Prévia do material em texto
GASTRONOMIA BRASILEIRA I Luana Costa Características dos estados RS, SC e PR Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar o estado do Paraná, sua história e sua cultura. � Reconhecer a parte histórica e alimentar de Santa Catarina. � Descrever a cultura colonizadora do estado do Rio Grande do Sul. Introdução A região Sul brasileira é composta por três estados – Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul –, os quais são mundialmente conhecidos como a Europa brasileira por conta do seu histórico colonizador. Devido a essa colonização europeia, os estados mantêm até hoje as fortes influências em seu dia a dia. Tais influências podem ser vistas nas construções, nas festas regionais e, principalmente, na alimentação. Neste capítulo, você vai estudar a parte histórica, a geografia, a fauna e a flora e as influências da colonização na alimentação dos três estados da região Sul do Brasil. Paraná História O nome Paraná significa rio. O estado ganhou esse nome, pois o Rio Paraná faz fronteira com o oeste do território, onde existia o Salto de Sete Quedas, que hoje está submerso pela represa da Usina Hidrelétrica de Itaipu. Durante milhares de anos a região que constitui o estado do Paraná era povoada por indígenas até a chegada dos exploradores europeus. Os principais povos eram os carijós, que habitavam a região litorânea, os tupis e os caingan- gues, os quais estavam localizados mais no interior, e o grupo jê. No século XVI, essa região foi praticamente esquecida por Portugal, o que acabou favorecendo a exploração por outros países que tinham interesse específico na madeira de lei. Aproveitando esse descuido de Portugal, as expedições espanholas também traziam consigo os religiosos da Companhia de Jesus, os quais eram responsáveis pela fundação dos primeiros centros de povoamento, localizados a oeste do Paraná. A descoberta do ouro nas terras paranaenses ocorreu no início do século XVII, período em que os luso-brasileiros começaram a ocupar a região por meio de expedições bandeirantes, as quais saíam da cidade de São Vicente. A extração de ouro era extremamente precária, devido ao desconhecimento de métodos adequados para essa atividade e também pela falta de mão de obra. Logo depois, com a descoberta de ouro em Minas Gerais, o ouro do Paraná deixou de ser importante. Somente em 1820 o território do Paraná foi entregue a Portugal e recebeu o nome de Comarca de Curitiba. Curitiba se dedicou à atividade pecuária desde então e prosperou muito, pois havia a necessidade de prover alimentos e os transportar para os mine- radores de Minas Gerais. Com a abertura do Caminho Viamão-Sorocaba, trecho que fazia a ligação entre Rio Grande do Sul e São Paulo por Curitiba, a região paranaense deu início a mais uma fase histórica, conhecida como Tropeirismo, que seguiu firme pelos séculos XVII e XIX. No final do século XIX, a economia paranaense sofreu um novo impulso devido à implantação das ferrovias, que eram responsáveis pela interligação das matas de araucária com os portos, como Paranaguá e São Paulo. Curitiba, que hoje é a capital paranaense, só foi reconhecida como cidade após uma lei provincial paulista, assinada em 29 de agosto de 1853 pelo im- perador Pedro II do Brasil. Em 1889, houve um intenso povoamento no estado do Paraná, justificado, principalmente, pela procura da já conhecida terra roxa do norte do estado. A principal atividade desenvolvida foi o plantio do café. A partir desse momento, as fazendas cafeeiras foram instaladas e as cidades estabelecidas. A Revolução Federalista e a Revolta da Armada, ocorridas durante a gestão do então presidente Floriano Peixoto, tiveram grande repercussão devido à expressiva quantidade de combates travados. A Guerra do Contestado — que era um conflito entre os habitantes pobres da região localizada entre os rios Uruguai, Pelotas, Iguaçu e Negro e as forças oficiais, além do Paraná e de Santa Catarina, que disputavam o domínio dessa região por meio de um conflito armado – teve início em 1912 e acabou em 1916. Logo depois, com a Revolução de 1930, Getúlio Vargas assumiu a presidên- cia do Brasil e a sua administração não encontrou resistência no Paraná. O único Características dos estados RS, SC e PR2 governante do Paraná na era Vargas foi Manuel Ribas, que