Prévia do material em texto
1 CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI FUNDAMENTOS DA MÚSICA GUARULHOS – SP 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 3 2 ORIGEM E HISTÓRIA DA MÚSICA ....................................................................... 4 2.1 A música e a sua relação com o contexto histórico .............................................. 9 2.2 Música e Matemática ........................................................................................ 13 2.3 Música e Filosofia ............................................................................................. 14 3 HISTÓRIA DA MÚSICA ........................................................................................ 15 3.1 Música na pré-história ....................................................................................... 16 3.2 Música no Egito ................................................................................................ 16 3.3 Música na Mesopotâmia ................................................................................... 17 3.4 Música na China e na índia .............................................................................. 17 3.5 Música na Grécia e em Roma........................................................................... 17 3.6 Música na Idade Média ..................................................................................... 18 3.7 Música no Renascimento .................................................................................. 18 3.8 Música no Barroco ............................................................................................ 18 3.9 Música no Classicismo ..................................................................................... 19 3.10 Música no Romantismo .................................................................................... 19 3.11 Música no Século XX ........................................................................................ 19 3.12 História não mitológica ...................................................................................... 20 3.13 Origem física e elementos ................................................................................ 20 3.14 A evolução da Música ....................................................................................... 22 4 MÚSICA ................................................................................................................ 23 4.1 Processo de reconhecimento do som ............................................................... 24 4.2 Constituição, características e elementos musicais .......................................... 26 4.3 Música sedativa e estimulante .......................................................................... 27 4.4 Musicoterapia.................................................................................................... 28 5 A MUSICA COMO FORMA DE COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO HUMANA ...... 29 3 5.1 Educação na perspectiva histórico-cultural ....................................................... 30 5.2 Música e influência no humor ........................................................................... 33 6 MÚSICA E EDUCAÇÃO ....................................................................................... 34 6.1 Educação musical ............................................................................................. 36 6.2 A importância do ensino de música na escola .................................................. 40 6.3 O ensino aprendizagem na Educação Infantil e a questão da música .............. 42 6.4 A gramática musical .......................................................................................... 49 6.5 O uso da música no ensino de história ............................................................. 51 6.6 Musicalidade no desenvolvimento infantil ......................................................... 54 6.7 Lateralização dos hemisférios cerebrais ........................................................... 55 7 TECNICAS E MÉTODOS PARA A EDUCAÇÃO MUSICAL ................................. 56 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ...................................................................... 60 3 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 2 ORIGEM E HISTÓRIA DA MÚSICA A música, ao longo da história, sempre “desempenhou, um importante papel no desenvolvimento do ser humano, seja no aspecto religioso, moral e social, o que contribuiu para a aquisição de hábitos e valores indispensáveis ao exercício de sua cidadania” Fonte: www.todamateria.com.br/historia-da-musica/ Segundo Loureiro (op.cit.) À palavra música é de origem grega – musiké téchne, a arte das musas – e, basicamente, “se constitui de uma sucessão de sons, entremeados por curtos períodos de silêncio, organizada ao longo de um determinado tempo” (p. 3). Vários autores apontam que a música existe desde a pré-história, cerca de 60.000 a.C., porém seu desenvolvimento, se deu apenas [...] através do estudo de sítios arqueológicos [...] nos primeiros grupos humanos. A arte rupestre encontrada em cavernas dá uma vaga ideia desse desenvolvimento ao apresentar figuras que parecem cantar, dançar ou tocar instrumentos. Fragmentos do que parecem ser instrumentos musicais oferecem novas pistas para completar esse cenário. No entanto, toda a cronologia do desenvolvimento musical não pode ser definida com precisão. É impossível, por exemplo, precisar se a música vocal surgiu antes ou depois das batidas com bastões ou percussões corporais. Mas podemos especular, a partir dos desenvolvimentos cognitivos ou da habilidade de manipular materiais, sobre algumas das possíveis evoluções na música. http://www.todamateria.com.br/historia-da-musica/ 5 Ao pensar na música aliada à educação formal é vital que se faça um percurso até a Grécia, por volta do século VI a.C., aproximadamente, isto porque, a música para os gregos era a forma que eles encontravam para alcançar a perfeição, ao atribuírem sua música para os deuses. Assim, os gregos tornam a música como uma arte, uma forma de pensar e de ser. Segundo o site edukbr.com.br (2011, p.11), Os gregos usavam as letras do alfabeto para representar notas musicais. Agrupavam essas notas em tetracordes (sucessão de quatro sons). Combinando esses tetracordes de várias maneiras, os gregos criaram grupos de notas chamados modos. Os modos foram os predecessores das escalas diatônicas maiores e menores. Os pensadores gregos construíram teorias musicais mais elaboradas do que qualquer outro povo da Antiguidade. Pitágoras, um grego que viveu no século VI a.C., achava que a Música e a Matemática poderiam fornecer a chave para os segredos do mundo. Acreditavaque os planetas produziam diferentes tonalidades harmônicas e que o próprio universo cantava. Essa crença demonstra a importância da música no culto grego, assim como na dança e nas tragédias. Mais tarde, as ideias de Pitágoras, influenciadas pela doutrina de Platão, perceberam o homem dicotômico, alma e corpo. Dessa forma, considera que é pela música, ao penetrar no espírito da pessoa, pelo ritmo e pela harmonia, desenvolve a forma dela distinguir o belo do feio. A música então passa ser ensinada, de forma leve e agradável, em todas as disciplinas, de acordo com faixa etária de seus alunos. Seus ensinamentos se davam a partir dos sete anos, através de canções (berceuses), para que, em seguida, aprendessem hinos guerreiros e religiosos. Para os pré-adolescentes, entre quatorze e dezesseis anos, aconselhado por Platão, somente se ensinavam dois estilos musicais. O primeiro, por músicas que direcionassem a violência, ligada às guerras, e a segunda, músicas mais lentas, relacionadas com a Igreja, preces e concentração. “Depois dos 16 anos, até o resto de suas vidas, os indivíduos continuariam a frequentar apenas os cantos corais e os jogos comunais”. Em um segundo nível, a educação musical, que se dava dos vinte aos trinta anos, tornou-se um momento de discussões literárias, abrindo espaços para um amplo estudo de assuntos gerais, tudo isso sobre a influência dos filósofos (MACEDO, 2011). 