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Racismo no Brasil e suas determinações históricas: Cais de Valongo Racismo Antes de iniciar qualquer discussão sobre o racismo é importante entender o que é o racismo. Segundo o Artigo 1º do Estatuto da Igualdade Racial, o racismo é a prática de discriminar indivíduos ou grupos com base em suas características físicas e étnicas, associando-as a estigmas, estereótipos e preconceitos. Essa discriminação resulta em tratamento diferenciado, levando à exclusão, segregação e opressão em várias esferas, incluindo espacial, cultural e social. No século XIX, o conceito de raça era fundamentado nas classificações taxonômicas das ciências biológicas, que presumiam uma ligação entre características genéticas, fenotípicas e sociais nos grupos humanos. A expressão "está no sangue" ilustra essa associação, ainda presente hoje em dia. A aplicação da teoria darwinista às ciências humanas resultou em teorias racialistas e evolucionistas sociais, que afirmavam a superioridade de certos grupos sociais e uma progressão unilateral da barbárie à civilização. Esse pensamento serviu como justificativa para empreendimentos neocoloniais e para a escravidão de povos não brancos, perpetuando diversas formas de racismo ao longo dos séculos seguintes. A história do racismo no Brasil. Entre os anos de 1501 e 1870, mais de 12,5 milhões de africanos foram capturados, vendidos como escravos e transportados para o continente americano. Desse total, aproximadamente 1 em cada 4 foi destinado ao Brasil, totalizando cerca de 4,8 milhões de pessoas até meados do século XIX. No entanto, uma parcela significativa, cerca de 20%, o equivalente a 1,8 milhão de indivíduos, não sobreviveu à jornada, perecendo devido a doenças como escorbuto, varíola, sarampo, sífilis, disenteria, ou mesmo pela violência brutal imposta pelos traficantes. Os registros oficiais de desembarque de escravizados no Brasil remontam a 1530, quando a produção de cana-de-açúcar estava em ascensão. O ápice do tráfico negreiro no Brasil foi entre 1800 e 1850. A maioria dos africanos desembarcados aqui provinha de regiões como Angola, Congo, Moçambique e o Golfo do Benim. As condições de vida dos escravizados eram extremamente precárias, com falta de higiene, alimentação insuficiente, exaustivas jornadas de trabalho e punições físicas cruéis, resultando em uma expectativa de vida média de apenas 25 anos. Na segunda metade do século XIX, o Brasil apresentava uma considerável população negra, o que levou a um aumento das fugas e à formação de comunidades quilombolas. A pressão internacional, especialmente por parte da Inglaterra, para o fim da escravidão, e a necessidade de adequação ao crescente sistema capitalista, que se expandia no país, foram fatores relevantes. O Brasil se destacou como o maior território escravista do hemisfério ocidental, sendo o último a abolir o tráfico negreiro, por meio da Lei Eusébio de Queirós em 1850, e o último a abolir a escravidão, o que ocorreu com a promulgação da Lei Áurea, em 1888. Cais do Valongo e sua história: O Cais do Valongo, localizado na região portuária do Rio de Janeiro, é um sítio histórico e arqueológico de extrema importância para a história da escravização de africanos nas Américas, especialmente no Brasil. Sua redescoberta em 2011 durante obras de revitalização da Zona Portuária do Rio de Janeiro trouxe à tona a memória do tráfico negreiro e a chegada de centenas de milhares de africanos escravizados ao Brasil no século XIX (Lima, 2013; Pinheiro & Carneiro, 2016). O Cais do Valongo foi o principal ponto de desembarque desses cativos africanos, sendo um local simbólico que representa a brutalidade da escravidão e a resistência dos afrodescendentes (Carneiro & Pinheiro, 2015; Franco, 2018). Além disso, o Cais do Valongo tem sido objeto de estudos que exploram suas múltiplas dimensões, incluindo sua importância religiosa, cultural e histórica. Práticas populares, imateriais e efêmeras, bem como a participação de lideranças religiosas de matriz africana, contribuem para a patrimonialização do local (Souty, 2023; Júnior & Lima, 2020). O Brasil recebeu perto de quatro milhões de escravos, durante os mais de três séculos de duração do regime escravagista. Pelo Cais do Valongo, na região portuária da cidade, passou cerca de um milhão de africanos escravizados em cerca de 40 anos, o que o tornou o maior porto receptor de escravos do mundo. Além de sua importância histórica, o Cais do Valongo também desempenha um papel significativo no contexto contemporâneo, servindo como um espaço de conscientização e educação sobre a herança da escravidão e a luta contínua contra o racismo. A preservação e divulgação desse sítio arqueológico são fundamentais para promover o diálogo intercultural e combater a discriminação racial no Brasil. Diversas iniciativas têm sido desenvolvidas em torno do Cais do Valongo, incluindo exposições, eventos culturais, atividades educativas e programas de pesquisa. Essas ações visam não apenas preservar a memória dos africanos escravizados, mas também destacar suas contribuições para a formação da identidade brasileira e promover a valorização da cultura afrodescendente. Além disso, o reconhecimento