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Drama das Escrituras - Bartholomew Craig

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Prévia do material em texto

O	drama	das	Escrituras	 é	 um	primor	 de	 erudição	 bíblica,	 integrando	métodos
críticos	sólidos	com	uma	disposição	de	fé	que	está	aberta	à	 revelação	do	Deus
vivo	 por	 meio	 de	 sua	 Palavra.	 Esse	 livro	 envolvente	 torna	 acessível	 aos
estudantes	a	visão	panorâmica	da	Bíblia	que	tem	sido	obscurecida	por	séculos	de
batalhas	confessionais	e	foi	fragmentada	pelo	racionalismo	do	Iluminismo.	[Essa
obra]	 consegue	 tornar	 o	 mundo	 bíblico	 verdadeiramente	 habitável,	 servindo
assim	de	ponte	entre	a	Bíblia	e	a	experiência	cristã.
Mary	E.	Healy,	da	Notre	Dame	Graduate	School	of	Christendom	College
Esse	 panorama	 breve	 e	 ainda	 assim	 penetrante	 e	 cativante	 da	 dramática
mensagem	bíblica	da	Criação,	Queda	e	redenção	—	de	Gênesis	a	Apocalipse	—
se	 tornará	 uma	 leitura	 obrigatória	 não	 somente	 para	 estudantes	 que	 estão
iniciando	 seus	 estudos	 teológicos,	 mas	 para	 todos	 que	 desejam	 ver	 a	 floresta
bíblica	e	não	apenas	suas	árvores.
Max	Turner,	professor	de	Estudos	do	Novo	Testamento
da	London	School	of	Theology
A	 redescoberta	 do	 significado	 da	 história	 é	 uma	 das	 mais	 importantes
descobertas	 recentes	 na	 intepretação	 bíblica.	 Esse	 livro	 magistral	 é	 uma
excelente	 introdução	 para	 o	 estudante	 dedicado,	 combinando	 o	 compromisso
evangélico	 com	 a	 autoridade	 normativa	 das	 Escrituras	 com	 uma	 profunda
compreensão	da	erudição	contemporânea.	Bartholomew	e	Goheen	prestaram	um
excelente	 serviço	 à	 comunidade	 cristã	 ao	 esclarecer	 a	 história	 bíblica	 de	 um
modo	que	pode	ser	vivida	no	mundo	de	hoje.
Trevor	Cooling,	da	University	of	Gloucestershire
Em	O	drama	das	Escrituras,	Bartholomew	e	Goheen	fornecem	uma	intepretação
cristã	da	história	bíblica	de	Gênesis	a	Apocalipse.	Eles	fazem	isso	de	um	modo
que	visa	a	lembrar	os	cristãos	contemporâneos	de	que	eles	também	habitam	essa
mesma	 história	 e	 precisam	 viver	 dentro	 dela,	 dando	 continuidade	 às	 obras	 e
palavras	de	 Jesus	no	mundo	atual.	O	 resultado	é	um	desafio	para	 recuperar	 as
Escrituras	como	uma	base	não	somente	para	a	igreja	e	a	teologia,	mas	também
para	a	própria	vida.
Raymond	 Van	 Leeuwen,	 professor	 de	 Estudos	 Bíblicos	 da	 Eastern
University
Esse	 livro	chegou	no	momento	certo.	Bartholomew	e	Goheen	produziram	uma
apresentação	 breve	 e	 acessível	 de	 toda	 a	 história	 bíblica	 ressaltando	 tanto	 a
unidade	 das	 Escrituras	 quanto	 sua	 profunda	 relevância	 cultural	 atual.	 Para
leitores	 que	 consideram	 a	 Bíblia	 uma	 sucessão	 de	 fragmentos	 devocionais
desconexos	 destinados	 principalmente	 à	 moralidade	 e	 à	 espiritualidade
individuais,	esse	livro	chegará	como	um	choque	salutar,	um	lembrete	de	que	as
Escrituras	 canônicas	 centradas	 em	 Cristo	 constituem	 uma	 Palavra	 de	 Deus
coerente	 que	 desafia	 a	 direção	 religiosa	 fundamental	 da	 civilização	 ocidental.
Baseado	 em	 estudos	 eruditos	 profundos	 e	 amplos,	 mas	 escrito	 de	 modo
envolvente	para	um	grande	gama	de	 leitores,	O	drama	das	Escrituras	promete
ser	 uma	 ferramenta	 indispensável	 para	 muitos	 cristãos	 que	 foram	 despertados
para	o	chamado	de	Deus	a	um	envolvimento	cultural	sério,	em	nome	de	Cristo,
com	um	mundo	pós-cristão	escravo	dos	ídolos	tanto	do	modernismo	quanto	do
pós-modernismo.
Albert	M.	Wolters,	 autor	de	Criação	 restaurada:	base	bíblica	para	uma
cosmovisão	reformada	(Cultura	Cristã)
Dados	Internacionais	de	Catalogação	na	Publicação	(CIP)
Angélica	Ilacqua	CRB-8/7057
Bartholomew,	Craig	G.
O	drama	das	Escrituras	:	encontrando	o	nosso	lugar	na	história	bíblica	/	Craig
G.	Bartholomew	e	Michael	W.	Goheen	;	tradução	de	Daniel	Kroker.	--	São
Paulo	:	Vida	Nova,	2017.
288	p.
ISBN	978-85-275-0754-7
Título	original:	The	drama	of	Scripture:	finding	our	place	in	the	biblical	story
1.	Bíblia	2.	Histórias	bíblicas	I.	Título	II.	Goheen,	Michael	W.	III.	Kroker,
Daniel
17-0522 CDD	230.041
Índices	para	catálogo	sistemático:
1.	Histórias	bíblicas
©2004,	de	Craig	G.	Bartholomew	e	Michael	W.	Goheen
Título	do	original:	The	drama	of	Scripture:	finding	our	place	in	the	biblical
story,
edição	publicada	pela	BAKER	ACADEMIC	(Grand	Rapids,	Michigan,	EUA).
Todos	os	direitos	em	língua	portuguesa	reservados	por
SOCIEDADE	RELIGIOSA	EDIÇÕES	VIDA	NOVA
Rua	Antônio	Carlos	Tacconi,	75,	São	Paulo,	SP,	04810-020
vidanova.com.br	|	vidanova@vidanova.com.br
1.a	edição:	2017
Proibida	a	reprodução	por	quaisquer	meios,
salvo	em	citações	breves,	com	indicação	da	fonte.
Impresso	no	Brasil	/	Printed	in	Brazil
Todas	as	citações	bíblicas	sem	indicação	da	versão	foram	traduzidas	diretamente
da	New	International	Version	(NIV).	As	citações	com	indicação	da	versão	in
loco	foram	traduzidas	diretamente	da	New	Revised	Standard	Version	(NRSV)	e
da	King	James	Version	(KJV)	ou	extraídas	da	Nova	Versão	Internacional	(NVI).
DIREÇÃO	EXECUTIVA
Kenneth	Lee	Davis
GERÊNCIA	EDITORIAL
Fabiano	Silveira	Medeiros
EDIÇÃO	DE	TEXTO
Arthur	Wesley	Dück
REVISÃO	DA	TRADUÇÃO	E
PREPARAÇÃO	DE	TEXTO
http://www.vidanova.com.br
mailto:vidanova@vidanova.com.br
Ingrid	Neufeld	de	Lima
REVISÃO	DE	PROVAS
Ubevaldo	G.	Sampaio
GERÊNCIA	DE	PRODUÇÃO
Sérgio	Siqueira	Moura
DIAGRAMAÇÃO
Claudia	Fatel	Lino
CAPA
Souto	Crescimento	de	Marca
Para	Doug	Loney,
pelo	seu	sacrifício	e	dom	de	escrever.
Para	Al	Wolters,
por	sua	influência	formativa	em	nós	dois.
Para	Gordon	Wenham,
por	seu	fiel	trabalho	acadêmico
nas	Escrituras	ao	longo	de	muitos	anos.
SUMÁRIO
	
Lista	de	figuras
Prefácio
Prólogo:	A	Bíblia	como	uma	grande	história
Ato	1. Deus	estabelece	seu	reino:	Criação
Ato	2. Rebelião	no	reino:	Queda
Ato	3. O	Rei	escolhe	Israel:	redenção	iniciada
Interlúdio. Um	relato	do	reino	aguardando	um	desfecho:	o	períodointertestamentário
Ato	4. A	vinda	do	Rei:	redenção	realizada
Ato	5. Propagando	a	notícia	do	Rei:	a	missão	da	igreja
Ato	6. A	volta	do	Rei:	redenção	concluída
LISTA	DE	FIGURAS
1.	A	raposa	e	o	corvo
2.	A	raposa	e	o	corvo	reconsiderada
3.	Percival	e	Abigail
4.	Planta	baixa	de	uma	catedral
5.	Mitos	pagãos	versus	Gênesis	1
6.	Uma	compreensão	bíblica	da	humanidade
7.	Uma	compreensão	bíblica	da	humanidade	—	os	efeitos	do	pecado
8.	Jornadas	de	Abraão
9.	O	Êxodo
10.	Impérios	Hitita	e	Egípcio,	c.	1500	a.C.
11.	Peregrinações	no	deserto
12.	Estrutura	da	aliança
13.	Conquista	da	terra
14.	Distribuição	da	terra	entre	as	doze	tribos
15.	Ciclos	de	juízo
16.	Impérios	de	Davi	e	Salomão
17.	Reino	dividido
18.	Impérios	mundiais
19.	Impérios	Ptolemaico	e	Selêucida,	c.	240	a.C.
20.	Palestina	na	época	de	Jesus
21.	Asno	em	uma	cruz
22.	Primeira	viagem	missionária	de	Paulo
23.	Segunda	viagem	missionária	de	Paulo
24.	Terceira	viagem	missionária	de	Paulo
25.	Cumprimento	nos	Evangelhos
26.	Expectativa	judaica
PREFÁCIO
Este	livro	originou-se	do	encontro	entre	Mike	Goheen	e	Craig	Bartholomew	em
Birmingham,	Inglaterra,	no	verão	de	2000.	Precisando	de	um	livro-texto	para	a
disciplina	 de	 teologia	 bíblica	 que	 ensinava,	Mike	 abordou	 Craig	 (um	 versado
biblista)	e	pediu	a	ele	que	o	escrevesse.	Craig	propôs	que	os	dois	trabalhassem
juntos	 no	 livro,	 para	mantê-lo	 cônscio	dos	 estudos	bíblicos	 acadêmicos	 (ponto
forte	de	Craig),	bem	como	dos	estudos	missiológicos	e	de	cosmovisão	(foco	de
Mike).	É	sabido	que	se	você	quiser	estragar	uma	amizade,	escreva	um	livro	com
um	amigo!	Temos	a	alegria	de	informar	que	tendo	chegado	ao	fim	desse	projeto
ainda	somos	bons	amigos.	Na	verdade,	o	projeto	foi	mutuamente	enriquecedor.
