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Conjunções e Orações na Gramática

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Pode-se também omitir a conjunção coordenativa numa série de equipolentes:
“Rubião passa muitas horas fora de casa, mas não o trata mal, e consente que vá acima, que assista ao almoço ou ao
jantar, que o acompanhe à sala ou ao gabinete” [MA].
1.ª oração – coordenada (ou coordenante):
Rubião passa muitas horas fora de casa,
2.ª oração – coordenada adversativa:
mas não o trata mal,
3.ª oração – coordenada aditiva e principal:
e consente + subordinada
4.ª oração – subordinada substantiva objetiva direta:
que vá acima,
5.ª oração – equipolente à 4.ª:
que assista ao almoço ou ao jantar,
6.ª oração – equipolente à 5.ª:
que o acompanhe à sala ou ao gabinete.
 
Concorrência de termo + oração subordinada
Às vezes a concorrência não se dá entre duas orações da mesma função sintática, mas entre
um termo da oração e outra oração:
“conheci a violência das suas paixões e que a do ciúme devia ser terrível naquele coração” [AH.3, 119].
O verbo conhecer tem dois objetos diretos: o substantivo violência e a oração substantiva
que a do ciúme devia ser terrível naquele coração, que se acham coordenados entre si.
No seguinte exemplo de Machado de Assis [MA.1, 242]:
“Virgília tragou raivosa esse malogro, e disse-mo com certa cautela, não pela cousa em si, senão porque entendia com o
filho”
temos dois adjuntos adverbiais de causa: a expressão pela cousa em si e a oração
subordinada adverbial porque entendia com o filho, que se acham conectadas pela série
não... senão.
3 – As chamadas Orações Reduzidas
Que é oração reduzida
Em
Estuda agora, porque, quando o verão chegar, entraremos de férias.
as três orações se dizem desenvolvidas, porque seus verbos estão no imperativo (estuda), no
subjuntivo (chegar)128 e no indicativo (entraremos).
Podemos, entretanto, alterar a maneira de expressar a subordinada quando o verão chegar
sem nos utilizarmos dos três modos verbais acima apontados:
quando o verão chegar = ao chegar o verão
quando o verão chegar = chegando o verão
quando o verão chegar = chegado o verão
Dizemos então que as subordinadas ao chegar o verão, chegando o verão e chegado o
verão são orações reduzidas, porque apresentam o seu verbo (principal ou auxiliar, este
último nas locuções verbais), respectivamente, no infinitivo, gerúndio e particípio (reduzidas
infinitivas, gerundiais e participiais).
 
Nota sobre o conceito de oração reduzida – Dentro e fora da gramática portuguesa tem
sido muito diversificado o conceito de oração reduzida. A opinião mais generalizada, partindo
da ideia de que o que caracteriza a relação predicativa é a presença de verbo na forma finita,
é que a construção com verbo nas formas nominais (infinitivo, gerúndio e particípio) não
constitui oração, e, neste caso, é uma subunidade da oração, um termo dela, quase sempre
como um adjunto adnominal ou adverbial. Esta maneira de ver se estende até àquelas
construções em que vem acompanhada a forma nominal de unidades que, se estivessem numa
oração com verbo finito, funcionariam como termo argumental ou não argumental (no caso de
papel de adjunto adverbial).
Outros autores, nestas últimas construções, dão estatuto de orações à parte (nem sempre
usando a nomenclatura “reduzida”) apenas àquelas que encerram infinitivo e gerúndio
independentes, considerando as de particípio meros termos oracionais.
Em português, que possui o infinitivo flexionado, fica ainda mais difícil não aproximar É
necessário que estudes a lição a É necessário estudares a lição, ainda que se trate de um
idiotismo da língua.
Neste livro, optamos por dar estatuto à parte às reduzidas de qualquer forma nominal do
verbo desde que apresentem autonomia sintática dentro do enunciado e possam estar
estruturadas analogamente às orações com verbo de forma finita, as desenvolvidas.
Observações:
1.ª) Havendo locução verbal é o auxiliar que indica o tipo de reduzida. Assim são exemplos de reduzidas de gerúndio: “estando
amanhecendo”, “tendo de partir”, “tendo partido”; são exemplos de reduzidas de infinitivo: “ter de partir”, “depois de ter
partido”; é exemplo de reduzida de particípio: “acabado de fazer”. Se, por outro lado, o auxiliar da locução estiver na forma
finita, não haverá oração reduzida: Quanta gente havia de chorar.
2.ª) Nem toda oração desprovida de transpositor é reduzida, uma vez que este transpositor pode estar oculto: Espero que sejas
feliz ou Espero sejas feliz. Em ambos os exemplos a subordinada que sejas feliz ou sejas feliz é desenvolvida. O que
caracteriza a reduzida é a forma infinita ou nominal do verbo (principal ou auxiliar): infinitivo, gerúndio e particípio.
3.ª) A Nomenclatura Gramatical Brasileira desprezou a denominação infinito para designar as formas nominais do verbo,
desfazendo uma incômoda sinonímia antiga entre infinito = infinitivo, que, em muitos casos, levava os leitores de gramática a
confusões. Infinita é uma forma verbal normalmente sem flexão, enquanto infinitivo é uma das chamadas formas nominais do
verbo; assim, se fala em emprego do infinitivo, e não em emprego do infinito.
 
