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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ 19ª CÂMARA CÍVEL Autos nº. 0000073-03.2022.8.16.0091 Apelação Cível n° 0000073-03.2022.8.16.0091 Ap Vara Cível de Icaraíma ANA PAULA RIBEIRO DOS SANTOSApelante(s): OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOApelado(s): Relator: Desembargador Domingos José Perfetto APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO – CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – FINANCIAMENTO DE VEÍCULO – JUROS REMUNERATÓRIOS – TAXA APLICADA QUE É INFERIOR AO TRIPLO DA MÉDIA DO BACEN – LICITUDE – CONDIZENTE ÀS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO – VEÍCULO COM MAIS DE 10 ANOS DE USO – SENTENÇA MANTIDA – MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de , da VaraApelação Cível nº0000073-03.2022.8.16.0091 Cível da Comarca de Icaraíma, em que o apelante é e o apeladoAna Paula Ribeiro dos Santos Omni S. A. Crédito, Financiamento e Investimento. Por brevidade, adota-se o relatório consignado na r. sentença (mov. 62.1): “ANA PAULA RIBEIRO DOS SANTOS, qualificada nos autos, por meio de advogado devidamente constituído, ajuizou a presente AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO em face de OMNI S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, na qual alega, em síntese, que contratou um financiamento com o Banco Réu, sendo que foram cobrados juros acima da média de mercado. Assim, requereu a procedência da ação, consubstanciada na repetição do indébito em dobro. Ao final, juntou os documentos (mov. 1.1/1.7). Pela decisão de mov. 17.1, concedeu-se o benefício da assistência judiciária gratuita à autora e determinou-se o processamento do feito pelo rito comum. Devidamente citada, a requerida apresentou contestação no evento 15. No mérito, alegou a inexistência de abusividades; legalidade da taxa de juros contratada e que a taxa elevada se refere ao risco de financiamento de carros antigos, pleiteando pela improcedência dos pedidos. Pela decisão de mov. 51.1, consignou-se a inversão do ônus da prova e foi determinada a reabertura do prazo para a especificação de provas. Encerrada a fase de instrução, as partes pleitearam o julgamento do feito. Vieram os autos conclusos para deliberação. É o sucinto relatório. ” Sobreveio a r. sentença de mov. 62.1, em que o magistrado julgou improcedente o pedido iniciala quo para reconhecer a licitude dos juros remuneratórios fixados no contrato de financiamento com alienação fiduciária em garantia (4,48% a.m. e 69,20% a.a.). Diante da sucumbência do autor, este foi condenado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, sendo estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa. Todavia, a exigibilidade foi suspensa em vista da concessão do benefício de justiça gratuita. Irresignado, o autor interpôs recurso de apelação (mov. 65.1), aduzindo, em síntese, que: a) o juízo a quo utilizou a taxa de juros média da própria instituição financeira ré (56,08% a.a.), não a média oficial do Banco Central à época da celebração do contrato (20,80% a.a.); b) por conseguinte, os juros pactuados extrapolam em 3,32 vezes a média de mercado, razão pela qual sua abusividade deve ser declarada e o contrato revisto para reduzir os juros remuneratórios para a taxa média de mercado à época da celebração do contrato. Contrarrazões apresentadas pelo apelado Omni S.A. (mov. 70.1). É o relatório. Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso é conhecido. Antes de adentrar à matéria referente à abusividade, ou não, das cláusulas contratuais, necessária breve digressão acerca dos contratos, para que se esclareça, desde logo, a possibilidade de sua revisão pelo Judiciário. Por longo tempo entendeu-se que os contratos “faziam lei” entre as partes, devendo ser estritamente respeitados, vez que refletiriam a vontade dos contratantes e, por consequência, a liberdade individual. Com o advento do Estado Social no pós-Guerra, o instituto evoluiu ao dirigismo contratual, permitindo- se ao Estado interferir na relação privada, com vistas a preservar questões de ordem pública, e garantindo o equilíbrio contratual, principalmente nos casos em que uma das partes é hipossuficiente, como ocorre com as relações de trabalho e de