6 Quando o indivíduo chegava ao terceiro nível de educação, a música se estendia por mais cinco anos, na intenção de levar o aluno à arte do diálogo, até demonstrar uma educação mais avançada, pela filosofia ou pelo militarismo. Mais tarde, de acordo com Loureiro (2011, p. 39), com a invasão do Império Romano no mundo grego este quadro se altera, pois a “sensibilidade”, as emoções e o sentimento de humanidade, características dos gregos, não se adequavam à formação dos soldados romanos, que eram educados para serem duros, rígidos, disciplinados e severos. O povo romano foi, por natureza, guerreiro e rude. Por muito tempo, seus ideais e propósitos restringiam-se à conquista do mundo e ao domínio dos povos conquistados. Entretanto, sob a influência grega, as artes e as letras começaram a florescer em Roma. Verifica-se que, durante a Idade Média, recupera-se a linguagem e os sentimentos humanos, estabelecidos pela música, ocorrendo assim, uma união da melodia com as primeiras manifestações polifônicas, ou seja, a oportunidade de se cantar em uma ou mais vozes, em uma mesma canção. Esse lado polifônico religioso, mesmo a Igreja indo contra, é que dá origem aos poetas líricos da corte, pelos músicos que trazem com eles canções com acompanhamento musical, falando de sentimentos, saudades, guerras, dando assim, a origem da música popular. Com a Reforma Protestante, liderada por Lutero, se inicia a história do humanismo, na qual o homem carece de ter responsabilidade pela sua própria fé, cuja Bíblia é base para sua sabedoria. Nesse feito, criam-se escolas pautadas na catequese protestante, na intenção de repassar a sua doutrina, frente às escolas dos jesuítas. Entretanto, a formação do bom cristão, em ambas as escolas, se deu à luz da educação musical, por considerarem esse recurso, infalível na escolarização da juventude europeia. As propostas metodológicas modificam os tradicionais conservatórios de música, com objetivo de modernizar a maneira de musicalizar as crianças. Tais propostas encontraram “espaço, no Brasil, nos centros alternativos para o ensino da iniciação musical, criados sob os auspícios de Liddy Chiaffarelli e Antônio Sá Pereira, em final da década de 30” (LOUREIRO, 2011, p. 43). Com a chegada dos jesuítas no Brasil, em 1549, o ensino da música passou a ser utilizado no processo de colonização, como uma das armas para propagarem sua doutrina junto aos índios. Isto porque, 7 [...] em função da forte ligação dos indígenas com essa manifestação artística. Eram eles músicos natos que, em harmonia com a natureza, cantavam e dançavam em louvor aos deuses, durante a caça e a pesca, em comemoração a nascimento, casamento, morte, ou festejando vitórias alcançadas (LOUREIRO, 2011, p. 44). Dessa forma, a música torna-se catequese de tão grande importância, que fez com que ela começasse a fazer parte do currículo das escolas de ler e de escrever (LOUREIRO, 2011). Nesse contexto, os jesuítas utilizaram a cartilha musical, para iniciar as suas aulas, porém em um modelo, baseado na sociedade europeia, ou seja, equivalente à educação humanista. Mais tarde, criam-se instituições, em nível de internato, para que os jesuítas pudessem controlar, de forma rigorosa, os seus alunos. Nessa época, o estudo se dá pelo canto, porque a partir dele, os jesuítas tentavam cativar seus alunos e fortalecer sua a fé. Com a expulsão dos jesuítas, em 1759, surgem novas escolas, iniciam-se, lentamente, algumas mudanças no sistema escolar brasileiro. No entanto, a educação segue a tradição jesuítica, evidenciada pelo canto gregoriano, porém pautada nas canções dos índios, dos negros, portugueses e espanhóis. A consideração pela música dos negros se deu porque a música brasileira sofreu [...] influência dos negros. [...] como escravos, os negros trouxeram consigo instrumentos de percussão, como o Ganzá, a Cuíca, o Atabaque, porém cantavam e dançavam embebidos pelos sons e ritmos de sua pátria distante (LOUREIRO, op.cit, p. 47). No decorrer do século XVIII, cria-se, no Rio de Janeiro, uma escola de música, frequentada pelos filhos de escravos. Nesta escola saíram artistas musicais natos. Assim, pela mistura de dança, ritmo, palavras e instrumentos de percussão, surgem o samba, dança da cultura africana, cuja concentração vinha das favelas do Rio de Janeiro entre outras tendências musicais. O brasileiro sempre deu para a música. Gostou sempre de tocar, de dançar, de cantar. É natural que, desde cedo, a música se tivesse cultivado entre nós. Sambava-se ao tam-tam dos atabaques nas senzalas, e nas casas grandes, ouvia-se a viola e depois o cravo. Na Igreja, é que se cultivava música com mais apuro, porque os padres a sabiam melhor (BAUAB apud LOUREIRO, op.cit, p.47) 8 Ainda no período colonial, a música brasileira começa a perder força, descobre-se uma nova cultura, devido à descoberta de ouro e pedras preciosas, em Minas Gerais, favorecendo-se uma nova cultura, para a vida musical brasileira. Os músicos dessa região, com conhecimentos europeus, demonstram habilidades para comporem melodias, fazendo de Minas uma importante sede para a música colonial. Com a chegada da família real ao Brasil, em 1808, é construída a Capela Real, composta por uma orquestra de música erudita, com cento e cinquenta integrantes, divididos entre o vocal e os instrumentalistas, em que cantavam e tocavam músicas populares (LOUREIRO, 2011). Em 1835, em Niterói, funda-se a primeira escola de formação normal, cujo currículo tornou-se diversificado, porém a educação musical estava presente. Entre os anos de 1891 a 1893, apesar das críticas, a música se manteve presente nos educandários, exercendo hábitos sociais e participação em cultos religiosos. Tanto que ela se fez presente, até no Colégio Pedro II, modelo de ensino secundário, da classe dominante (LOUREIRO, op.cit.). O conservatório passou a fazer parte da escola Nacional de Belas Artes, mas, mais tarde, se tornou autônomo, “passando a chamar-se Instituto e, hoje, Escola de Música, subordinado à Universidade Federal do Rio de Janeiro” (op.cit., p.51). Em 1889, com a Proclamação da República, foram modificados os planos políticos, cultural, econômico e social, marcando assim uma nova fase no ensino das artes, porém pautados nos ensinamentos europeus. O ensino musical, no Instituto Nacional de Música e no Imperial Conservatório de Música, baseava-se em preparar seus alunos aoensinamento específicos de atuar no teatro e na Igreja (LOUREIRO, op.cit.). De acordo com Freire (apud Loureiro, 2011, p.52): seu currículo original constava das seguintes disciplinas: rudimentos preparatórios e solfejos; canto para o sexo masculino; rudimentos e canto para o sexo feminino; instrumentos de corda; instrumentos de sopro; harmonia e composição. Este elenco de disciplinas remetia, clara e objetivamente, aos objetivos propostos – à capacitação técnica de artistas para suprirem as exigências do Culto e do Teatro. Averígua-se que a educação musical, durante um bom tempo, não foi tão presente no sistema escolar brasileiro, segundo Loureiro (2011), se deu pela ausência de identidade dessa disciplina nos currículos. 9 A partir de 1973, os cursos de Arte e Educação foram implantados nas universidades, com um novo currículo básico, em todo país, porém, somente, nos anos 80 o curso de Arte na Educação dá início à conscientização, de formar profissional, através da mobilização de professores de Artes, tanto em nível formal quanto informal. Os educadores de Arte conquistam seu lugar, na promoção do currículo educacional, pressionado por determinados deputados que estavam no comando da nova constituição. Na Seção sobre educação, artigo 206, parágrafo II, a Constituição determina: O ensino tomará lugar sobre os seguintes princípios (...). II — liberdade para aprender, ensinar, pesquisar e disseminar pensamento, arte e conhecimento (Barbosa, 2011, p. 4). Atualmente, há uma sequência de palavras que expressa o significado de música, de certo modo que chega a ser consideradas ciência e arte, devido à sua prática social e humana (BARRETO; CHIARELLI, 2011). Dessa forma, a música foi incluída no cotidiano escolar, após a obrigatoriedade do ensino da Arte, apontada pela Lei de Diretrizes e Bases Nacionais de nº 9394 de 20 de dezembro de 1996, tanto que no § 2o do artigo 26 fica promulgado que “a música deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do componente curricular de que trata a sua inclusão, pela Lei nº 10.769, de 2008”. Nesse contexto, de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte (BRASIL, 1997) fica firmado que o ensino da Arte volta-se para o desenvolvimento natural da criança, centrado no respeito às suas necessidades e aspirações, valorizando suas formas de expressão e de compreensão do mundo. As práticas pedagógicas, que eram diretivas, com ênfase na repetição de modelos e no professor, são redimensionadas, deslocando-se a ênfase para os processos de desenvolvimento do aluno e sua criação (p.18). 2.1 A música e a sua relação com o contexto histórico Um número crescente de historiadores está ampliando as suas fontes de pesquisa a partir da escola dos Annales. Uma das fontes exploradas em algumas investigações históricas é a música, devido às suas características intrínsecas de 10 história social. Conforme Napolitano (2005), a música, sobretudo a chamada música popular, possui relevância na história sociocultural, já que realiza mediações e fusões e proporciona encontros de diversas etnias, classes e regiões que formam a grande diversidade do povo brasileiro. Até boa parte do século XX, a música foi um modo de traduzir e representar os dilemas e lutas nacionais da população, utilizada até mesmo como forma de resistência contra as classes sociais dominantes. Para completar, ela conseguiu, ao menos nos últimos 40 anos, atingir um grau de reconhecimento cultural que encontra poucos paralelos no mundo ocidental. Hoje, o Brasil é uma das grandes usinas sonoras do planeta; é um lugar privilegiado não apenas para se ouvir música, mas também para se pensar a respeito dela. E isso não está restrito à música brasileira no sentido estrito: a partir de uma mirada local, é possível pensar ou repensar o mapa-múndi da música ocidental, sobretudo este objeto não identificado chamado música popular. Nesse contexto, é necessário considerar a possibilidade e, principalmente, a viabilidade de o historiador tratar a música e a canção popular como fontes documentais importantes para mapear e desvendar zonas obscuras da história, sobretudo aquelas relacionadas com os setores subalternos e populares. A música pode ser relacionada a outras fontes de pesquisa para levar à análise de determinados fatos históricos a partir de diversas perspectivas. É possível, inclusive, encarar a música como fonte de investigação de determinada época, no sentido de que dada realidade “se traduz” em canções populares (NAPOLITANO, 2005). A música popular é fruto de um cruzamento da música ligeira com as músicas tradicionais, das danças de salão com as danças folclóricas. Até aí, nenhuma novidade, se não fosse o momento histórico que propiciou esse encontro, marcado pela industrialização da cultura e pelo surgimento das sociedades de massa. Portanto, não se trata de um cruzamento simples, de descendência direta: trata-se de uma relação complexa que precisa ser analisada em suas características específicas. Afinal, por que as músicas foram criadas? Sobre qual realidade foram constituídas? Essas problematizações tecem uma gama de possibilidades e relações complexas. Assim, as músicas podem ser utilizadas para a investigação sobre a realidade que constitui o Brasil enquanto nação e sobre a diversidade que forma o povo brasileiro (NAPOLITANO, 2005). 