O desdobramento das orações reduzidas
As orações reduzidas são subordinadas e quase sempre se podem desdobrar em orações
desenvolvidas.129 O emprego de reduzidas por desenvolvidas e vice-versa, quando feito com
arte e bom gosto, permite ao escritor variados modos de tornar o estilo conciso, não
acumulado de quês e outros transpositores, enfim, elegante.130
Vejamos os seguintes exemplos:
a) Declarei estar ocupado = declarei que estava ocupado.
b) Para estudarmos precisamos de sossego = para que estudemos, precisamos de sossego.
c) Chovendo não sairei = se chover, não sairei.
d) Acabada a festa, retirou-se = quando acabou a festa, retirou-se.
Estes desdobramentos são meros artifícios de equivalências textuais, que nos ajudam a
classificar as orações reduzidas, uma vez que poderemos proceder da seguinte maneira:
a) Declarei estar ocupado = declarei que estava ocupado.
que estava ocupado: subordinada substantiva objetiva direta.
Logo:
estar ocupado: subordinada substantiva objetiva direta reduzida de infinitivo (ou reduzida
infinitiva).
 
b) Chovendo não sairei = se chover, não sairei.
se chover: subordinada adverbial condicional.
Logo:
chovendo: subordinada adverbial condicional reduzida de gerúndio (ou reduzida
gerundial).
 
c) Acabada a festa, retirou-se = quando acabou a festa, retirou-se.
quando acabou a festa: subordinada adverbial temporal.
Logo:
acabada a festa: subordinada adverbial temporal reduzida de particípio (ou reduzida
participal).
 