O	drama	das	Escrituras	 foi	 escrito	 tendo	em	mente	alunos	universitários	de
primeiro	 ano.	 Ele	 foi	 elaborado	 como	 livro-texto	 para	 uma	 disciplina
introdutória	 de	 teologia	 bíblica	 lecionada	 na	Redeemer	University	College	 em
Ancaster,	 Ontário,	 Canadá.	 Como	 universidade	 cristã,	 a	 Redeemer	 está
comprometida	 com	 um	 estudo	 acadêmico	 claramente	 cristão	 moldado	 pela
Bíblia.	Queremos	 que	 nossos	 alunos	 primeiro	 entendam	 a	 verdadeira	 natureza
das	 Escrituras:	 elas	 são	 a	 história	 de	 Deus,	 a	 história	 verdadeira	 do	 mundo.
Somente	 quando	 são	 compreendidas	 peloque	 são,	 elas	 podem	 se	 tornar	 o
fundamento	para	a	vida	humana,	incluindo	a	vida	do	acadêmico.	Nosso	segundo
objetivo	 para	 os	 estudantes	 é	 que	 aprendam	 a	 articular	 uma	 cosmovisão
completamente	bíblica	ao	desenvolver	as	categorias	mais	abrangentes	do	enredo
da	 Bíblia:	 Criação,	 pecado	 e	 redenção.	 Este	 livro	 foi	 escrito	 para	 atingir	 o
primeiro	 objetivo,	 ele	 estabelece	 a	 base	 para	 o	 segundo	 e	 de	 modo	 bastante
natural	conduz	a	ele.
O	 drama	 das	 Escrituras	 conta	 a	 história	 bíblica	 da	 redenção	 como	 uma
narrativa	 unificada	 e	 coerente	 da	 obra	 contínua	 de	Deus	 em	 seu	 reino.	Depois
que	Deus	criou	o	mundo	e	a	rebelião	humana	o	desfigurou,	ele	passou	a	restaurar
o	 que	 havia	 feito:	 “Deus	 não	 deu	 as	 costas	 para	 um	 mundo	 destinado	 à
destruição;	voltou-se	a	ele	com	amor.	Iniciou	a	longa	jornada	de	redenção	para
restaurar	 os	 perdidos	 como	 seu	 povo	 e	 o	 mundo	 como	 seu	 reino”.1	 A	 Bíblia
conta	 a	 história	 da	 jornada	 de	 Deus	 nesse	 longo	 caminho	 de	 redenção.	 É	 um
drama	unificado	e	que	se	desdobra	de	modo	progressivo	a	 respeito	da	ação	de
Deus	 na	 história	 para	 a	 salvação	 do	 mundo	 todo.	 A	 Bíblia	 não	 é	 uma	 mera
junção	 aleatória	 de	 história,	 poesia,	 lições	 morais	 e	 teológicas,	 promessas
confortantes,	 princípios	 de	 orientação	 e	 ordens;	 em	 vez	 disso,	 ela	 é
essencialmente	coerente.	Todas	as	partes	da	Bíblia	—	cada	acontecimento,	livro,
personagem,	 ordem,	 profecia	 e	 poema	 —	 precisam	 ser	 compreendidas	 no
contexto	do	enredo	único.2
Muitos	 de	 nós	 temos	 lido	 a	 Bíblia	 como	 se	 fosse	 apenas	 um	 mosaico	 de
pequenas	partes:	partes	teológicas,	partes	morais,	partes	histórico-críticas,	partes
de	 sermão,	 partes	 devocionais.	 Mas	 quando	 lemos	 a	 Bíblia	 de	 um	 modo	 tão
fragmentado,	 ignoramos	 a	 intenção	 de	 seu	 autor	 divino	 em	moldar	 nossa	 vida
por	meio	da	história	 que	 ela	 conta.	Todas	 as	 comunidades	humanas	 existem	a
partir	de	alguma	história	que	fornece	um	contexto	para	entender	o	significado	da
história	 e	que	molda	e	direciona	 sua	vida.	Quando	permitimos	que	a	Bíblia	 se
torne	fragmentada,	há	o	perigo	de	ela	ser	absorvida	em	qualquer	outra	história
que	esteja	moldando	a	nossa	cultura	e	ela,	assim,	deixará	de	moldar	nossa	vida
como	 deveria.	 A	 idolatria	 distorceu	 a	 história	 cultural	 dominante	 do	 mundo
ocidental.	Se	como	cristãos	permitirmos	que	essa	história	(e	não	a	Bíblia)	seja	a
base	de	nosso	pensamento	e	ação,	então	nossa	vida	manifestará	não	as	verdades
das	 Escrituras,	 mas	 as	mentiras	 de	 uma	 cultura	 idólatra.	 Logo,	 a	 unidade	 das
Escrituras	 não	 é	 uma	 questão	 secundária:	 uma	 Bíblia	 fragmentada	 pode	 na
verdade	 gerar	 adoradores	 de	 ídolos	 teologicamente	 ortodoxos,	 moralmente
íntegros	e	fervorosamente	piedosos!
A	fim	de	que	nossa	vida	seja	moldada	pela	história	das	Escrituras,	precisamos
entender	bem	duas	coisas:	primeiro,	a	história	bíblica	é	uma	unidade	convincente
da	qual	podemos	depender;	 segundo,	cada	um	de	nós	 tem	 lugar	nessa	história.
Este	 livro	é	a	narração	dessa	história.	Convidamos	os	 leitores	a	 torná-la	a	 sua
história,	encontrar	nela	o	seu	 lugar	e	vivenciá-la	como	a	verdadeira	história	de
nosso	mundo.
Há	 três	 ênfases	 importantes	 neste	 livro.	 Em	 primeiro	 lugar,	 enfatizamos	 o
escopo	abrangente	da	obra	redentora	de	Deus	na	Criação.	A	história	bíblica	não
avança	para	a	destruição	do	mundo	e	do	nosso	próprio	“resgate”	ao	céu.	Em	vez
disso,	 ela	 culmina	 na	 restauração	 de	 toda	 a	 Criação	 à	 sua	 virtude	 original.	 O
escopo	 abrangente	 de	 Criação,	 pecado	 e	 redenção	 está	 evidente	 em	 toda	 a
história	bíblica	e	é	central	para	uma	cosmovisão	bíblica	fiel.
Em	segundo	lugar,	enfatizamos	o	próprio	lugar	do	cristão	na	história	bíblica.
Alguns	se	referem	a	quatro	perguntas	fundamentais	em	uma	cosmovisão	bíblica:
“Quem	sou?”,	“Onde	estou?”,	“O	que	está	errado?”,	“Qual	é	a	solução?”.	Tom
(N.	T.)	Wright	acrescenta	uma	quinta	pergunta	 importante:	“Que	horas	são?”.3
Com	 isso,	 nos	 pergunta:	 “Onde	nós	 nos	 encaixamos	 nessa	 história?	Como	 ela
molda	 a	 nossa	 vida	 no	 presente?”.	 Como	 parte	 de	 nossa	 narrativa	 da	 grande
história	da	Bíblia,	exploraremos	as	respostas	bíblicas	a	essas	cinco	perguntas.
Em	terceiro	lugar,	ressaltamos	a	centralidade	da	missão	na	história	bíblica.4	A
Bíblia	narra	a	missão	de	Deus	de	restaurar	a	criação.	A	missão	de	Israel	decorre
disso:	 Deus	 escolheu	 um	 povo	 para	 concretizar	 novamente	 os	 propósitos
criacionais	que	Deus	tinha	para	a	humanidade	e,	assim,	ser	luz	para	as	nações,	e
o	 Antigo	 Testamento	 narra	 a	 história	 da	 resposta	 de	 Israel	 ao	 seu	 chamado
divino.	Jesus	entra	em	cena	com	a	missão	de	assumir	para	si	próprio	a	vocação
missionária	 de	 Israel.	 Ele	 encarna	 o	 propósito	 de	 Deus	 para	 a	 humanidade	 e
conquista	 a	 vitória	 sobre	 o	 pecado,	 abrindo	 o	 caminho	 para	 um	 novo	mundo.
Quando	seu	ministério	terreno	termina,	ele	deixa	a	sua	igreja	com	o	mandato	de
continuar	 nessa	 mesma	 missão.	 Em	 nossa	 própria	 época,	 localizada	 entre	 o
Pentecostes	 e	 a	 volta	 de	 Jesus,	 nossa	 tarefa	 central	 como	 povo	 de	 Deus	 é
testemunhar	acerca	do	governo	de	Jesus	Cristo	sobre	toda	a	vida.
Além	disso,	apropriamo-nos	da	útil	metáfora	de	Tom	Wright,	a	qual	retrata	a
Bíblia	 como	 um	 drama.5	 Mas	 enquanto	 Wright	 fala	 de	 cinco	 atos	 (Criação,
pecado,	 Israel,	 Cristo,	 igreja),	 nós	 contamos	 a	 história	 em	 seis	 atos.
Acrescentamos	a	vinda	da	nova	criação	como	elemento	final	e	singular	do	drama
bíblico.	 Também	 acrescentamos	 um	 prólogo.	 Esse	 prólogo	 trata	 de	 modo
preliminar	do	que	significa	dizer	que	a	vida	humana	é	moldada	por	uma	história.
Se	 você	 está	 usando	 este	 livro	 para	 uma	 disciplina	 ou	 estudo	 bíblico,	 você
pode	acessar	recursos	em	língua	inglesa	em	nosso	site	www.biblicaltheology.ca
que	ajudará	no	uso	deste	livro:	uma	ementa	da	disciplina,	slides	de	PowerPoint,
http://www.biblicaltheology.ca
um	 plano	 de	 leitura	 para	 uma	 disciplina	 de	 treze	 semanas,	 leituras
complementares	e	muito	mais.