11 A reflexão sobre as relações existentes entre a música e o contexto histórico deve levar em conta o processo geral no qual a música foi construída e as crises que a sociedade viveu durante a sua elaboração (nos aspectos econômicos, sociais ou culturais). A música brasileira não apenas expressou, mas equacionou os impasses gerados ao longo desse processo, sob a perspectiva dos diversos atores envolvidos. A música popular brasileira, enquanto sistema musical/cultural amplo, exerce o papel de vórtice de tempos históricos e tradições diferenciadas. Apesar disso, qualquer história, social ou cultural, da vida musical do País não pode reproduzir a indiferenciação dos tempos históricos e das séries culturais aglutinadas nesse longo processo sob uma aparente linearidade cronológica, de sucessão tranquila de estilos, artistas e movimentos (NAPOLITANO, 2005). Trata-se de examinar as diversas tradições específicas e os tempos históricos conforme a sua inserção social e a sua dinâmica própria. É necessário examinar o material musical como elemento que congrega uma pluralidade de memórias e projetos culturais, quase sempre conflitivos entre si. A música popular tem traduzido e iluminado, a um só tempo, as posições e os dilemas não só dos artistas, mas também dos seus públicos e mediadores culturais (produtores, críticos, formadores de opinião). Ao mesmo tempo, esse tipo de problematização histórica só se torna possível na medida em que duas operações são conjugadas pelo pesquisador: a construção de ferramentas teórico-metodológicas claras e coerentes de análise das fontes (sobretudo as próprias fontes musicais); e o exame (auto) crítico da própria historiografia (acadêmica, de ofício ou amadora) como formadora de tradições e memórias. No cotejo da obra/fonte histórica com o pensamento historiográfico que emerge em torno dela é que se pode redefinir a relação da música com a história (NAPOLITANO, 2005). Nos últimos anos, tem sido bastante comum a utilização da canção, seja como fonte para a pesquisa histórica, seja como recurso didático para o ensino de humanidades em geral (história, sociologia, línguas, etc.). Como você sabe, entre os brasileiros, a canção ocupa um lugar muito especial na produção cultural. Em suas diversas matizes, ela tem sido termômetro, caleidoscópio e espelho não só das mudanças sociais, mas sobretudo das sociabilidades e sensibilidades coletivas mais profundas. Por isso mesmo, o uso da canção como documento e recurso didático12 deve dar conta de um conjunto de problemas nada simples de resolver (NAPOLITANO, 2005). É viável e cientificamente possível utilizar a música como uma fonte de pesquisa para a área de história, no sentido de uma investigação mais profunda e complexa de determinado fato. Talvez a música possa ser estudada como única fonte de coleta, mas também pode enriquecer outros estudos, sendo uma ferramenta a mais no processo. O uso da música como fonte de pesquisa para a história é possível justamente por sua relação com o contexto histórico de uma nação. Quando se fala na música africana no Brasil, sabe-se que ela representou um símbolo da cultura, mas mais do que isso: também representou uma forma de resistência, de luta e de expressão de um povo guerreiro que sofreu atrocidades catastróficas. Também é possível considerar a relação da música com os povos indígenas, ou com períodos de tensão política no País, como a época da ditadura militar. A relação da música com o contexto histórico é sempre muito próxima e complexa, na medida em que a música representa os anseios, angústias, alegrias e esperanças do povo que vive no tempo e no espaço em que ela foi constituída. Nesse sentido, a música funciona como um sinal a ser interpretado para revelar a época que a concebeu. A primeira geração de músicos da música popular urbana foi composta, com algumas exceções, por pessoas de extração social humilde, mestiços de diversas origens, que percorreram trajetórias profissionais tortuosas. Muitos nasceram no período de passagem do século XIX ao XX. Portanto, eles viram surgir um novo modo de vida urbano, marcado pela tecnologia dos meios de comunicação eletrônicos. Começaram a trabalhar muito cedo em várias profissões, mas desde jovens conviveram com músicos e compositores que participavam da indústria fonográfica, radiofônica, do espetáculo e da emergente “crítica” sobre a música popular. É esse universo cultural, encarado com preconceito pela intelectualidade, que impregnou suas vidas e que eles revelam, registram, analisam e reorganizam com outra narrativa (MORAES, 2000). Na passagem dos anos 1930 para os 1940, os fenômenos da cultura urbana foram incluídos no projeto nacional do Estado. Assim, a ação intelectual dessa geração começou a adquirir outra relevância, que antes era atribuída ao mundo rural 13 do folclore. Provavelmente, todo o conjunto de acervos e narrativas da primeira geração de historiadores teve alguma relevância para a construção do novo projeto nacionalista, que passou a incluir uma espécie de “folclore urbano”. As obras desses cronistas continuam formando um acervo documental fundamental para a memória da cultura musical do País. Daí eles ainda serem tratados, e os da geração imediatamente posterior também, pelos atuais pesquisadores da música popular como fontes primárias e “fidedignas” que servem de suporte documental básico e conferem autoridade às investigações mais recentes. Contudo, já é tempo de compreender os primeiros historiadores da música brasileira de outra maneira, alargando e diversificando os horizontes de análise e de crítica. Desde os anos 1980, se registra o esforço de ampliar os estudos sobre a música popular para além da crônica jornalística, das biografias e da crítica musical. No circuito dos historiadores de ofício, no entanto, o ritmo foi um pouco mais lento. Somente nos últimos anos houve certa multiplicação de pesquisas relacionadas direta ou indiretamente com a música popular urbana. Apesar dos evidentes avanços, as potencialidades que as relações entre história e música podem oferecer para a construção do conhecimento histórico permanecem pouco exploradas e discutidas pela historiografia (MORAES, 2000). Por fim, um dos desafios mais relevantes em relação ao trabalho desenvolvido pelo historiador na produção de conhecimento com o uso da música é compreender a sua importância e as relações que se constroem entre essas duas temáticas que se complementam. 2.2 Música e Matemática A música era quase sinônima de matemática, como afirma Leibnitz “prática escondida da aritmética, na qual o espírito ignora que conta” (HERBERT, C.-M., 2014). Foi Pitágoras, filósofo e matemático grego que viveu entre 580 e 495 a. C., quem elaborou as bases da notação musical e das regras da Harmonia. Para Pitágoras, (ECO, U., 2014, p.61-62) a ordem matemática seria condição da existência e da beleza, e estaria no princípio de todas as coisas. Ele teve então a intuição de que haveria uma relação numérica entre o comprimento de uma corda vibrante e a altura do som emitido. Assim foram estabelecidas as quatro 14 consonâncias fundamentais da escala musical: o uníssono, a oitava, a quinta e a quarta. Os outros intervalos eram considerados dissonantes. O mais harmônico, quer dizer o que melhor soava aos ouvidos, era a oitava (duplicação de uma mesma nota). Considerava-se que essa Harmonia estava ligada não somente à relação numérica entre as notas, mas também à sensação auditiva, pois já se percebia que certas sonoridades eram mais agradáveis aos ouvidos que outras (MORAES, 2000). Para os pitagóricos cada número tinha além do valor científico, uma significação espiritual. Eles estudaram particularmente o número 1,618 chamado número de ouro, representado por Ф, que resumiria a estética da beleza, o cânone da harmonia, símbolo da perfeição. Esse número de ouro seria encontrado na própria natureza e no corpo humano. Pitágoras deduziu também que havia, como barulho de fundo do universo, uma Música das esferas, acorde sublime composto por notas produzidas pelos astros em seus movimentos em torno da terra, a distância entre os planetas correspondendo a uma projeção dos intervalos musicais. Os pitagóricos matemáticos (aqueles que sabiam) e os acusmáticos (aqueles que escutavam) foram assim os primeiros teóricos a estabelecer as leis da harmonia musical, enquanto procuravam traduzir os segredos do universo. E a música seria a encarnação mais perfeita da Harmonia do Universo, suas proporções eram consideradas uma expressão matemática da Harmonia do Cosmo. As regras da Harmonia musical se tornaram também regras para a produção do Belo em outras formas de arte. O número de ouro será reencontrado mais tarde em muitas criações artísticas tais como as pirâmides, as catedrais góticas, ou na obra de artistas como Leonardo da Vinci, Salvador Dali, Bach, Beethoven, Bartók, Xenakis. Falar em número de ouro, já era pressupor a lei única da Harmonia