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BACHARELADO EM DIREITO Direito Penal – Teoria Geral da Infração Penal. Professor Mestre Roniery Rodrigues Machado. Aula 03: Tempo e lugar do crime; Aplicação da lei penal no espaço; Homologação de sentença estrangeira. 1.1. TEORIAS SOBRE O TEMPO DO CRIME TEORIA DA ATIVIDADE: considera praticado o delito no momento da conduta, não importando o instante do resultado; TEORIA DO RESULTADO: reputa cometido o crime no momento do resultado; TEORIA MISTA OU DA UBIQUIDADE: entende que o momento do crime pode ser tanto o da conduta, quanto o do resultado. É adotado no Brasil, segundo demonstra o art. 4.º do Código Penal, a teoria da atividade. “Tempo do crime Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.” 1.2. ALCANCE DA TEORIA DA ATIVIDADE A teoria da atividade serve para, dentre outros efeitos: determinar a imputabilidade do agente; fixar as circunstâncias do tipo penal; possibilitar eventual aplicação da anistia; dar oportunidade à prescrição. EXEMPLIFICANDO: Adotando-se essa teoria, se houver, por exemplo, um homicídio (crime material), o mais importante é detectar o instante da ação (desfecho dos tiros), e não o momento do resultado (ocorrência da morte). Assim fazendo, se o autor dos tiros for menor de 18 anos à época dos tiros, ainda que a vítima morra depois de ter completado a maioridade penal, não poderá ele responder, criminalmente, pelo delito. 1.3. O TEMPO DO CRIME NAS INFRAÇÕES PENAIS PERMANENTES E CONTINUADAS Aplicam-se para as infrações penais permanentes (crime cuja consumação se prolonga no tempo) e continuadas (uma ficção jurídica idealizada para beneficiar o réu, mas que é considerada uma unidade delitiva) a mesma regra especial. É considerado tempo do crime todo o período em que se desenvolver a atividade delituosa. Ilustração para o crime permanente: durante um sequestro os prazos prescricionais só passam a correr após o encerramento da atividade delituosa. Ilustração para o crime continuado: uma série de quatro furtos realizado pelo mesmo agente, com o mesmo modo de operação, na mesma comarca e em um prazo curto, os prazos prescricionais só passam a ser contados a partir do último delito. 1.3.1. O TEMPO DO CRIME NAS INFRAÇÕES PENAIS PERMANENTES E CONTINUADAS: inimputalibidade O que ocorre se o agente era inimputável no início da execução de um crime continuado ou permanente e se torna imputável ao final? Resposta para o crime permanente: durante um sequestro, pode ocorrer de um menor de 18 anos completar a maioridade, sendo considerado imputável para todos os fins penais. Resposta para o crime continuado: caso o agente de quatro furtos, possua 17 anos, quando do cometimento dos dois primeiros, e 18, por ocasião da prática dos dois últimos, apenas estes dois é que servirão para formar o crime continuado. Despreza-se o que foi cometido em estado de inimputabilidade. 1.4. TEORIAS SOBRE O LUGAR DO CRIME ATIVIDADE: considera local do delito aquele onde foi praticada a conduta (atos executórios); RESULTADO: reputa o lugar do crime como sendo aquele onde ocorreu o resultado (consumação); MISTA OU DA UBIQUIDADE: aceita como lugar do crime tanto onde houve a conduta (atos executórios), quanto onde se deu o resultado (consumação). Adota-se, no Brasil, pelo art. 6.º do Código Penal, a teoria mista. “Lugar do crime Código Penal, Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.” 5. CONFLITO APARENTE ENTRE O ART. 6.º DO CP E O ART. 70 DO CPP Levando-se em consideração que o art. 70 do Código de Processo Penal estabelece que a competência será determinada pelo “lugar em que se consumar a infração”, poder-se-ia sustentar a existência de uma contradição entre a lei penal (teoria mista) e a lei processual penal (teoria do resultado). Ocorre que o art. 6.