contextos sócio-históricos de sua produção. ATIVIDADE 26 Relações de trabalho Ensino Médio Documento 3 É o trabalho, portanto, que atribui a maior parte do valor à terra, sem o qual dificilmente valeria algu- ma coisa; é a ele que devemos a maior parte dos produtos úteis da terra, por tudo isso a palha, farelo e pão desse acre de trigo valem mais do que o produto de um acre de terra igualmente boa, mas aban- donada, sendo o valor daquele o efeito do trabalho. Não é simplesmente o esforço do lavrador, a labu- ta do ceifador e do trilhador e o suor do padeiro que se têm de incluir no pão que comemos; o trabalho dos que amansaram os bois, extraíram e prepararam os ferros e as mós, derrubaram as árvores e pre- pararam a madeira empregada no arado, no moinho, no forno ou em outros utensílios quaisquer, que são em grande parte indispensáveis a esse trigo, desde que foi semente a plantar-se até transformar-se em pão, terá de computar-se a conta do trabalho, e receber-se como efeito deste; a natureza e a ter- ra forneceram somente os materiais de menor valor em si. Seria estranho o “catálogo dos artigos que a indústria fornece e utiliza, com relação a cada pão” antes de nos chegar às mãos, se fosse possível acompanhá-los: ferro, madeira, couro, casca, tábuas, pedras, tijolos, carvão, cal, pano, tinturas, piche, alcatrão, mastros, cordas e todos os materiais que se empregam nos navios que transportam qualquer dos artigos usados pelos operários em qualquer parte do trabalho; contar todos eles seria impossível ou, pelos menos, demasiado trabalhoso. (LOCKE, Carta da tolerância [1689], 1983, p. 51). Documento 4 O trabalho anual de cada nação constitui o fundo que originalmente lhe fornece todos os bens ne- cessários e os confortos materiais que consome anualmente. O mencionado fundo consiste sempre na produção imediata do referido trabalho ou naquilo que com essa produção é comprado de outras na- ções. Conforme, portanto, essa produção ou o que com ele se compra, estiver em proporção maior ou menor em relação ao números dos que a consumirão, a nação será mais ou menos suprida de todos os bens necessários e os confortos de que tem necessidade. Essa proporção deve em cada nação ser regulada ou determinada por duas circunstâncias dife- rentes: primeiro, pela habilidade, destreza e bom senso com os quais seu trabalho for geralmente exe- cutado; em segundo lugar, pela proporção entre o número dos que executam trabalho útil e o dos que não executam tal trabalho. Qualquer que seja o solo, o clima ou a extensão do território de uma deter- minada nação, a abundância ou a escassez do montante anual de bens de que disporá, nessa situ- ação específica, dependerá necessariamente das duas circunstâncias que acabamos de mencionar. (SMITH, 1985 [1776], p. 35). O Mundo do trabalho contemporâneo Nas sociedades modernas, ocorre uma volta à idéia de que todos têm que trabalhar e a constante repressão à vadiagem. O trabalhador era impulsionado a exercer uma atividade, mesmo que por um salá- rio que mal pagava sua alimentação. Desse modo, o trabalho assalaria- do se impõe como condição de existência humana, na medida em que esta foi a forma de produzir instituída na sociedade contemporânea. 27O Conceito de trabalho História Documento 5 Linha de montagem Divulgação: Cummins do Brasil Tem-se com isso um processo de disciplinari- zação da força de trabalho. Assim consolida- do o capitalismo, a classe trabalhadora passou a reivindicar para si, como direito,o emprego remunerado. A partir deste momento, o traba- lho passa a ser visto como parte da personali- dade dos trabalhadores, o que podemos cha- mar de consciência profissional dos operários, assim, a luta por direitos civis, políticos e so- ciais é intensificada. A divisão do trabalho Nas sociedades pré-industriais já existia uma divisão do trabalho como repartição de tarefas necessárias à sobrevivência de um grupo, cujo objetivo era obter maior rendimento. A partir do surgimento da sociedade industrial (na Inglaterra do séc. XVIII), a divisão do trabalho aparece como algo significativo para seus sujeitos. Um dos primeiros pensadores a falar sobre esse assunto foi Adam Smith, destacando su- as vantagens para o sistema capitalista de então. Adam Smith nasceu em 05 de julho de 1723, no Rei- no Unido. Publicou sua obra mais importante, A rique- za das nações, em 1776. Foi o protótipo do filósofo ilu- minista: esperançoso porém realista, especulativo e, ao mesmo tempo, prático. Sem- pre respeitador do passado clássico, mas dedicado com afinco à grande descober- ta de sua época, o progres- so. Faleceu em 17 de julho de 1790. Documento 6 Tomemos, pois, um exemplo, tirado de uma manufatura muito