Universal, símbolo do Belo. 2.3 Música e Filosofia Mas por ser intrinsecamente ligada à filosofia, a música também era considerada uma criação do espírito, um meio de alcançar a perfeição. Continha uma série de regras éticas que eram utilizadas na composição e execução, 15 buscando imitar a ordem perfeita do cosmo. E tendo o poder de exprimir ou mesmo de induzir diversos estados de espírito, supunha-se que a violação das regras de harmonia poderia provocar desordens na sociedade. Daí porque Platão considerava que a música deveria estar sob o controle do Estado para promover o bem social. Observa-se, que a palavra Harmonia é relacionada com a justa proporção, com a conveniência entre as partes, entre as partes e o todo e entre as partes e o universo, remetendo à Harmonia das esferas e a Harmonia da natureza. No final do século XVI o sentido de “justa relação” ampliou-se para fora do campo musical, significando as relações existentes, do ponto de vista estético, entre os elementos de uma obra de arte, de um objeto, etc. Atualmente, no campo musical, se fala de harmonia em referência ao conjunto dos sons percebidos, ou seja, o acorde (sons simultâneos), assim como às regras para articular os sons entre eles. Ou seja, seria na verdade um conjunto de regras necessárias para se relacionar sons simultâneos ou sucessivos. E pelas suas origensfilosóficas, fora do campo musical, a palavra harmonia continua tendo os sentidos de unidade, ordem, organização, concordância, conformidade, paz, união, equilíbrio, simetria... 3 HISTÓRIA DA MÚSICA A história mitológica da música, no mundo ocidental, começou com a morte dos Titãs. Conta-se que depois da vitória dos deuses do Olimpo sobre os seis filhos de Urano (Oceano, Ceos, Crio, Hiperião, Jápeto e Crono), mais conhecidos como os Titãs, foi solicitado a Zeus que se criasse divindades capazes de cantar as vitórias dos Olímpicos. Zeus então partilhou o leito com Mnemosina, a deusa da memória, durante nove noites consecutivas e, no devido tempo, nasceram as nove Musas. Entre as nove Musas estavam Euterpe (a música) e Aede, ou Arche (o canto). As nove deusas gostavam de frequentar o monte Parnaso, na Fócida, onde faziam parte do cortejo de Apolo, deus da Música (DAVID, 2012) Há também, na mitologia, outros deuses ligados à história da música como Museo, filho de Eumolpo, que era tão grande musicista que quando tocava chegava a curar doenças; de Orfeu, filho da musa Calíope (musa da poesia lírica e considerada a mais alta dignidade das nove musas), que era cantor, músico e poeta; 16 de Anfião, filho de Zeus, que após ganhar uma lira de Hermes, o mais ocupado de todos os deuses, passou a dedicar-se inteiramente à música. Se estudarmos com cuidado a mitologia dos povos, perceberemos que todo o povo tem um deus ou algum tipo de representação mitológica ligado à música. Para os egípcios, por exemplo, a música teria sido inventada por Tot ou por Osíris; para os hindus, por Brama; para os judeus, por Jubal e assim por diante, o que prova que a música é algo intrínseco à história do ser humano sobre a Terra e uma de suas manifestações mais antigas e importantes. 3.1 Música na pré-história A humanidade possui uma relação longa com a música, sendo essa umas das formas de manifestação cultural mais antigas. Ainda na pré-história, há mais de 50 mil anos, os seres humanos começaram a desenvolver ações sonoras baseadas na observação dos fenômenos da natureza. Os ruídos das ondas quebrando na praia, os trovões, a comunicação entre os animais, o barulho do vento balançando as árvores, as batidas do coração; tudo isso influenciou as pessoas a também explorarem os sons que seus próprios corpos produziam. Como por exemplo os sons das palmas, dos pés batendo no chão, da própria voz, entre outros (AIDAR, 2010) Nessa época, tais experimentações não eram consideradas arte propriamente e estavam relacionadas à comunicação, aos ritos sagrados e à dança. 3.2 Música no Egito No Egito Antigo, ainda no século 4.000 a.C., a música era muito presente, configurando um importante elemento religioso. Os egípcios consideravam que essa forma de arte era uma invenção do deus Thoth e que outro deus, Osíris, a utilizou como uma maneira para civilizar o mundo. A música era empregada de forma a complementar os rituais sagrados em torno da agricultura, que era farta na região e os instrumentos utilizados eram harpas, flautas, instrumentos de percussão e cítara - que é um instrumento de cordas derivado da lira. 17 3.3 Música na Mesopotâmia Na região da Mesopotâmia, localizada entre os rios Tigre e Eufrates, habitavam os povos sumérios, assírios e babilônios. Foram encontradas harpas de 3 a 20 cordas na região onde os sumérios viviam e estima-se que sejam objetos com mais de 5 mil anos. Também foram descobertas cítaras que pertenceram ao povo assírio. 3.4 Música na China e na índia Na Ásia - em torno de 3.000 a.C. - a atividade musical prosperou na Índia e China. Nessas regiões, ela também estava fortemente relacionada à espiritualidade. O instrumento mais popular entre os chineses era a cítara e o sistema musical utilizado era a escala de cinco tons - pentatônica. Já na Índia, em 800 a.C., o método musical era o de "ragas", que não utilizava notas musicais e era composto de tons e semitons. 3.5 Música na Grécia e em Roma Podemos observar que a cultura musical na Grécia Antiga funcionava como uma espécie de elo entre os homens e as divindades. Tanto que a palavra "música" provém do termo grego mousikē, que significa "a arte das musas". As musas eram as deusas que guiavam e inspiravam as ciências e as artes. É importante ressaltar que Pitágoras, grande filósofo grego, foi o responsável por estabelecer relações entre a matemática e a música, descobrindo as notas e os intervalos musicais. Sabe-se que na Roma Antiga, muitas manifestações artísticas foram herança da cultura grega, como a pintura e a escultura. Supõe-se, dessa forma, que o mesmo ocorreu com a música. Entretanto, diferente dos gregos, os romanos usufruíam dessa arte de maneira mais ampla e cotidiana (AIDAR, 2010). 18 3.6 Música na Idade Média Durante a Idade Média a Igreja Católica esteve bastante presente na sociedade europeia e ditava a conduta moral, social, política e artística. Naquela época, a música teve uma presença marcante nos cultos católicos. O Papa Gregório I - século VI - classificou e compilou as regras para o canto que deveria ser entoado nas cerimônias da Igreja e intitulou-o como canto gregoriano. Outra expressão musical do período que merece destaque são as chamadas Cantigas de Santa Maria, que agregam 427 composições produzidas em galego-português e divididas em quatro manuscritos. Uma importante compositora medieval foi Hidelgard Von Bingen, também conhecida como Sibila do Reino. 3.7 Música no Renascimento Já na época renascentista - que compreende o século XIV até o século XVI - a cultura sofreu transformações e os interesses estavam voltados para a razão, a ciência e o conhecimento do próprio ser humano. Tais preocupações se refletiram também na música, que apresentava características mais universais e buscava se distanciar dos costumes da Igreja. Uma característica significativa da música nesse período foi a polifonia, que compreende a combinação simultânea de quatro ou mais sons (AIDAR, 2010). Podemos citar como um grande compositor da Renascença Thomas Weelkes. 3.8 Música no Barroco A partir do século XVII, o movimento barroco promove mudanças marcantes no cenário musical. Foi um período bastante fértil e importante para a música ocidental e apresentava novos contornos tonais, com a utilização do modo jônico (modo “maior”) e modo eólio (modo “menor”). O surgimento das óperas e das orquestras de câmaras também acontece nessa fase, assim como o virtuosismo dos músicos ao tocar os instrumentos. Os 19 maiores representantes da música barroca foram Antônio Vivaldi, Johann Sebastian Bach, Domenico Scarlatti, entre outros. 3.9 Música no Classicismo No Classicismo, que corresponde ao período em torno de 1750 e 1830, a música adquire objetividade, equilíbrio e clareza formal, conceitos já utilizados na Grécia Antiga. Nessa época, a música instrumental e as orquestras ganham ainda mais destaque. O piano toma o lugar do cravo e novas estruturas musicais são criadas, como a sonata, a sinfonia, o concerto e o quarteto de cordas. Os artistas que se sobressaíram são Haydn, Mozart e Beethoven. 3.10 Música no Romantismo No século XIX, o movimento cultural que surgiu na Europa foi o Romantismo. A música predominante tinha como qualidades a liberdade e a fluidez, e primava também pela intensidade e vigor emocional. Esse período musical é inaugurado pelo compositor alemão Beethoven - com a Sinfonia nº3 - e passa por nomes como Chopin, Schumann e sua esposa Clara Shumann, Wagner, Verdi, Tchaikovsky, R. Strauss, entre outros. 