Projetos	 com	 essa	 abrangência	 e	 tipo,	 além	 dos	 autores,	 sempre	 envolvem
contribuições	de	muitas	pessoas,	e	há	várias	a	quem	expressamos	aqui	a	nossa
gratidão.	Em	primeiro	 lugar,	 agradecemos	 aos	muitos	 estudantes	 da	Redeemer
University	 College	 que	 leram	 o	 manuscrito	 em	 vários	 estágios	 e	 ofereceram
comentários	pertinentes,	especialmente	Elizabeth	Buist,	Elizabeth	Klapwyk,	Ian
Van	 Leeuwen	 e	 Dylon	 Nofziger.	 Apreciamos	 a	 ajuda	 que	 Dawn	 Berkelaar
forneceu	em	uma	pequena	seção	do	livro.	Para	os	diagramas	e	desenhos	no	livro,
somos	 gratos	 a	 Ben	Goheen	 pelo	 talento	 artístico.	 Fred	Hughes,	 ex-diretor	 da
School	of	Theology	and	Religion	na	University	of	Gloucestershire,	tem	apoiado
este	 projeto	 desde	 o	 início,	 leu	 todo	 o	 manuscrito	 de	 uma	 versão	 anterior	 e
ofereceu	 muitas	 sugestões	 úteis.	 Ele	 também	 proporcionou	 a	 oportunidade	 de
Mike	e	Craig	trabalharem	juntos,	convidando	Mike	como	acadêmico	visitante	no
International	Centre	for	Biblical	Interpretation	da	University	of	Gloucestershire
durante	o	verão	de	2002,	quando	escreveu	a	maior	parte	do	manuscrito.	Também
somos	gratos	pelo	apoio	da	Redeemer	University	College,	que	desde	o	início	do
projeto	ofereceu	apoio	e	assistência	de	muitos	 tipos.	Estamos	endividados	para
com	nossos	amigos	e	colegas	Gene	Haas	e	Al	Wolters	no	Religion	and	Theology
Department	 da	 Redeemer	 e	Wayne	Kobes	 no	 Theology	Department	 do	Dordt
College,	 Sioux	 Center,	 Iowa.	 Tanto	 Gene	 quanto	 Wayne	 também	 lecionam
disciplinas	de	teologia	bíblica	no	primeiro	ano	do	curso	e	deram	sugestões	úteis.
Al	 foi	 um	 mentor	 dos	 dois	 autores	 e	 apreciamos	 grandemente	 o	 seu	 sábio
conselho	e	incansável	apoio.
No	Reino	Unido,	Alan	Dyer	e	Mark	Birchall	sempre	apoiaram	este	projeto	e
fizeram	 muitos	 comentários	 úteis	 em	 suas	 repetidas	 leituras	 do	 manuscrito.
Infelizmente,	 mais	 ou	 menos	 na	 época	 em	 queentregamos	 o	 manuscrito	 ao
editor,	Mark	partiu	para	estar	com	o	Senhor.	Sentiremos	imensamente	sua	falta.
Na	 África	 do	 Sul,	 Wayne	 Barkhuizen	 fez	 comentários	 preciosos	 sobre	 o
manuscrito.
Jim	Kinney,	gerente	da	Baker	Academic,	foi	muito	solícito	e	encorajador.	Ele
e	alguns	de	seus	colegas	leram	um	esboço	inicial	e	ofereceram	crítica	e	conselho
perspicazes	 que	 moldaram	 significativamente	 o	 manuscrito	 final.	 Sem	 dúvida
alguma,	aquele	com	quem	estamos	mais	em	dívida	é	Doug	Loney,	nosso	colega
na	Redeemer,	deão	de	artes	e	humanidades	e	membro	do	departamento	de	língua
inglesa.	Doug	 forneceu	a	este	projeto	muito	 tempo	e	habilidade	como	escritor,
pegando	 nosso	 manuscrito	 em	 suas	 duas	 versões	 e	 o	 transformando	 no	 que
acreditamos	ser	um	texto	empolgante	e	coerente.	Também	agradecemos	à	esposa
de	 Doug,	 Karey,	 e	 à	 esposa	 de	 Mike,	 Marnie,	 por	 sua	 paciência	 e	 apoio.
Dedicamos	este	livro	a	nossos	colegas	na	Redeemer,	Doug	Loney	e	Al	Wolters,
e	 a	Gordon	Wenham	 da	University	 of	Gloucestershire,	 cujo	 empenho	 fiel	 em
estudos	do	Antigo	Testamento	durante	muitos	 anos	 tem	sido	uma	bênção	para
nós	dois.
1	 Contemporary	 Testimony	 Committee	 of	 the	 Christian	 Reformed	 Church,
Our	 world	 belongs	 to	 God:	 a	 contemporary	 testimony	 (Grand	 Rapids:	 CRC,
1987),	parágrafo	19.
2	Estamos	cientes	dos	vários	argumentos	que	estudiosos	da	Bíblia	levantaram
contra	a	unidade	das	Escrituras.	Tratamos	de	algumas	dessas	preocupações	e	de
várias	questões	hermenêuticas	de	modo	mais	acadêmico	em	“Story	and	biblical
theology”,	 in:	Craig	Bartholomew	et	al.,	orgs.,	Out	of	Egypt:	biblical	 theology
and	biblical	interpretation	(Grand	Rapids:	Zondervan,	2004).
3	N.	T.	Wright,	Jesus	and	the	victory	of	God	(London:	SPCK,	1996),	p.	443,
467-72.
4	 Para	 duas	 boas	 discussões	 a	 respeito	 de	 uma	 ênfase	 emergente	 na
centralidade	da	missão	para	a	história	bíblica,	veja	Richard	Bauckham,	Bible	and
mission:	Christian	witness	in	a	postmodern	world	(Grand	Rapids:	Baker,	2003);
e	 Christopher	 Wright,	 “Mission	 as	 a	 matrix	 for	 hermeneutics	 and	 biblical
theology”,	in:	Bartholomew,	Out	of	Egypt.
5	N.	T.	Wright,	“How	can	the	Bible	be	authoritative?”,	Vox	Evangelica,	n.	21
(1991):	7-32;	idem,	The	New	Testament	and	the	people	of	God	(London:	SPCK,
1992),	p.	139-43.
PRÓLOGO
A	Bíblia	como	uma	grande	história
Observe	atentamente	esta	figura.	O	que	você	acha	que	está	acontecendo?
Figura	1:	A	raposa	e	o	corvo
Se	 você	 tiver	 uma	 imaginação	 fértil,	 será	 capaz	 de	 inventar	 alguma	história
sobre	 a	 raposa	 e	 o	 corvo,	 ou	 até	mais	 de	 uma	 história.	Mas	 todos	 os	 leitores
criteriosos	 sabem	 que,	 a	 não	 ser	 que	 se	 possa	 situar	 o	 evento	 esboçado	 nessa
figura	 no	 contexto	 de	 sua	 história	 de	 origem,	 é	 difícil	 para	 qualquer	 leitor	 ter
certeza	do	significado	que	o	autor	(ou	artista)	tem	em	mente.
Agora	observe	a	imagem	novamente,	com	a	inclusão	de	mais	informações:
Figura	2:	A	raposa	e	o	corvo	reconsiderada
Você	pode	entender	o	que	acontece	entre	essa	raposa	e	esse	corvo	somente	se
tiver	algum	conhecimento	de	toda	a	história	que	envolve	esse	episódio.	Quando
é	revelado	que	há	uma	fome	na	 floresta	e	que	animais	espertos	como	a	 raposa
usam	 todos	 os	 tipos	 de	 estratégias	 desonestas	 para	 conseguir	 comida,	 você
começa	a	perceber	por	que	a	 raposa	poderia	estar	 reduzindo	o	corvo.	Primeiro
você	 precisa	 saber	 algo	 sobre	 o	 início,	 o	 meio	 e	 o	 fim	 da	 história.	 Somente
depois	disso,	poderá	entender	qualquer	um	dos	episódios	dela.	Isso	não	se	aplica
somente	 a	 histórias	 fictícias	 com	 essa,	 mas	 também	 à	 vida:	 precisamos	 de
alguma	 percepção	 da	 “grande	 história”	 do	 mundo	 antes	 do	 significado	 de
qualquer	acontecimento	em	nossa	vida	fazer	sentido.
Isso	nos	leva	a	mais	um	exemplo,	uma	história	que	talvez	esteja	mais	próxima
de	 nossa	 própria	 experiência	 de	 vida	 uma	 fábula	 sobre	 raposas	 sedutoras	 e
corvos	fabricados:
Figura	3:	Percival	e	Abigail
Percival	e	Abigai	estão	sentados	à	mesma	mesa	durante	um	encontro	após	o
culto	para	recém-chegados	na	igreja.	Enquanto	tomam	café	e	comem	sanduíches,
começam	a	falar	sobre	várias	coisas.	Chega	um	determinado	momento	em	que
os	outros	 à	 sua	mesa	 já	 haviam	 saído	 e	 alguém	 intencionalmente	 remove	 suas
xícaras	de	café	e	começa	a	empilhar	cadeiras.	Contudo,	Percival	e	Abigail	mal
notam	essas	coisas.	Cada	um	está	começando	a	pensar	que	poderia	valer	a	pena
conhecer	essa	outra	pessoa	um	pouquinho	melhor.	Assim,	eles	combinam	de	se
encontrarem	novamente,	em	um	café	tranquilo,	para	um	doce	e,	claro,	mais	café.
Mas	 a	 verdadeira	 razão	 para	 o	 encontro	 ali	 é	 que	 é	 um	 lugar	 muito	 mais
adequado	para	uma	conversa	particular	do	que	aquele	 salão	da	 igreja	 cheio	de
pessoas.	 (Em	 respeito	 à	 privacidade	 desse	 jovem	 casal,	 decidimos	 não	 incluir
mais	uma	ilustração	aqui.)