peque- na, mas na qual a divisão de trabalho tem sido muito notada: a fabricação de alfinetes. Um operário não treinado para essa atividade (que a divisão de trabalho transformou num indústria específica) nem familiarizado com a utili- zação das máquinas ali empregadas (sua invenção provavelmente também se deveu à mesma divisão do trabalho), dificilmente poderia talvez fabricar um único alfinete em um dia, empenhando o máximo trabalho; de qualquer forma, certamente não conseguirá fabricar vinte. Entretanto, da forma como essa atividade é hoje executada, não somente o trabalho todo constitui uma indústria específica, mas ele está dividido em uma série de setores, dos quais, por sua vez, a maior parte também constitui provavelmente um ofício especial. Um operário desenrola o arame, um outro o endireita, um terceiro o corta, um quarto faz as pontas, um quinto o afia nas pontas para a colo- cação da cabeça do alfinete; para fazer uma cabeça de alfinete requerem- se 3 ou 4 operações diferentes; montar a cabeça já é uma atividade diferen- te, e alvejar os alfinetes é outra; a própria embalagem dos alfinetes também constitui uma atividade independente. Assim, a importante atividade de fa- bricar um alfinete está dividida em aproximadamente 18 operações distin- tas, as quais, em algumas manufaturas, são executadas por pessoas dife- rentes, ao passo que em outras, o mesmo operário executa 2 ou 3 delas. Vi 28 Relações de trabalho Ensino Médio uma pequena manufatura deste tipo, com apenas dez empregados, e na qual alguns desses executa- vam 2 ou 3 operações diferentes. Mas, embora não fossem muito hábeis, e, portanto, não estivessem particularmente treinados para o uso das máquinas, conseguiam, quando se esforçavam, fabricar em torno de 12 libras de alfinetes por dia. Ora, uma libra contém mais de 4 mil alfinetes de tamanho médio. Por conseguinte, essas 10 pessoas conseguiam produzir entre elas mais de 48 mil alfinetes por dia. Assim, já que cada pessoa conseguia fazer 1/10 de 48 mil alfinetes por dia, pode-se considerar que cada um produzia 4800 alfinetes diariamente. Se, porém, tivessem trabalhado independentemente um do outro, e sem que nenhum deles tivesse sido treinado para esse ramo de atividade, certamente cada um deles não teria conseguido fabricar 20 alfinetes por dia e talvez nem mesmo 1, ou seja: com certe- za não conseguiria produzir a 240ª. parte e talvez nem mesmo a 4800ª. parte daquilo que hoje são ca- pazes de produzir, em virtude de uma adequada divisão do trabalho e combinação de suas diferentes operações. (SMITH, 1985 [1776], pp. 41-42). Entretanto, para Marx, essa divisão do trabalho não trouxe van- tagens aos operários porque, ao “apertar apenas um parafuso”, por exemplo, perdem o controle e o conhecimento sobre o processo de produção. Ao especializar-se em apenas uma pequena tarefa não con- seguem mais perceber o conjunto da atividade em que seu esforço se insere. Documento 7 Os conhecimentos, a compreensão e a vontade, que o camponês ou artesão desenvolve mesmo que em pequena escala, agora passam a ser exigidos apenas pela oficina em seu conjunto. As potên- cias intelectuais ampliam-se por um lado, porque desaparecem por muitos lados. Esse processo de dissociação começa na cooperação simples, desenvolve-se na manufatura, que mutila o trabalhador convertendo-o em trabalhador parcial e se completa na grande indústria, que separa trabalho e ciên- cia. (MARX, 1983 [1867], p. 283). O sociólogo francês Émile Durkheim (1858-1917) ti- nha uma visão otimista do trabalho, apesar de reconhe- cer seus efeitos negativos. Segundo Durkheim, a espe- cialização servia para fortalecer a solidariedade social dentro das comunidades. Para este pensador, era pre- ciso estabelecer vínculos sociais que resultassem na so- lidariedade social. A divisão do trabalho deveria pro- porcionar a cooperação entre os indivíduos e, assim, conseguir o bom funcionamento da sociedade. Émile Durkheim nasceu em Epinal, França, em 15 de abril de 1858 e faleceu em 15 de novembro 1917. Dedicou sua vida à sociologia, tornando-a uma ciên- cia autônoma, sendo ministrada no ensino superior francês e, depois, em todo o mundo. Escreveu, entre outras obras: Elementos da sociologia (1889), Da divisão do trabalho social (1893) e O suicídio (1897). ww w. ne wg en ev ac en te r.o rg n 29O Conceito de trabalho História Documento 8 A divisão do trabalho é, portanto, um resultado da luta pela vida, mas é um resultado suavizado. Gra- ças a divisão do trabalho, com efeito, os rivais não são obrigados a se eliminarem mutuamente, mas po- dem coexistir uns ao lado dos outros. E também, a medida que ela se desenvolve, proporciona a um grande número de indivíduos, que