º do Código Penal destina-se, exclusivamente, ao denominado direito penal internacional, ou seja, à aplicação da lei penal no espaço, quando um crime tiver início no Brasil e terminar no exterior ou vice-versa (é o denominado “crime à distância”). Para delitos cometidos no território nacional, vale o disposto no art. 70 do CPP, pois, quase sempre os crimes são executados e consumados no mesmo local. Uma das exceções é o crime de homicídio em que já é pacífico o entendimento de que deve ser o juízo competente o do local em que houve impacto social, essa mesma lógica é usada em outros crimes que excetuam a regra geral. Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. § 1o Se, iniciada a execução no território nacional, a infração se consumar fora dele, a competência será determinada pelo lugar em que tiver sido praticado, no Brasil, o último ato de execução. § 2o Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será competente o juiz do lugar em que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou devia produzir seu resultado. § 3o Quando incerto o limite territorial entre duas ou mais jurisdições, ou quando incerta a jurisdição por ter sido a infração consumada ou tentada nas divisas de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção. § 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção [aquele juízo que teve o primeiro contato com a causa]”. 6. LUGAR DO CRIME NAS INFRAÇÕES PENAIS PERMANENTES OU CONTINUADAS No caso de crimes permanentes ou continuados, continua-se a adotar a teoria mista para a adoção do juízo competente para o julgamento, permitindo, portanto, considerar lugar do crime aquele onde se der qualquer ato de execução ou mesmo onde se concretizou o resultado. Exemplo: se houver um sequestro, cujos autores mudam o local do cativeiro a todo momento, passando por várias cidades até que soltam a vítima, o lugar do crime é qualquer um daqueles por onde passou o ofendido. Para a solução do juízo competente, segue-se a regra do art. 71 do Código de Processo Penal. “CPP, Art. 71. Tratando-se de infração continuada ou permanente, praticada em território de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção [aquele juízo que teve o primeiro contato com a causa]”. 6. LUGAR DO CRIME NAS INFRAÇÕES PENAIS PERMANENTES OU CONTINUADAS 7. TERRITORIALIDADE E EXTRATERRITORIALIDADE Territorialidade é a aplicação das leis brasileiras aos delitos cometidos dentro do território nacional (art. 5.º, caput, CP). Esta é uma regra geral, que advém do conceito de soberania, ou seja, a cada Estado cabe decidir e aplicar as leis pertinentes aos acontecimentos dentro do seu território. Excepcionalmente, no entanto, admite-se o interesse do Brasil em punir autores de crimes ocorridos fora do seu território. Extraterritorialidade, portanto, significa a aplicação da lei penal nacional a delitos ocorridos no estrangeiro (art. 7.º, CP). “Territorialidade Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. (...) Extraterritorialidade Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:” 8. REGRAS PARA A APLICAÇÃO DA LEI PENAL NO ESPAÇO As regras são basicamente duas: TERRITORIALIDADE (regra geral); EXTRATERRITORIALIDADE (exceção: aplicação da lei penal brasileira a crime ocorrido fora do território nacional). Esta, por sua vez, é regida pelos seguintes princípios: B.1) defesa ou proteção (leva-se em consideraçãoa nacionalidade brasileira do bem jurídico lesado pelo delito); B.2) justiça universal ou cosmopolita (tem-se em vista punir crimes com alcance internacional); B.3) nacionalidade ou personalidade (leva-se em conta a nacionalidade brasileira do agente do delito); B.4) representação ou bandeira (tem-se em consideração a bandeira brasileira da embarcação ou da aeronave privada, situada em território estrangeiro). 9. CONCEITO DE TERRITÓRIO E SEUS ELEMENTOS Trata-se de todo espaço onde o Brasil exerce a sua soberania, seja ele terrestre, aéreo, marítimo ou fluvial. São elementos do território nacional: o solo ocupado pela nação; os rios, os lagos e os mares interiores e sucessivos; os golfos, as baías e os portos; a faixa de mar exterior, que corre ao largo da costa e que constitui o mar territorial; a parte que o direito atribui a cada Estado sobre os rios, lagos e mares fronteiriços; os navios nacionais; o espaço aéreo correspondente ao território; as aeronaves nacionais. 