3.11 Música no Século XX A música no século XX expressou bem a grande agitação social causada pelas duas grandes guerras, pelas ditaduras da Rússia com Stalin, da Itália com Mussolini e da Alemanha com Hitler. Uma grande depressão econômica pairou sobre as nações da época, dando lugarao surgimento de novas potências mundiais (U.S.A e U.R.S.S), ocasionando o fortalecimento de um novo sistema econômico através do desenvolvimento industrial, o capitalismo. Segundo Grout e Palisca: o início do século XX foi marcado por uma agitação social e uma tensão internacional crescentes, que viriam a culminar na catástrofe da primeira Guerra Mundial. No domínio musical, a agitação e a tensão manifestaram- se através de diversas experiências radicais; esses anos puseram fim não só ao período clássico-romântico, como também as convenções em matéria 20 de tonalidade tal como os séculos XVIII e XIX as haviam entendido (GROUT e PALISCA, 2007, p 653). Com a expansão do rádio e a invenção da televisão, a arte ganhou uma nova concepção no que tange a sua comercialização, difusão e formas de composição, os artistas ganham um papel mais arquetípico. Há também um amplo desenvolvimento da música popular nas diversas esferas da sociedade. Blues, Jazz, Polca, Modinha, Baião, Rock, Mazurca, cada país com suas características próprias, pois aqui os Estados nação já estão em plena forma, é onde se tem uma ampliação dos processos de globalização cultural fomentados pelos meios de comunicação, rompendo as fronteiras físicas e criando novas características mercadológicas. 3.12 História não mitológica A origem mecânica e não-mitológica da música divide-se em duas partes: a primeira, na expressão de sentimentos através da voz humana; a segunda, no fenômeno natural de soar em conjunto de duas ou mais vozes; a primeira, seria a raiz da música vocal; a segunda, a raiz da música instrumental. Na história não-mitológica da música são importantes os nomes de Pitágoras, inventor do monocórdio para determinar matematicamente as relações dos sons, e o de Lassus, o mestre de Píndaro, que, perto do ano 540 antes de Cristo, foi o primeiro pensador a escrever sobre a teoria da música. Outro nome é o do chinês Lin-Len, que escreveu também um dos primeiros documentos a respeito de música, em 234 antes de Cristo, época do imperador chinês Haung-Ti. No tempo desse soberano, Lin-Len - que era um de seus ministros, estabeleceu a oitava em doze semitons, aos quais chamou de doze lius. Esses doze lius foram divididos em liu Yang e liu Yin, que correspondiam, entre outras coisas, aos doze meses do ano. 3.13 Origem física e elementos A música, segundo a teoria musical, é formada de três elementos principais. São eles o ritmo, a harmonia e a melodia. Entre esses três elementos podemos afirmar que o ritmo é a base e o fundamento de toda expressão musical. 21 Sem ritmo não há música. Acredita-se que os movimentos rítmicos do corpo humano tenham originado a música. O ritmo é de tal maneira mais importante que é o único elemento que pode existir independente dos outros dois: a harmonia e a melodia. A harmonia, segundo elemento mais importante, é responsável pelo desenvolvimento da arte musical. Foi da harmonia de vozes humanas que surgiu a música instrumental. A melodia, por sua vez, é a primeira e imediata expressão de capacidades musicais, pois se desenvolve a partir da língua, da acentuação das palavras, e forma uma sucessão de notas característica que, por vezes, resulta num padrão rítmico e harmônico reconhecível. O que resulta da junção da melodia, harmonia e ritmo são as consonâncias e as dissonâncias. Acontece, porém, que as definições de dissonâncias e consonâncias variam de cultura para cultura. Na Idade Média, por exemplo, eram considerados dissonantes certos acordes que parecem perfeitamente consonantes aos ouvidos atuais, principalmente aos ouvidos roqueiros (trash metal e afins) de hoje. Essas diferenças são ainda maiores quando se compara a música ocidental com a indiana ou a chinesa, podendo se chegar até à incompreensão mútua. Para melhor entender essas diferenças entre consonância e dissonância é sempre bom recorrer ao latim: Consonância, em latim consonantia, significa acordo, concordância, ou seja, consonante é todo o som que nos parece agradável, que concorda com nosso gosto musical e com os outros sons que o seguem. Dissonância, em latim dissonantia, significa desarmonia, discordância, ou seja, é todo som que nos parece desagradável, ou, no sentido mais de teoria musical, todo intervalo que não satisfaz a ideia de repouso e pede resolução em uma consonância. Trocando em miúdos, a dissonância seria todo som que parece exigir um outro som logo em seguida (MUSZKAT, 2012). Já a incompreensão se dá porque as concordâncias e discordâncias mudam de cultura para cultura, pois quando nós, ocidentais, ouvimos uma música oriental 22 típica, chegamos, às vezes, a ter impressão de que ela está em total desacordo com o que os nossos ouvidos ocidentais estão acostumados. Portanto o que se pode dizer é que os povos, na realidade, têm consonâncias e dissonâncias próprias, pois elas representam as suas subjetividades, as suas idiossincrasias, o gosto e o costume de cada povo e de cada cultura (MUSZKAT, 2012). A música seria, nesse caso, a capacidade que consiste em saber expressar sentimentos através de sons artisticamente combinados ou a ciência que pertence aos domínios da acústica, modificando-se esteticamente de cultura para cultura. 3.14 A evolução da Música A história da música se confunde com a história da humanidade. Desde que o homem dá início a sua caminhada em direção ao seu desenvolvimento sapiente, ou seja, interagir racionalmente com o meio ambiente, buscando a razão pela qual as coisas são manifestas tanto no mundo racional quanto espiritual, o então infante ser, em sua ânsia por interagir de forma mais ampla com o meio natural dá início a produção sonora, utilizando artefatos encontrados no meio ambiente. Para facilitar a compreensão dos fatos ocorridos, vamos dividir a história da música em: Primitiva (relativa aos povos primevos) – que compreende os inícios das atividades laborais de adaptação da natureza as suas necessidades, realizadas pelo homem pré-histórico. Cultural (relativa ao domínio de técnicas rudimentares para manipulação dos metais) – que compreende a chamada música antiga realizada por povos denominados de média cultura tais como: caçadores, agricultores, pastores e etc. E os de alta cultura como os chineses, indianos, egípcios e gregos. Cientifico-cultural – que compreende os períodos medieval, renascença, barroco, clássico, romântico, pós-romântico, nacionalismo e contemporâneo. Falar de um conteúdo tão extenso, que objetiva esclarecer ao estudante como se deu o desenvolvimento da música através das transformações sociais vividas pela humanidade, constitui-se um grande desafio. Porém, buscarei fazer com que o nosso conteúdo 23 tenha apenas o que seja mais relevante para nossos estudos, dando maior ênfase na música popular brasileira, sem deixar de lado o acervo histórico que temos resguardado. 4 MÚSICA A música, mais do que qualquer outra arte, tem uma representação neuropsicológica extensa, com acesso direto à afetividade, controle de impulsos, emoções e motivação. Ela pode estimular a memória não verbal por meio das áreas associativas secundárias as quais permitem acesso direto ao sistema de percepções integradas ligadas às áreas associativas de confluência cerebral que unificam as várias sensações. Exemplo pode ser dado referindo-se à sensação gustativa, olfatória, visual e proprioceptiva as quais dependem da integração de várias impressões sensoriais num mesmo instante, como a lembrança de um cheiro ou de imagens após ouvir determinado som ou determinada música. O conjunto dessas atividades motoras e cognitivas envolvidas no processamento da música é chamado de função cerebral. Tal função exige várias operações mentais tais como interpretação de ritmos, harmonias, timbres, expressão motora, processos cognitivos e emocionais paraa formação de um complexo de interpretação da música (MUSZKAT, 2012). Nas crianças, a música também exerce grande influência em seu desenvolvimento e funcionamento cerebral, sendo entendida pelo cérebro como uma forma de linguagem. Assim, à semelhança da linguagem falada, a música envolve diferentes entonações, ritmos, andamentos e contornos melódicos. É considerada uma arte que se utiliza da linguagem para a comunicação e expressão (CUERVO, 2011). A partir disso, compreenderam-se aspectos relacionados à dominância cerebral na função dos hemisférios cerebrais. O hemisfério esquerdo contém as habilidades verbais, enquanto as não verbais dependem do hemisfério cerebral direito (SCHMIDEK, 2005). A neurociência mostra que o cérebro de um praticante de música em longo prazo, como em músicos profissionais, funciona de uma forma diferente do cérebro de um não músico. O primeiro apresenta maior capacidade de aprendizado, atenção, concentração, controle emocional e normalmente são 24 indivíduos bem-humorados. No desenvolvimento de suas atividades, como executar uma peça musical, eles usam os dois lados do cérebro ao mesmo tempo devido o desenvolvido das habilidades musicais localizadas em ambos os hemisférios indicando mudanças positivamente mensuráveis (TRAVIS, 2011; AAMODT e WANG, 2013). 