Orações substantivas reduzidas
Normalmente as orações substantivas reduzidas têm o verbo, principal ou auxiliar, no
infinitivo:
a) subjetiva:
“Agora mesmo, custava-me responder alguma coisa, mas enfim contei-lhe o motivo da minha ausência” [MA.1, 208].
b) objetiva direta:
“... como se estivesse ainda no vigor da mocidade e contasse como certo vir a gastar frutos desta planta” [LCo apud
FB.1, 38].
c) objetiva indireta:
“Tudo, pois, aconselhava o rei de Portugal a tentar uma expedição para aquele lado” [AH.2, 148].
d) completiva relativa:
“Um povo que se embevecesse na História, que cultivasse a tradição, que amasse o passado, folgaria de relembrar
esses feitos...” [CL.1, I, 123].
e) predicativa (do sujeito ou do objeto):
“O primeiro ímpeto de Luísa foi atirar-se-lhe aos braços, mas não se atreveu” [MLe apud FB.1, 31].
“... o averbara de não possuir atributos de administrador”.
“O resultado foi eu arrumar uns cocotes na Germana e esfaquear João Fagundes” [GrR.2, 13].
f) apositiva:
“Dois meios havia em seguir esta empresa: ou atacar com a armada por mar, ou marchar o exército por terra e
sitiar aquela cidade” [AH.2, 69].
Observações:
1.ª) Não é raro vir precedido de preposição o infinitivo das orações reduzidas subjetivas e objetivas:
“Desaire real seria de a deixar sem prêmio” [AGa.3, 122, da 5.ª ed.].
“mas não era assaz difícil de reconhecer um cadáver coberto de feridas...” [AH.2, 72].
“Custou-lhe muito a aceitar a casa” [MA.1, 194].
“Mostrou-se pesarosa de não o encontrar, e prometeude voltar hoje às três horas” [CBr.1, 118].
“Senhor Luís de Melo, eu tenho por princípio de me não intrometer...” [AGa.6, 173 apud MBa.3, 212, da 2ª ed.].
2.ª) Não raro também a oração substantiva reduzida de infinitivo vem precedida de artigo (mormente se a oração funciona
como sujeito ou objeto direto):
“o haver de marchar em um país inimigo, ocupado por gente belicosa, era considerado muito grave...” [AH.2, 69].
“Daí nasce o trabalharem os mais notáveis escritores da Europa por vivificarem o espírito religioso” [AH.2, 145].
“Aumentando (o rei) as fortificações da ilha, tornou impossível aos portugueses o reconquistá-la” [AH.2, 62].
 
Orações adjetivas reduzidas
As orações adjetivas reduzidas têm o verbo, principal ou auxiliar, no:
a) infinitivo:
“O orador ílhavo não era homem de se dar assim por derrotado” [AGa.5, 14 apud ED.2, § 308].
Está marcada a festa a realizar-se na próxima semana.
“mas nem um momento duvidamos de que a sua convicção íntima seja a necessidade de restituir o antigo lustre e
preço à filosofia do Evangelho” [AH.2, 145].
Observações:
1.ª) “Ligar qualificativamente a substantivos o infinitivo precedido de a (v. g. : livros a consultar) em vez de uma oração
relativa (v. g. : livros que se hão de consultar), ou de um infinitivo precedido de para (v. g. : roupa para consertar), é
imitação moderna da sintaxe francesa, imitação que só por descuido se encontra nos que melhor falam a língua pátria.
“Qual é a relação a deduzir destas considerações e destes fatos?” [AH.8, IV, 177]. [ED.2, § 304]. [Cf. MBa.1,
490, 515].
2.ª) Condenam também algumas autoridades o emprego do infinitivo precedido da preposição a depois de adjetivos como único,
último, derradeiro, além dos ordinais (primeiro, etc.). Para tais mestres o melhor é o emprego da preposição em, nesses
casos, ou de uma oração iniciada por pronome relativo: o primeiro em fazer ou o primeiro que fez , e não o primeiro a fazer.
Epifânio Dias, excelente conhecedor do português e francês, aceita a expressão condenada [Cf. ED.2, § 299], no que
concordamos com ele.
 
b) gerúndio, indicando de um substantivo ou pronome:
1) uma atividade passageira:
“cujos brados selvagens de guerra começavam a soar ao longe como um trovão ribombando no vale” [AH.3, 218, ed.
de 1878].
“Realmente, não sei como lhes diga que não me senti mal, ao pé da moça, trajando garridamente um vestido fino...”
[MA.1, 260].
Em todos estes exemplos o gerúndio figura com a ideia de tempo transitório muito
acentuada, servindo de atribuir um modo de ser, uma qualidade, uma atividade a um nome ou
pronome, mas apenas dentro de certo período e em determinada situação. Assim, água
fervendo é água que naquele momento fervia ou fervia dentro de certo espaço de tempo.
Vale o gerúndio, nestas circunstâncias, por uma expressão formada de preposição a +
infinitivo: água a ferver:
“Também algumas vezes foram dar com ela a abraçar a cadelinha” [MLe apud JR.5, 32].
 