10. TERRITÓRIO BRASILEIRO POR EQUIPARAÇÃO - TERRITORIALIDADE Há duas situações que a lei brasileira considera território nacional por equiparação (art. 5.º, § 1.º, CP): embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde estiverem. (PRINCÍPIO DA DEFESA OU PROTEÇÃO) embarcações e aeronaves brasileiras, de propriedade privada, que estiverem navegando em alto-mar ou sobrevoando águas internacionais. (PRINCÍPIO DA REPRESENTAÇÃO OU BANDEIRA) “Art. 5º § 1º - Para os efeitos penais, [1] consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, [2] bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. ” A lei penal e a Convenção de Tóquio Em 1963, o Brasil subscreveu a Convenção de Tóquio, que cuida das infrações praticadas a bordo de aeronaves, aprovada pelo Decreto 479/69. Pelo texto da Convenção, aplica-se a lei do Estado de matrícula da aeronave, com relação a todas as infrações penais, com exceção a crimes que possam imediatamente ameaçar a soberania e ordem do Estado sobre cujo território se comete o delito. Entretanto, o texto da Convenção de Tóquio entra em conflito com o disposto no art. 5.º, § 2.º, do Código Penal, com a redação dada pela Lei 7.209/84. A posição do STF é que conflito entre normas deve ser resolvido pelo critério cronológico. Portanto, valeria o Código Penal (1984) em detrimento da Convenção de Tóquio (1963). TERRITORIALIDADE – Embarcações e aeronaves estrangeiras sobre o território brasileiro Territorialidade Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. (...) § 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. 10.1.Competência para o julgamento de crimes cometidos a bordo de embarcações e aeronaves É da Justiça Federal (art. 109, IX, CF), ressalvada a competência da Justiça Militar, do local onde primeiro pousar a aeronave (art. 90, CPP), ou atracar o navio (art. 89, CPP) após o delito . Entretanto, o STJ tem dado uma interpretação restritiva ao conceito de embarcação, pois a Constituição Federal menciona a palavra “navio”. Entende-se por esse termo a embarcação de grande porte, autorizada e adaptada para viagens internacionais. Portanto, é da competência da Justiça Estadual a punição de crimes cometidos a bordo de iates, lanchas, botes e embarcações equiparadas. No tocante à aeronave, não há interpretação restritiva, mesmo que o crime seja praticado dentro de um avião ainda em terra. “CPP, Art. 89. Os crimes cometidos em qualquer [1] embarcação nas águas territoriais da República, ou nos rios e lagos fronteiriços, bem como [2] a bordo de embarcações nacionais, em alto-mar, [3] serão processados e julgados pela justiça do primeiro porto brasileiro em que tocar a embarcação, após o crime, ou, quando se afastar do País, pela do último em que houver tocado.” “CPP, Art. 90. Os crimes praticados a bordo [1] de aeronave nacional, dentro do espaço aéreo correspondente ao território brasileiro, ou ao alto-mar, [2] ou a bordo de aeronave estrangeira, dentro do espaço aéreo correspondente ao território nacional, [3] serão processados e julgados pela justiça da comarca em cujo território se verificar o pouso após o crime, ou pela da comarca de onde houver partido a aeronave.” 11. CRITÉRIOS PARA A EXTRATERRITORIALIDADE Os critérios para o exercício da extraterritorialidade dividem-se em: incondicionada, significando que o interesse punitivo da Justiça brasileira deve ser exercido de qualquer maneira, independentemente de qualquer condição (art. 7.º, I e § 1º, do CP); condicionada, demonstrando que somente há interesse do Brasil em punir o autor de crime cometido no exterior se preenchidas as condições descritas no art. 7.º, II e §§ 2.º e 3.º, do Código Penal. 11.a.Hipóteses de extraterritorialidade incondicionada Os seguintes são as hipóteses que se fundam no princípio da defesa ou da proteção (art. 7.