foi responsável por importantes obras, tais como o reaparelhamento do Porto Paranaguá, além da interligação de rodovias entre algumas cidades e a melhoria na infraestrutura educacional, da saúde e de demais áreas. Geografia e fauna O solo de maior fertilidade do Brasil, conhecido como terra roxa, cobre mais de 40% do território paranaense, principalmente no norte do estado, o que justifica a expansão da prática cafeeira desde 1920. O contrário ocorre nas regiões ocupadas por florestas e formações campestres, onde o solo é infértil. O estado do Paraná tem um dos mais altos relevos do Brasil, haja vista que cerca de 52% do território está localizado em altitudes superiores a 600 m e somente 3% do território está localizado em altitude inferior a 300 m. Cerca de 9% do território do estado é coberto por campos limpos, uma espécie de vegetação rasteira que é composta de plantas herbáceas, as quais predominam o leste do planalto, além das cidades de Curitiba, Castro, Guarapuava e Palmas e o Planalto Basáltico. Já os campos cerrados, ou caatinga, representam apenas 1% da área estadual e esses terrenos mais baixos estão localizados na baixada litorânea. A parte norte, fragmentada, deu origem à baía de Paranaguá. A sua bacia hidrográfica é formada por importantes rios, como o Rio Paraná, Rio Iguaçu, Rio Ivaí, Rio Tibagi, Rio Paranapanema, Rio Itararé e o Rio Piquiri. A maioria desses rios é afluente do Rio Paraná, sendo o rio Paranapanema o de maior extensão. Os rios com menor extensão descem em direção ao litoral e desembocam no Rio Ribeira de Iguape, em direção ao estado de São Paulo. A fauna paranaense é bem diversificada, variando conforme o ambiente geográfico e composta por espécies terrestres, localizadas nas florestas e nos campos, espécies aquáticas, que habitam o mar ou os rios da região, e uma grande variedade de anfíbios, cujo habitat varia entre terra e água. Animais como a anta, o lobo-guará, o guaraxaim, o caititu, o bugio, a onça, o gato-do-mato, a jaguatirica, o tatu, a paca, o veado e o quati estão entre as espécies terrestres mais comuns dessa região. Entre as aves, o destaque fica por conta do papagaio, do tucano, da gralha, do pica-pau, do bem-te-vi, entre outros. Os rios da região, muito disputados entre os praticantes da pesca esportiva ou para consumo dos moradores da região, têm uma rica diversidade de peixes. Destes, os mais importantes são o jaú, o dourado, o pintado e o surubim, os 3Características dos estados RS, SC e PR quais são especialmente encontrados no rio Paraná e seus afluentes. Já a fauna marinha é composta por peixes como pescada, tainha, robalo, linguado, bem como o boto, que é um mamífero aquático. Os destaques da fauna anfíbia são o cágado, a tartaruga marinha, a lontra, a ariranha e o jacaré. Essas espécies podem ser encontradas no Rio Paraná e em outros rios litorâneos. Imigração Os primeiros a colonizar o estado do Paraná foram os espanhóis, por meio de um programa provincial de imigração, promovido para expandir a colonização europeia e o aparecimento de novas economias. Por conta desse programa, o estado também foi colonizado por portugueses, italianos, alemães, franceses, ingleses, poloneses, ucranianos, japoneses, coreanos e árabes. Os povos indígenas também contribuíram para a formação do povo parana- ense e se sabe que ainda vivem, no estado, cerca de 9 mil índios, os quais estão divididos em 19 grupos responsáveis pela ocupação de uma área de 85.264,030 hectares de extensão. Existe também uma grande concentração de pessoas que migraram de outros estados brasileiros para o Paraná,principalmente em busca de melhores condições de vida. Influências gastronômicas A cultura alimentar paranaense recebeu influência principalmente dos povos europeus, negros e indígenas que habitavam a região. No século XIX, com a chegada de alemães, italianos, poloneses, ucranianos e russos, essa experiência se tornou ainda mais rica. As influências gastronômicas geradas pela migração de outras correntes, como a paulista, a mineira, a nordestina e a gaúcha, também contribuíram para o enriquecimento dessa história, tendo participação direta do tropeirismo e dos porcadeiros (tropeiros que levavam porcos para outras regiões). O Paraná tem, entre seus principais pratos, o barreado, a quirera com suã, o pão no bafo, a