2) uma atividade permanente, qualidade essencial, inerente aos seres, própria das coisas:
“O livro V, compreendendo as leis penais, aquele que, após os progressos efetuados na legislação e na humanidade,
mais carecia de pronta reformação” [LCo.1, I, 288].
“Decreto de 14 de fevereiro de 1786, proibindo a entrada das meias de seda que não fossem pretas, e decreto de 2 de
agosto de 1786, suscitando a observância e ampliando o cap. II...” [LCo.1, I, 298].
“Algumas comédias havia com este nome contendo argumentos mais sólidos” [FF apud SA.2, 249].
Estes e muitíssimos outros exemplos atestam que tal emprego do gerúndio131 ocorre
vitorioso na língua culta portuguesa, desde longos anos, dando-nos a impressão de se tratar de
uma evolução normal, comum a mais de uma língua românica, e não de uma simples influência
francesa. Entretanto, notáveis mestres condenam este uso como galicismo: Epifânio Dias,
Júlio Moreira, Leite de Vasconcelos, Mário Barreto, entre outros. Defendem-no Otoniel Mota,
Said Ali, Eduardo Carlos Pereira, Cláudio Brandão, entre outros.
Para os que têm a expressão como francesa, deve-se substituir o gerúndio por uma oração
adjetiva iniciada por pronome relativo, ou por uma preposição conveniente:
 Livro contendo gravuras
 passaria a
 Livro que contém gravuras
 ou
 Livro com (ou de) gravuras.
Aceitar o gerúndio como construção vernácula não implica adotá-lo a todo momento,
acumulando-o numa série de mau gosto. Em muitos casos, como bem pondera Rodrigues Lapa
[RLp.1, 227], “não há dúvida que o uso do gerúndio é preferível à oração relativa, sobretudo
quando não temos o recurso acertado, expressivo das preposições. Não abusemos dele, mas
não hesitemos em empregá-lo, sempre que o reconheçamos superior a outros modos de
escrever”.
 
c) particípio:
“Os anais ensanguentados da humanidade estão cheios de facínoras, empuxados (= que foram empuxados) ao crime
pela ingratidão injuriosa de mulheres muito amadas, e perversíssimas” [CBr.1, 120].
 
Orações adverbiais reduzidas
Têm o verbo, principal ou auxiliar, no:
A) infinitivo: caso em que, normalmente, se emprega o verbo regido de preposição
adequada. Para o desdobramento da reduzida em desenvolvida basta substituir a
preposição ou locução prepositiva por uma conjunção ou locução conjuntiva do mesmo
valor e pôr o verbo na forma finita. É de toda conveniência conhecermos as principais
preposições que correspondem a “conjunções” subordinativas adverbiais, porque isso
melhor nos adestra na plástica da sintaxe portuguesa:
 
1) para as causais temos:
a) com:
“Porém, deixando o coração cativo,/ com fazer-te a meus rogos sempre humano,/ fugiste-me traidor...” [RD.1, c. VI].
Com fazer-te = porque te fizeste sempre humano.
b) em:
“Em verdade, bem louco deve ser este homem em estar a plantar agora esta nogueira, como se estivesse ainda no
vigor da mocidade” [LCo apud JR.5, 38].
em estar a plantar = porque está a plantar;
c) por:
“... é tão desairoso falar um homem a sua língua mal, sob o pretexto de que ela é difícil, como tirar as botas num salão
por lhe doerem os calos” [SR.1].
d) visto:
Visto sair de manhã bem cedo, não é muito conhecido pelos vizinhos.132
e) locuções prepositivas: à força de, em virtude de, em vista de, por causa de, por motivo
de, devido a, etc.:
“À força de se tornar trivial, esta verdade eterna, que resume todo o espírito do cristianismo, deixou de ser para
muitos” [AH.2, 159].
 