º, I, a, b e c): crimes cometidos contra a vida ou a liberdade do Presidente da República (arts. 121 e 122 e 146 a 154 do Código Penal e arts. 28 e 29 da Lei de Segurança Nacional – Lei 7.170/83). crimes contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público (são os arts. 155 a 180 e 289 a 311-A do Código Penal). crimes contra a administração pública, por quem está a seu serviço (são os arts. 312 a 326, em combinação com o art. 327, do Código Penal). 11.a. Hipóteses de extraterritorialidade incondicionada Os seguintes são as hipóteses que se fundam no princípio da justiça universal (art. 7.º, I, d, CP): crime de genocídio (extermínio, no todo ou em parte, de grupo nacional, étnico, racial ou religioso, matando ou causando lesão grave à integridade física ou mental de seus membros; submetendo o grupo, deliberadamente, a condições de existência capazes de proporcionar-lhe a destruição física, integral ou parcial; adotando medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo, bem como efetuando a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo, conforme art. 1.º da Lei 2.889/56), quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil. OUTRA HIPÓTESE FORA DO CÓDIGO PENAL: crime de tortura, conforme previsão da Lei 9.455/97, que estabeleceu a possibilidade de se aplicar a lei brasileira ao torturador, onde quer que o delito seja cometido, desde que a vítima seja brasileira ou esteja o autor da infração penal sob jurisdição brasileira (art. 2.º). Como se trata de lei especial, que não fixou condições para se dar o interesse do Brasil na punição do torturador, trata-se de extraterritorialidade incondicionada. Dispositivos sobre a extraterritorialidade incondicionada Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I - os crimes: a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil; (...) § 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. (...) Art. 8º - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas,ou nela é computada, quando idênticas. DEBATE SOBRE A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 8.º DO CÓDIGO PENAL Tratando-se de extraterritorialidade condicionada, a pena cumprida no estrangeiro faz desaparecer o interesse do Brasil em punir o criminoso. Entretanto, nos casos de extraterritorialidade incondicionada, o infrator, ingressando no País, estará sujeito à punição, pouco importando já ter sido condenado ou absolvido no exterior. Para tentar amenizar a não aplicação do princípio que proíbe a dupla punição pelo mesmo fato, fixou-se, no art. 8.º do Código Penal uma fórmula compensadora. Caso a pena cumprida no exterior seja idêntica à que for aplicada no Brasil (exemplo: pena privativa de liberdade no exterior e pena privativa de liberdade no Brasil), será feita a compensação; caso a pena cumprida no exterior seja diversa da que for aplicada no Brasil (exemplo: multa no exterior e privativa de liberdade no Brasil), a pena a ser fixada pelo juiz brasileiro há de ser atenuada. DEBATE SOBRE A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 8.º DO CÓDIGO PENAL O entendimento majoritário da doutrina atualmente é o de que o art. 8º do Código Penal não se coaduna com a garantia constitucional de que ninguém pode ser punido ou processado duas vezes pelo mesmo fato – consagrada na Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969, em vigor no Brasil, e cuja porta de entrada no sistema constitucional brasileiro dá-se pela previsão feita no art. 5.º, § 2.º, da Constituição Federal. Esse é um PRINCÍPIO DO DIREITO PENAL CHAMADO DE NE BIS IN IDEM. Em 2019 o STF julgou o HC 171.118, que versava sobre lavagem de dinheiro envolvendo o Brasil a Suíça e a pessoa havia sido condenado e cumprido pena por lá, a partir desse entendimento. “Pena cumprida no estrangeiro Art. 8º - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas. ” 11.b. Hipóteses de extraterritorialidade condicionada São as seguintes: crimes que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir (Ex.: tráfico ilícito de drogas, a pirataria, entre outros). É o princípio da justiça universal (art. 7.