nas sociedades mais homogêneas estariam condenados ao desapa- recimento, os meios de se manter e de sobreviver. Entre muitos povos inferiores, todo organismo mal- formado deveria perecer, pois não tinha utilidade em nenhuma função. Nas sociedades mais avança- das, o que acontece é muito diferente. Um indivíduo deficiente pode encontrar, nos quadros complexos de nossa organização social, um lugar onde pode prestar serviços à coletividade. (Aptadado de DURKHEIM apud ARON, 1982, p. 371-372). Ao analisar o mundo do trabalho, pode-se levar em consideração várias formas de divisão do trabalho conforme o aspecto que se está privilegiando. a) Divisão da produção social: é feita por setores ou ramos de trabalho, como: agricultura, indústria e comércio. b) Divisão técnica do trabalho: cooperação entre trabalhadores para exe- cutar uma tarefa ou produzir uma mercadoria. c) Divisão Internacional do trabalho: Ocorreu a partir do desenvolvimen- to do capitalismo. Os países mais desenvolvidos tecnicamente espe- cializaram-se, primeiramente, em produtos manufaturados e, pos- teriormente, em tecnologia e bens de capital em geral (máquinas, equipamentos, instalações, etc.). Os países menos desenvolvidos tecnicamente, também denominados por sociólogos contemporâ- neos de subdesenvolvidos, em desenvolvimento ou periféricos, fo- ram obrigados a especializar-se em exportar produtos primários (agrícolas ou extrativos). Com isto, os trabalhadores do primeiro grupo de países (EUA, países da Europa Ocidental e Japão) reali- zam o trabalho melhor qualificado e remunerado; e os trabalhado- res do segundo grupo (países latino-americanos, africanos e asiáti- cos) realizam, em sua maior parte, trabalhos menos qualificados e mal remunerados. d) Divisão sexual do trabalho: é a separação e distribuição das atividades de produção de acordo com o sexo dos indivíduos. Nas socieda- des industriais, de modo geral, esperava-se que as mulheres ficas- sem reservadas ao mundo doméstico privado, cuidando das crian- ças, velhos e inválidos, realizandotarefas para o consumo do grupo familiar. Nestas mesmas sociedades, reservou-se aos homens as ati- vidades relacionadas ao mundo público, realizando tarefas de pro- dução social e de direção da sociedade. Sob essa lógica, o trabalho das mulheres foi, muitas vezes, marginalizado. Nos casos de guer- Podemos pensar a divisão do trabalho sob vários aspectos a partir do pensamento de Durkheim e seus seguidores: 30 Relações de trabalho Ensino Médio ras, por exemplo, a presença feminina foi requisitada no mundo do trabalho; já em outros momentos, de progresso econômico seu acesso aos empregos foi limitado. Desta forma, a divisão sexual do trabalho estabeleceu para as mulheres as atividades mais difíceis e de menor remuneração, os setores e postos de trabalho de maior prestígio e melhores salários eram escassos, bem como, os cargos de chefia. • Produza uma explicação sobre os efeitos da divisão do trabalho para o trabalhador e para a socie- dade. Para isso compare as diferenças de concepção presentes nos documentos 1 e 7, de Karl Marx e no documento 8, de Èmile Durkheim. ATIVIDADE • Organize um debate sobre a divisão sexual do trabalho. Consiga mais informações em revistas e sí- tios eletrônicos que falem sobre as questões referentes ao trabalho feminino. Elabore propostas pa- ra a diminuição da diferença entre os salários entre homens e mulheres. Busque informações sobre a vida de mulheres que conseguiram destaque nacional com seu trabalho. DEBATE O mundo do trabalho vai acabar? No contexto do mundo industrial e informatizado, o trabalho é um esforço planejado e coletivo. Se quase tudo é produzido em indústrias ou com a ajuda de equipamentos (máquinas), as pessoas certamente irão em direção onde este modo de produzir se encontra, ou seja, pa- ra os grandes centros. Contudo, com o avanço do capitalismo, o desenvolvimento tec- nológico e uma grande quantidade de trabalhadores o desemprego tornou-se uma realidade na maioria dos países industrializados e em quase todos os países pobres. Ocorreu, portanto, uma redução de em- pregos. O que quer dizer ter um emprego? Quer dizer ter uma tarefa a ser feita, com um salário fixo, mesmo que essa remuneração não seja interessante. A esta noção podemos acrescentar que o emprego significa contar com recursos (renda) para ter, conseqüentemente, condições de consumir. Será que esta dimen- são que o trabalho tomou nos últimos anos não deixou o trabalho mais monótono e sem sentido? Através do que foi dito, podemos perceber que não é o trabalho que vem diminuindo, mas sim o número de postos de trabalho, ou se- ja, de empregos. Passamos por uma transformação no mundo do tra-