Buscar

Orientações de estudos (3) - Compliance e Contratações Públicas

Prévia do material em texto

COMPLIANCE E AS CONTRATAÇÕES PÚBLICAS 
Em 2013 foi editada a Lei 12.846/2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil 
de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Esse 
diploma legal ficou conhecido como Lei Anticorrupção. 
Pode-se afirmar sem receio de errar que, antes da edição da lei, os significados das palavras 
compliance e conformidade eram conhecidos de poucos. 
Apenas as empresas que negociavam com países estrangeiros como Estados Unidos e alguns países 
do bloco Europeu é que costumavam constituir áreas de Compliance em suas empresas. Mesmo que 
estes e outros conceitos, como governança e accountability, já fossem discutidos e estudados nos 
meios acadêmicos, foi só no início dessa década que o Brasil começou a respirar os novos ares da 
conformidade em seus negócios. 
O Compliance tem relação estreita com as ideias de governança, ética, gestão de riscos, 
sustentabilidade e integridade. Busca-se reduzir a incidência dos desvios de conduta e as ocorrências 
de práticas de corrupção, evitando que o interesse público seja substituído pelos interesses 
privados e que, em consequência de atos antirrepublicanos, os custos sejam majorados e os 
objetivos não sejam concretizados, prejudicando a eficiência e a eficácia administrativas. 
Compliance e Programa de Integridade 
Compliance é responsável pelo cumprimento de todas as regras internas, além das determinações 
dos órgãos reguladores. É uma área bastante ampla, que pode ser dividida em outras menores para 
um trabalho mais específico. Uma destas áreas menores é, justamente, a responsável pelo Programa 
de Integridade, que garante que a empresa siga de maneira correta os procedimentos voltados ao 
combate à corrupção, já que, com a edição da Lei nº 12.846/2013, passou a ser responsabilizada 
pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira ( art. 1º) 
O Programa de Integridade é um “braço” do Programa de Compliance, já que também visa o 
cumprimento de regras internas e externas, porém específicas para o combate à corrupção e 
“consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos 
de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos 
de ética e de conduta” ( art. 41, Dec. 8420/2015) 
Os Pilares do Programa de Integridade 
Para o sucesso do programa é necessário o desenvolvimento de cinco ações, que devem ser 
realizadas simultaneamente, de forma integrada. Elas funcionam como os pilares de uma construção, 
em que quando não existe um, a construção não para em pé. São eles: 
1. Comprometimento e apoio da alta direção: é fundamental, para o sucesso do programa, o apoio 
total daqueles que ocupam o topo da hierarquia da empresa. Começa por eles a vivência de uma 
cultura ética, de respeito às leis e às determinações do Programa de Integridade. 
Os Pilares do Programa de Integridade 
2. Instância Responsável: o programa necessita de um grupo de pessoas voltadas para esta função, 
com total autonomia e independência para realizar suas atividades, tendo acesso a todos os campos 
da empresa (inclusive os de direção), sem deixar de contar com recursos humanos, materiais e 
financeiros. 
3. Análise de perfil e riscos: a empresa precisa se entender, conhecer seus processos e estrutura 
organizacional. Desta forma, pode realizar uma avaliação de riscos ligada ao mercado no qual atua, 
mantendo um mapeamento periódico destes. 
Os Pilares do Programa de Integridade 
4. Estruturação das regras e instrumentos: a partir do conhecimento de seu perfil e de seus riscos, a 
empresa deve elaborar ou atualizar o código de ética (valores e princípios da empresa) e o código de 
conduta (regras a serem seguidas pelos funcionários do empreendimento). Além disso, deve 
implantar políticas e procedimentos de prevenção de irregularidades, aliado a um plano de 
comunicação e treinamento. 
5. Estratégias de monitoramento contínuo: é preciso garantir a aplicabilidade do programa. Para 
isso, recomenda-se uma rotina que atue de maneira integrada com outras áreas como recursos 
humanos, departamento jurídico, auditoria interna e departamento contábil-financeiro. 
É importante reafirmar que a realização de todas as etapas deve ser feita de forma integrada, pois o 
programa não se realiza com a ausência de um dos pilares, ou a atuação isolada de um deles. O 
caminho deve ser trilhado de forma coletiva. 
Todavia, a implantação desses pilares deve ser feita respeitando-se as características específicas de 
cada empresa. Não é possível ter um Programa de Integridade genérico, ele precisa atender todas 
as necessidades de cada empresa. 
Atos lesivos contra a Administração na Lei nº12.846/2013 
A Lei 12.846/2013, Lei Anticorrupção, veio para mudar a cultura das empresas, responsabilizando-as 
por práticas ilegais lesivas à Administração Pública, independentemente da comprovação do 
conhecimento ou conivência de seus diretores ou donos. Por meio dela, diversas medidas 
começaram a ser tomadas, como o desenvolvimento de áreas, dentro de uma empresa, para 
combater a realização de ações ilícitas 
Isso ocorre para que a companhia não seja punida, já que o valor pode ser bem alto (de 0,1% até 20% 
de seu faturamento bruto). Além da prevenção, se for encontrado algum ato irregular, a empresa 
pode ter uma redução da sanção, caso tenha implantado um programa de combate a estes atos. 
A lei 12.846/2013 estabeleceu, em seu artigo 5º, inciso IV, quais são atos lesivos à administração 
pública, nacional ou estrangeira, no tocante a licitações e contratos: 
 
a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter 
competitivo de procedimento licitatório público; 
b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público; 
 
c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer 
tipo; 
d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente; 
e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou 
celebrar contrato administrativo; 
f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de 
contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da 
licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou 
g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a 
administração pública; 
 
OS CASOS DOS METRÔS SP- DF-MG 
Em dezembro de 2018, a Superintendência-Geral do Cade solicitou a condenação de 16 empresas 
acusadas de envolvimento no esquema de fraude nas licitações dos metrôs de São Paulo, Rio de 
Janeiro, Distrito Federal e Minas Gerais . Parecer do órgão divulgado na ocasião apontava que as 
empresas envolvidas no suposto cartel e os funcionários suspeitos de operar o esquema interferiram 
no resultado das licitações nessas quatro unidades da federação. 
De acordo com CADE, as companhias alvo do processo dividiram concorrências e combinaram valores 
das propostas. Ainda segundo as investigações, as fraudes incluíram institutos formalmente legais, 
como a formação de consórcio e a subcontratação, para dar uma aparência de competição ao cartel. 
O caso começou a ser investigado a partir da celebração de um acordo de leniência entre o Cade e a 
empresa alemã Siemens. Seis ex-executivos da companhia da Alemanha colaboraram com as 
investigações. 
No acordo, os representantes da multinacional alemã revelaram que os contatos entre as empresas 
que disputavam as licitações de trens e metrôs ocorriam, pelo menos, desde 1998. O objetivo desta 
aproximação, conforme os delatores da Siemens, era eliminar a competição em licitações públicas 
de projetos do sistema ferroviário. 
Metro SP 
Os contatos ilícitos começaramem 1998, no processo de licitação da Linha 5 do Metrô de São Paulo. 
Na época, as empresas Siemens, Siemens AG, Alstom, Alstom Transport, DaimlerChrysler 
(atualmente Bombardier), CAF, Mitsui e TTrans teriam combinado dividir a concorrência da licitação. 
Outros processos fraudulentos foram identificados pelo Cade em 2000, 2007.2008, 2009, 2011 e 
2013 nas licitações para manutenção de trens da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos 
(CPTM). 
Metro-DF 
O Cade identificou que, em 2005, houve acordo entre consórcios no projeto de manutenção da 
Companhia do Metropolitano do Distrito Federal. 
O acordo entre o Consórcio Metrô Planalto (Alstom, IESA e TC/BR) e o Consórcio Metroman (Siemens 
e Serveng) tinha como objetivo dividir o projeto com subcontratação do consórcio perdedor pelo 
consórcio vencedor. As empresas também supostamente acordaram que os preços a serem 
apresentados na licitação. 
Metro de Belo Horizonte 
Segundo as investigações, em 2012, CAF e Alstom também dividiram licitações destinadas à aquisição 
de trens para os metrôs para a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) de Belo Horizonte. 
As empresas participaram das licitações, de acordo com o Cade, como um consórcio e definiram que 
a CAF Brasil Indústria e Comércio ficaria com a maior parte do projeto da CBTU. 
 
O CASO DO METRO-RJ 
LINHA 4 
Em 2017 o Ministério Publico Federal acusou a Construtora Odebrecht de ter criado um atalho para 
driblar a lei e assumir a construção da Linha 4 do Metrô do Rio sem disputar licitação. A manobra, 
que consistiu em comprar a participação de uma empresa no consórcio construtor, o Rio Barra, dois 
meses antes do início das obras. 
O objeto do contrato é “a exploração, precedida de obra pública pelo consórcio Concessionário, dos 
serviços públicos de transporte metroviário de passageiros da linha 4”. 
A Odebrecht entrou no consórcio 11 anos após a licitação da obra, feita em 1998, na gestão Marcello 
Alencar. 
Naquela ocasião as obras estavam paradas há mais de uma década, e o mais correto seria que o 
Governo do Rio de Janeiro tivesse instaurado um novo processo licitatório, pois seria necessária uma 
atualização do projeto do orçamento. 
Contudo, foi permitido à Odebrecht substituísse a Constran S.A no Consórcio Rio Barra S/A, que ela 
formava ao lado da Queiróz Galvão e Trans Sistemas de Transportes S/A, e participasse da construção 
da Linha 4, após supostamente pagar R$ 11 milhões à Constran S.A. 
Em delação premiada, o então vice-presidente da Odebrecht Benedicto Júnior contou que, além de 
comprar a participação da Constran S.A, também foi obrigado a pagar propina ao ex-governador e 
ao ex-secretário de Transportes. 
Além das irregularidades encontradas na execução das obras e na fiscalização, o MP-RJ identificou as 
alterações contratuais nos quatro aditivos como sendo os instrumentos para o direcionamento das 
subcontratações e para o superfaturamento. O primeiro deles ocorreu em fevereiro de 2010, ano 
eleitoral, dois meses depois da troca de empresas que formavam a Concessionária Rio Barra S/A. 
 Os promotores identificaram problemas na mudança de traçado, na metodologia de escavação e na 
antecipação dos pagamentos. Também sustentam que o governo estadual aumentou o aporte de 
recursos, inicialmente previsto para 43% do total da obra, para 89%. 
Também foi verificada nova antecipação de valores pelo Estado para compra do equipamento 
conhecido como "Tatuzão" e ficou registrado, por fim, aumento de 675% dos aportes de recursos do 
Estado na obra, aumentando o custo para o erário em quase 9 vezes, passando de mais de R$ 880 
milhões na contratação original em 1998 para R$ 9,2 bilhões, em 2011. 
R$ 4.402.845.208,53 + 25% (R$1.100.711.302,13) = 
R$ 5.503.556.510,66 
Valor total do prejuízo ao erário : R$ 4.246.798.999,33 
Empresa Ato Lesivo 
Siemens , 
Siemens AG, 
Alstom, Alstom 
Transport, 
DaimlerChrysler, 
CAF, Mitsui e 
TTrans 
art. 5º , Inciso IV, alínea "a" - frustrar ou fraudar, mediante ajuste, 
combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de 
procedimento licitatório público; 
Consórcio Metrô 
Planalto (Alstom, 
IESA e TC/BR) 
art. 5º , Inciso IV, alíneas "a" e "d"-fraudar licitação pública ou contrato dela 
decorrente 
Consórcio 
Metroman 
(Siemens e 
Serveng) 
art. 5º , Inciso IV, alíneas "a" e "d"-fraudar licitação pública ou contrato dela 
decorrente 
CAF e Alstom art. 5º , Inciso IV, alíneas "a" e "d"-fraudar licitação pública ou contrato dela 
decorrente 
Empresa Ato Lesivo 
Odebrecht art. 5º , inciso I ( prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, 
vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada) ; 
Inciso IV, alíneas "a" (frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou 
qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório 
público); "c" ( afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou 
oferecimento de vantagem de qualquer tipo); "d" ( fraudar licitação pública 
ou contrato dela decorrente) "e"( criar, de modo fraudulento ou irregular, 
pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato 
administrativo); "f" (obter vantagem ou benefício indevido, de modo 
fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a 
administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da 
licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais); "g"(manipular 
ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a 
administração pública;) 
Constran S.A art. 5º , Inciso IV, alínea "f" obter vantagem ou benefício indevido, de modo 
fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a 
administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da 
licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; 
Queiróz Galvão art. 5º , Inciso IV, alíneas "d" ( fraudar licitação pública ou contrato dela 
decorrente); "f" (obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, 
de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a 
administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da 
licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; "g"(manipular 
ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a 
administração pública;) 
Trans Sistemas 
de Transportes 
S/A 
art. 5º , Inciso IV, alíneas "d" ( fraudar licitação pública ou contrato dela 
decorrente); "f" (obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, 
de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a 
administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da 
licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; "g"(manipular 
ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a 
administração pública;) 
 
O CASO DO TRT-SP 
O escândalo de superfaturamento na construção da sede do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de 
São Paulo veio à tona em 1998. Procuradores da República que atuaram no caso identificaram desvio, 
na ocasião, de R$ 169 milhões – atualizado, o montante alcança cerca de R$ 1 bilhão, segundo a 
Procuradoria. Auditoria do Ministério Público feita na época apontou que 64% da obra estavam 
concluídos após seis anos da licitação enquanto todo o recurso previsto para a construção já havia 
sido liberado. 
Janeiro de 1992 - O TRT, presidido pelo juiz Nicolau, abre licitação para a construção do fórum. 
Março de 1992 - A Incal Alumínio sai vencedora, com o valor da obra de cerca de US$ 140 milhões. 
Monteiro de Barros transfere a obra para a Incal Incorporações. 
Abril de 1992 - Monteiro de Barros constitui uma construtora, a Ikal. O TRT libera US$ 22 milhões 5 
meses antes do início da obra. 
Novembro de 1992 - Auditoria do TCU de São Paulo recomenda anulação da concorrência. 
Fevereiro de 1994 - Obras têm início. Foram feitas várias liberações de verba e começaram a serfeitos adiantamentos que se estenderam por quatro anos. 
Junho de 1998 - TRT descobre que há falha no projeto e pede correção. A Incal se dispõe a fazê-la 
desde que receba por isso. O TRT não paga e obra é paralisada. Auditoria da Receita na Ikal constatou 
que, até aquele ano, foram desviados R$ 162,28 milhões da verba repassada pelo Tesouro e que 
apenas R$ 60,34 milhões dos R$ 222,62 milhões transferidos a título de pagamento para a 
empreiteira foram aplicados na construção. 
As apurações das irregularidades envolveram o esforço conjunto de diversos órgãos, com destaque 
para a Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado Federal, o Tribunal de Contas da União (TCU), 
Ministério Público Federal (MP) e os veículos jornalísticos. 
Ao longo das apurações, foi possível identificar os aspectos vulneráveis na estrutura da 
Administração Pública do Poder Judiciário e como os responsáveis pelo desvio dos recursos atuaram 
para tornar possível a ocorrência da fraude. 
1. Edital de licitação impreciso e vago: 
Objeto: aquisição de imóvel, em construção ou a construir, adequado para a instalação de, no 
mínimo, 79 juntas de conciliação e julgamento na cidade de São Paulo, podendo permitir a ampliação 
para a instalação posterior de mais 32 juntas 
a) Definição imprecisa; 
b) Não delimita as especificações mínimas para a execução do contrato; 
Além disso, definiu-se preço fixo para a obra, sem parâmetros consistentes. Foi igualmente 
estipulado que os pagamentos decorrentes do futuro contrato dependeriam de repasses de recursos 
do Tesouro Nacional, fato que criaria total incerteza por parte da empresa contratada acerca do 
recebimento dos pagamentos. 