Ao	retomarem	a	conversa,	Abigail	e	Percival	aos	poucos	se	dão	conta	de	que
estão	 compartilhando	 detalhes	 da	 vida	 particular	 de	 cada	 um:	 eles	 começam	a
contar	 as	histórias	de	 sua	vida.	De	que	ele	 é	o	mais	novo	de	quatro	e	o	único
menino,	extremamente	mimado	por	três	irmãs	corujas.	Que	ela	nasceu	em	Nova
Deli,	enquanto	seus	pais	estavam	servindo	no	consulado	e	passou	seus	anos	de
ensino	médio	 em	 quatro	 países	 diferentes.	 Aos	 poucos,	 eles	 lançam	 as	 linhas
gerais	 do	 enredo	 e	 começam	 a	 preencher	 as	 lacunas:	 Percival	 mal	 se	 afastou
mais	de	300	quilômetros	da	fazenda	da	família	(embora	tenha	muita	vontade	de
viajar).	 Abigail	 fala	 quatro	 idiomas	 e	 pode	 entender	 mais	 alguns.	 Durante	 a
infância,	ele	passava	os	feriados	com	uma	multidão	de	primos	na	casa	de	campo
de	seus	avós	em	Muskoka.	Uma	vez	ela	celebrou	a	virada	do	ano	mergulhando
em	Mauri	Bay	(África	do	Sul).	E	assim	prosseguem,	percorrendo	as	memórias
das	 crenças	 e	 medos	 da	 infância,	 primeiro	 emprego	 de	 verão,	 planos	 para	 a
formação	profissional	e	expectativas	para	o	futuro.
A	única	 resposta	apropriada	a	“Conte-me	sobre	você”	é	contar	uma	história
ou	uma	série	de	histórias.	Ao	compartilhar	essas	narrativas	pessoais,	passamos	a
conhecer	uns	aos	outros.	Não	queremos	entender	somente	o	que	a	outra	pessoa	é
agora,	 neste	momento,	 mas	 também	 como	 ela	 veio	 a	 ser	 assim.	 Quais	 são	 as
experiências,	 ideias	 e	 pessoas	 que	moldaram	 sua	 vida?	Suas	 histórias	 pessoais
fornecem	o	contexto	e	explicam	muito	a	respeito	de	sua	vida.	Contudo,	à	medida
que	 continuam	 a	 conversa,	 elas	 poderiam	 perguntar:	 para	 dar	 sentido	 à	 nossa
vida,	 devemos	 nos	 basear	 apenas	 em	 nossas	 histórias	 pessoais?	 Ou	 há	 uma
história	 verdadeira	 que	 é	 maior	 do	 que	 nós	 dois,	 por	 meio	 da	 qual	 podemos
entender	o	mundo	e	encontrar	significado	para	a	nossa	vida?	Será	que	as	nossas
histórias	pessoais	—	quer	separadas,	quer	juntas	—	fazem	parte	de	uma	história
mais	abrangente?
A	fim	de	entender	nosso	mundo,	dar	sentido	à	nossa	vida	e	tomar	as	decisões
mais	 importantes	 sobre	 como	 devemos	 viver,	 dependemos	 de	 alguma	 história.
Na	 verdade,	 entre	 alguns	 filósofos,	 teólogos	 e	 estudiosos	 da	 Bíblia,	 há	 um
reconhecimento	 crescente	 de	que	 “uma	história	 […]	 é	 […]	o	melhor	modo	de
falar	 sobre	 como	 o	 mundo	 realmente	 é”.1	 Assim	 como	 é	 difícil	 entender	 a
primeira	figura	sem	um	enredo,	também	o	é	nos	detalhes	isolados	de	nossa	vida.
Percival	precisa	saber	algo	sobre	o	contexto	da	vida	de	Abigail	a	fim	de	entender
o	 que	 é	 importante	 para	 ela.	 Do	 mesmo	 modo,	 precisamos	 de	 uma	 grande
história	como	pano	de	fundo	se	quisermos	entender	a	nós	mesmos	e	o	mundo	em
que	 nos	 encontramos.	 Experiências	 individuais	 fazem	 sentido	 e	 adquirem
significado	 somente	 se	 vistas	 no	 contexto	 ou	 na	 estrutura	 de	 uma	 história	 que
acreditamos	ser	a	verdadeira	história	do	mundo:	cada	episódio	das	histórias	de
nossa	vida	encontra	seu	lugar	ali.
Isso	não	significa	que	toda	história	é	tão	importante	quanto	qualquer	outra.	Há
uma	grande	variedade	de	histórias.Algumas	meramente	nos	entretêm;	outras	nos
ensinam	o	que	é	certo	e	bom	ou	nos	advertem	de	perigo	e	do	mal.	Mas	também
há	 histórias	 que	 são	 básicas	 ou	 fundacionais:	 elas	 nos	 fornecem	 uma
compreensão	 de	 todo	 o	 nosso	 mundo	 e	 do	 nosso	 lugar	 nele.	 Essas	 histórias
abrangentes	 nos	 proporcionam	 o	 significado	 da	 história	 universal.	 Elas	 foram
chamadas	 de	 “grandes	 narrativas”,	 “grandes	 histórias”	 ou	 “metanarrativas”.
Cada	 um	 de	 nós	 (quer	 estejamos	 conscientes	 disso	 ou	 não)	 tem	 uma.	 Para
estruturar	 e	 dar	 forma	 e	 significado	 à	 nossa	 experiência	 de	 vida,	 todos
dependemos	de	uma	história	em	particular.
Lesslie	Newbigin	trabalhou	como	missionário	na	Índia	durante	muitos	anos	e
escreveu	 extensamente	 sobre	 a	 importância	 dessas	 grandes	 narrativas	 para
entender	nossa	vida.	Ele	traça	a	conexão	entre	história	e	compreensão:	“O	modo
de	compreendermos	a	vida	humana	depende	de	que	concepção	temos	da	história
humana.	 Qual	 é	 a	 história	 verdadeira	 da	 qual	 a	 minha	 vida	 faz	 parte?”.2	 O
filósofo	Alasdair	MacIntyre	 concorda,	 afirmando	 que	 nossas	 decisões	 que	 dão
rumo	 à	 vida	 são	moldadas	 e	 reguladas	 pela	 nossa	 percepção	 de	 como	 elas	 se
encaixam	nesse	contexto	maior:	“Somente	posso	 responder	a	pergunta:	 ‘O	que
devo	fazer?’	se	puder	responder	à	pergunta	anterior:	‘De	que	história	creio	que
faço	 parte?’”.3	 Esses	 dois	 pensadores	 presumem	 corretamente	 que	 há	mais	 de
uma	história	básica	competindo	em	nossa	cultura	por	 aceitação	e	por	uso	para
dar	sentido	atualmente	à	nossa	vida.
Qual	 história	 uma	 pessoa	 vive	 faz	 uma	 enorme	 diferença	 em	 como	 ela
interpreta	os	acontecimentos	na	vida.	Tomemos	o	divórcio	como	exemplo.	Até
quando	o	divórcio	 é	necessário	 e	 a	 coisa	 certa	para	uma	pessoa	 fazer,	 cristãos
sempre	 verão	 o	 divórcio	 como	muito	 longe	 do	 ideal	 que	Deus	 tem	 em	mente
para	um	homem	e	uma	mulher	unidos	no	casamento.	Logo,	ele	é	uma	tragédia.
O	 divórcio	 não	 se	 encaixa	 na	 história	 bíblica	 de	 como	 a	 nossa	 vida	 deve	 ser
vivida	uns	com	os	outros	e	diante	de	Deus.	Mas	essa	perspectiva	é	radicalmente
diferente	 da	 que	 muitas	 pessoas	 possuem	 em	 nossa	 cultura.	 Uma	 vez	 que	 o
individualismo	 e	 o	 consumismo	 são	 elementos	 centrais	 na	 história	 cultural
ocidental,	muitas	 vezes	 o	 divórcio	 é	 apresentado	 como	 algo	 bastante	 positivo:
nenhuma	 tragédia,	 antes	 um	 passo	 corajoso	 de	 crescimento	 pessoal.	 Podemos
perceber	que	essas	duas	visões	de	divórcio	não	procedem	de	uma	discordância
trivial.	 Suas	 raízes	 vão	 ao	 fundamento	 das	 respectivas	 histórias	 que	 deram	 às
diferentes	visões	a	sua	forma	e	essência.
Enquanto	Newbigin	vivia	e	trabalhava	entre	os	hindus	e	muçulmanos	da	Índia,
ele	 se	 debatia	 com	 o	 significado	 das	 histórias	 fundamentais	 compartilhadas
nessas	culturas	e	como	essas	histórias	poderiam	se	relacionar	ao	cristianismo.	E,
de	 modo	 parecido,	 quando	 se	 aposentou	 e	 voltou	 à	 Inglaterra,	 Newbigin	 se
esforçou	sinceramente	para	compreender	justamente	qual	história	de	vida	estava
refletida	 em	 sua	 própria	 cultura	 (ocidental	 e	 europeia)	 e	 como	 ela	 também
poderia	 se	 relacionar	 à	 outra	 história	 abrangente	 com	 a	 qual	 estava
comprometido:	 a	 Bíblia.	 O	 que	 ele	 passou	 a	 perceber	 é	 que	 a	 história	 básica
pressuposta	 em	 grande	 parte	 da	 cultura	 ocidental	moderna	 é	 humanista	 e	 tem
suas	raízes	no	Iluminismo	europeu	dos	séculos	17	e	18.	A	crença	de	que	a	razão
humana	 é	 a	 medida	 de	 todas	 as	 coisas	 e	 de	 que	 “conhecimento	 é	 poder”4
permeava	a	sociedade	europeia.	As	pessoas	acreditavam	que	somente	por	meio
da	ciência	e	da	tecnologia,	e	totalmente	à	parte	de	Deus,	a	humanidade	poderia
construir	um	mundo	perfeito.
Newbigin	 sustenta	 categoricamente	 que	 essa	 história	 abrangente	 é	 inútil	 e
falsa.	Visto	que	ela	se	tornou	o	fundamento	para	a	vida	humana,	ela	também	é
perigosa.	 Ela	 é	 uma	 história	 falsa,	 em	 absoluta	 contradição	 com	 a	 verdade	 da
história	bíblica.	Desde	o	Iluminismo,	o	pensamento	e	a	vida	humanos	no	mundo
ocidental	 têm	 se	 adequado	 a	 essa	 falsa	 visão,	muitas	 vezes	 produzindo	 efeitos
desastrosos.	Mas	como	Alasdair	MacIntyre	insiste	que	reconheçamos,	temos	sim
uma	 escolha.	 A	 cosmovisão	 ocidental	 moderna	 não	 é	 a	 única	 grande	 história
desse	tipo	que	está	disponível.	Há	um	outro	modo	melhor	e	mais	verdadeiro	de
ver	o	nosso	mundo.
