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Filosofia da Biologia - Paulo C Abrantes-316

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Honshu, Kyushu e Shikoku5. Imanishi observa estes animais em seu hábitat natural,
entre outros lugares, na já mítica ilha de Koshima (“ilha da felicidade”, em japonês)
frente à costa sudeste de Kyushu (município de Miyasaki).
Foto 1: Vista aérea de Koshima. Nessa época, a ilha estava unida ao continente por uma faixa de areia.
Foto a partir de um pôster, cortesia do Japanese Monkey Center. (Foto © J. Martínez-Contreras).
Foto 2: Koshima, 2005. A praia está na encosta vulcânica, à esquerda da foto.
Pois bem, a figura de Imanishi tem grande importância não apenas na tradição da
primatologia, mas também na da filosofia de seu país.
Como seu colega, o etólogo austríaco Lorenz, Imanishi faz uma incursão na filosofia
ocidental que, lembremos, valorizou altamente o diálogo como meio para aproximar-se
do conhecimento verdadeiro, uma tradição que foi renovada por pensadores dos séculos
XVII e XVIII. Assim, Imanishi imagina diálogos entre personagens que representam,
como antanho (HUME, 1673), correntes do pensamento. Publica seu trabalho seminal,
5 Os macacos estão ausentes de Hokkaido, a grande ilha do norte, que é fria demais para esses animais.
A subespécieM. f. yakui é encontrada exclusivamente na pequena ilha de Yakushima, no sudeste do
arquipélago. (Fotos unidas © J. Martínez-Contreras).
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“A evolução da humanidade” (ITANI; NISHIMURA, 1973, passim)6, em 1952, o mesmo
ano em que começam as pesquisas “com aprovisionamento” dos macacos japoneses e,
rapidamente, as especulações sobre o que significa cultura frente aos extremos que são
instinto e raciocínio. Em seu trabalho Imanishi introduz um diálogo entre um homem
não culto, que manifesta assim o senso comum, um macaco e uma vespa, moderados
em sua discussão por um evolucionista. Um evolucionista que não tenta impor suas
ideias — um evolucionista neutro, que não quer favorecer especialmente nenhuma
das três espécies — e que se eclipsa do debate afirmando que se trata apenas de ver o
que há em comum entre o evolucionismo e cada uma das visões dos três personagens.
A discussão concentra-se em torno do confronto entre o instinto, que caracterizaria
os animais, e a cultura, que seria a marca exclusiva dos humanos. Podemos ver que
o macaco ocupa uma situação intermediária entre a vespa, guiada pelo instinto, e o
humano, pela cultura. Apesar de não termos podido ler o texto original — escrito
em japonês — devemos lembrar que justamente nessa época os trabalhos dos pais da
moderna etologia, Tinbergen e Lorenz, tinham alçado grande importância no ocidente.
Apesar de que Imanishi também não o menciona, porque provavelmente não co-
nhece sua obra, seria, na verdade, um experimento em torno das teorias de Rousseau
(MARTÍNEZ-CONTRERAS, 2006, cap. IV) que sustentava que as sociedades humanas
eram produto da reunião acidental —mas que não podiam voltar atrás — de indivíduos
isolados que antes de sua “socialização” somente entravam em contato entre si para
reproduzir-se.
De qualquer maneira, os autores mostram como Imanishi faz predições para con-
trastar empiricamente a parte do instinto da parte do aprendizado social, tanto nos
primatas não humanos quanto entre nós. O japonês, que tinha lido, sem dúvida, Yerkes,
lembra que o americano assinalava como alguns de seus chimpanzés nascidos e criados
em cativeiro nem sempre faziam seus ninhos antes de dormir, o que podia indicar um
comportamento que não era nem totalmente aprendido, nem totalmente inato. Yer-
kes escrevia também sobre a dificuldade de ser mãe que experimentavam as fêmeas
primíparas. Por isso, propunha o estudo de macacos crescidos em isolamento para
abordar a velha pergunta sobre o que separa, nos humanos, a natura da cultura, proposta
que é, sem dúvida, secundada por Imanishi, mas que na verdade fará a fama de outro
pesquisador americano, Harlow (1965)7, alguns anos depois.
Contudo, diferentemente de um filósofo ocidental, Imanishi propõe estudos experi-
mentais sobre o problema. É assim que, de maneira mais prática, promove os esforços
por aprovisionar dois bandos de macacos, um deles na agora famosa ilha de Koshima.
É Imanishi, com efeito, quem introduz a tradição de complementar a alimentação dos
6 Citado e resumido pelos autores. O texto está realmente em japonês e não conhecemos versão ocidental
do mesmo, mas sim muitas referências diretas a ele.
7 Considerado agora como o summum da crueldade contra os macacos pelos promotores do fim do sofri-
mento dos animais de laboratório (http://www.primatefreedom.com & http://www.allanimals.org).
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http://www.primatefreedom.com
http://www.allanimals.org

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