4.1 Processo de reconhecimento do som A música e a linguagem são ferramentas de estudo que exploram funções cerebrais. Enquanto a voz falada envolve entonação, ritmo, andamento e um contorno melódico, a música utiliza-se da linguagem de símbolos para comunicação e expressão. No entanto, ambas dependem de esquemas sensoriais responsáveis pela percepção e processamento auditivo e visual para que haja uma organização temporal e motora necessárias para a fala e execução musical (MUSZKAT et al, 2000). Ao chegarem aos ouvidos, os sons são convertidos em impulsos que percorrem os nervos auditivos até o tálamo, região do cérebro considerada central para as emoções, sensações e sentimentos. Os impulsos cerebrais provocados pela música afetam todo o corpo e podem ser detectados por técnicas de escaneamento cerebral ou neuroimagem (GASPARINI, 2003). Quando um som é ouvido, o ouvido externo o capta, transfere e conduz a onda de pressão sonora (energia sonora) pelo canal auditivo em direção à membrana timpânica a qual vibra. Tal vibração é transmitida aos ossículos do ouvido, de modo que martelo, bigorna e estribo oscilam em resposta ao som e, através do movimento mecânico, conduzem o som do meio gasoso para o meio líquido do compartimento seguinte. O martelo recebe inicialmente o estímulo e o estribo empurra a cóclea que se situa numa cavidade no osso temporal (ouvido interno) criando pressão sobre o fluido lá dentro. Na cóclea existem células ciliadas, que atuam como receptores sensoriais os quais geram estímulos elétricos através de sequências de descargas nervosas para o nervo auditivo, que vai transmiti-lo ao cérebro, no córtex auditivo, que se situa no lobo temporal. A cóclea separa os sons complexos em suas frequências elementares e cada célula ciliada está afinada para diferentes frequências de vibração, sendo que no 25 cérebro também existem células que respondem melhor a frequências específicas. O nervo auditivo recebe informação nervosa das células ciliadas e a transmite ao tronco encefálico que vai repassar ao tálamo que, enfim o direciona ao córtex ou a bloqueia. Todo o mecanismo nervoso de condução auditiva permite, por exemplo, prestar atenção a um só instrumento numa orquestra. O cérebro processa a música de forma distribuída uma vez que existem muitas áreas auditivas no córtex cerebral as quais são de difícil delimitação. Sabe-se que a percepção musical envolve as áreas primárias, secundárias e terciárias do sistema auditivo, além das áreas de associação auditivas nos lobos temporais e da Área de Wernicke. Esta, por sua vez, está ligada à percepção da linguagem e do processamento da maioria das funções intelectuais do cérebro. As áreas primárias recebem sinais do ouvido interno através do tálamo e estão envolvidas nos primeiros estágios da percepção musical tais como frequência de um tom, contornos melódicos e volume. Áreas secundárias processam padrões mais complexos de harmonia, melodia e ritmo. As terciárias permitem uma percepção geral da música (GASPARINI, 2003). Segundo estudos realizados no Instituto de Fisiologia da Música e da Medicina da Arte, em Hannover na Alemanha, o lado esquerdo do cérebro parece processar elementos básicos como intervalos musicais e ritmos ao passo que o lado direito se relaciona ao reconhecimento de características como métrica e contorno melódico. Vale lembrar que o córtex auditivo primário é amplamente influenciado pela experiência de forma que, quanto maior for a experiência, maior é o número de células estimuladas e reativas a sons e tons musicais importantes. A experiência induz ao aprendizado e este afeta os processamentos nas áreas auditivas secundárias e de associação, onde se supõe que os padrões musicais mais complexos, como harmonia, melodia e ritmo são processados. Desta forma, aprender a tocar um instrumento faz com que haja uma reorganização de diversas áreas cerebrais como, por exemplo, as áreas motoras, o corpo caloso e o cerebelo. Esta reorganização se faz através da plasticidade neural, quer seja a partir do aumento no número de sinapses e de neurotransmissores, quer seja como o aumento da potência da sinapse existente e a formação de novas conexões. Este fato ocorre predominantemente a partir de exercícios musicais os quais são 26 apontados como capazes de desenvolverem o hemisfério esquerdo (área da linguagem) e de beneficiarem a memória e a realização de tarefas espaciais. A música também tem sido apontada como hábil a influenciar o estado emocional. A percepção musical relacionada às emoções depende de variáveis tais como a experiência emocional específica de cada um. No entanto, de acordo com pesquisas do Instituto de Música e Aprendizagem de Paris (IRCAM) e Dijon (Lead), as reações emocionais de indivíduos sem formação musical e de músicos são bastante parecidas (GASPARINI, 2003). A capacidade de a música influenciar o estado emocional do indivíduo se deve ao fato dela produzir reações fisiológicas cuja magnitude parece depender do conteúdo emocional. Portanto, a percepção musical envolve muitas variáveis, muitas áreas encefálicas e é capaz de influenciar o corpo todo através das reações emocionais e fisiológicas. A música, que é parte da cultura humana desde tempos remotos, é um instrumento de diálogo não verbal. Ela é inata e pode desencadear profundos processos de transformação pessoal os quais afetam não só o próprio indivíduo, mas também o universo que o rodeia em todas as suas manifestações e formas. 4.2 Constituição, características e elementos musicais O som é caracterizado como uma onda sonora mecânica percebida pelo sentido da audição devido suas características musicais, timbre (amplitude), altura (frequência) e intensidade. O timbre é uma característica sonora que permite distinguir sons que possuem mesma frequência, porém são emitidos de fontes diferentes, por exemplo, ao tocar a mesma nota em dois instrumentos diferentes, o som produzido tem a mesma altura (frequência), mas mesmo assim, é possível distinguir o som de cada instrumento porque o timbre (determinado pela forma de onda emitida) é diferente para cada um. A intensidade é a característica que distingue sons fortes e fracos. Ela depende da amplitude das vibrações que as partículas de ar realizam sobre suas posições de equilíbrio enquanto um som se propaga, portanto, quanto maior a frequência, mais agudo é o som e vice-versa. Ritmo, melodia e harmonia são os principais elementos que constituem a música. Dentre eles, o ritmo é o que mais se associaà percepção de duração no 27 tempo, de periodicidade, pois é algo que flui, que se move, é um movimento regulado. É importante, pois sem movimento não há som uma vez que todo movimento produz som, mesmo que este não seja percebido pelo ouvido humano. Vale ressaltar que o aparelho auditivo humano é sensível a sons de frequência que estejam entre 20 e 20.000 Hz. Tal capacidade de reconhecimento auditivo é conhecida como espectro audível ou limiar de audibilidade (GASPARINI, 2003). Estudos foram feitos a fim de entender os efeitos fisiológicos e psíquicos das ondas sonoras de baixa frequência no corpo humano os quais demonstraram que, para a maioria dos indivíduos, a vibração sonora mais confortável foi a de 69,2 Hz e a mais desconfortável foi a de 24,49 Hz. As sensações benéficas descritas pelos participantes foram leveza, tranquilidade, relaxamento, sonolência, paz, meditação, sonho, anestesia, esquecimento de imagens e cenas ocorridas durante a aplicação, maior consciência corporal, melhora postural, sensação de bem-estar, redução de dores musculares, sensação de conforto, menos ansiedade, desobstrução das vias aéreas e desejo de urinar (por estimulação do sistema autônomo). 4.3 Música sedativa e estimulante Estudos sobre a influência da música no comportamento humano categorizam, principalmente, dois estilos de música, a sedativa e a estimulante. A música de estilo sedativo compreende os andamentos lentos, com harmonias simples e leves variações musicais. Uma de suas características é o fato dela poder tornar suave uma atividade física ou aumentar a capacidade contemplativa do ser humano produzindo um efeito relaxante, com redução da frequência cardíaca, pressão arterial e ventilação. Ao contrário, a música estimulante pode produzir um efeito excitante aumentando o ritmo da respiração, da pressão arterial e dos batimentos cardíacos em consequência de ativação autônoma simpática que produz uma sensação de aumento do estado de alerta. Neste caso, uma pré-disposição à atividade motora é gerada assim como maior ativação mental devido seus tempos mais rápidos, forte presença de articulações em staccato (notas com curta duração), harmonias complexas e dissonantes e mudanças repentinas na dinâmica. 28 4.4 Musicoterapia A musicoterapia é considerada uma ciência nova aplicada por pessoa qualificada que usa a música de forma prescrita e clínica como intervenção terapêutica, que deve possuir algumas exigências técnicas e científicas, como maturidade, controle afetivo e emocional, imaginação, capacidade de observação do mundo interior e exterior. A musicoterapia destina-se a facilitar e promover a mobilização, a comunicação, a expressão, a organização e melhorar relacionamentos sociais. Outros objetivos terapêuticos relevantes são descritos como melhora de necessidades físicas, emocionais, mentais, sociais e cognitivas do indivíduo o qual desenvolve potenciais e recupera funções. Fonte:www. www.revistainterativa.org O musico terapeuta cria formas e estratégias de fazer com que as atividades musicais contemplem o paciente. As mais comuns incluem dança, improvisação, associação do canto a tons combinados, uso de imagens, o canto, tocar um instrumento ou compor uma música. Tais atos ajudam na expressão emocional, na melhora das habilidades motoras além de melhorar lembranças associadas favorecendo indivíduos portadores de Alzheimer (GOLD et al., 2004), com danos cerebrais ou necessidades especiais (COVINGTON, 2001), autistas (CHANDLER et al., 2002), indivíduos com síndrome de Down (BROTONS e KOGER, 2000) e pessoas que não estão em tratamento, crianças, adolescentes e idosos, sendo seus efeitos incontáveis sobre cada indivíduo. http://www.revistainterativa.org/ 29 Muitas pesquisas relatam e apontam a importância da música como um elemento de otimização das funções cerebrais com destaque para a memória, uma vez que a música, a influência da música no comportamento humano envolve armazenamento de símbolos organizados estimulando a cognição. Além disso, a música apresenta grande importância em distúrbios motores como a doença de Parkinson. Num estudo recente, idosos após acidentes vasculares