Ser	 humano	 significa	 adotar	 alguma	 história	 básica	 desse	 tipo	 por	meio	 da
qual	entendemos	nosso	mundo	e	traçamos	nosso	caminho	nele.	Isso	não	significa
que	indivíduos	estão	necessariamente	conscientes	da	história	em	que	se	baseia	a
vida	deles	ou	do	efeito	moldador	que	uma	história	desse	tipo	tem	tido	sobre	seus
pensamentos	 e	 ações.5	 Por	 exemplo,	 muitos	 estudantes	 de	 faculdade	 e
universidade	 de	 nossa	 época	 estão	 levando	 uma	 vida	 sexualmente	 promíscua.
Eles	 podem	 viver	 assim	 sem	 pensar	muito	 sobre	por	que	 fazem	 isso.	 Logo,	 é
muito	pouco	provável	que	chegarão	a	ver	que	a	história	em	que	essa	conduta	é
aprovada	 se	deve	em	grande	parte	a	 Jean-Jacques	Rousseau,	Sigmund	Freud	e
outros	pensadores	desse	tipo	de	séculos	passados.	Suas	visões	do	casamento	e	da
pessoa	humana	subjazem	as	mudanças	de	atitude	em	relação	à	sexualidade	que
ocorreu	na	década	de	1960	e	daí	em	diante.6
Todos	têm	uma	história	básica.	Como	devemos	relacionar	a	história	bíblica	e
a	história	humanista	da	cultura	ocidental?	Em	suas	diferentes	versões,	a	história
ocidental	 moderna	 tem	 sido	 tão	 dominante	 e	 asseverado	 tão	 fortemente	 seu
direito	de	ser	a	história	que	muitas	vezes	se	pressupõe	que	devemos	usá-la	para
entender	a	grande	narrativa	das	Escrituras.	Mas	o	cristianismo	bíblico	afirma	que
somente	a	Bíblia	conta	a	verdadeira	história	de	nosso	mundo.
Newbigin	identifica	corretamente	quanto	está	em	jogo	aqui:	“A	pergunta	é	se
a	fé	que	encontra	o	seu	foco	em	Jesus	é	a	fé	com	a	qual	buscamos	entender	toda
a	 história	 ou	 se	 limitamos	 essa	 fé	 a	 um	 mundo	 particular	 de	 religião	 e
entregamos	 a	 história	 pública	 do	 mundo	 a	 outros	 princípios	 de	 explicação”.7
Será	que	de	fato	faz	uma	diferença	se	usamos	a	história	ocidental	moderna	como
base	para	entender	a	história	bíblica	ou	se	tentamos	entender	a	história	ocidental
a	 partir	 da	 história	 bíblica?	 Faz	 uma	 profunda	 diferença!	 Construção	 alguma
pode	 ter	 mais	 de	 um	 fundamento.	 Não	 podemos	 ter	 mais	 de	 uma	 história
fundamental	como	base	do	que	pensamos	e	de	como	agimos.	Uma	vez	que	você
torna	 uma	 história	 parte	 de	 outra,	 a	 natureza	 da	 primeira	 como	 “básica”	 é
destruída.	 O	 ponto	 fundamental	 de	 uma	 história	 básica	 ou	 dessas	 grandes
narrativas	 é	 dar	 sentido	 à	 vida	 como	 um	 todo	 e	 essas	 grandes	 narrativas	 não
podem	ser	misturadas	facilmente	umas	com	as	outras.	Histórias	básicas	são,	em
princípio,	normativas	—	elas	definem	pontos	de	partida,	modos	de	ver	o	que	é
verdade	—	e	elas	são	abrangentes,	uma	vez	que	fornecem	um	relato	do	 todo.8
Como	 N.	 T.	Wright	 afirma:	 “O	 ponto	 fundamental	 do	 cristianismo	 é	 que	 ele
oferece	uma	história	que	é	a	história	de	todo	o	mundo.	Ele	é	verdade	pública”.9
Pense,	por	exemplo,	sobre	a	pergunta	a	respeito	do	que	significa	ser	humano.
Essa	é	uma	questão	realmente	 importante,	de	que	 todas	as	histórias	 tratam.	No
século	 21,	muitos	 de	 nós	 lidam	 com	questões	 a	 respeito	 de	 quem	 somos	 e	 há
muito	 em	 jogo	 em	 chegar	 à	 resposta	 correta.	 Repetidamente	 ouvimos	 uma
resposta	a	essa	pergunta	de	muitas	direções	diferentes	e	em	muitas	vozes:	“Você
não	é	nada	mais	do	que	um	produto	aleatório	do	 tempo	e	do	acaso”.	Mas	essa
resposta	 provém	 de	 uma	 história	 que	 nega	 a	 própria	 existência	 de	 Deus.	 A
resposta	da	história	bíblica	é	completa	e	radicalmente	diferente,	como	veremos.
Da	Bíblia	aprendemos	que	somos	obra	de	Deus	e	o	ápice	de	sua	criação,	sendo
feitos	à	sua	imagem.	À	medida	que	buscamos	a	verdade	acerca	de	quem	somos,
precisamos	 decidir	 qualdessas	 histórias	 básicas	 é	 verdadeira.	 Claramente	 as
duas	 não	 podem	 ser	 verdadeiras.	 Elas	 fornecem	 respostas	 verdadeiramente
diferentes	às	perguntas	mais	 importantes	que	temos	e	precisamos	escolher	uma
delas.
Acreditamos	que	N.	T.	Wright	está	correto	em	afirmar	que	a	Bíblia	apresenta
uma	 história	 que	 é	a	 verdadeira	 história	 de	 todo	 o	mundo.	 Portanto,	 a	 fé	 em
Jesus	 deve	 ser	 o	 meio	 pelo	 qual	 um	 cristão	 tenta	 entender	 toda	 a	 vida	 e	 a
totalidade	da	história.	A	 razão	disso	não	é	 somente	pelo	 fato	de	que	a	história
bíblica	 é	 abrangente	 ou	 por	 ser	 a	 história	 que	 herdamos	 ou	 ainda	 por	 ser	 a
história	que	 funciona	para	nós.	Precisamos	 levar	 a	história	 cristã	 a	 sério	desse
modo	por	que	é	verdade	 e	 nos	 conta	 de	modo	 verdadeiro	 a	 história	 de	 toda	 a
história,	começando	com	a	Criação	e	terminando	com	a	Nova	Criação.	É	assim
que	o	mundo	é	e	os	cristãos	precisam	assegurar	que	a	história	da	Bíblia	é	a	base
de	 sua	 vida.	 Mas	 o	 que	 exatamente	 é	 a	 história	 bíblica	 e	 como	 é	 que	 a
compreendemos?
Há	várias	maneiras	de	deparar-se	com	a	história	cristã.	A	liturgia	eclesiástica
(quer	 do	 tipo	 carismático	 livre	 ou	 do	 tipo	 mais	 tradicional)	 nos	 lembra
constantemente	 da	 história	 que	 deve	moldar	 a	 nossa	 vida.	Hinos	 e	 canções	 de
louvor	a	celebram.	Os	credos	a	recitam	quando	confessamos	nossa	fé	em	Deus
Pai,	Filho	e	Espírito	Santo.	Sermões	explicam	sua	 importância	para	nossa	vida
semanalmente.	 Mas	 a	 fonte	 imbuída	 de	 autoridade	 para	 a	 história	 cristã	 é	 a
própria	Bíblia.
O	cristianismo	ortodoxo	sempre	afirmou	que	as	Escrituras	são	a	norma	para	a
fé	 e	 para	 a	 vida,	 a	 grande	 regra	 e	 fonte	 de	 orientação.	 Todas	 as	 grandes
confissões	 cristãs	 certamente	 dizem	 isso.	 No	 entanto	 os	 cristãos	 nem	 sempre
concordam	 sobre	 como	 as	 Escrituras	 funcionam	 para	 dirigir	 a	 fé	 e	 a	 vida.	Às
vezes,	 os	 cristãos	 trataram	 a	 Bíblia	 como	 se	 fosse	 uma	 lista	 sistemática	 de
proposições	como	as	Confissões	de	Westminster	ou	Belga.	Mas,	embora	a	Bíblia
seja	 a	 fonte	 suprema	 desses	 importantes	 documentos,	 ela	 claramente	 não	 está
escrita	 do	 mesmo	 modo,	 como	 uma	 série	 de	 verdades	 proposicionais,	 e	 nem
possui	 o	 mesmo	 propósito.	 No	 decorrer	 das	 últimas	 décadas,	 um	 dos
desenvolvimentos	mais	empolgantes	nos	estudos	acadêmicos	da	Bíblia	tem	sido
o	reconhecimento	crescente	entre	alguns	estudiosos	de	que	a	Bíblia	tem	a	forma
de	uma	história,	de	que	é	“uma	narrativa	imensa,	heterogênea	e	abrangente”.10
Ela	funciona	como	a	Palavra	de	Deus	imbuída	de	autoridade	para	nós	quando	se
torna	 a	 única	 história	 básica	 por	 meio	 da	 qual	 entendemos	 nossa	 própria
experiência	 e	 pensamento	 e	 o	 fundamento	 sobre	 o	 qual	 baseamos	 as	 nossas
decisões	e	ações.
Em	outras	palavras,	a	Bíblia	nos	fornece	a	história	básica	de	que	precisamos	a
fim	de	entender	o	nosso	mundo	e	viver	nele	como	povo	de	Deus.	Sabemos	que
uma	coisa	é	confessar	a	Bíblia	como	a	Palavra	de	Deus,	mas	muitas	vezes	outra
bem	diferente	é	saber	como	interpretar	a	Bíblia	de	um	modo	que	permita	que	ela
influencie	a	totalidade	de	nossa	vida.	Facilmente	pode	haver	uma	lacuna	entre	o
que	dizemos	crer	e	como	vivemos.	Se	Deus	deliberadamente	nos	deu	a	Bíblia	na
forma	 de	 uma	 história,	 então	 somente	 à	 medida	 que	 prestarmos	 atenção	 nela
como	 história	 e	 nos	 apropriarmos	 ativamente	 dela	 como	 a	 nossa	 história
sentiremos	o	pleno	impacto	de	sua	autoridade	e	iluminação	em	nossa	vida.