carne de onça e a grande variedade de pratos feitos à base de pinhão, que são reconhecidos como patrimônio cultural imaterial. Além dos pratos já reconhecidos, as festas típicas, também com destaque para os pratos preparados com carnes diversas, movimentam a economia e o turismo Características dos estados RS, SC e PR4 das cidades, as quais contam também com as chamadas rotas turísticas do café e do vinho. Os hábitos alimentares dos paranaenses são bem diferentes entre deter- minadas regiões. Um exemplo é o consumo de pimenta nos locais onde o clima é mais elevado. Já nas regiões mais frias, o consumo de carne é maior, enquanto em outras regiões prevalece o consumo de massas e vinhos. Até mesmo nas regiões do litoral, a influência europeia é tão preponderante que o prato que tem maior representatividade é um cozido de carnes. Toda essa diversidade gastronômica é justificada, principalmente, pela imigração dos povos europeus, africanos e orientais. Por ser um estado localizado na região Sul do país, há predominância de pratos quentes e, entre eles, o que tem maior destaque na culinária paranaense é o barreado, que pode ser encontrado em festas típicas há mais de 300 anos. Na história desse prato, conta-se que ele era preparado por índios carijós, que também fabricavam as próprias panelas de barro. O barreado é feito com cortes menos nobres da carne bovina, tais como acém e músculo. Esses cortes e outros ingredientes ficam cozinhando em panela de barro por mais ou menos 12 horas, sendo que a panela fica barreada, ou seja, fica vedada por uma massa de farinha de mandioca e água para evitar que o vapor escape (Figura 1). Passadas essas 12 horas, é possível ver os pedaços de carne se desmanchando em meio ao molho. Como acompanhamento, são servidos farinha de mandioca, banana e rodelas de laranja. Figura 1. Barreado. Fonte: Ribeiro (2016, documento on-line). 5Características dos estados RS, SC e PR Foz do Iguaçu é um município do estado do Paraná que é considerado aquele com maior número de quedas d’água, tendo cerca de 250 cascatas de até 75 m de altura. Conhecida internacionalmente, a Garganta do Diabo é uma das maiores atrações do conjunto de cataratas do mundo. Santa Catarina História Com o início das expedições europeias ao nosso continente, Santa Catarina também se tornou, rapidamente, uma parada obrigatória para exploração das riquezas naturais. O primeiro explorador a chegar a Santa Cataria foi o português Juan Dias Solis, em 1515. Nessa época, os índios carijós e um grupo de índios tupi-guarinis habitavam o território. Antes de se chamar Santa Catarina, Juan Dias Solis deu ao lugar o nome de Baía dos Perdidos, devido ao naufrágio de um navio local, que ocorreu entre a Ilha de Santa Catarina e o Continente. Outro explorador a se aventurar pelo território foi o italiano Sebastião Caboto, que prestava serviços à Espanha e chegou com a sua expedição em 1526. Mesmo tendo chegado ao território depois do português Juan Dias, Sebastião Caboto também fez questão de dar nome ao local. Em seus mapas, ele chamava esse território de Porto dos Patos. Há grandes dúvidas sobre quem batizou a cidade com o nome de Santa Catarina. A primeira vez que se viu o nome atual sendo aplicado de maneira oficial foi no mapa-múndi de Diego Ribeiro, cartógrafo português que também trabalhava a serviço da coroa espanhola. Alguns historiadores atribuem a Sebastião Caboto o nome da cidade, que foi dado como forma de homenagem à sua esposa – Catarina Medrano. Outra hipótese é que o nome tenha sido dado em homenagem à Santa Catarina de Alexandria, que é uma santa católica festejada pela igreja no dia 25 de novembro. Apesar da descoberta, em meados de 1500, o território só começou a ser povoado 100 anos depois, a partir da chegada dos bandeirantes, que iniciaram a sua ocupação em um lugar chamado Nossa Senhora do Desterro, o qual mais tarde foi chamado de Florianópolis. Em 1714, nasceu o segundo município, Características dos estados RS, SC e PR6 chamado de Santo Antônio dos Anjos da Laguna, hoje chamado apenas de Laguna. A Coroa Portuguesa estruturou muito bem as posições de suas tropas no estado, uma vez que era o posto mais avançado da América do Sul, o que provocou a ira dos espanhóis, que resolveram tomar a ilha em 1777, expulsando todos que a ocupavam. Tudo