encefálicos foram submetidos a cinco sessões semanais de 30 minutos de musicoterapia interagindo com piano e bateria. Os mesmos foram avaliados antes e após este período quanto ao desempenho motor fino (movimento de dedos), movimentos de pulso e movimentos mais amplos. A melhora na capacidade motora foi percebida nos movimentos e atribuída à plasticidade neural das vias motoras do córtex cerebral para a medula espinal a partir da estimulação causada pelos estímulos musicais (AMENQUAL et al., 2013). Por isso, Sacks (2007) afirma que a música correta, pode orientar o indivíduo quando este não é mais capaz de fazê-lo por si só. 5 A MÚSICA COMO FORMA DE COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO HUMANA A música se faz presente em todas as manifestações sociais e pessoais do ser humano desde os tempos mais remotos. Schaeffner (1958) explica que mesmo antes da descoberta do fogo, o homem primitivo se comunicava por meio de gestos e sons rítmicos, sendo, portanto, o desenvolvimento da música, resultado de longas e incontáveis vivências individuais e sociais. Da mesma maneira, ao nascer, a criança entra em contato com o universo sonoro que a cerca: sons produzidos pelos seres vivos e pelos objetos. Essa sua relação com a música pode ocorrer, por exemplo, por meio do acalanto da mãe ou aparelhos sonoros, sons da natureza e outros sons produzidos no seu cotidiano. Nesse sentido, a música dialoga com a constituição interna do ser humano. A criança estabelece suas primeiras relações com o mundo sociocultural por meio dos sentidos sensoriais e de laços afetivos. Segundo a educadora musical brasileira Ilari (2003), o primeiro contato do ser humano com a música acontece mesmo antes de nascer, na sua vida intrauterina. Ao ouvir o batimento cardíaco da mãe mais 30 compassado e mais lento que o seu, como feto toma contato com um dos elementos fundamentais da música – o ritmo. Os sons que se ouvem, quaisquer que sejam não passam de ritmos. Uma melodia, que nos possibilita escutar uma nota ou um “tum” do coração, consolida-se pela aceleração de mínimas batidas que compõem o som estável, suficiente para que o ouvido humano escute. Já o silêncio, imprescindível para a composição da música, é aquele que não conseguimos ouvir, mas que caminha também pelo ar como matéria, e que necessariamente selecionamos e relativizamos. Além do som organizado – aquele que ouvimos em um instrumento ou de um pássaro cantando – existem sons desorganizados, os chamados ruídos, que nos rodeiam incessantemente (como o som de um trovão) e aqueles que inserimos na música (como os instrumentos de percussão). A música, portanto, é a junção de sons, ruídos, silêncios, ritmos e melodias. Enfim, iniciamos o nosso contato musical desde quando crescemos no útero materno e por toda a nossa vida. Por conseguinte, cada criança traz práticas sociais e tradições culturais musicais, historicamente produzidas no seu contexto histórico, e ainda bebê já percebe as variações rítmicas e muda seus comportamentos, como por exemplo, ao ouvir uma canção de ninar conhecida. O canto é a estruturação musical da palavra, portanto, organização temporal de ritmos, frequências e timbres que demonstram a profunda tessitura da palavra (SANTOS, 2004). Nesse sentido, a música folclórica pode ser usada na Educação Infantil como instrumento de valor próprio e significativo, visto que, as canções tradicionais de um povo tratam de quase todos os tipos de atividades humanas. Muitas dessas canções expressam crenças religiosas ou políticas, ou descrevem a sua história, que são passadas de geração em geração por meio da oralidade. 5.1 Educação na perspectiva histórico-cultural Coadunam-secom essas reflexões as teorizações de Leontiev (1978), psicólogo russo, quando no texto O Homem e a Cultura ressaltam a importância do conhecimento culturalmente construído pelas gerações antecedentes. Segundo este autor, Cada geração começa, portanto, a sua vida num mundo de objetos e de fenômenos criados pelas gerações precedentes. Ela apropria- -se das 31 riquezas deste mundo participando no trabalho, na produção e nas diversas formas de atividade social e desenvolvendo assim as aptidões especificamente humanas que se cristalizaram, encarnaram nesse mundo (LEONTIEV, 1978, p.265-6). Leontiev afirma a necessidade do processo da objetivação e apropriação pelas gerações futuras como condição para que ocorra seu desenvolvimento e humanização. Esses conceitos são explicados por ele baseados na obra de Karl Marx, o primeiro que forneceu uma análise teórica da natureza social do homem e do seu desenvolvimento sócio histórico. A objetivação consiste na realização material do homem das suas faculdades físicas, mentais ou espirituais, ou seja, na produção e reprodução de objetos materiais e não materiais que refletem a ação do homem no seu meio sociocultural. A apropriação corresponde ao complemento desse processo, significando a incorporação pelos indivíduos dos objetos materiais e não materiais produzidos pela humanidade. Portanto, ao se apropriar do objeto o sujeito se apropria do pensamento que o objetivou. De acordo com Leontiev (1978), cada indivíduo aprende a ser homem; ninguém nasce personalidade; para viver em sociedade não basta o que a natureza lhe dá ao nascer. Tem que se apropriar do que foi produzido pela humanidade no decurso do seu desenvolvimento histórico. A apropriação enfocada por ele pressupõe três particularidades essenciais: é sempre um processo ativo, realizado pelo homem para se apropriar e desenvolver novos traços essenciais da atividade acumulada pelo objeto; é sempre um processo mediador entre a formação histórica do gênero humano e a formação singular de cada indivíduo; é sempre um processo mediatizado pelas relações entre seres humanos, numa constante transmissão cultural de geração para geração, dos valores, conceitos, aptidões e demais atividades ao longo da história. Dessa forma, Leontiev (1978, p.273) chega à conclusão de que “o movimento da história só é possível com a transmissão, às novas gerações, das aquisições da cultura humana, isto é, com educação”. O autor deixa claro que, quanto mais a humanidade progride, mais imprescindível se torna a educação para o seu desenvolvimento, vinculando o progresso histórico de uma sociedade ao progresso do seu sistema de ensino. Mas, o que vem a ser educação nessa concepção? Leontiev se ocupa ainda de explicar que, 32 O homem não nasce dotado das aquisições históricas da humanidade. Resultando estas do desenvolvimento das gerações humanas, não são incorporadas nem nele, nem nas suas disposições naturais, mas no mundo que o rodeia, nas grandes obras da cultura humana. Só se apropriando delas no decurso da sua vida ele adquire propriedades e faculdades verdadeiramente humanas (LEONTIEV, p.282-3). A educação como se pode perceber tem como principal objetivo possibilitar a apropriação das criações humanas. É também, uma atividade social e histórica que se realiza nos múltiplos espaços da sociedade. No entanto, Leontiev (1978) complementa que não é qualquer tipo de educação que preconiza esses objetivos, e sim o ensino sistematizado, por possuir um nível de elaboração mais complexo do que aprendizagens espontâneas e não dirigidas. Neste sentido, Vygotsky (2001, p. 77) pontua que “a educação só pode ser definida como ação planejada, racional, premeditada e consciente e como intervenção nos processos de crescimento natural do organismo”. Portanto, na perspectiva enfocada pelo autor, para ter validade, deve ser implementado um modelo educacional que vise à apropriação da cultura material e intelectual, com vistas à superação das formas primitivas de pensamento e desenvolvimento da consciência, bem como com ênfase na formação dos processos psicológicos superiores. Nessa perspectiva de educação, é importante não perder de vista que, o que determina o desenvolvimento da inteligência, do raciocínio, da consciência é a própria vida, ou seja, a atividade que o ser humano desenvolve, seja externa, por meio da interação, ou interna. Dessa forma, quanto mais diversificada for à atividade, mais se abrem possibilidades de desenvolvimento para as referidas funções. Nesse processo de aprendizagem enfatizado pelos psicólogos russos, será que as crianças aprendem alguma coisa por meio das cantigas de acalanto, das advinhas ou das danças folclóricas? Será que a música folclórica possui valor educativo? Poderá contribuir de alguma forma para o desenvolvimento das funções psíquicas? 33 5.2 Música e influência no humor A música é descrita como tendo um papel envolvente na vida das pessoas, podendo causar aproximação e atração entre indivíduos melhorando assim sua socialização. Fonte:www.oplanetaalternativo.com Em relação à influência da música sobre o humor e a despeito da preferência musical de cada pessoa, nem todos os indivíduos poderão se beneficiar dos efeitos positivos da música sobre o humor. Este fato foi demonstrado em pesquisas feitas sobre determinados estilos musicais os quais mostraram correlação entre os traços de personalidade, valores humanos, risco de suicídio, uso de drogas e outros comportamentos antissociais, no comportamento pró-social, nos pensamentos e sentimentos agressivos e no comportamento do consumidor. Alguns estilos musicais como heavy metal e o rap preocupam os pesquisadores devido à forte frequência de comportamentos de risco em suas letras. Ao contrário, a música clássica tem efeitos relaxantes e positivos sobre o humor, mesmo que não sejam as músicas preferidas ou habitualmente ouvidas. Assim, estudos demonstraram significativa redução nos níveis de estresse após quatro meses de sessões semanais de música clássica (VYGOSTSKY, 2001) Altshuler, um psiquiatra americano, durante suas experiências clínicas verificou que a música cujo caráter e andamento coincidiam com o tempo mental do paciente, influenciava seu humor. Este médico tratava um paciente depressivo com músicas de caráter triste e em tonalidade menor ao passo que, para pacientes http://www.oplanetaalternativo.com/ 34 maníacos, empregava música de tempo “allegro” ou “vivace” devido seu tempo mental se apresentar disperso e rápido. Com o andamento adequado para cada um dos pacientes, o tempo mental era estimulado ao entrar em contato com a música. 