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Victor Braga Gurgel | 201 104) traz informações sobre a proveniência na maioria das vezes. Em am- bos os materiais as fontes estão conectadas com a narrativa didática, e seguem um sentido lógico. Fábio Frizzo (2017, p. 83), em análise de outros cinco livros didáticos de História, chama a atenção para a ausência de men- ções a coleções e museus nos quais as peças representadas se encontram, demonstrando ser esta ausência algo comum. Já em relação às fontes es- critas, Boulos Júnior (2018, p. 97, 114) traz em dois momentos trechos da Sátira dos Ofícios, retirada do livro didático de Maurício Schneider. No entanto, Schneider não indica a proveniência da tradução que consta em seu livro. Vicentino e Vicentino (2015, p. 117) trazem apenas uma adapta- ção do mito de Ísis, Osíris e Hórus, traduzida do francês. Tais fatos demonstram uma ausência de textos egípcios antigos traduzidos para o português, o que se reflete diretamente no ensino de História. Retornando à metodologia de ensino, Vicentino e Vicentino (2015, p. 108-109) trazem uma seção, “Jeitos de mudar o mundo”, em que abordam o papel da mulher nas sociedades humanas desde a pré-história, passando pela Antiguidade até a contemporaneidade. Os autores apresentam fontes materiais – sem expressar a proveniência e atual localização das mesmas – porém, fazem uma discussão muito profícua sobre como o papel das mulhe- res foi mudando. Ademais, expõem como no século XX muitas conquistas foram feitas após muita luta, a exemplo do voto feminino no Brasil a partir de 1932, e a igualdade de direitos e deveres na Constituição de 1988. Boulos Júnior (2016, p. 63), no livro do 1º ano do Ensino Médio, traz informações sobre Hatshepsut (c. 1473-1458 a.C.), faraó mulher que reinou no Egito durante o Reino Novo (c. 1550-1070 a.C.) e rompeu com paradig- mas sociais e políticos. Após introduzi-la, ele questiona o estudante se o tema é novidade para ele, se ele conhece pessoas que aderiram à “egiptomania” – sem, no entanto, dar o significado do conceito – e afirma que Hatshepsut 202 | Histórias Antigas: entre práticas de ensino e pesquisa continua ditando modas atualmente. Percebe-se que o autor buscou dar im- portância aos conhecimentos prévios do estudante. Porém, seria válido explicitar os conceitos que ele mesmo traz, bem como que “modas” seriam essas ditadas até hoje por Hatshepsut. De todo modo, consideramos positiva a iniciativa, pois busca explorar o papel da mulher na Antiguidade, partindo do presente. (FUNARI & GARRAFONI, 2020, p. 195). No entanto, o ponto que mais nos chamou a atenção foi a menção à esfinge no livro de Boulos Júnior do 6º ano (2018, p. 94). O texto é uma citação direta do livro Egiptomania, o Egito no Brasil, organizado por Mar- garet Bakos. Vejamos a citação: Obra do faraó Quéfren (3098 a.C.), restaurada na XVIII dinastia por Tutmés IV, a esfinge de Gizé é, sem dúvida, a maior e mais conhecida de todas. Entre as patas do imenso corpo de leão, havia um templo subterrâneo, onde os oráculos se reuniam. BAKOS, Margaret. Egiptomania: o Egito no Brasil. São Paulo: Paris Editorial, 2004, p. 49. (BOULOS JÚNIOR, 2018, p. 94, grifos nos- sos). O trecho citado não é da autoria de Margaret Bakos, como afirma a citação. O livro é uma coletânea de artigos, dentre eles alguns da historia- dora, não sendo este o caso. A autoria do trecho é de Thiago Nicolau de Araújo e Harry Rodrigues Bellomo15, ambos pesquisadores cemiteriais. No entanto, a ideia de que entre as patas da Esfinge de Gizé havia um templo subterrâneo foi largamente difundida pela cultura histórica egip- tomaníaca do século XX. As chamadas “Salas de Registro” (Hall of Records) – termo cunhado pelo clarividente da Nova Era (New Age) Edgar Cayce – seriam supostas câmaras subterrâneas por baixo das patas da Esfinge de Gizah, e conteriam conhecimentos lá guardados pelos atlantes. 15 ARAÚJO, Thiago Nicolau de; BELLOMO, Harry Rodrigues. Presença do Antigo Egito nos cemitérios. In: BAKOS, Margaret (Org.). Egiptomania: o Egito no Brasil. São Paulo: Paris, 2004, p. 45-53.