Há,	 desse	 modo,	 muito	 em	 jogo	 em	 como	 entendemos	 que	 a	 Bíblia	 está
falando	a	nós.	Se	a	vermos	como	uma	única	história	se	desenrolando,	ela	pode
ser	tremendamente	empolgante.	Essa	história	nos	convida	—	nos	compele	—	a
nos	envolver.	Pense	novamente	em	Abigail	e	Percival,	dois	 jovens	que	contam
um	ao	outro	suas	narrativas	pessoais	para	averiguar	se	poderia	haver	lugar	para
cada	um	deles	na	história	de	vida	do	outro.	Se	tudo	der	certo	para	esses	dois,	eles
descobrirão	 uma	 história	 maior	 e	 mais	 básica.	 Suas	 vidas	 como	 indivíduos
adquirirão	novo	significado	como	partes	de	uma	vida	inteira	que	vivem	juntos	na
história	de	Deus.	À	medida	que	nos	aprofundarmos	na	história	da	Bíblia,	Deus
será	revelado	a	nós.	Também	nos	veremos	chamados	a	fazer	parte	na	missão	de
Deus	e	de	seus	propósitos	com	a	criação.	Neste	livro,	nosso	propósito	é	analisar
a	 Bíblia	 atentamente	 como	 uma	 história	 que	 se	 desenrola	 e	 ver	 o	 que	 uma
interpretação	desse	tipo	produz.	Afinal,	a	Bíblia	afirma	não	ser	nada	menos	que
a	própria	história	verdadeira	de	Deus	acerca	de	nosso	mundo	e	nos	chama	a	nos
apropriarmos	pessoalmente	dessa	história.
A	Bíblia	é	o	desdobramento	de	uma	única	história?
Talvez	 você	 tenha	 ouvido	 a	 antiga	 fábula	 hindu	 em	 que	 seis	 homens	 cegos
encontram	um	elefante	pela	primeira	vez.	Cada	um	por	 sua	vez	o	descreve	de
modo	distinto	aos	outros:	o	animal	é	como	um	muro,	uma	cobra,	uma	lança,	um
ventilador,	uma	corda	ou	uma	árvore.	Embora	haja	um	só	elefante,	cada	homem
tem	 uma	 percepção	 completamente	 diferente,	 dependendo	 se,	 ao	 aproximar-se
do	animal,	tocou	o	seu	lado,	a	tromba,	a	presa	de	marfim,	a	orelha,	o	rabo	ou	a
pata.	A	história	nos	 lembra	que	muitas	vezes	é	difícil	 ter	certeza	de	que	nossa
experiência	 isolada	 nos	 forneceu	 o	 retrato	 completo	 de	 algo	 complexo.	Tentar
compreender	a	perspectiva	e	forma	gerais	da	Bíblia	pode	ser	semelhante	a	isso.
Dependendo	 de	 onde	 primeiro	 tocamos	 as	 Escrituras,	 pode	 não	 ficar
imediatamente	claro	que	elas	como	um	todo	têm	a	forma	de	uma	história.	Assim,
o	leitor	que	abre	o	Novo	Testamento	em	1Coríntios	se	vê	lendo	uma	carta	de	um
missionário	a	uma	igreja	nova	com	problemas	e	se	perguntando:	como	é	que	isso
faz	 parte	 da	 grande	 história?	Ou	 considere	 a	 poesia	 de	 Salmos	 ou	 as	 imagens
fantásticas	de	Apocalipse:	como	e	onde	elas	se	encaixam	na	grande	história?
Pode	ser	útil	pensar	na	Bíblia	—	sendo	um	livro	tão	extenso	e	variado	quanto
obviamente	é	—	não	como	se	fosse	um	elefante,	mas	algo	ainda	maior:	como	um
prédio	enorme,	uma	catedralmercado.
Se	você	alguma	vez	visitou	uma	dessas	 igrejas	magníficas,	como	a	Catedral
Nacional	de	Washington	 (D.C.),	 a	de	Notre-Dame,	em	Montreal	 (ou	sua	ainda
mais	famosa	irmã	mais	velha	em	Paris),	ou	a	de	St.	Paul,	em	Londres,	sabe	que
pode	 passar	 dias	 explorando	 cada	 uma	 delas.	 Há	 muitos	 ângulos	 diferentes	 a
partir	 dos	 quais	 se	 pode	 analisar	 uma	 catedral.	 Dentro	 dela	 há	muitas	 capelas
secundárias	e	principais	para	explorar,	repletas	de	vitrais,	pinturas,	esculturas	e
outros	 tesouros.	 O	 que	 inicialmente	 parece	 ser	 um	 enorme	 espaço	 único,	 na
verdade	é	constituído	de	inúmeras	salas	e	corredores,	torres	e	galerias,	escadarias
e	 passagens	 secretas.	 E	 isso	 é	 somente	 o	 que	 as	 pessoas	 veem.	 Se	 obtiver
permissão	do	deão,	o	diretor	da	catedral,	para	explorar	a	grande	igreja	como	um
todo,	descobrirá	maneiras	bem	variadas,	além	das	tradicionais,	de	entrar	e	sair	do
prédio	e	muitos	pontos	de	observação	diferentes	a	partir	dos	quais	é	possível	vê-
lo.
Figura	4:	Planta	baixa	de	uma	catedral
Imagine	a	Bíblia	 com	os	 seus	 sessenta	e	 seis	 livros,	 escritos	por	dezenas	de
autores	humanos	ao	longo	de	mais	de	mil	anos,	como	uma	grande	catedral	com
muitas	 salas	 e	 andares	 e	uma	variedade	de	 entradas.	Você	pode,	 por	 exemplo,
entrar	 na	Bíblia	 por	meio	 de	 um	dos	Evangelhos.	De	 fato,	muitas	 pessoas	 são
encorajadas	 a	 começar	 lendo	 a	 Bíblia	 com	 o	 Evangelho	 de	 Marcos	 ou	 o
Evangelho	de	 João.	Muitos	 cristãos	 começam	a	 explorar	 o	Antigo	Testamento
relativamente	 tarde	 em	 sua	 jornada	 de	 fé.	 Poucos	 se	 veem	 atraídos	 repetidas
vezes	às	genealogias	no	início	de	Crônicas	ou	às	longas	listas	de	leis	alimentares
em	Levítico.
Se	 quisermos	 obter	 uma	 percepção	 da	 catedral	 como	 um	 todo,	 precisamos
responder	a	uma	pergunta	importante:	qual	é	a	entrada	principal,	o	lugar	a	partir
do	 qual	 podemos	 nos	 orientar	 para	 o	 todo?Uma	 catedral	 tradicional
normalmente	 tem	uma	entrada	principal	pela	porta	ocidental,	da	qual	podemos
observar	a	longa	nave	que	chega	até	o	fim	do	prédio,	na	parte	oriental,	onde	se
encontra	 o	 altar.	 No	 Ocidente,	 essas	 igrejas	 sempre	 foram	 construídas	 com	 o
altar	 voltado	 para	 o	 Oriente,	 para	 Jerusalém	 (o	 que	 originou	 a	 palavra
“orientado”,	agora	também	significando	de	modo	mais	geral	“fornecer	um	senso
de	direção”).	A	“catedral”	da	Bíblia	tem	muitos	temas.	Já	se	propuseram	vários
temas	 abrangentes	 da	 Bíblia	 e	 eles	 são	 portas	 diferentes	 a	 partir	 das	 quais
podemos	obter	uma	perspectiva	sobre	toda	a	impressionante	revelação	de	Deus.
Em	nossa	opinião,	“aliança”	(no	Antigo	Testamento)	e	“o	reino	de	Deus”	(no
Novo	Testamento)	apresentam	uma	forte	 reivindicação	de	ser	a	porta	principal
pela	qual	podemos	começar	a	entrar	na	Bíblia	e	a	e	enxergá-la	como	uma	grande
e	 ampla	 estrutura.	 No	 Antigo	 Testamento,	 Deus	 estabelece	 uma	 aliança	 com
Noé,	Abraão,	Israel	e	o	rei	Davi;	em	Jeremias,	Deus	fala	sobre	uma	nova	aliança
que	 fará	no	 futuro.	Nos	Evangelhos,	 está	 claro	que	o	 tema	principal	no	amplo
ministério	de	ensino	de	Jesus	é	o	reino	de	Deus.	Marcos	(1.14,15)	assim	resume
o	ministério	de	Jesus:	“Depois	que	João	foi	colocado	na	prisão,	Jesus	foi	para	a
Galileia,	pregando	as	boas-novas	de	Deus.	O	tempo	chegou,	ele	afirmou.	O	reino
de	Deus	está	próximo.	Arrependam-se	e	creiam	nas	boas-novas!”.	Considerar	a
aliança	 e	 o	 reino	 como	 entrada	 principal	 à	 Bíblia	 não	 significa	 negar	 que	 há
outras	entradas.	Leitores	têm	sugerido	muitas	outras	entradas	como	as	melhores
para	obter	 uma	visão	do	 todo:	 entradas	 como	“promessa”	 e	 “presença”.	Todas
elas	são	úteis,	mas	são	um	pouco	como	capelas	secundárias	ou	entradas	laterais	e
não	 a	 entrada	 principal.	 Certamente	 temos	 um	 vislumbre	 da	 catedral	 a	 partir
delas,	mas	não	obtemos	 a	mesma	visão	geral	 do	 todo	que	obtemos	 a	partir	 de
aliança	e	reino.
Você	pode	perguntar:	aliança	e	reino	são	a	mesma	entrada	ou	duas	diferentes?
Essa	é	uma	pergunta	importante.	O	reino	de	Deus,	como	explicamos	abaixo,	diz
respeito	ao	governo	de	Deus	sobre	o	seu	povo	e	por	fim	sobre	toda	a	criação.	A
aliança	 se	 refere	 especificamente	 ao	 relacionamento	 especial	 que	 Deus
estabelece	 com	 seu	 povo	 à	 medida	 que	 realiza	 seus	 planos	 na	 história.	 Na
verdade,	 alianças	 eram	 relacionamentos	 que	 reis	 estabeleciam	 com	 os	 povos
sujeitos	a	eles.	Quando	o	povo	de	Deus	entra	em	um	relacionamento	de	aliança
com	ele,	tem	a	obrigação	de	ser	seu	povo	subordinado	e	viver	sob	seu	governo.
Como	 logo	 veremos,	 a	 aliança	 também	 insiste	 em	 que	 levemos	 a	 sério	 os
propósitos	divinos	para	com	toda	a	criação.	Assim,	aliança	e	reino	são	como	dois
lados	 da	 mesma	 moeda,	 evocando	 a	 mesma	 realidade	 de	 modos	 ligeiramente
diferentes.