6 MÚSICA E EDUCAÇÃO A música tem um grande poder de interação e desde muito cedo adquire grande relevância na vida de uma criança despertando sensações diversas, tornando-se uma das formas de linguagem muito apreciada por facilitar a aprendizagem e instigar a memória das pessoas. Desde o nascimento que o ser humano mostra suas necessidades de comunicação, interagir com a sociedade e meio envolvente. Essa necessidade se inicia no ventre da sua mãe, onde é criada uma relação de afeto, estabelecendo formas de comunicação entre a mãe e a criança, através de simples gestos. Segundo Morris (1975, p. 235): Tudo que é caracteristicamente humano depende da linguagem. O ser humano é, em primeira instância, o animal falante. O discurso representa o mais essencial – mas não o único – papel no desenvolvimento e na preservação da identidade humana e de suas aberrações, assim como faz no desenvolvimento e na manutenção da sociedade e de suas aberrações. A cultura vem acompanhando as gerações e sua importância é incontestável. A necessidade de comunicação entre os povos tornou a música uma marca vital de identificação de cada comunidade e sua cultura. Segundo Oliveira (1999,p. 42), “é a necessidade de comunicação que impulsiona, inicialmente, o desenvolvimento da linguagem”. A música é a forma de expressão artística, tanto no campo popular quanto no erudito. As comunidades podem ser identificadas pela música que escutam. Como podemos definir taxar ou estimar o gosto musical, a cultura, classe social, se a criança não tem opção de aprofundar seu conhecimento nos diversos campos culturais oferecidos pelas artes? A música proporciona uma forma de expressão e contribui para buscar a identidade de um povo, mas, isso não quer dizer que se devem privar o mergulho em outras culturas, pois a igualdade implica no 35 direito de não haver discriminação, sendo assim a escola tem obrigação de oferecer essa cartela de opções a seus alunos. Charles Husband (1998, p. 139) afirma: No reconhecimento de nossa individualidade está a possibilidade de assumirmos a identidade da comunidade que fazemos parte, aquilo que nos une e nos solidariza. Consequentemente, os direitos individuais não podem ser inteiramente usufruídos ou garantidos, na ausência do respeito para com a dignidade, a integridade, a igualdade e a liberdade daquelas comunidades com as quais nos identificamos, incluindo a comunidade étnica a qual pertencemos. Na busca do reconhecimento de quaisquer de nossas comunidades [...] nós devemos reconhecer reciprocamente a legitimidade da existência e da integridade de outras comunidades, inclusive suas diferenças em relação a nós. No Brasil ainda temos pouco incentivo para pesquisas sobre educação musical enquanto em outros países a música já é vista como obrigatória nas escolas. A finalidade da inclusão da música na escola não é tanto transmitir uma técnica particular, mas sim trazer para o aluno opções de expressão e linguagens que o ajudarão a desenvolver o gosto pela cultura e assim futuramente expressar-se através dela. Dessa maneira, é possível afirmar que no Brasil já temos uma trajetória histórica, educativa e cultural que nos permite uma reflexão crítica acerca de perspectivas e caminhos concretos que possam subsidiar a inserção da educação musical nas escolas. Sabendo que as aulas de educação artística, onde a música está inserida, não tem um papel de grande destaque no currículo escolar uma vez que as disciplinas seguem uma regra hierárquica, onde as que são tidas como as mais importantes para o desenvolvimento escolar do aluno tem um enorme destaque e são consideradas como as de mais necessidade para a vida escolar e social do aluno, enquanto as demais disciplinas que estão presentes no currículo são levadas em “banho-maria” nas salas de aula como é o caso da disciplina de Artes. 36 As aulas de educação artística há muito tempo vêm sendo relegadas ao segundo plano, os alunos só se dedicam as atividades artísticas dentro da escola apenas quando o professor ou a instituição tem atividades específicas ou projetos, apresentações, amostras, recitais, encontros, etc. Assim não sendo a arte, ficando sempre em segundo plano. Para as escolas ainda é mais importante que o aluno venha a ler e escrever com maior rapidez para assim acompanhar os planos escolares e suas atividades diárias, facilitando assim o trabalho de acompanhar as fases individuais dos alunos, que quase sempre não são respeitadas, pois estes alunos que não acompanham essa norma (ler e escrever) no tempo determinado pelo sistema educacional são taxados como lentos e necessitados de reforço em suas atividades (HUSBAND, 1998). 6.1 Educação musical A arte é um instrumento para a transformação de seres humanos em sua plenitude, desperta mais atenção em seu processo de sentir, por conseguinte, para o sentir dos outros. A música, como uma das linguagens da arte, como capacidade exclusivamente humana, tem sido compartimentada e compartilhada pelos diversos povos e sociedades através dos tempos. A música é um acontecimento sonoro que ao ser ouvido, diz como foi feito e oferece acepções diversas para a receptividade sensível. A música como expressão transforma emoções, percepções, sentimentos e ideias do ser humano num processo elaborado de organização dos sons, dando- lhes forma. A música sempre esteve presente na vida das pessoas, seja em forma de letras simples desde a infância, ou cantaroladas e até pelos cantos dos pássaros. Os sons podem ser ouvidos de várias formas e cada qual interpreta do seu modo e a sua maneira. 37 Fonte:www. terradamusicablog.com.br A Educação Musical é um valor da construção humana, porque a música é uma linguagem artística organizada e estruturada culturalmente, que, justamente com o código de sua construção, é um fato histórico e social. A principal fonte musical para as crianças em idade escolar é a mesma para todas as classes sociais. O papel do educador musical, neste caso, torna-se de extrema importância, pois estará em suas mãos a condução de um processo de construção de ouvintes críticos e conscientes. Na escolarização, a criança intensifica sua ação avaliativa sobre o que está ao nível de fantasia, o que é real, o que é conveniente, o que é aconselhável, o que é válido, o que é saudável, ou não. O processo de escolarização sendo propício para explorar a imaginação da criança deve ser bem aproveitado, pois, a partir daí o desenvolvimento infantil se orienta para o discurso verbal e lógico e os centros de interesses passam a ser outros (BRITO, 2003) É tarefa da escola estender o campo da experiência musical do aluno, oferecendo-lhe, também, meios que diferenciem os contextos sonoros e suas relações nos períodos históricos-sociais. A música afeta a mente, o corpo e as emoções, desta forma o período de educação musical pode ser crucial na vida da pessoa, configurando-se como agente de desenvolvimento sensorial e emocional, como estímulo mental e como forma de sensibilização. Estes aspectos entrelaçados entre si, fundem a mente, o corpo e as emoções do aluno numa experiência musical importante ao desenvolvimento dos processos cognitivos. 38 A música, enquanto atividade social, cria um espaço onde se dão as relações interpessoais. O espaço social criado para o aluno na escola é, desde o início, um mundo próprio, diferente do círculo familiar, no qual existem grupos maiores que impõem certos padrões de conduta, onde o aluno deverá desenvolver-se integrando- se. Uma das formas que proporcionam está integração é o grupo musical. A educação musical, enquanto processo de desenvolvimento da linguagem musical da pessoa, depende das suas experiências e da maneira que as utiliza. Elas podem permitir a auto expressão e o desenvolvimento da personalidade, oferecendo oportunidade à criação de atitudes sadias sobre si mesmo e sobre os outros e, ainda, provocar identificações de acordo com seu próprio nível emocional. Se a educação musical tomar como princípio a ênfase nos processos cognitivos, vai movimentar o fazer musical do aluno. Como consequência da ação cognitiva, a objetivação do conhecimento permitirá a qualquer pessoa o acesso a pensamentos expostos sobre determinado fenômeno musical. O desenvolvimento da consciência e da inteligência depende do desenvolvimento perceptivo que pode e deve ser trabalhado na área do conhecimento musical fundamentado nas experiências auditivas (BRITO, 2003). A criança não nasce com seu desenvolvimento predeterminado, ao contrário, a exposição à cultura e à língua específica determina a sua forma de perceber o mundo e a si mesmo. Nesse contexto como a música parte da cultura sócio histórica do homem, pode contribuir para o desenvolvimento da criança. A música se faz presente na história da humanidade. Ao nascer a criança entra em contato com o universo sonoro que a cerca. Sua relação com a música pode ocorrer, por exemplo, por intermédio do acalanto da mãe ou aparelhos sonoros, sons da natureza