consumo. Os princípios contratuais típicos do Estado Social (função social do contrato, boa-fé objetiva, equivalência material do contrato) não afastaram a incidência dos princípios liberais tradicionais (liberdade contratual, e eficácia relativa às partes contratantes), mas limitaram seupacta sunt servanda alcance. No Brasil, com o advento da Constituição Federal de 1988, surgiu a preocupação entre os juristas de adequar a legislação civil à nova sistemática constitucional e às transformações sociais da época, dando início à chamada “constitucionalização do direito privado”, segundo a qual as normas civis devem ser lidas à luz da Constituição. O diploma consumerista consagrou diversos princípios decorrentes da CF/88, como a função social do contrato e a boa-fé, com o objetivo de corrigir desequilíbrios na relação contratual. Importante a doutrina de Paulo Lôbo sobre o tema: “A Constituição apenas admite o contrato que realiza a função social, a ela condicionando os interesses individuais, e que considera a desigualdade material das partes. Com efeito, a ordem econômica tem por finalidade “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social” (art. 170). A justiça social importa “reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3º e inciso VII do art. 170). São, portanto, incompatíveis com a Constituição as políticas econômicas públicas e privadas denominadas neoliberais, pois pressupõem um Estado mínimo e total liberdade ao mercado, dispensando a regulamentação da ordem econômica, que só faz sentido por perseguir a função social e a tutela jurídica dos mais fracos e por supor a intervenção estatal permanente (legislativa, governamental e judicial). Um dos mais importantes dispositivos no Código Civil de 2002, o art. 421, que introduz a normativa geral dos contratos, estabelece que a liberdade de contratar será exercida “em razão e nos limites da função social do contrato”. Não se trata aí apenas de limites negativos, mas, principalmente, de condicionamento positivo do conteúdo e finalidades do contrato; a essencialidade principiológica da norma é demonstrada pelo parágrafo único do art. 2.035 que prevê a nulidade de qualquer convenção das partes que contrarie a função social do contrato. Uma das mais importantes realizações legislativas dos princípios constitucionais da atividade econômica é o Código do Consumidor, que regulamenta a relação contratual de consumo. Seu âmbito de abrangência é enorme, pois alcança todas as relações havidas entre os destinatários finais dos produtos e serviços lançados no mercado de consumo por todos aqueles que a lei considera fornecedores, vale dizer, dos que desenvolvem atividade organizada e permanente de produção e distribuição desses bens. Assim, o Código do Consumidor subtraiu da regência exclusiva do Código Civil a quase totalidade dos contratos em que se inserem as pessoas, em seu cotidiano de satisfação de necessidades e desejos econômicos e vitais. Talvez uma das maiores características do contrato, na atualidade, seja o crescimento do princípio da equivalência material das prestações, que perpassa todos os fundamentos constitucionais a ele aplicáveis. Esse princípio preserva a equação e o justo equilíbrio contratual, seja para manter a proporcionalidade inicial dos direitos e obrigações, seja para corrigir os desequilíbrios supervenientes, pouco importando que as mudanças de circunstâncias pudessem ser previsíveis. O que interessa não é mais a exigência cega de cumprimento do contrato, da forma como foi assinado ou celebrado, mas se sua execução não acarreta vantagem excessiva para uma das partes e desvantagem excessiva para outra, aferível objetivamente, segundo as regras da experiência ordinária.O princípio é espécie dos princípios sociais do contrato, que incluem a boa-fé objetiva e a função social” (LOBO. Paulo. Novas Perspectivas da Constitucionalização do Direito Civil. Publicado em 10/2013. In: http://jus.com.br/artigos/25361/novas-perspectivas-da-HYPERLINK "http://jus.com.br /artigos/25361/novas-perspectivas-da-constitucionalizacao-do-direito-civil"constitucionalizacao-do- direito-civil). No caso em análise aplica-se as regras do Código de Defesa do Consumidor, sendo, inclusive, questão sumulada: “Súmula 297, STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, a relação contratual aqui debatida deve ser analisada e interpretada de acordo com os princípios norteadores das relações de consumo, que consagraram a evolução do instituto civilista, no sentido de preservar o equilíbrio contratual, em observância aos preceitos constitucionais. Dessa forma, para que sejam efetivados os princípios constitucionais e das relações de consumo, imperioso admitir a intervenção do Judiciário nos contratos que não observem seus ditames, vez que se trata de matéria de ordem pública, devendo haver revisão de cláusulas que coloquem em risco o equilíbrio e tornem desproporcionais as prestações entre consumidor e fornecedor. Em que pese a aplicação do Código do Consumidor na espécie e o notório protecionismo trazido por essa legislação, não é possível admitir que referido códex se apresente como um subterfúgio que permita ao consumidor negligenciar suas responsabilidades e atribuir os ônus da negociação integralmente às instituições fornecedoras de produtos e serviços. Da taxa de juros remuneratórios O apelante pretende a minoração da taxa de juros remuneratórios fixada em contrato para a taxa média do Bacen. A legislação específica sobre as cédulas de crédito bancárias (Lei 10.931/04) disciplina que a taxa de juros pode ser livremente contratada e sua revisão apenas ocorrerá em situação excepcional, quando ficar comprovada sua abusividade. A súmula 382 do Superior Tribunal de Justiça prevê: “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.061.530/RS, pelo rito dos recursos repetitivos, consolidou o entendimento: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, foi instaurado o incidente de processo repetitivo referente aos contratos bancários subordinados ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos da ADI n.º 2.591-1. Exceto: cédulas de crédito rural, industrial, bancária e comercial; contratos celebrados por cooperativas de crédito; contratos regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, bem como os de crédito consignado. Para os efeitos do § 7º do art. 543- C do CPC, a questão de direito idêntica, além de estar selecionada na decisão que instaurou o incidente de processo repetitivo, deve ter sido expressamente debatida no acórdão recorrido e nas razões do recurso especial, preenchendo todos os requisitos de admissibilidade. Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício. PRELIMINAR O Parecer do MPF opinou pela suspensão do recurso até o julgamento definitivo da ADI 2.316/DF. Preliminar rejeitada ante a presunção de constitucionalidade do art. 5º da MP n.º 1.963-17/00, reeditada sob o n.º 2.170-36/01. I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto (...)” (REsp n. 1.061.530 /RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10 /2008, DJe de 10/3/2009). Visando a averiguar a ocorrência de eventual abusividade, adota-se como parâmetro a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central. Não obstante, sempre cabe ao magistrado examinar as nuances do caso concreto. A pretensão inicial é a revisão dos juros remuneratórios incidentes no Contrato de Financiamento nº 1.01897.0000562.19, firmado em 11/06/2019, para a aquisição do veículo FIAT/IDEA ELX 1.4 MPI FIRE FLEX 8V 5P G, Placa ADJ0222, Ano 2006, Modelo 2007, fixado à taxa de 4,48% a.m. e 69,20% a. a., conforme quadro demonstrativo do contrato juntado aos autos (mov. 1.7). A taxa média divulgada pelo Banco Central para a operação e período correspondentes é de 1,59% a.m. e 20,80% a.a. (https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do? method=prepararTelaLocalizarSeries). A taxa média de mercado, contudo, é apenas um referencial, cabendo somente ao juiz, no exame das peculiaridades de cada caso, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos, considerando, também, o risco assumido pela instituição financeira. Vale dizer, é admissível uma faixa de variação sem que isso configure abusividade. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO – ARRENDAMENTO MERCANTIL DE 25.09.2009 – CARÊNCIA DE AÇÃO – (...) JUROS CAPITALIZADOS – POSSIBILIDADE – EXPRESSA PACTUAÇÃO – TAXA ANUAL SUPERIOR AO DUODÉCIMO DA TAXA MENSAL – ORIENTAÇÃO FIRMADA PELO STJ NO JULGAMENTO DO RESP 973.827/RS – PARCELAS PREFIXADAS – MÉTODO COMPOSTO DE JUROS PARA FORMAÇÃO DO CÁLCULO – TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS – ABUSIVIDADE NÃO CONFIGURADA – SÚMULA 382, DO STJ – AVALIAÇÃO CONFORME A TAXA MÉDIA DE JUROS DIVULGADA PELO BACEN – FAIXA DE VARIAÇÃO ADMISSÍVEL – PRECEDENTES STJ – (...) COBRANÇAS FUNDADAS EM PREVISÕES CONTRATUALMENTE AJUSTADAS – READEQUAÇÃO DA SUCUMBÊNCIA. (...) 5. Segundo orientação da Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça, “a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”. 6. Somente se configuram abusivos os juros remuneratórios quando fixados em dissonância com a média praticada pelo mercado em cada período e que exceda a uma vez e meia, ao dobro ou ao triplo da taxa referencial estimada pelo Banco Central do Brasil. Precedentes do STJ. (...) EXTINÇÃO PARCIAL DO FEITO, DE OFÍCIO, POR AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDO” (TJPR, 17ª Câmara Cível, AC 1288339-7, Relatora Des. Rosana Amara Girardi Fachin – sem grifos no original). “AGRAVOS RETIDOS - NÃO CONHECIDOS - AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO EM APELAÇÃO - ART. 523 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - CONTRATO DE FINANCIAMENTO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - 21.06.2010 - (...) TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS - ABUSIVIDADE NÃO CONFIGURADA - AVALIAÇÃO CONFORME A TAXA MÉDIA DE JUROS DIVULGADA PELO BACEN - FAIXA DE VARIAÇÃO ADMISSÍVEL - PRECEDENTES STJ - DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA - NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS ELENCADOS NA ORIENTAÇÃO N° 2 DO STJ, DO RECURSO ESPECIAL N° 1.061.530-RS - PROCEDÊNCIA DA BUSCAE APREENSÃO - INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA - SENTENÇA REFORMADA (...) 3. No tocante à taxa de juros, é preciso ter em vista, em primeiro lugar, a orientação da Súmula nº 382, do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade". 4. Somente se configuram abusivos os juros remuneratórios quando fixados em dissonância com a média praticada pelo mercado em cada período e que exceda a uma vez e meia, ao dobro ou ao triplo da taxa referencial estimada pelo Banco Central do Brasil. (...) AGRAVOS RETIDOS NÃO CONHECIDOS.Precedentes do STJ. APELAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA” (TJPR - 17ª C.Cível - AC - 1470609-3 - São José dos Pinhais - Rel.: Rosana Amara Girardi Fachin - Unânime - J. 22.06.2016). Sob essa perspectiva, quando comparadas a taxa utilizada no contrato em análise (4,48% a.m. e 69,20% a. a.) e a taxa média do mercado de acordo com o Banco Central (1,59% a.m. e 20,80% a.a.), verifica-se que a taxa de juros remuneratórios utilizada pela instituição financeira é inferior ao triplo da taxa (veja-se que a taxa média mensal era de 1,59% ao mês e o triplo resultariamédia mensal do mercado em 4,77%, inferior à taxa contratada de 4,48% ao mês). Ao ser realizado o cálculo para averiguação da suposta abusividade da taxa de juros, constata-se que a pactuada é maior que a taxa média da época.taxa mensal 2,82 vezes Este cálculo de comparação entre as taxas deve considerar a taxa mensal, pois a utilização da taxa anual, capitalizada, pode levar a equívoco, exatamente pelo modo de cômputo da capitalização, que não é linear, mas exponencial. Quanto maior o prazo utilizado, maior será a diferença. Portanto, a revisão da taxa de juros remuneratórios é feita apenas em situações excepcionais e, no caso em apreço, demonstrou-se que o consumidor não restou em desvantagem, nos termos do art. 51, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, haja vista que a taxa cobrada é condizente ao risco negocial assumido pela instituição financeira, mostrando-se compatível com a prática do mercado à época. Logo, deve-se reconhecer a legalidade da aplicação de juros remuneratórios até o triplo da taxa referencial, pois o negócio jurídico possui peculiaridades a justificar a cobrança, qual seja, a idade avançada de 13 anos de uso do veículo quando o contrato foi celebrado (FIAT/IDEA, ano 2006). A taxa mais elevada de juros se justifica em decorrência dos maiores riscos negociais. A garantia de um veículo com mais de uma década de uso é diferente de um novo ou seminovo. Tal oscilação, portanto, é razoável e se justifica