isso foi em vão, pois no final do mesmo ano a ilha foi devolvida a Portugal depois da assinatura do Tratado de Santo Idelfonso. O estado conserva até hoje alguns dos principais pontos históricos que trazem a lembrança dos combates que ocorreram no passado. Há 18 km do centro de Santa Catarina, é possível conhecer a Serra da Garganta, local onde, em 1930, ocorreu a guerra entre os revolucionários gaúchos de Getúlio Vargas e os soldados da força pública catarinense. Podemos afirmar que esse sangue guerreiro do povo catarinense se mantém evidente até hoje. Blumenau é a cidade que tem o maior número de clubes de atiradores de todo o mundo. No passado, a função dos atiradores era proteger o território e hoje em dia essa prática é voltada apenas para os campeonatos e as festas esportivas. Geografia Santa Catarina é o menor estado da região Sul do país, com apenas 95,4 mil km² e sendo dividido em oito regiões: Litoral, Nordeste, Planalto Norte, Vale do Itajaí, Planalto Serrano, Sul, Meio-oeste e Oeste. Suas características são realmente impressionantes, pois, mesmo com um rápido passeio pelo muni- cípio, é possível conhecer climas diferentes, regiões de montanhas, litoral, entre outros. Santa Catarina faz fronteira com o Paraná, o Rio Grande do Sul e a Ar- gentina e é um dos poucos estados brasileiros que ainda mantêm as quatro estações do ano bem definidas, tem chuvas distribuídas durante o ano todo e uma temperatura que varia entre 13 e 25°C. A região que mais sofre com o frio é o Planalto Serrado, devido à sua grande altitude, que atinge 1.820 m, sendo o local no Brasil com a maior incidência de neve. O estado tem vegetação mista entre mangue, restinga, praia, dunas e Mata Atlântica. A formação do território sofreu, até mesmo, intervenção do espaço na sua formação. Há mais de 100 milhões de anos, o local onde hoje está localizado o município de Vargeão sofreu com a queda de um meteorito. Este é um dos raros exemplos de astroblemas no território nacional. 7Características dos estados RS, SC e PR Trata-se de uma depressão circular, com aproximadamente 12 km de diâmetro. Em sua volta, ocorre a presença de vários arenitos, alcançando até 1000 m de distância da área de impacto. Todos esses arenitos estão bem visíveis até hoje. A exemplo dos estados vizinhos, Santa Catarina também tem um solo muito fértil, o que fez com que os imigrantes europeus tivessem interesse na região para a prática da agricultura. Imigração Os primeiros imigrantes que chegaram à região com a função real de povoar o território foram os alemães, em 1829, e logo depois os italianos, em 1877. É necessário compreender essa divisão entre colonos e povoadores, pois existia, na época, um programa nacional responsável pela imigração de europeus que se instalavam no país com a intenção de estruturar uma política de trabalho profissional e econômica na região. Dos descendenteseuropeus, quem mais esteve presente no processo de imigração foram os italianos, os quais são responsáveis pela herança arquite- tônica em vários municípios. Ao lado, é claro, da riquíssima herança alemã, que com o passar dos anos se mostrou muito mais evidente que a italiana nos grandes centros. Ao contrário do que se pensa, os imigrantes alemães chegaram ao Brasil primeiramente no sul da Bahia, por volta de 1818, e não diretamente na região Sul do país. Somente em 1829 é que os primeiros colonos vindos da Alemanha chegaram à Santa Catarina. A cronologia da ocupação alemã do território ocorreu da seguinte maneira: em 1850, foi fundada a colônia de Blumenau; em 1860, os imigrantes alemães, ao lado de imigrantes italianos, chegaram ao Vale do Itajai-Mirim, que hoje se chama Brusque; e em 1893, a colônia Harmonia se instalou no Vale do Itajaí do Norte, a qual hoje é conhecida como Ibirama. Os imigrantes italianos que vieram da região da Sardenha, na Itália, fun- daram, em 1836, a colônia Nova Itália, no Vale do Rio Tijucas. As outras colônias só começaram a se instalar 40 anos depois, na região ao redor de Blumenau e Brusque. Em 1877, outras colônias se instalaram ao longo do território, as quais são conhecidas hoje como Cacoal e Criciúma, sendo que essa colonização italiana se estendeu até 1823 e residia nos municípios que hoje são chamados de Nova Veneza e Siderópolis. Características dos estados RS, SC e PR8 