2) para as concessivas:
a) com:
Com fazer todas as obrigações corretamente, não conseguiu livrar-se da falência.
com fazer = embora fizesse;
 
b) sem, negando a causa e a consequência, pode exprimir a concessão:
“Este era funestamente o sistema colonial adotado pelas nações que copiavam sem o entender nem fecundar, como os
romanos, o governo discricionário das províncias avassaladoras” [LCo apud FB.1, 215].
 
c) malgrado:
Estudou malgrado ter perdido o caderno.
 
d) não obstante:
Saíram não obstante terem ouvido os conselhos do pai.
 
e) locuções prepositivas: apesar de, sem embargo de:
“Apesar, porém, da casa ser tida como imagem dos perigos e privações da guerra, e do duque haver adquirido com
ela grande disposição e robustez, observou-se depois que as armas o atraíam pouco” [RS.2, IV, 96].
 
3) para as condicionais (e hipotéticas):
a) a:
“... houve quem visse, ou fingisse ver, um notável reflexo que a ser verdadeiro devia nascer das muitas luzes que
provavelmente estariam acesas” [AH.2, 83].133
No seguinte trecho vale por uma comparativa hipotética do tipo de como se ou modal:
“... depois veio a mim, que estava sentado, deu-me pancadinhas na testa, com um só dedo, a repetir: – Isto, isto – e eu
não tive remédio senão rir também, e tudo acabou em galhofa” [MA.1, 209].134
Observação: como a + infinitivo
 
b) sem:
Não sairá sem apresentar os exercícios.
 
4) para a consecutiva: de:
É feio de meter medo.
 
5) para as finais:
a) a:
“Muitos personagens eminentes do Império e diversas famílias, ligadas por aproximação de afeto à família imperial,
apresentaram-se a falar ao imperador...” [RP apud FB.1, 145].Observações:
1.ª) O infinitivo das orações finais pode aparecer sem preposição: “Diz-se que ele era um dos doze que foram a Inglaterra
pelejar (= para pelejar) em desagravo das damas inglesas, fato assaz duvidoso...” [AH.2, 92].
Construções deste tipo, aproximando-se o infinitivo do verbo principal anterior (foram pelejar), permitiriam um início de
locução verbal, onde o 1.º verbo passaria a ser sentido como auxiliar modal denotador de movimento para realizar um intento
futuro. Este histórico importa para a explicação do emprego antigo da preposição a, suplantado depois, entre brasileiros
principalmente, pela preposição em, no termo adverbial de lugar. Em O rio Amazonas vai desaguar ao Atlântico, temos ainda
vestígio da fase em que o sentimento linguístico levava em consideração o verbo de movimento, vai desaguar (= para
desaguar). Perdida esta noção de movimento, vai ao Atlântico desaguar passou a ser interpretado como um todo,
prevalecendo a regência que competia ao verbo desaguar: vai desaguar no Atlântico.
Ambas as construções são corretas, tendo sido esta última, sem razão, recriminada por certos gramáticos:
“Veio embarcar-se (D. João) a Aldeia Galega, aonde o guardavam muitos fidalgos e eclesiásticos” [RS.2, IV, 171];
“Do outro lado da povoação corre o pequeno rio... que vem desaguar no Lucus” [AH.2, 70];
“... enquanto a frota se ia colocar na boca do rio a que deu nome aquela povoação” [AH.2. 70].
2.ª) Sobre a construção questão a resolver.
 
b) de:
Dava aos pobres algo de comer pela manhã.
Observação: Estas expressões alternam com as de preposição a: Dava aos pobres algo a comer pela manhã. Entretanto,
parece entrever aqui uma imitação do francês: “A preposição à entre donner e infinitivo equivale a de: donner à boire et à
manger, dar de comer e beber; donner à diner à quelqu’um, dar de jantar; elle lui donna à souper, deu-lhe de cear.
Nessas construções dar de comer, dar de almoçar, dar de mamar, pedir de beber, pedir de almoçar, ganhar de comer, o
complemento formado por de e um infinitivo é, na sua origem, de caráter adjetivo. Dê-me algo, alguma coisa, qualquer coisa
de comer, é como se disséramos algo comível ou comestível. Omitido o substantivo, significa por si só as coisas sobre que se
exerce a ação do infinitivo: dê-me de comer = dê-me coisa que comer” [MBa.3, 129]. Apesar do voto do ilustre mestre,
julgamos ser irreprovável a linguagem dar a comer. Epifânio Dias [ED.2, § 293, a, 1] não vê galicismo na construção: dar a
alguém algo a beber.135
 