a depender do caso concreto. Conforme constou no julgamento do recurso de apelação nº 0010198-17.2016.8.16.0131, de Relatoria do eminente Desembargador Substituto Guilherme Frederico Hernandes Denz: “a caracterização da abusividade na taxa de juros depende da análise do caso concreto. Vale dizer, a taxa de juros se caracteriza como abusiva quando se afasta muito da taxa praticada pelo mercado à época da contratação, observando-se, ainda, outros critérios, como o tomador de recursos, os riscos, as garantias, o prazo ”.do mútuo e forma de fixação dos juros - se pré ou pós fixados Embora este julgador haja se posicionado sobre o tema de modo dessemelhante em outras ocasiões, compreende-se prudente readequar o entendimento para a possibilidade de cobrança de juros remuneratórios até o dobro da taxa média do mercado quando existir normalidade contratual, esta compreendida como sendo financiamento, com garantia de alienação fiduciária, de veículos novos ou seminovos, com uso inferior a 10 (dez) anos. Em situações peculiares, a depender do conjunto fático- probatório, será admitida a cobrança de juros remuneratórios até o triplo da taxa referencial. Em que pese uma taxa de juros remuneratórios superior à média ou até o dobro da média do Bacen possa abusiva, neste caso específico, considerando o elevado risco do negócio, as especificações do veículoser (ano 2006 com 18 anos de uso); o valor total do financiamento (R$ 13.059,51) comparado ao custo efetivo total da operação (R$ 27.038,16 em 36 parcelas fixas de R$751,06); e os parâmetros do mercado divulgados pelo Bacen (1,59% a.m. e 20,80% a.a.), o triplo da taxa referencial mensal mostra-se como um limite condizente às circunstâncias concretas do caso, bem como à jurisprudência desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça. Nesse diapasão, conclui-se que os juros remuneratórios contratados (4,48% a.m.) são lícitos visto que inferiores a 3 vezes a taxa média mensal do mercado à época da contratação do financiamento (4,77% a. m. = 3 x 1,59% a.m.). Apesar da equivocada da decisão quo, é de direito o desprovimento do recursoratio decidendi a interposto pela autora e a manutenção do dispositivo da sentença. Pelo exposto, inexistem valores indébitos a serem repetidos. Dos honorários e custas processuais A solução conferida à lide incorre no desprovimento do recurso interposto pelo autor e na manutenção do dispositivo da sentença. Em conformidade com a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 1059, o desprovimento do apelo enseja majoração dos honorários recursais. Veja-se: Tema Repetitivo 1059/STJ: A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação. Assim, considerando os princípios da isonomia e equidade, bem como o local de prestação de serviço, a natureza da causa (ação revisional), o trabalho realizado pelos causídicos e o tempo de duração da ação (em trâmite desde janeiro de 2022), a competência dos profissionais envolvidos os atos processuais realizados, majoram-se os honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor corrigido da causa (art. 85, §§2º e 11, CPC). Assim, considerando que a apelante foi vencida, este deve arcar com a integralidade das custas processuais e dos honorários advocatícios de 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa. Todavia, diante do benefício de justiça gratuita concedido à autora Ana Paula Ribeiro dos Santos (mov. 17.1), suspende-se a exigibilidade do pagamento dos seus valores sucumbenciais pelo prazo de cinco anos (art. 98, §3º, CPC). Do exposto, é desprovido o recurso interposto por Ana Paulo Ribeiro dos Santos para manter a taxa de juros remuneratórios fixada contratualmente em 4,48% a.m., pois inferior ao triplo da taxa média do Bacen à época da celebração do negócio. Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 19ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em julgar CONHECIDO O RECURSO DE PARTE E NÃO- PROVIDO o recurso de ANA PAULA RIBEIRO DOS SANTOS. O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Andrei De Oliveira Rech, sem voto, e dele participaram Desembargador Domingos José Perfetto (relator), Desembargador José Hipólito Xavier Da Silva e Desembargador Rotoli De Macedo. 05 de abril de 2024 Desembargador Domingos José Perfetto Relator