A região de Santa Cataria também conta com imigrantes vindos da Polônia e da Ucrânia, os quais chegaram ao território até a segunda metade do século XIX, instalando-se, principalmente, nos vales dos municípios de Urussanga, Tubarão, Mãe Luzia, Araranguá, Itajaí, Itapocu, Rio Negro e São Bento do Sul. Mesmo depois desse período, os imigrantes continuaram chegando, instalando-se em vários locais do estado. Influências gastronômicas Italianos, alemães, portugueses, poloneses, italianos e ucranianos, todos esses imigrantes participaram diretamente do processo que deu origem à culinária local. Não é à toa que a gastronomia de Santa Catarina é tão rica. O litoral norte, onde ficam Itapema e o Balneário Camboriú, receberam influência dos portugueses e por isso são bastante conhecidos por seus frutos do mar. Entre os pratos típicos dessa região, podemos destacar a tainha na brasa e o camarão e a lula à dorê. Outro exemplo é Florianópolis, que é conhecida como a capital nacional da ostra. O Vale do Itajaí é conhecido como o Vale Europeu, haja vista que é região que, desde o século XIX, recebe influências alemã, austríaca e polonesa. Entre os principais pratos, destacam-se o kassler (chuleta de porco), o eisbein (joelho de porco) e o apfelstrudel (folhado de maçã). Os italianos buscaram as regiões mais frias, localizadas no planalto serrano, e também mantêm até hoje a sua gastronomia bastante evidente. Espaguetes, sopa de agnolini, lasanha, vinho e polenta estão entre os pratos mais comuns dessa região. Atualmente, muitos dos pratos típicos de cada uma dessas regiões recebem os toques da alta gastronomia, mantendo, ao lado da tradição, um toque de requinte e sofisticação. Entre os pratos alemães mais simples disponíveis em praticamente todo o estado, podemos destacar o Streuselkuchen, ou simplesmente cuca, como é conhecida pela maioria das pessoas. É um prato simples, que consiste em uma massa doce e fermentada, que é coberta por uma deliciosa farofa doce. A cuca pode receber diversos tipos de recheios, sendo que tradicionalmente esse recheio é feito com creme ou frutas vermelhas. Na sua versão tupiniquim, esse prato recebeu uma cobertura de banana. Entre os pratos alemães de maior tradição, podemos destacar o eisbein (joelho de porco), um assado que é servido com chucrute (repolho fermentado). 9Características dos estados RS, SC e PR Esse prato é melhor degustado acompanhado de uma boa cerveja, devido ao gosto forte da carne. Já do lado italiano, a receita mais tradicional e que se encontra facilmente espalhada pelas cantinas de Santa Catarina é a polenta. É um prato simples, pois se trata de um cozido feito com água e fubá, o qual pode ser substituído por pão ou macarrão. Em algumas versões brasileiras, tal iguaria também é servida frita. Blumenau tem a segunda maior festa da cerveja do mundo Blumenau, cidade pertencente ao estado de SC, é mundialmente conhecida como a segunda maior festa da cerveja depois da tradicional Oktoberfest alemã. A Oktoberfest de Blumenau foi inspirada na tradicional festa da cerveja alemã de Munique, na Alemanha. A primeira Oktoberfest dessa cidade aconteceu em 1984, e já na sua primeira e mais simples edição teve recorde de público, que ultrapassou mais da metade da população da cidade. A partir do ano de 1888, a festa, já conhecida nacional e mundialmente, passou a ser o principal destino turístico da cidade. Atualmente, a festa conta com sede própria, que é a famosa Vila Germânica, onde toda a decoração remete a uma cidade alemã. Esse local está aberto todos os dias do ano e não apenas em outubro, como acontecia até os anos 1990. A Vila Germânica é composta por várias lojas de produtos dedicados aos turistas, como, por exemplo, canecas de chope, camisetas, chaveiros, entre outros artigos, por lojas de produtos da culinária alemã, bem como por bares e restaurantes especializados em pratos dessa cultura. Rio Grande do Sul História A história desse estado tem início antes da data oficial da descoberta do Brasil, em 1500. Nessa região, ocorriam as disputas entre portugueses e espanhóis pelo domínio do Sul da América, entre os séculos XVI e XVII, período em que aconteceram as guerras que definiriam as fronteiras do Brasil com os países vizinhos, desde o Brasil Império até a República. Durante, praticamente, os 400 