º, II, a, CP); crimes praticados por brasileiros no exterior. A justificativa para a existência desse princípio é a proibição de extradição de brasileiros, vedada pela Constituição Federal (art. 5.º, LI). Assim, caso um brasileiro cometa um crime no exterior e se refugie no Brasil, deve ser punido por um tribunal pátrio. Cuida-se do princípio da nacionalidade ou da personalidade (art. 7.º, II, b, CP); crimes praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando realizado em território estrangeiro e aí não sejam julgados. Trata-se do princípio da bandeira ou da representação (art. 7.º, II, c, CP); crimes cometidos por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, desde que não tenha sido pedida ou tenha sido negada a extradição e quando houver requisição do Ministro da Justiça. É a aplicação do princípio da defesa ou da proteção (art. 7.º, § 3.º, CP). 11.1. Condições para a extraterritorialidade Nos casos descritos no subitem anterior, é preciso o advento de cinco condições para que surja o interesse punitivo da Justiça brasileira (art. 7.º, § 2.º, CP). São eles: entrada do agente no território nacional. existência de dupla tipicidade, ou seja, o fato praticado no exterior e considerado crime no Brasil necessita ser também infração penal no exterior. Quando o crime for cometido em lugar não pertencente a país algum, aplica-se a lei da pátria do agente do delito, pois são os nacionais responsáveis pelo cumprimento das leis do seu país; estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição (a pena máxima prevista deve ser necessariamente superior a um ano). não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou, tendo sido condenado, não ter aí cumprido pena. não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por qualquer outro motivo, não estar extinta a punibilidade, conforme a lei mais favorável. Dispositivos sobre a extraterriorialidade condicionada Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: (...) II - os crimes: a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; b) praticados por brasileiro; c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados. (...) § 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. § 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior: a) não foi pedida ou foi negada a extradição; b) houve requisição do Ministro da Justiça. Art. 7º, II, c/c art. 7º, §§ 2º e 3º, todos do CP (extraterritorialidade condicionada): se o agente é condenado e cumpre pena no exterior, cessa o interesse do Estado Brasileiro em punir. Art. 7º, I c/c arts. 7º, § 1º e 8º, todos do CP (extraterritorialidade incondicionada): se o agente é condenado e cumpre pena no exterior apenas pode ser compensada ou atenuada a pena a ser cumprida no Brasil. Diferença entre a extraterriorialidade condicionada e a incondicionada 12. EXTRADIÇÃO Trata-se de um instrumento de cooperação internacional na repressão à criminalidade por meio do qual um Estado entrega a outro uma pessoa acusada ou condenada, para que seja julgada ou submetida à execução da pena. A sua relevância surge a partir do momento em que consideramos os princípios da territorialidade e da extraterritorialidade. Caso alguém cometa um crime em solo nacional (territorialidade), refugiando-se em país estrangeiro, cabe ao Brasil solicitar a sua extradição, a fim de que possa responder, criminalmente, pelo que fez. Em igual prisma, se o agente comete o crime no exterior, mas ofendendo interesse ou bem jurídico brasileiro, aplicando-se a regra da extraterritorialidade, terá o Brasil interesse em puni-lo, havendo necessidade de se utilizar do instituto da extradição. 12. EXTRADIÇÃO “Art. 5º, CRFB (...) LI – [1] nenhum brasileiro será extraditado, [3] salvo o naturalizado, em caso de crime comum, [3.1] praticado antes da naturalização, [3.2] ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, [3.2.1] na forma da lei; LII – [2] não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião;” Ou seja: é vedada a concessão de extradição de brasileiro nato de modo absoluto. 2) é vedada a concessão de extradição do estrangeiro por crime político ou de opinião. 