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Honshu, Kyushu e Shikoku5. Imanishi observa estes animais em seu hábitat natural, entre outros lugares, na já mítica ilha de Koshima (“ilha da felicidade”, em japonês) frente à costa sudeste de Kyushu (município de Miyasaki). Foto 1: Vista aérea de Koshima. Nessa época, a ilha estava unida ao continente por uma faixa de areia. Foto a partir de um pôster, cortesia do Japanese Monkey Center. (Foto © J. Martínez-Contreras). Foto 2: Koshima, 2005. A praia está na encosta vulcânica, à esquerda da foto. Pois bem, a figura de Imanishi tem grande importância não apenas na tradição da primatologia, mas também na da filosofia de seu país. Como seu colega, o etólogo austríaco Lorenz, Imanishi faz uma incursão na filosofia ocidental que, lembremos, valorizou altamente o diálogo como meio para aproximar-se do conhecimento verdadeiro, uma tradição que foi renovada por pensadores dos séculos XVII e XVIII. Assim, Imanishi imagina diálogos entre personagens que representam, como antanho (HUME, 1673), correntes do pensamento. Publica seu trabalho seminal, 5 Os macacos estão ausentes de Hokkaido, a grande ilha do norte, que é fria demais para esses animais. A subespécieM. f. yakui é encontrada exclusivamente na pequena ilha de Yakushima, no sudeste do arquipélago. (Fotos unidas © J. Martínez-Contreras). 618 “A evolução da humanidade” (ITANI; NISHIMURA, 1973, passim)6, em 1952, o mesmo ano em que começam as pesquisas “com aprovisionamento” dos macacos japoneses e, rapidamente, as especulações sobre o que significa cultura frente aos extremos que são instinto e raciocínio. Em seu trabalho Imanishi introduz um diálogo entre um homem não culto, que manifesta assim o senso comum, um macaco e uma vespa, moderados em sua discussão por um evolucionista. Um evolucionista que não tenta impor suas ideias — um evolucionista neutro, que não quer favorecer especialmente nenhuma das três espécies — e que se eclipsa do debate afirmando que se trata apenas de ver o que há em comum entre o evolucionismo e cada uma das visões dos três personagens. A discussão concentra-se em torno do confronto entre o instinto, que caracterizaria os animais, e a cultura, que seria a marca exclusiva dos humanos. Podemos ver que o macaco ocupa uma situação intermediária entre a vespa, guiada pelo instinto, e o humano, pela cultura. Apesar de não termos podido ler o texto original — escrito em japonês — devemos lembrar que justamente nessa época os trabalhos dos pais da moderna etologia, Tinbergen e Lorenz, tinham alçado grande importância no ocidente. Apesar de que Imanishi também não o menciona, porque provavelmente não co- nhece sua obra, seria, na verdade, um experimento em torno das teorias de Rousseau (MARTÍNEZ-CONTRERAS, 2006, cap. IV) que sustentava que as sociedades humanas eram produto da reunião acidental —mas que não podiam voltar atrás — de indivíduos isolados que antes de sua “socialização” somente entravam em contato entre si para reproduzir-se. De qualquer maneira, os autores mostram como Imanishi faz predições para con- trastar empiricamente a parte do instinto da parte do aprendizado social, tanto nos primatas não humanos quanto entre nós. O japonês, que tinha lido, sem dúvida, Yerkes, lembra que o americano assinalava como alguns de seus chimpanzés nascidos e criados em cativeiro nem sempre faziam seus ninhos antes de dormir, o que podia indicar um comportamento que não era nem totalmente aprendido, nem totalmente inato. Yer- kes escrevia também sobre a dificuldade de ser mãe que experimentavam as fêmeas primíparas. Por isso, propunha o estudo de macacos crescidos em isolamento para abordar a velha pergunta sobre o que separa, nos humanos, a natura da cultura, proposta que é, sem dúvida, secundada por Imanishi, mas que na verdade fará a fama de outro pesquisador americano, Harlow (1965)7, alguns anos depois. Contudo, diferentemente de um filósofo ocidental, Imanishi propõe estudos experi- mentais sobre o problema. É assim que, de maneira mais prática, promove os esforços por aprovisionar dois bandos de macacos, um deles na agora famosa ilha de Koshima. É Imanishi, com efeito, quem introduz a tradição de complementar a alimentação dos 6 Citado e resumido pelos autores. O texto está realmente em japonês e não conhecemos versão ocidental do mesmo, mas sim muitas referências diretas a ele. 7 Considerado agora como o summum da crueldade contra os macacos pelos promotores do fim do sofri- mento dos animais de laboratório (http://www.primatefreedom.com & http://www.allanimals.org). 619 http://www.primatefreedom.com http://www.allanimals.org