Depois	de	 todo	o	nosso	estudo,	 constatamos	que	 reino	e	aliança	 são	a	porta
dupla	 da	 mesma	 entrada	 principal	 à	 catedral	 bíblica,	 evocando	 a	 mesma
realidade.	 É	 por	 isso	 que	 usamos	 “reino”	 para	 estruturar	 este	 livro.	 As	 duas
coisas	nos	alertam	sobre	Deus	como	o	grande	Rei	sobre	 tudo,	que	quer	 ter	um
povo	vivendo	sob	o	seu	reinado	e	espalhando	a	fragrância	de	sua	presença	por
toda	a	sua	criação.	Ambas	também	nos	alertam	sobre	o	fato	de	que	esse	sempre
foi	o	plano	de	Deus	desde	o	início,	mas	que	as	coisas	deram	muito	errado.	Agora
Deus	está	realizando	trabalho	corretivo	para	restaurar	seu	projeto	e	exercer	suas
intenções	originais	e	permanentes.	Nas	alianças	do	Antigo	Testamento,	o	foco	é
restrito	a	Israel	e,	mesmo	assim,	sempre	para	que	Israel	seja	luz	para	as	nações.
No	 Novo	 Testamento,	 “o	 reino	 de	 Deus”	 claramente	 tem	 em	 vista	 todas	 as
nações	e	toda	a	criação.	De	qualquer	modo,	quando	entramos	na	Bíblia	por	essa
porta	dupla,	aliança	e	reino	nos	alertam	sobre	a	importância	do	enredo	da	Bíblia.
Este	 inicia	 com	 a	 criação	 e	 prossegue	 a	 partir	 desse	 ponto.	 Essa	 entrada	 nos
fornece	a	perspectiva	correta	para	compreender	o	que	Deus	está	fazendo	e	o	que
está	dizendo	para	nós	hoje.
Podemos	 não	 começar	 lendo	 a	 Bíblia	 em	Gênesis	 e	 talvez	 nunca	 gastemos
muito	tempo	nas	genealogias	de	Crônicas	e	nas	leis	de	Levítico	e	Números.	Mas
se	entramos	na	Bíblia	pela	aliança	e	pelo	 reino,	 logo	nos	descobrimos	 fazendo
perguntas	como	estas:
•	Como	a	aliança	de	Deus	com	Abraão	se	relaciona	com	os	seus	propósitos
para	toda	a	sua	criação?
•	Se	Jesus	é	o	nosso	Rei,	o	que	dizer	sobre	o	restante	da	criação?
•	Se	este	é	o	mundo	de	Deus,	o	que	deu	errado	com	ele?	Como	é	que	Deus
perdeu	o	controle	sobre	ele?
•	Como	a	igreja	se	encaixa	nos	propósitos	do	reino	de	Deus	para	toda	a
criação?
O	único	modo	de	responder	a	essas	perguntas	é	voltar	ao	início	da	Bíblia	e	ler
a	história	 à	medida	que	 ela	 se	desenrola	 em	 seus	vários	 atos,	 começando	 com
“No	princípio…”.	E	isso	é	o	que	faremos	neste	livro.	Portanto,	sim,	contanto	que
não	entendamos	a	questão	de	uma	maneira	simplista,	a	Bíblia	certamente	é	uma
única	história	que	se	desenrola.	E	neste	livro	contaremos	essa	história.
O	drama	bíblico
No	segundo	século	d.C.,	o	dramaturgo	Terêncio	começou	a	escrever	peças	em
cinco	 “atos”	 distintos	 para	 espetáculos	 em	 teatros	 romanos.	 Desde	 então,	 a
tradição	 ocidental	 de	 narrativa	 dramática	 veio	 a	 reconhecer	 essa	 estrutura	 de
cinco	 atos	 como	 especialmente	 adequada	 ao	 desenvolvimento	 meticuloso	 de
uma	história	longa	e	importante.	Os	cinco	atos	são	geralmente	organizados	deste
modo:	(1)	O	primeiro	ato	nos	fornece	informação	contextual	essencial,	apresenta
os	personagens	importantes	e	estabelece	a	situação	estável	que	será	interrompida
pelos	 acontecimentos	 que	 estão	 prestes	 a	 se	 desenrolar.	 (2)	 A	 primeira	 ação
começa,	geralmente	 com	a	 introdução	de	um	conflito	 significativo.	O	meio	da
peça	 (3)	 é	 a	 parte	 em	 que	 a	 ação	 principal	 do	 drama	 ocorre.	 Aqui	 o	 conflito
inicial	se	intensifica	e	se	torna	cada	vez	mais	complicado	até	(4)	o	clímax,	ou	o
ponto	de	maior	tensão,	após	o	qual	o	conflito	precisa	ser	resolvido,	de	um	modo
ou	de	outro.	Após	o	clímax	vem	(5)	a	resolução,	em	que	as	implicações	do	ato
do	clímax	são	elaboradas	para	todos	os	personagens	do	drama	e	a	estabilidade	é
restaurada.
Essa	 é	 a	 estrutura	 que	 Wright	 tem	 em	 mente	 quando	 descreve	 a	 história
bíblica	 como	uma	peça	de	 cinco	atos,	da	qual	uma	grande	parte	do	quinto	ato
está	faltando.11	Os	atores	(nós)	precisam	improvisar	uma	segunda	cena	adequada
no	 ato	 5,	 preparando	 para	 a	 conclusão	 que	Deus	 revelou,	 para	 a	 qual	 a	 nossa
peça	precisa	se	dirigir.12
A	 aplicação	 de	 Wright	 da	 estrutura	 de	 cinco	 atos	 do	 drama	 à	 história
dramática	da	Bíblia	é	muito	útil	e	é	por	isso	que	adotamos	(em	sua	maior	parte)
essa	estrutura	para	a	nossa	própria	versão	da	história	bíblica.	O	ato	1,	que	você
está	prestes	a	ler,	fornece	informação	essencial	sobre	Deus,	sobre	a	humanidade
e	a	respeito	do	mundo.	Descreve	uma	situação	estável,	uma	criação	muito	boa.
Os	atores	humanos	iniciam	o	seu	trabalho	no	jardim	e	a	história	começa.	No	ato
2,	o	conflito	é	introduzido	ao	depararmos	com	um	inimigo	misterioso	do	plano
de	Deus.	Aqui	o	problema	fundamental	em	nosso	mundo	tem	sua	origem.	No	ato
3,	 o	 conflito	 (entre	 o	 pecado	 humano	 e	 os	 bons	 propósitos	 de	 Deus	 para	 a
criação)	se	intensifica	e	complicações	aparecem.	O	ato	4	é	a	narrativa	de	como	a
história	das	condutas	graciosas	de	Deus	com	suas	criaturas	rebeldes	chega	a	um
clímax	 na	 morte	 e	 na	 ressurreição	 de	 Jesus	 Cristo.	 No	 ato	 5,	 vemos	 as
implicações	do	grande	ato	de	redenção	de	Cristo	 terem	efeito	nas	vidas	de	sua
comunidade.
E	é	aqui	que,	neste	livro,	nos	afastamos	da	tradição	de	cinco	atos	(e	do	modelo
de	 Wright).	 Está	 claro	 que	 a	 história	 bíblica	 não	 termina	 simplesmente	 na
conclusão	do	quinto	ato.	O	desdobramento	do	ato	5	também	não	é	caracterizado
por	uma	resolução	fácil.	Embora	a	resolução	tenha	ocorrido	em	Cristo,	o	conflito
continua	 ena	 verdade	 se	 intensifica.	 O	 propósito	 de	 Deus	 é	 nada	menos	 que
reconciliar	toda	a	criação	consigo,	um	propósito	realizado	de	uma	vez	por	todas
na	morte	e	na	 ressurreição	de	 seu	Filho	cerca	de	dois	mil	anos	atrás.	Temos	a
própria	 promessa	 tremenda	 de	 Deus	 de	 que	 o	 seu	 grande	 propósito	 para	 sua
criação	é	contínuo	e	ainda	não	 terminou	em	nosso	mundo.	Há	muito	mais	por
vir	na	história	de	Deus.	Ele	preparou	mais	um	ato,	que	ainda	será	revelado,	um
ato	diferente	de	qualquer	coisa	que	vimos	ou	imaginamos	até	aqui	e	sobre	o	qual
a	 cortina	 da	 história	nunca	 se	 fechará.	 Assim,	 incluímos	 esse	 ato	 6	 em	 nossa
narrativa	 da	 história	 bíblica.	 Usando	 o	 reino	 de	 Deus	 como	 o	 nosso	 tema
abrangente	e	a	estrutura	de	seis	atos,	 identificamos	os	seguintes	atos	principais
no	drama	bíblico:
Ato	1: Deus	estabelece	o	seu	reino:	Criação
Ato	2: Rebelião	no	reino:	Queda
Ato	3: O	Rei	escolhe	Israel:	a	redenção	é	iniciada
	 Cena	1:	Um	povo	para	o	Rei
	 Cena	2:	Uma	terra	para	seu	povo
Interlúdio: Um	relato	do	reino	aguardando	um	desfecho:	o	períodointertestamentário
Ato	4: A	vinda	do	Rei:	redenção	realizada
Ato	5: Propagando	a	notícia	do	Rei:	a	missão	da	igreja
	 Cena	1:	De	Jerusalém	até	Roma
	 Cena	2:	E	a	todo	o	mundo
Ato	6: A	volta	do	Rei:	redenção	concluída
1	N.	T.	Wright,	The	New	Testament	and	the	people	of	God	 (London:	SPCK,
1992),	p.	40,	grifo	dos	autores.
2	 Lesslie	 Newbigin,	 The	 gospel	 in	 a	 pluralistic	 society	 (Grand	 Rapids:
Eerdmans,	1989),	p.	15	[edição	em	português:	O	evangelho	em	uma	sociedade
pluralista,	 tradução	 de	 Valéria	 Lamim	 Delgado	 Fernandes	 (Viçosa:	 Ultimato,
2016)].
3	 Alasdair	MacIntyre,	After	 virtue	 (Notre	Dame:	University	 of	Notre	Dame
Press,	 1981),	 p.	 216	 [edição	 em	 português:	 Depois	 da	 virtude,	 tradução	 de
Jussara	Simões	(São	Paulo:	EDUSC,	2001)].