primeiros anos de sua história, os gaúchos estavam envolvidos com as guerras travadas para defender o seu território. Características dos estados RS, SC e PR10 O Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494, deu à Espanha o controle do território do Rio Grande do Sul e estabeleceu os limites com Portugal. A exploração econômica permitiu que os indígenas fossem escravizados, o que acabou chamando a atenção dos colonizadores europeus e provocou o envio dos jesuítas espanhóis para converter esses nativos. Até o início do século XVII, esse estado era conhecido como terra de ninguém e a sua ocupação só começou com a chegada dos padres jesuítas. Somente em 1682 estes fundaram a primeira cidade do Rio Grande do Sul, chamada São Francisco de Borja, atualmente conhecida como São Borja. Em 1740, um grupo de povoadores, apoiados pelo governo, instalou-se nas proximidades de Porto Dornelles e mais tarde essa população deu origem à cidade de Porto Alegre. O capítulo mais importante da história do Rio Grande do Sul foi a Revolução Farroupilha, também chamada de Guerra dos Farrapos, que durou 10 anos (1835-1845). Os principais líderes dessa revolução foram Bento Gonçalves e Giuseppe Garibaldi, que, embora não fizesse parte da carbonária, sempre esteve envolvido em movimentos republicanos na Itália. Essa revolta aconteceu, principalmente, pelo fato de a elite rio-grandense se render às ideias liberais iluministas, dessa forma, essas pessoas resolveram enfrentar os desmandos do poder imperial, que impunha altos impostos e ignoravam as reais necessidades da região. O conflito terminou em 1º março de 1945, com a assinatura do Ponche Verde, ou Paz do Ponche Verde, dando fim à ideia separatista e determinando que o estado fazia parte do Império do Brasil. Geografia e fauna As fronteiras da região do estado do Rio Grande do Sul foram determinadas depois de muitos conflitos entre o Brasil e os seus países vizinhos, além das disputas entre os portugueses e os espanhóis. O Rio Grande do Sul ocupa uma área de 282.062 km² e está localizado no extremo sul do Brasil. O relevo do estado se assemelha muito com o restante do país, devido à composição rochosa antiga depositadahá milhões de anos e sem a ação de manifestações tectônicas de grande expressão. Devido a esse fato, o relevo é relativamente tênue e tem diferentes unidades, variando conforme a sua altitude, o tipo de rocha e a forma predominante. O Rio Grande do Sul tem relevo e vegetação bastante diversificados, como veremos a seguir: 11Características dos estados RS, SC e PR � Pampas: a principal característica é a vegetação rasteira, composta, basicamente, por gramíneas, arbustos e árvores de pequeno porte, geralmente com boa resistência à falta de chuvas. � Planalto Serrano: situado na região Nordeste do estado, compreende uma área que ocupa mais da metade do território. O maior ponto é o Pico do Monte Negro, com 1410 m de altitude. Essa região tem vege- tação mista, variando entre campos limpos e vegetação de araucárias. � Região Lagunar: encontradas em grande quantidade, as lagunas (lagos de água salgada) estão localizadas na costa do estado, sendo que as maiores são a Lagoa dos Patos, que é uma das maiores do mundo, a Lagoa da Mangueira e a Lagoa Mirim. A região também conta com várias dunas e lindas praias. O clima tropical predomina na região, mantendo a temperatura média inferior a 18°C, além disso, as chuvas são bem escassas na região dos Pampas. O Rio Uruguai banha o estado e juntamente com os rios Guaíba, Taquari, Pelotas, Ijuí, entre outros, formam a bacia do Prata. Boa parte da fauna rio-grandense está localizada na região dos Pampas, a qual é composta de animais raros e ameaçados de extinção devido à caça e ao comércio ilegal dessas espécies. São cerca de 500 espécies de aves e mais de 100 espécies de mamíferos, das quais podemos destacar o quero-quero, o pica-pau do campo, o perdiz, a ema, o ratão do banhado, a capivara, o tatu-mulita, o graxaim, o zorrilho, a preá, o tuco-tuco, o sapinho de barriga vermelha, entre outros. Existem hoje, pelo menos, 280 espécies com algum grau de ameaça de extinção, sendo que os mais ameaçados são o lobo guará, a jaguatirica, o papagaio do peito roxo e o veado campeiro. Nos meses mais quentes, os ventos do norte, originados em baixas latitudes, ocasionam