3) é vedada a concessão de extradição de brasileiro naturalizado, 3.1) salvo em relação a crime comum cometido antes da naturalização 3.2) ou envolvido em tráfico de entorpecentes e drogas afins, 3.2.1) essa lei ainda não foi aprovada. 12.1. Espécies de extradição e fonte legislativa Chama-se extradição ativa o pedido formulado por um Estado para a entrega de alguém e extradição passiva a entrega de uma pessoa por um Estado em razão do pedido formulado por outro. A fonte legislativa principal é a Lei 6.815/80 (alterada pela Lei 6.964/81) – denominada Estatuto do Estrangeiro – e o Decreto 86.715/81. Na Constituição Federal há dispositivo expresso determinando que somente a União pode legislar sobre extradição (art. 22, XV). O princípio básico que rege a extradição é que a punição do crime deve ser feita no local onde foi praticado, em virtude do abalo causado na sociedade. 12.2. Requisitospara a concessão da extradição Os requisitos para concessão de extradição são: exame prévio do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, g, CF); existência de convenção ou tratado firmado com o Brasil ou, em sua falta, oferecimento de reciprocidade; existência de sentença final condenatória do Estado requerente; ser o extraditando estrangeiro (o naturalizado não pode ter adquirido essa condição após o fato que motiva o pedido e/ou não pode estar envolvido em tráfico ilícito de entorpecentes – art. 5.º, LI, da CF); 12.2. Requisitos para a concessão da extradição Os requisitos para concessão de extradição são: o fato imputado deve constituir crime – e não contravenção penal – perante a lei brasileira e a do Estado requerente; a pena máxima para o crime imputado ao extraditando deve ser privativa de liberdade superior a um ano, pela legislação brasileira; o crime imputado ao extraditando não pode ser político ou de opinião, incluídos nestes os de fundo religioso e de orientação filosófica (art. 5.º, LII, da CF, e art. 77, VII, do Estatuto do Estrangeiro); o extraditando não pode estar sendo processado, nem pode ter sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido. É a aplicação do princípio do ne bis in idem; 12.2. Requisitos para a concessão da extradição Os requisitos para concessão de extradição são: o Brasil tem que ser incompetente para julgar a infração, segundo suas leis, e o Estado requerente deve provar que é competente para julgar o extraditando; o extraditando, no exterior, não pode ser submetido a tribunal de exceção, que é o juízo criado após o cometimento da infração penal, especialmente para julgá-la; não pode estar extinta a punibilidade pela prescrição, segundo a lei do Estado requerente ou de acordo com a brasileira; o extraditando não pode ser considerado, oficialmente, como refugiado pelo Governo brasileiro (art. 33, Lei 9.474/97). Vale lembrar o disposto na Súmula 421 do STF: “Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou ter filho brasileiro” 13. OUTRAS EXCEÇÕES À REGRA DA TERRITORIALIDADE Como regra geral, aplica-se a lei penal brasileira aos crimes cometidos no território nacional. Entretanto, há duas exceções: as convenções, tratados e regras de direito internacional podem afastar a aplicação da lei penal, conforme dispõe o art. 5.º, caput, do Código Penal. Exemplo disso é a Convenção de Viena, que trata das imunidades diplomáticas, desse modo, o diplomata que cometer um crime no Brasil não será preso, nem processado no território nacional, por força da exceção criada; as imunidades parlamentares, instituídas pela Constituição Federal, configuram outra hipótese de não aplicação da lei penal brasileira a infrações de opiniões, palavras e votos cometidas no território nacional (art. 53, caput, da CF). 14. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA E SOBERANIA NACIONAL Em razão da soberania da nação, uma sentença estrangeira não pode produzir efeitos no Brasil sem a homologação feita por um tribunal pátrio, porque, se assim fosse feito, estar-se-ia, em última análise, aplicando em território nacional leis estrangeiras. Um povo somente é efetivamente soberano quando faz suas próprias normas, não se submetendo a ordenamentos jurídicos alienígenas. Por isso, quando, em determinados casos, for conveniente que uma decisão estrangeira produza efeitos no Brasil é preciso haver homologação. O objetivo é nacionalizar a lei penal estrangeira que deu fundamento à sentença a ser homologada. A competência para a homologação é do Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, i, CF). “Eficácia de sentença estrangeira Art. 9º - A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas conseqüências, pode ser homologada no Brasil para: I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; II - sujeitá-lo a medida de segurança. Parágrafo único - A homologação depende: a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada; b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça.” 14.1.a HIPÓTESES PARA A HOMOLOGAÇÃO 1) Reparação civil do dano causado à vítima Busca-se facilitar a posição da vítima do crime, que não terá que dar início a um processo de indenização, na esfera cível, provando novamente a culpa do infrator, uma vez que, feita a homologação da sentença condenatória estrangeira, concretiza-se a formação de um título executivo (art. 9.º, I, CP). A discussão, quando a decisão homologada for executada, volta-se apenas ao valor da reparação do dano. Nessa hipótese, deve o ofendido requerer a homologação no Superior Tribunal de Justiça (art. 9.º, parágrafo único, a, CP). 14.1.b HIPÓTESES PARA A HOMOLOGAÇÃO 2. Aplicação de medida de segurança (art. 9.º, II) ao inimputável, absolvido e sujeito à medida de segurança, isto é, à internação ou ao tratamento ambulatorial (art. 97, CP). O semi-imputável, por sua vez, pode ser condenado e ter sua sanção penal substituída por medida de segurança, que seja internação ou tratamento ambulatorial (art. 98, CP). Utiliza-se a aplicação da medida de segurança imposta por autoridade estrangeira em benefício do próprio sentenciado e também da sociedade, que evitará o convívio desregrado com um enfermo perigoso. Para essa hipótese, é preciso requerimento do Procurador-Geral da República no STJ, desde que exista tratado de extradição entre o país de onde vem a sentença impondo a medida de segurança, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça. 14.1.c HIPÓTESES PARA A HOMOLOGAÇÃO 3. Hipótese prevista na Lei de Lavagem de Dinheiro A Lei 9.613/98, no art. 8.º, assegurou a possibilidade de serem decretadas medidas assecuratórias, como o sequestro dos bens, direitos e valores decorrentes do crime de “lavagem”, de forma que, findo o processo, quando se tratar de delito internacional, poderão o Brasil e o país solicitante da medida assecuratória dividir o que foi amealhado. Para tanto, é preciso a homologação da sentença estrangeira pelo Superior Tribunal de Justiça, a fim de que a perda dos bens se consume em definitivo. 14.2. EFEITOS DA SENTENÇA CONDENATÓRIA ESTRANGEIRA QUE INDEPENDEM DE HOMOLOGAÇÃO Há casos em que a sentença estrangeira produz efeitos no Brasil, sem necessidade de homologação pelo Superior Tribunal de Justiça. São situações particulares, nas quais não existe execução da sentença alienígena, mas somente a consideração das mesmas como fatos jurídicos. São as seguintes hipóteses: a) gerar reincidência (art. 63, CP); b) servir de pressuposto da extraterritorialidade condicionada (art. 7.º, II, § 2.º, d e e, CP); c) impedir o sursis (art. 77, I, CP); d) prorrogar o prazo para o livramento condicional (art. 83, II, CP); e) gerar maus antecedentes (art. 59, CP). Para tanto, basta a prova da existência da sentença estrangeira. Note-se que, mesmo não sendo a sentença estrangeira suficiente para gerar a reincidência, é possível que o juiz a leve em consideração para avaliar os antecedentes, a conduta social e a personalidade do criminoso. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal / Guilherme de Souza Nucci. – 10. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2014. image1.png image2.png