c) para:
“Tudo isto diz o quadro a quem tiver olhos para ver, coração para sentir, entendimento para perceber” [AH.2, 165].
 
d) por, hoje mais rara, fixada em por assim dizer e semelhantes:
“Recomendava el-rei D. Manuel, por suas cartas, a Afonso de Albuquerque que trabalhasse por haver às mãos a
cidade de Adém” [AH.2, 105].
 
e) em:
“e por isso posto que a Inglaterra não precisasse dela, para este fim, trabalhou em possuí-la para que os holandeses
não se aproveitassem das vantagens que a sua situação oferecia” [AH.2, 102-3].
“Dois meios havia em seguir esta empresa” [AH.2, 69].
 
f) locuções prepositivas: a fim de, com o fim de, etc.:
“Da sua parte, os alunos não devem dar de mão à gramática elementar a fim de se exercitarem nos verbos e adquirirem
outras noções básicas e, como tais, indispensáveis...” [SR.1].
 
6) para iniciar orações locativas reduzidas (correspondem a orações justapostas): em:
“Filha, no muito possuir não é ainda posta a felicidade, mas sim no esperar e amar muito” [AC apud JR.5, I, 37].136
 
7) para as ideias de meio e instrumento:
a) com:
“... até o (D. Afonso) induzirem a mandá-lo (D. Pedro) sair da corte, ao que D. Pedro atalhou com retirar-se antes que
lho ordenassem” [AH.2, 91].
 
b) de:
“Eu não sou, minha Nise, pegureiro,
Que viva de guardar alheio gado” [TG.1, 15].
 
8) para as temporais:
a) tempo anterior: antes de:
“E, se ambos, morrermos antes de estarem em idade que se possam por si manter, terão por pai aquele que mora nos
céus” [AC apud JR.5, 35].
 
b) tempo concomitante: a (neste caso o infinitivo pode vir ou não precedido de artigo):
“Tais eram as minhas reflexões ao afastar-me do pobre...” [AH.2, 190].
“E o moço, a falar de sua mãe, chorava...” [CBr.6, 59].
 
c) tempo posterior: depois de, após:
“A borboleta, depois de esvoaçar muito em torno de mim, pousou-me na testa” [MA.1, 99].137
 
d) tempo futuro próximo: perto de, prestes a:
“... e só abandona (o comandante) o posto quando voa em socorro da Parnaíba ou do Belmonte, prestes a soçobar”
[Ouro Preto apud FB.l, 84].
 