altas temperaturas, ao contrário dos ventos que invadem o estado nos meses de inverno, que são frios e de origem polar. É justamente essa diferença entre as estações climáticas que favorece a agricultura do estado, uma vez que o calor favorece o cultivo de produtos tropicais, como o arroz, milho, soja, fumo e outros, enquanto no inverno as melhores culturas são as do centeio, do linho e, principalmente, do trigo. A maior parte dos agropecuários do estado estão enquadrados no que chamamos de agricultura familiar, com cerca de 400 mil famílias, que são diretamente responsáveis pelo cultivo de aproximadamente 6 milhões de hec- tares. Apesar dos números, o Rio Grande do Sul é o terceiro estado brasileiro com maior número de pessoas atuando na agricultura familiar. Esse segmento da agricultura é notado, também, em atividades de agricultura empresarial, Características dos estados RS, SC e PR12 como, por exemplo, a bovinocultura de corte, a sojicultora e a triticultura, em que a participação dos estabelecimentos familiares é expressiva. Outra grande concentração de agricultores pode ser vista nas cooperativas. Há cerca de 138 cooperativas agropecuárias no estado, as quais são responsá- veis pela associação de 290 mil pessoas e pelo emprego de outras de 30 mil. Imigração Inicialmente habitada por índios das etnias charrua/minuano, guarani e cain- gangue, o estado do Rio Grande do Sul já recebia grande concentração de imigrantes europeus, mesmo antes da sua fundação oficial. Foi justamente essa imigração dos povos alemães, italianos, espanhóis e portugueses que consolidou a identidade desse povo. Essa imigração foi uma decisão provincial, apoiada por alguns e negada por outros. Quem apoiava a decisão de imigração, principalmente dos povos europeus, afirmava que a ideia de termos no país uma mão de obra formada por homens livres que tivessem habilidade profissional para trabalhar era uma oportunidade de produzir, aqui, produtos que até então eram importados. A ideia encontrou resistência entre os senhores de escravos, que davam como certa a ideia de que, a partir da imigração de profissionais, a mão de obra escrava deixaria de ter o seu valor. Contudo, não houve outra opção a não ser direcionar esses imigrantes apenas para o Rio Grande do Sul. Os primeiros a chegar foram os alemães, em 1824, que rapidamente começaram a mudar a economia do estado. Nos primeiros 50 anos, foram introduzidos cerca de 28 mil alemães no estado. Essa colonização não saía de graça para o Brasil. Com o sucesso obtido com os primeiros imigrantes, o governo brasileiro anunciou um pacote de benefícios para aqueles que quisessem ocupar o país, sendo que, entre estes, estava a passagem por conta do governo, a concessão gratuita de um lote de terra de 78 hectares, um valor em dinheiro no primeiro ano e o restante no segundo que era pago a cada colono. Proporcionalmente, conforme o número de pessoas de cada família, era fornecida uma quantia de cavalos, bois, vacas, porcos e galinhas. Em 1870, com a notícia de que os imigrantes alemães estavam passando necessidades no Rio Grande do Sul, a imigração alemã praticamente se ex- tinguiu, obrigando o governo brasileiro a buscar alternativas. Era vez de dar início à imigração italiana. 13Características dos estados RS, SC e PR Em 1875, chegaram ao estado os primeiros grupos, os quais vieram dire- tamente de Piemonte e Lombardia e, posteriormente, de Vêneto, instalando- -se nas colônias Conde d’Eu, que mais tarde passou a se chamar Garibaldi, e Dona Isabel, hoje chamada de Bento Gonçalves e Caxias. Os imigrantes italianos viviam, basicamente, da plantação e do cultivo de milho, trigo e outros produtos agrícolas. Mais tarde, com a introdução do cultivo de uvas, deu-se início à produção de vinho, que se transformou na principal economia dos colonos italianos. Como as terras baixas já estavam colonizadas pelos alemães, os italianos se instalaram no planalto norte. Entre 1875 e 1914, cerca de 100 mil italianos chegaram ao Rio Grande do Sul. A imigração europeia era algo tão sério, que até mesmo os índios que viviam na região foram expulsos da sua própria terra para que a colonização italiana fosse priorizada. Os imigrantes que vinham do norte da Itália eram instalados na região Sul do Rio Grande do Sul. Nesse local, eles criavam