do Cais do Valongo como Patrimônio Mundial pela UNESCO, em 2017, foi um marco importante na promoção da conscientização global sobre a história da escravidão e a preservação dos locais associados a ela. Essa designação reforça a importância do sítio não apenas para o Brasil, mas também para toda a humanidade, como um testemunho vívido dos horrores do tráfico transatlântico de escravos e um apelo à justiça e à reconciliação. No entanto, apesar dos esforços de preservação e valorização, o Cais do Valongo enfrenta desafios contínuos, incluindo a pressão urbanística na região portuária do Rio de Janeiro e a necessidade de garantir uma gestão sustentável e inclusiva do patrimônio cultural. É essencial que as autoridades governamentais, organizações da sociedade civil e comunidades locais trabalhem em conjunto para proteger e promover esse importante legado histórico, assegurando que as futuras gerações possam aprender com os erros do passado e construir um futuro mais justo e igualitário. Em suma, o Cais do Valongo é um local emblemático que representa a história da escravidão no Brasil, sendo um ponto de memória e resistência que desperta reflexões sobre o passado e o presente da sociedade brasileira. Dados do Racismo no Brasil: Conforme dados do IBGE de 2018, 56,10% da população brasileira declara-se como preta ou parda. No entanto, quando observamos dados do mercado de trabalho, 68,6% dos cargos gerenciais eram ocupados por brancos, e somente 29,9%, por pretos ou pardos. Já na taxa de força de trabalho subutilizada, isto é, pessoas que trabalham menos do que gostariam, 29% eram pretas ou pardas contra 18,8% de brancos subocupados. Na representação legislativa, dentre os deputados federais, 75,6% eram brancos, contra 24,4% de pretos ou pardos. A taxa de analfabetismo entre pessoas brancas era de 3,9%; entre pretos e pardos, era 9,1%. Nas taxas de homicídios por 100 mil habitantes na faixa etária de 15 a 29 anos, a população branca tinha a média de 34,0, e a população preta ou parda apresentava 98,5, ou seja, a chance de um jovem negro morrer de homicídio é quase três vezes maior que a de um jovem branco. A ocupação informal também é maior entre pretos e pardos (47,3%) do que entre brancos (34,6%.) A desigualdade salarial é notória quando a renda média é estratificada. O rendimento mensal de pessoas brancas naquele ano foi R$ 2.796,00, e o rendimento mensal médio de pessoas pretas ou pardas foi R$ 1.608,00. O 13º Anuário da Violência, compilado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em 2019, aponta que, em 2018, 75,4% das vítimas da letalidade policial eram pretas ou pardas, em sua maioria jovens e do sexo masculino. A pesquisa também revela quemulheres negras representam 61% das vítimas de feminicídio e 50,9% das vítimas de estupro. Dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), no último levantamento nacional realizado em 2016, apontam que 65% da população carcerária brasileira é composta por pretos e pardos. Esses dados ressaltam a urgência na promoção de políticas públicas voltadas para a população parda e preta de forma a democratizar o acesso a serviços públicos e a oportunidades. Referencias: Batalha, M. (2020). Relatos e travessias em eliana alves cruz. Pragmatizes - Revista Latino-Americana De Estudos Em Cultura, 246- 265. https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v10i18.40323 Carneiro, S. and Pinheiro, M. (2015). Cais do valongo: patrimonialização de locais, objetos e herança africana. Religião & Sociedade, 35(2), 384-401. https://doi.org/10.1590/0100- 85872015v35n2cap16 Franco, D. (2018). Cais do valongo: obstáculo hipocrático aos direitos fundamentais (1811-1831). Prim Facie, 17(35), 01-28. https://doi.org/10.22478/ufpb.1678- 2593.2018v17n35.39848 Júnior, A. and Lima, J. (2020). Aproximações entre arqueologia, educação patrimonial e diferentes segmentos da sociedade. Revista Escritas, 12(2), 144-164. https://doi.org/10.20873/vol12n2pp144- 164 Lima, T. (2013). Arqueologia como ação sociopolítica: o caso do cais do valongo, rio de janeiro, século xix. Vestígios - Revista Latino-Americana De Arqueologia Histórica http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/1605/ https://mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/racismo-no-brasil.htm IBGE. Desigualdades Sociais por Cor ou Raça. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/25844-desigualdades-sociais- por-cor-ou-raca.html?=&t=sobre. Acesso em: [data de acesso, por exemplo, 26 de março de 2024]. https://doi.org/10.22409/pragmatizes.v10i18.40323 https://doi.org/10.1590/0100-85872015v35n2cap16 https://doi.org/10.1590/0100-85872015v35n2cap16 https://doi.org/10.22478/ufpb.1678-2593.2018v17n35.39848 https://doi.org/10.22478/ufpb.1678-2593.2018v17n35.39848 https://doi.org/10.20873/vol12n2pp144-164 https://doi.org/10.20873/vol12n2pp144-164 http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/1605/ https://mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/racismo-no-brasil.htm https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/25844-desigualdades-sociais-por-cor-ou-raca.html?=&t=sobre https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/25844-desigualdades-sociais-por-cor-ou-raca.html?=&t=sobre