e) duração de prazo: até:
“... o Sália... arrancava os penedos, aluía as raízes das árvores seculares, carreava as terras e rebramia com som
medonho, até chegar às planícies...” [AH.1, 236].
Observação final: É importante não confundirmos (e às vezes se não podem traçar limites rigorosos neste assunto (por
serem razões extraídas dos elementos fornecidos pelo texto e não pela gramática) em certas expressões, o conjunto
preposicional com um substantivo seguido de seu complemento nominal reduzido de infinitivo. Como bem ensina José Oiticica,
“em certas locuções como por causa de, por motivo de, em virtude de, em vista de, etc., a oração de infinitivo não deve ser
tida por complementar. Exemplo: “Em vista de lhe haverem furtado a chave, não pôde abrir o depósito”. Esta oração de
infinitivo seria complementar se o substantivo vista conservasse seu valor semântico; porém, na locução, desapareceu tal valor,
e vigora num todo meramente prepositivo”.138 E mais adiante continua: “Com locuções: no intuito de, no propósito de, com
intenção de, etc., as orações são complementares, porque os substantivos mantêm seu valor (semântico) normal”. Destarte, é
de valor adjetiva completiva nominal reduzida grifada do seguinte período:
“Mandou então el-rei por seus arautos apregoar à roda do arraial de D. Pedro que, sob pena de serem havidos em
conta de traidores, todos os que seguiam o Duque de Coimbra o abandonassem” [AH.2, 96}.
B) gerúndio e aí equivalente a:
1) uma oração causal:
“Vendo este os seus maltratados, mandou disparar algumas bombardas contra os espingardeiros” [AH.2, 97].
vendo = porque visse;
2) uma oração consecutiva:
“Isto acendeu por tal modo os ânimos dos soldados, que sem mandado, nem ordem de peleja, deram no arraial do
infante, rompendo-o por muitas partes” [AH.2, 97].
rompendo-o = e como consequência o romperam;
3) uma oração concessiva:
Tendo mais do que imaginavam não socorreu os irmãos.
tendo = embora tivesse;
4) uma oração condicional:
Tendo livres as mãos, poderia fugir do cativeiro.
tendo livre as mãos = tivesse livres as mãos.
5) uma oração que denota modo, meio, instrumento:
“Um homem agigantado e de fera catadura saiu da choupana murmurando sons mal-articulados” [AH.1 apud ED.2, §
316, b, 1].
“E não os (destinos) podia realizar senão ceifando cidades em lugar de farragiais, e enfeixando com mão robusta
povos” [AC.1 apud ED.2, 2].
6) uma oração temporal:
“El-rei, quando o mancebo o cumprimentou pela última vez, sorriu-se e disse voltando-se: Por que virá o conde quase
de luto à festa?” [RS apud FB.5, 205].
voltando-se = enquanto se voltava;
No seguinte exemplo se acha reforçado por um advérbio de tempo:
“Desviando depois a mão que o suspendia baixou mais dois degraus” [RS apud FB.5, 209].
desviando = depois que desviou, no momento em que desviou.
Observação: O gerúndio pode aparecer precedido de preposição em quando indica tempo, condição ou hipótese. Neste caso,
o português moderno exige que o verbo da oração principal denote acontecimento futuro ou ação que costuma acontecer:
“Ninguém, desde que entrou, em lhe chegando o turno, se conseguirá evadir à saída” [RB apud FB.1, 126].
Aqui o gerúndio indica tempo, e o verbo da principal exprime ação futura (conseguirá).
“Em Vieira morava o gênio: em Bernardes o amor, que, em sendo verdadeiro, é também gênio” [AC apud FB.1, 186].
Nesta passagem, o gerúndio exprime condição ou hipótese, e o verbo da oração que é também gênio (subordinante dacondicional) denota um acontecimento que costuma ocorrer.
 