vilarejos e, inclusive, contavam com uma linguagem pró- pria, chamada de Talian, que mais tarde foi considerada, oficialmente, como patrimônio linguístico do estado. Influências gastronômicas A chegada dos alemães e dos italianos trouxe, ao Rio Grande do Sul, uma grande herança gastronômica, que até hoje é praticada em todo o estado. A batata, por exemplo, é um dos alimentos que passou a ser consumido em todo o país a partir da chegada dos alemães. O consumo de massas, polentas e frangos é costume dos italianos que também foram inseridos com sucesso no dia a dia das famílias gaúchas. De origem espanhola, as missões jesuítas introduziram, no Rio Grande do Sul, o gado bovino, que era criado solto e se passou a se multiplicar rapidamente na região. Mesmo com a iniciativa dos espanhóis de introduzir a criação de gado na cultura rio-grandense, foram os índios os primeiros a fazer uso dos novos animais, o que os fez um povo carnívoro, deixando as matas e iniciando a atividade pecuária. Outro animal introduzido pelos jesuítas foi a ovelha, devido à rapidez de crescimento e por ser um animal de pequeno porte. A ovelha era usada para abastecer os povos durante as missões, uma vez que a carne desse animal era de consumo diário e a lã muito utilizada. Os imigrantes espanhóis e italianos encontraram no Rio Grande do Sul a fartura que faltava em seus países. O gaúcho encontrou, com a chegada Características dos estados RS, SC e PR14 da culinária espanhola e italiana, a extravagânciaque faltava para tirar da simplicidade os pratos típicos da região. O churrasco, que antes da imigração era apenas composto por carne, pão e farinha, ganhou acompanhamento de batatas, saladas verdes, cebolas, tomates, polenta, carne de porco, linguiça, frango e, principalmente, o galeto, que hoje assume papel de destaque nos costumeiros churrascos dos gaúchos. Um dos pratos mais tradicionais da culinária gaúcha é o charque. Desde a época das cruzadas, os gaúchos já se alimentam deste que é um prato simples e que servia para alimentar todos os tropeiros. A origem do charque vem da riqueza dos Pampas e de Pelotas. Acredita-se que a tradição de usar o sal como conservante tenha vindo da Irlanda, pois lá o sal era usado para conservar o bacalhau. O charque consiste em pedaço de carne bovina com uma considerada quantidade de gordura, protegida por uma camada de sal fina, que é usada para desidratar a carne. Os tropeiros usavam essa técnica durante suas expedições, uma vez que os bois introduzidos pelos colonizadores jesuítas, que eram criados soltos, reproduziam-se com facilidade. Durante as expedições, os tropeiros levavam esse charque para outros estados, apenas usando o sal como conservante, garantindo, dessa forma, que o produto chegaria ao seu destino sem estragar. Outro alimento característico da cultura rio-grandense é o chimarrão, porém, este teve a sua origem nos povos indígenas das etnias caingangue, guarani, aimará e quíchua. RIBEIRO, C. Barreado, o que é? 2016. Disponível em: <http://www.mesacompleta.com. br/barreado-o-que-e/>. Acesso em: 15 jun. 2018. Leituras recomendadas ALMEIDA, G. Salvem a marmelada! Revista Isto É, São Paulo, ano 32, n. 2058, p. 62, 2009. BARBOSA, L. Tendências da alimentação contemporânea. In: PINTO, M. L.; PACHECO, J. K. (Org.). Juventude, consumo e educação. 2. ed. Porto Alegre: ESPM, 2009. p. 15-64. BONI, L. A.; COSTA, R. Os italianos no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, 1984. Referência 15Características dos estados RS, SC e PR http://www.mesacompleta.com/ BRAGA, V. Cultura alimentar: contribuições da antropologia alimentar. Saúde em Revista, Piracicaba, v. 6, n. 13, p. 37-44, 2004. COSTA, R. et al. Imigração italiana no Rio Grande do Sul: vida, costumes e tradições. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, 1974. FERNÁNDEZ-ARMESTO, F. Comida: uma história. Rio de Janeiro: Record, 2004. LEAL, M. L. M. S. A história da gastronomia. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2008. REINHARDT, J. C. Dize-me o que comes e te direi quem és: alemães, comida e identidade. 2007. 204 f. Dissertação (Doutorado em História) – Faculdade de Ciências, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2007. Características dos estados RS, SC e PR16 Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra.