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SUSEME EMERGÊNCIA E CTI MÓDULO ONCOLOGIA ÍNDICE LISE TUMORAL ........................................................................................................................ 3 SÍNDROME DA VEIA CAVA SUPERIOR ......................................................................... 6 HIPERCALCEMIA .................................................................................................................... 9 LISE TUMORAL • Visão geral A síndrome de lise tumoral (SLT) é descrita como um conjunto de alterações re- sultantes da maciça liberação de metabólitos intracelulares provenientes da lise de células tumorais. O resultado é hiperuricemia, hipercalemia, hiperfosfatemia, hipocalcemia e lesão renal aguda. Pode ser classificada de acordo com tipo de neoplasia, relação com tratamento e classificação de Cairo-Bishop. Classificação Cairo-Bishop SLT laboratorial Presença de 2 ou mais achados seguintes (3 dias antes até 7 dias após o início do tratamento): Ácido úrico sérico >8mg/dl ou aumento de >25% do valor prévio Potássio sérico >6mEq/L ou aumento de >25% do valor prévio Fósforo sérico >4,5mg/dl ou aumento de >25% do valor prévio Cálcio total sérico <7mg/dl ou redução de >25% do valor prévio SLT clínica/IRA SLT laboratorial associada a 1 ou mais critérios a seguir: Creatinina sérica >1,5x o valor normal Arritmias cardíacas ou parada cardiorrespiratória Convulsão • Etiologia As principais causas são neoplasias hematológicas, sendo mais frequentemente linfomas não Hodgkin de alta proliferação (“agressivos””) e leucemia linfoide aguda, em comparação com tumores sólidos. • Fisiopatologia A maciça destruição celular provoca a liberação de grande quantidade de meta- bólitos do ácido nucleico, do fósforo e do potássio, justificando os achados característicos da síndrome; a saber: hiperuricemia, hipercalemia, hiperfosfate- mia e hipocalcemia. • Fatores de risco Paciente com maior risco de evoluir para SLT são: aqueles com história de do- ença renal preexistente, desidratados, com doença avançada (especialmente de acometimento abdominal), linfoma de Burkitt, linfoblástico e o de grandes célu- las, linfoma linfoide aguda, hemograma com >100.000/mm3 células, níveis séri- cos aumentados de ácido úrico e fosforo, e desidrogenase lática sérica >2x o limite superior da normalidade. • Fatores precipitantes Destacam alta “carga tumoral”, câncer com alta taxa de proliferação, relativa- mente sensível o tratamento oncológico, desidrogenase sérica elevada e desi- dratação. • Manifestações clínicas Além dos sinais e sintomas associados à neoplasia de base (variados e depen- dendo do tipo e local do tumor), podemos citar: náusea, vomito, anorexia, diarreia e desconforto abdominal; oligúria ou anúria e sintomas urêmicos (decorrente de depósitos de urato no trato urinário e deposição de cristais de cálcio-fosforo); alterações neuromusculares (como fraqueza muscular, cãibras e tetania) e arrit- mias (resultantes de hipercalemia e hipocalcemia); e, convulsões (consequência de hiperfosfatemia e hipocalcemia). • Abordagem investigativa Os exames complementares devem ser solicitados imediatamente à chegada do paciente. Os exames laboratoriais incluem hemograma, eletrólitos, função renal, desidrogenase lática, exames de coagulação, urina tipo I e hepatograma. O aumento de ureia e creatinina são achados de maior gravidade, correlacionando a pior prognóstico. Ademais, considera-se exames séricos relacionados à SLT: dosagem de ácido úrico, fósforo, cálcio e potássio. O eletrocardiograma (ECG) pode ajudar na identificação de arritmias graves e possíveis parada cardiorres- piratória. Na hipercalemia (complicação inicial mais grave), observa-se ondas T apiculadas, prolongamento do segmento QRS, achatamento ou ausência de onda P; por outro lado, as características eletrocardiográficas da hipocalcemia são aumento do intervalo QT, podendo causar taquicardia ventricular (mais es- pecificamente torsades de pointes). Por fim, a USG de rins e vias urinárias é útil para avaliar e excluir outras causas de IRA. • Diagnósticos diferenciais Englobam desidratação, infecção (sepse), uso excessivo de anti-inflamatórios (frequente em pacientes oncológicos), exposição recente a nefrotoxinas, com- pressão de vias urinárias e invasão do parênquima renal pelo tumor. • Tratamento A identificação precoce da síndrome é de grande importância, visto que a insti- tuição rápida de medidas preventivas é uma etapa prioritária. (1) Hidratação vigorosa: Idealmente, visa o débito urinária >3l/dia. A hidratação aumenta a excreção de urato e reduz a precipitação renal de cristais de cálcio- fosforo e de urato. Não é indicado para paciente congesto. (2) Diuréticos: Sem benefício comprovada para SLT. Apresenta maior utilidade em casos de sinal de congestão com hiperidratação. Adota-se furosemida como opção terapêutica. (3) Alopurinol: É um inibidor da xantina-oxidase, o que resulta na redução da produção de ácido úrico. (4) Rasburicase: Tem como mecanismo farmacológico aumentar a conversão de ácido úrico para alantoína (metabólito mais solúvel), reduzindo a lesão renal. É melhor para pacientes já com SLT, em comparação a alopurinol; no entanto, pode causar urticária e broncoespasmo, é contraindicada em pacientes com deficiên- cia da G6PD, e é de alto custo. (5) Alcalinização da urina: Aumenta a solubilidade do ácido úrico. (6) Quelante do fósforo: Objetiva reduzir a hiperfosfatemia. (7) Gluconato de cálcio: Importante pra a estabilização da membrana miocár- dica, em caso de arritmia grave. (8) Hemodiálise: Deve ser considerada precocemente em pacientes com anor- malidades metabólicas e eletrolíticas persistentes ou que pioram com o trata- mento clínico. Além disso, também deve ser indicada em pacientes hipervolêmi- cos, urêmicos, com repercussão neurológica, muscular ou miocárdica. Alteração Tratamento Injúria renal aguda Hidratação IV Hiperuricemia Alopurinol Rasburicase Hiperfosfatemia Quelante de fósforo Hipocalcemia Gluconato de cálcio Hipercalemia Gluconato de cálcio Insulina regular + glicose a 50% Inalação com beta2-agonista Resina quelante de potássio Bicarbonato de sódio SÍNDROME DA VEIA CAVA SUPERIOR • Visão geral A síndrome da veia cava superior (SVCS) é uma complicação típica da doença avançada, de neoplasias agressivas e de alta proliferação (respondem 90% dos casos), ou de complicações iatrogênicas. Em alguns casos, pode se apresentar como uma emergência clínica: obstrução de vias aéreas, choque obstrutivo, hi- pertensão intracraniana, por exemplo. • Etiologia Em sua maioria, a SVCS é casada por neoplasia, em especial, câncer de pulmão (80%; mais frequentes em pacientes >50 anos) e linfoma (10%; mais comum em mais jovens). As causas não malignas representam a minoria; em destaque, são de origens infecciosas e iatrogênicas. • Fisiopatologia Formada pela junção das veias braquicefálicas, a veia cava superior se unta à veia ázigos antes de entrar no átrio direito. Como esse sistema é de baixa pres- são, de paredes finas e com muitas estruturas circundantes (traqueia, brônquio direito, timo, aorta ascendente, artéria pulmonar e linfonodos), o crescimento sig- nificativo dessas estruturas pode obstruir ou invadir a cava superior, provocando a síndrome. A SVCS também pode ser resultante da trombose relacionada a ca- teter de dialise ou de quimioterapia. • Quadro clínico A intensidade e a gravidade dos achados dependem da velocidade de instalação, da totalidade ou parcialidade, e do local da obstrução. As principais manifesta- ções são: edema na face e no pescoço (82%), edema nas extremidades superio- res (62%), dispneia em repouso (52%), tosse (50%), circulação colateral ou veias dilatadas no tórax (38%) e dor no ombro (28%). Os sintomas geralmente são piores quando o paciente acorda. Cefaleia matinal,confusão e letargia são acha- dos de pior prognóstico, indicando dificuldade de drenagem venosa do SNC e hipertensão intracranaiana. Outros achados graves são intolerância ao decúbito, cornagem, insuficiência respiratória aguada e hipotensão. Além do mais, pode haver sinais e sintomas relacionados à própria doença de base, como síndrome de Horner (ptose, miose, enoftalmia e anidrose), rouquidão, disfagia e paralisia do nervo frênico. • Diagnóstico Além da suspeição clínica, alguns exames complementares podem auxiliar na investigação. Solicita-se hemograma, exames de coagulação, eletrólitos, desi- drogenase lática, ácido úrico e função renal. A radiografia de tórax encontra-se alterada em 70-80% dos casos (massa mediastinal ou hilar direita). A TC de tó- rax é o exame de escolha na emergência, permitindo avaliar os detalhes anatô- micos da obstrução, bem como sugerir ou identificar a causa. A biópsia de me- dula óssea é útil nos casos de linfoma ou suspeita de invasão medular. Consi- dera-se dosagem de alfa-fetoproteína e beta-HCG se houver suspeita de tumo- res germinativos, em pacientes jovens (<40-50 anos). • Tratamento (1) Avaliar ABC, especialmente a patência das vias aéreas. (2) Elevar a cabeceira (a 45%) e fornecer oxigênio (útil em paciente sintomático). (3) Não existe evidência para o uso de diuréticos. (4) Não há comprovação da efetividade do corticoide empírico. A dexametasona pode ser útil nos casos em que o tipo de tumor é sensível à droga. (5) O diagnóstico histológico é crucial e determinante para a escolha correta do tratamento. A radioterapia apresenta maior utilidade quando o câncer é de pul- mão não pequenas células ou de metástases mediastinais. A quimioterapia é o tratamento de escolha para neoplasia de pequenas células, nos linfomas e nos tumores germinativos de mediastino. (6) A radiologia intervencionista (stent e/ou trombólise local), visando a obstru- ção da veia cava superior, e é a melhor terapêutica de urgência nos casos graves e mais sintomáticos. O alívio da obstrução costuma ser efetivo e rápido em mais de 90% dos casos. É considerada de primeira linha nos casos de SVCS sintomá- tica. Pode resolver a trombose de cateter central. HIPERCALCEMIA • Visão geral É definida como cálcio sérico >10,5mg/dl ou cálcio iônico plasmático >5,2 mg/dl. A hipercalcemia provem da alteração de mecanismos homeostáticos que resul- tam em influxo de cálcio proveniente do esqueleto, absorção de cálcio intestinal e diminuição do clearance renal do cálcio. Vários fatores influenciam a dosagem do cálcio sérico, como proteínas séricas (em especial albumina), gamopatias mo- noclonais, desidratação e distúrbios do equilíbrio acidobásico; desse modo, é im- portante verificar o cálcio iônico. • Etiologia e fisiopatologia As principais causas incluem hiperparatireoidismo (produção excessiva de PTH), excesso de vitamina D, câncer (liberação de PTH-like) e aumento da reabsorção óssea. O cálcio da dieta e sua absorção não parecem representar papel predo- minante. • Quadro clínico A apresentação clínica da hipercalcemia geralmente reflete a causa desta, assim como é dependente de sua gravidade. Os sintomas mais comuns incluem: alte- ração de comportamento, poliúria, polidipsia, confusão, letargia, fraqueza mus- cular, anorexia e vômitos, constipação. As complicações decorrentes são desidratação, nefrolitíase, nefrocalcinose, insuficiência renal, hipertensão, arrit- mias cardíacas, úlcera péptica, pancreatite e coma. Manifestações clínicas da hipercalcemia Renais Poliúria Polidipsia Nefrolitíase Nefrocalcinose Acidose tubular renal distal Diabetes insipidus nefro- gênico Insuficiência renal Musculoesqueléticas Fraqueza muscular Miopatia grave (rara) Osteíte fibrosa cística Osteosporose Neurológiacas Alteração de concentra- ção Perda de memória Confusão mental Cardiovasculares Encurtamento do intervalo QT Bradicardia Hipertensão (rara) Gastrointestinal Anorexia, náuseas e vô- mitos Constipação Pancreatite • Diagnóstico Faz-se pela mensuração das concentrações plasmáticas de cálcio sérico, cálcio iônico e PTH. Vale lembrar que o ideal é dosar o cálcio iônico, pois a concentração sérica do cálcio total é influenciada pelo equilíbrio acidobásico e albumina sérica. A presença de PTH elevado em pacientes com hipercalcemia faz o diagnóstico de hiperparatireoidismo primário; as únicas outras possibilidades diagnósticas são o uso de lítio ou a hipercalcemia hipocalciúria familiar. Classifica-se hipercal- cemias em PTH-dependentes ou PTH-independentes. A presença de níveis ele- vados de PTHrp confirma o diagnóstico de hipercalcemia da malignidade. Os ní- veis elevados de calcidiol indicam ingestão excessiva de vitamina D; entretanto, a concentração de 1,25-hidróxi-vitamina D aumentada pode indicar ingesta in- direta desse metabólito, produção por doenças granulomatosas ou linfoma e produção renal aumentada da mesma secundária ao hiperparatiroidismo. A pre- sença de níveis diminuídos de PTH, PTHrp e de vitamina D e seus metabólitos sugere outras causas de hipercalcemia, como hipertireoidismo, doença de Paget ou intoxicação por vitamina A. No ECG, verifica-se bloqueios atriventriculares, e encurtamento do segmento QT. No exame oftalmológico, pode apresentar cera- topatia em banda, que representa depósito subendoterial de fosfato de cálcio na córnea. • Complicações A hipercalcemia, se não tratada, pode evoluir a óbito. A hipercalcemia crônica está associada a nefrolitíase e calcificações metastáticos. O hiperparatireoidismo primário pode evoluir com osteoporose, fraturas patológicas e doença ulcerosa péptica. • Tratamento O objetivo é aumentar a excreção de cálcio e reduzir a reabsorção óssea de cál- cio. A primeira medida nos casos de hipercalemia grave é a hiper-hidratação com salina fisiológica, visando aumentar o fluxo sanguíneo renal e depuração do cál- cio acumulado nos túbulos renais (onde é tóxico), além de promover a restaura- ção volêmica do paciente que se encontra desidratado. A seguir, inicia-se com diurético de alça (furosemida). Por fim, a terapia deve ser direcionada para cada tipo de patologia; sendo a medida mais eficaz, sobretudo em hipercalemia grave e associada à malignidade, o uso dos bifosfonados, como pamidronato e zolen- dronato (ácido zolendrônico), que inibem a função osteoclástica de reabsorção óssea. A calcitonina tem efeito em diminuir a calcemia nas primeiras 24 horas, haevendo escape posterior. Os corticosteroides são uma boa opção para hiper- calcemia secundária à doença granulomatosa.