C) particípio e aí equivale a:
1) uma oração causal:
“Irado o infante com as injúrias que lhe tinham dito, mandou enforcar uns e degolar outros...” [AH.2, 96].
2) uma oração condicional:
Entramos em uma batalha, onde, vencidos os inimigos, honraremos nosso país.
vencidos = se forem vencidos.
3) uma oração temporal:
“E neste sentido, mudados os nomes, fez uma comunicação à sociedade cientista dos avicultores da imperial cidade da
Mogúncia” [JR.2, 42].
Observações:
1.ª) Nestes empregos do particípio, observam-se as regras de concordância, estudadas no capítulo da Concordância, entre o
verbo e o seu sujeito.
2.ª) Alguns particípios passaram a ter emprego equivalente a preposições e advérbios: exceto, salvo, mediante, não obstante,
tirante, etc., e, como tais, normalmente devem aparecer invariáveis. Entretanto, não se perdeu totalmente a consciência de seu
antigo valor, e muitos escritores de nota procedem à concordância necessária:
“Os tribunais, salvas exceções honrosas, reproduziam, povoados de criaturas do valido, todos os defeitos do sistema”
[RS.2, IV, 67].
“A razão desta diferença é que a mulher (salva a hipótese do capítulo CI e outras) entrega-se por amor...” [MA.1,
327}.
Utilizar estas maneiras de dizer, devidas ao “amor excessivo da exatidão” é, como bem pondera Epifânio, expressar-se na
verdade com correção gramatical, mas de modo desusado [ED.2, § 220, a].
3.ª) Elegantemente podemos empregar, para a ideia de tempo, o particípio seguido de que e duma forma adequada do verbo
ser:
Acabado que foi o prazo destinado à revisão, os candidatos continuaram insatisfeitos.
Há discordância entre os autores quanto à natureza deste que posposto ao particípio. Para Maximino Maciel (Gramática
Descritiva, 368), é conjunção, segundo este trecho: “Também elegantemente se conjuncionalizam as reduzidas de particípio
passado, interpondo entre o particípio e o substantivo sujeito a conjunção que a uma forma do verbo ser, adaptável ao tempo,
exemplo: ‘A ideia republicana e democrática se acabaria em toda a Europa, eclipsado que fosse o esplêndido luzeiro que até
então lhe serviu de fanal’” (Latino Coelho, República e Monarquia).
Para Epifânio, o que é pronome relativo, e julgamos que com ele está a razão (cf. Sintaxe Histórica Portuguesa, § 91,c): “Na
qualidade de nome predicativo ou aposto, pode (o pronome relativo) referir-se a adjetivos (ou particípios), servindo de realçar a
qualidade ou estado: acabada que esteja a obra” (Cf. ainda a Gramática Francesa, § 282, 2, Obs. 1.ª).139
 
Orações reduzidas fixas
A nossa língua possui certo número de orações reduzidas que normalmente não aparecem
sob forma desenvolvida. Neste grupo se acham:
a) as orações subjetivas que se seguem a certos verbos, como caber, valer, impedir, em
construções do tipo de:
Coube-nos ornamentar o salão (e não: que ornamentássemos).
Valeu-nos estarem perto alguns amigos (e não: que estivessem perto).
Impediu-nos a viagem ter vindo ordem de voltarmos (e não: que veio).140
 
b) as orações objetivas diretas que se seguem a verbos como agradecer, perdoar e o
impessoal haver na expressão não há valer-lhe (e equivalentes) em construções do tipo:
“Perdoou-lhes o haverem-nos ofendido” [ED.1, § 226, b].
“E lá se vão: não há mais contê-los ou alcançá-los” [EC, 128].
 
c) as de sentido aditivo enfático do tipo (verbo no infinitivo):
“Além de que a fumarada do charuto, sobre ser purificante e antipútrida, dava aos alvéolos solidez, e consistência
aos dentes” [CBr.1, 108].
 
d) as que denotam pensamentos para cuja expressão não existem conjunções
subordinativas, como as que indicam:
1) exclusão (verbo no infinitivo):
“Em vez (diziam) dos nossos navios carregarem as mercadorias daqueles portos para o de Lisboa... são
embarcações estranhas as que hoje demandam as ilhas...” [RS.2, IV, 533].
Longe de desanimar com os obstáculos, reanima-se para vencê-los.
 
2) exceção (verbo no infinitivo):
“A filha estava com quatorze anos; mas era muito fraquinha, e não fazia nada, a não ser namorar os capadócios...”
[MA.1, 201].
3) meio ou instrumento (verbo no infinitivo ou gerúndio) e modo (verbo no gerúndio,
embora aqui haja conjunção correspondente):
“Salvou-o o senado, segurando-lhe a pessoa até poder sair a bordo de uma nau holandesa a 21 de maio” [RS.2, IV,
244].
Desmoralizou-o com desmenti-lo em público.
“Procurou este logo estorvar-lhe (a missão) por todos os ombros, prendendo-o ou matando-o.” [RS.2, 244].
Enfrenta a vida sorrindo dos perigos.141
 
	As Unidades no Enunciado
	C�
	3 – As chamadas Orações Reduzidas