Segundo o Tribunal de Contas da União, que investigou a execução do contrato, o objeto licitado foi 
inadequado, pois o caso exigia “dois certames distintos: um para a aquisição do terreno, outro para 
a realização das obras propriamente ditas. Desse erro inicial, originaram- se diversas outras 
impropriedades decorrentes da elaboração do contrato, uma vez que esse fora redigido como se a 
operação fosse uma simples „aquisição‟ [contrato de promessa de compra e venda], e não uma 
contratação de obra pública, como realmente era 
O primeiro passo para conformar o esquema de fraude foi exatamente a elaboração de edital com 
características que afastariam eventuais empresas desconhecedoras –ou excluídas– do esquema de 
fraude que se perpetrava. Essa conclusão é compartilhada no citado Relatório Final da CPI, que assim 
consignou: 
 “É evidente que, no momento da assinatura do contrato, muitas das cláusulas que afastaram alguns 
concorrentes foram retiradas do contrato. Isso é algo extremamente grave porque muitas empresas 
não participaram da licitação por causa daquelas cláusulas.” 
2. Falta de qualificação técnica e econômica da empresa contratada 
A licitação foi vencida pela empresa Incal - Indústria e Comércio de Alumínio mas, em razão de 
arranjos societários o contrato para a execução da obra – que compreendia, além da construção do 
edifício, a venda do imóvel onde ocorreria a construção – acabou por ser adjudicado a uma empresa 
que sequer participou da concorrência, a Incal Incorporações. 
Outro aspecto que chamou a atenção foi que o objeto do contrato, cujo valor aproximado era de US$ 
140 milhões, foi adjudicado a empresa cujo capital social era de cerca de US$ 70. Ainda segundo o 
Relatório da CPI do Judiciário, havia indícios de que a Incal Alumínio foi constituída apenas para que 
pudessem participar indiretamente os Grupos Monteiro de Barros e OK na licitação. 
3. Pagamentos sem a contrapartida em serviços 
Segundo apontado nas investigações conduzidas pelo TCU, pactuou-se “a liberação de parcelas em 
datas específicas, independentemente da realização de medições físicas dos serviços realizados, 
contrariando praxe comum nos contratos de obras públicas, o que estaria a caracterizar o pagamento 
antecipado dos serviços.” 
O contrato já iniciou com antecipação de pagamentos, sem prestação prévia dos serviços. Desses 
pagamentos, cerca de US$ 22 milhões, foram antecipados antes do início da obra para a compra do 
terreno. Não obstante, apenas pouco mais de sete milhões de dólares foram necessários à aquisição 
do terreno. Na escritura de compra e venda do terreno, constaram apenas cerca de US$ 4 milhões. 
As apurações feitas pelo TCU, concluíramque o custo do imóvel adquirido foi cerca de 20% superior 
aos valores de mercado de mercado. 
4. Pagamentos a agentes públicos 
A CPI do Judiciário, acessando informações bancárias dos envolvidos, apurou diversos pagamentos 
inexplicados feitos pela Corretora Split ao Juiz Nicolau dos Santos Neto, então Presidente do TRT/SP, 
e vice-versa. A CPI descobriu, ainda, o envolvimento do Grupo Monteiro de Barros na compra do 
apartamento em Miami, que pertencia a uma empresa do Juiz Nicolau dos Santos Neto. Outra prova 
obtida pela CPI, sobre os pagamentos feitos ao Juiz Nicolau dos Santos relacionados às obras do 
TRT/SP são os depósitos feitos em contas do magistrado na Suíça. 
5- Fraude na fiscalização da obra (superfaturamento de serviços) 
Somente após determinação do TCU, o TRT da 2ª Região (ou TRT/SP) contratou, em 1993, o 
Engenheiro Antonio Carlos Gama e Silva, para fazer as medições da obra, previamente aos 
pagamentos. 
As medições realizadas por esse engenheiro indicavam, em janeiro de 1998 –quando foi paralisada–
, cerca de 98% de conclusão da obra. No entanto, levantamentos periciais, in loco, demonstraram 
que aquele percentual era muitíssimo superior ao efetivamente executado. 
Outra fraude apurada nas medições dos serviços executados foi a falsificação de rubricas do 
Engenheiro Gilberto Morand Paixão em laudos referentes às obras do TRT/SP, fato noticiado nos 
Acórdãos 163/2001 e 301/2001, ambos do Plenário do TCU. 
A CPI do Judiciário, por meio do acesso a extratos bancários, de depósitos diversos feitos pelo Grupo 
Monteiro de Barros em conta bancária do Engenheiro Gama e Silva. Segundo o Relatório da CPI, 
foram pagos cerca de “US$ 42 mil dólares [ao engenheiro] ao longo de toda essa obra, nos anos de 
93 e 94, demonstrando que, ao mesmo tempo que ele fiscalizava uma empresa, ele recebia recursos 
dessas empresa.” 
6 Aditivos contratuais indevidos 
Outro meio de fraude apurado no esquema, desta feita pelo TCU, foi a realização de aditivos 
contratuais para a elevação dos valores devidos à contratada, sob o pretexto de busca de reequilíbrio 
econômico financeiro da avença sem que tivesse sido evidenciado o desequilíbrio necessário à 
repactuação. 
7- Falhas graves nos projetos de construção e dificuldades para a mensuração do real valor da obra 
A ausência ou insuficiência do projeto básico, e da ausência de projeto executivo, refletiram na 
impossibilidade de medir-se o real valor da obra. O que também dificutou calcular o débito a favor 
do Erário. Mas o TCU com a ajuda da CAIXA conseguiram calcular o valor da obra, no estado em que 
se encontrava, subtraindo-o do somatório dos valores pagos pelo TRT/SP. Obteve, assim, um valor 
histórico de R$ 169 milhões que foi o débito imputado aos responsáveis. 
Fatores que permitiram o desenvolvimento do esquema: 
• ausência ou insuficiência de controle prévio ou concomitante do procedimento licitatório, 
eivado das seguintes anomalias: elaboração de edital impreciso e com cláusulas 
desvantajosas ao futuro contratado, que afastaram concorrentes, reduzindo- os ao grupo de 
empresas em conluio; definição de objeto inadequado e obscuro, contrário às disposições 
legais e ao interesse público (confusão entre licitações para aquisição de terreno e de obra 
pública); incompletude do projeto básico; 
• ausência ou insuficiência de fiscalização concomitante da obra, ensejando medições 
fraudulentas, pagamentos indevidos e antecipados, desvio de recursos etc.; 
• falhas no controle de remessas de divisas ao exterior, mediante a sistemática das contas CC5,facilitando a lavagem do dinheiro desviado; 
• impossibilidade de acesso, pelo TCU, a informações protegidas por sigilo, em especial as 
referentes a extratos bancários, tendo em vista que a fiscalização efetuada em 1992 chegou 
a apontar várias irregularidades na licitação, no contrato e na execução contratual, porém, 
em face da complexidade da obra e da ausência de provas mais contundentes, a fiscalização 
não atingiu a eficácia esperada. 
Se fosse hoje, a INCAL e suas “controladoras” teriam cometido os seguintes atos lesivos à 
Administração relacionados à licitação: 
a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter 
competitivo de procedimento licitatório público; 
b) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou 
celebrar contrato administrativo; 
c) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente; 
d)obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações 
de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório 
da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; 
e)manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a 
administração pública; 
Além destes, as empresas também teriam praticado os atos lesivos previstos nos incisos I e II do art. 
5º : 
I. prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, 
ou a terceira pessoa a ele relacionada; 
II. comprovadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a 
prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei;

Mais conteúdos dessa disciplina