4	Scientia	potestas	est.	A	expressão	vem	de	Francis	Bacon	(1561-1626).
5	 Fazemos	 uma	 distinção	 entre	 ter	 uma	 história	 que	 molda	 nossa	 vida	 e
articular	essa	história.
6	Se	uma	história	básica	 é	 similar	 a	uma	cosmovisão,	 então	é	 intrigante	ver
que	James	Sire	sugere	que	um	ministério	cristão	pode	servir	para	ajudar	pessoas
a	se	tornarem	conscientes	de	sua	cosmovisão,	a	chamar	a	atenção	para	o	que	está
presente,	mas	do	que	elas	podem	não	estar	conscientes	(The	universe	next	door:
a	basic	worldview	catalog,	3.	ed.	[Downers	Grove:	InterVarsity,	1997])	[edição
em	 português:	 O	 universo	 ao	 lado:	 um	 catálogo	 básico	 sobre	 cosmovisão,
tradução	de	José	Fernando	Cristófalo	(São	Paulo:	Hagnos,	2009)].	Nick	Pollard,
um	 evangelista	 inglês	 que	 trabalha	 com	 estudantes	 do	 ensino	 médio	 e	 da
universidade,	 conta	 uma	história	 encantadora	 relacionada	 a	 isso.	A	 abordagem
evangelística	de	Nick	tem	em	vista	ajudar	estudantes	a	ficar	conscientes	de	sua
história	básica	ou	de	sua	cosmovisão,	de	modo	que	possam	perceber	como	isso
se	 relaciona	 ao	 cristianismo.	Nick	 relata	 a	 respeito	 de	 um	 jovem	que	 vai	 para
casa	empolgado	em	contar	à	sua	mãe	que	havia	descoberto	que	é	um	hedonista
epicureu!
7	 Lesslie	 Newbigin,	 Foolishness	 to	 the	 Greeks:	 the	 gospel	 and	 Western
culture	(Grand	Rapids:	Eerdmans,	1986),	p.	61.
8	“A	Palavra	de	Deus	[…]	é	uma	história	ampla,	que	alcança	e	engloba	tudo:
uma	meta-história”	 (Eugene	 Peterson,	 “Living	 into	 God’s	 story”).	 Esse	 artigo
orginalmente	 apareceu	 no	 site	 “The	 ooze:	 conversation	 for	 a	 journey”
(www.theooze.com).	 O	 artigo	 está	 disponível	 em:
https://secure.electricurrent.com/freshresource/articles/index.cfm?
task=detail&ID=1081&bSHOW=no&navResources=2.
9	N.	T.	Wright,	The	New	Testament	and	the	people	of	God,	p.	41-2.
10	Peterson,	“Living	into	God’s	story”.
11	 A	 analogia	 de	 Wright	 de	 uma	 peça	 de	 cinco	 atos	 é	 analisada	 em	 mais
detalhes	nas	páginas	238	e	239.
12	N.	T.	Wright,	“How	can	the	Bible	be	authoritative?”,	Vox	Evangelica,	n.	21
(1991):	 7-32;	 idem,	 The	 New	 Testament	 and	 the	 people	 of	 God,	 p.	 139-43.
Alteramos	ligeiramente	a	ilustração,	sugerindo	seis	atos	e	não	cinco.
Deus	estabelece	seu	reino
http://www.theooze.com
https://www.secure.electricurrent.com/freshresource/articles/index.cfm?task=detail&ID=1081&bSHOW=no&navResources=2
Criação
Os	primeiros	cinco	livros	da	Bíblia	são	conhecidos	como	Torá	ou	Lei	de	Moisés.
Embora	 isso	 não	 signifique	 necessariamente	 que	 Moisés	 escreveu	 todas	 as
palavras,	a	maioria	delas	veio	por	meio	dele	e	certamente	ele	é	a	figura	central
na	 história	 que	 contam.	 O	 livro,	 Êxodo,	 narra	 o	 nascimento	 de	Moisés	 e	 sua
ascensão	como	o	líder	por	meio	de	quem	Deus	opera	para	tirar	os	israelitas	do
Egito.	 Depois,	 Moisés	 está	 em	 quase	 todos	 os	 capítulos	 até	 o	 fim	 de
Deuteronômio.	Mas	 isso	 reflete	 somente	quatro	dos	cinco	primeiros	 livros.	De
onde	veio	o	primeiro	livro	e	por	que	está	incluído	como	parte	da	Lei	de	Moisés
ao	contar	uma	história	que	aconteceu	muito	antes	do	próprio	Moisés	ter	nascido?
Quem	é	o	“SENHOR	Deus”?
Provavelmente	não	tem	muita	importância	para	você	que	“Michael”	é	um	nome
hebraico	que	significa	“(Aquele)	que	é	como	Deus”	ou	que	“Craig”	é	um	nome
gaélico	 que	 significa	 “um	 afloramento	 rochoso”.	 Embora	 em	 nossa	 cultura
nomes	sejam	importantes,	não	é	comum	atribuirmos	significado	especial	a	eles.
Entretanto	 no	mundo	 do	Antigo	Testamento	 que	 estamos	 nos	 preparando	 para
visitar	no	ato	1,	o	significado	de	nomes	muitas	vezes	tem	grande	importância.	E
não	 há	 nomes	 mais	 importantes	 do	 que	 aqueles	 que	 identificam	 a	 Deus	 em
Gênesis	e	nos	outros	livros	do	Antigo	Testamento.
Em	Gênesis	1,	a	palavra	hebraica	Elohim	(traduzida	simplesmente	por	“Deus”
nas	versões	bíblicas	em	português)	é	o	nome	comum	para	Deus,	usado	em	todo	o
antigo	 Oriente	 Próximo.	 E	 a	 Bíblia	 afirma	 que	 “Deus”	 traz	 toda	 a	 criação	 à
existência	a	partir	do	nada.	Mas	em	Gênesis	2.4	outro	nome	começa	a	ser	usado.
“Deus”	 é	 agora	 chamado	 de	 “o	 SENHOR	 Deus”	 (Yahweh	 Elohim).	 Esse	 é	 um
modo	extremamente	 incomum	de	se	 referir	a	Deus	e	 tem	o	objetivo	de	revelar
algumas	coisas	importantes	sobre	quem	ele	é.
Duas	 passagens	 fundamentais	 no	Antigo	 Testamento	 (Êx	 3;	 6.1-12)	 lançam
luz	 sobre	 o	 misterioso	 nome	 Yahweh1	 (ou	 Jeová,	 em	 algumas	 versões	 mais
antigas	 da	Bíblia).2	 Esses	 textos	 relatam	 a	 forma	 de	Deus	 se	 revelar	 a	Moisés
como	Yahweh	ao	chamá-lo	para	tirar	o	povo	de	Israel	da	escravidão	no	Egito.	O
nome	Yahweh	 é	o	 título	que	Deus	escolhe	para	 identificar	a	 si	mesmo	como	o
Redentor	divino,	o	Deus	que	resgata	seu	povo	da	escravidão	e	se	encontra	com
ele	no	monte	Sinai	(Êx	19.4).
Quando	 os	 nomes	Yahweh	 (SENHOR)	 e	Elohim	 (Deus)	 são	 unidos	 conforme
Gênesis	2.4,	a	implicação	pujante	é	de	que	o	mesmo	Deus	que	resgata	Israel	da
escravidão	 é	 o	 Deus	 que	 criou	 todas	 as	 coisas,	 o	 Criador	 do	 céu	 e	 da	 terra.3
“Yahweh,	o	Deus	dos	hebreus,	é	também	o	Deus	de	toda	a	terra	sobre	a	qual	seu
senhorio	brilha	por	meio	do	granizo	e	do	trovão”.4	Os	israelitas	primeiro	passam
a	conhecer	a	Deus	(por	meio	de	Moisés)	como	seu	Redentor;	somente	mais	tarde
tomam	conhecimento	do	seu	papel	como	o	Criador.	E	isso	não	é	muito	diferente
para	 nós,	 ainda	 que	 estejamos	muito	mais	 adiante	 na	 história	 bíblica.	Quando
passamos	a	 conhecer	 a	Deus	por	meio	da	obra	 salvífica	de	 seu	Filho,	 Jesus,	o
encontramos	primeiro	como	nosso	Salvador	e	Redentor,	 todavia	Deus	continua
sendo	 o	 Criador	 de	 tudo	 o	 que	 era	 ou	 é	 ou	 será:	 ele	 é	 o	 único	 SENHOR	 Deus
eterno,	Yahweh	Elohim.	Portanto,	no	instante	em	que	começamos	a	testemunhar
acerca	 de	 nossa	 fé	 e	 contar	 a	 história	 cristã	 (e	 não	 somente	 a	 nossa	 história
pessoal),	 somos	 inevitavelmente	 levados	 de	 volta	 ao	 início	 de	 tudo:	 à	 própria
Criação.	“No	princípio,	Deus…”.
Uma	fé	para	Israel
A	primeira	cena	de	qualquer	história	merece	nossa	atenção	e	a	primeira	cena	da
história	bíblica	não	é	exceção.	Os	primeiros	capítulos	de	Gênesis,	que	contam	a
história	 da	 criação,foram	 escritos	 para	 os	 israelitas	 há	 muito	 tempo	 em	 uma
cultura	 bastante	 diferente	 da	 nossa.	 Embora	 alguns	 aspectos	 das	 histórias	 da
criação	em	Gênesis	1	e	2	possam	nos	parecer	estranhos,	precisamos	lembrar	que
faziam	sentido	para	o	povo	de	Israel	quando	as	ouviu	pela	primeira	vez.	A	razão
disso	é	que	o	autor	está	usando	imagens	e	conceitos	familiares	aos	seus	próprios
ouvintes.	 Quando	 lemos	 os	 primeiros	 capítulos	 de	 Gênesis	 considerando	 o
contexto	do	mundo	antigo	em	que	foram	escritos,	começamos	a	perceber	o	poder
da	mensagem	que	essa	história	almeja	comunicar.
Vários	 estudiosos	mostraram	 um	 forte	 aspecto	 de	 disputa	 ou	 argumentativo
em	Gênesis	1	e	2.	O	antigo	Oriente	Próximo	tinha	muitos	relatos	rivais	de	como
o	 mundo	 surgiu.	 Essas	 histórias	 eram	 comuns	 no	 Egito	 quando	 Israel	 estava
cativo	e	em	Canaã	quando	Israel	começou	a	conquistá-la	como	sua	terra.	Teria
sido	 extremamente	 fácil	 para	 os	 israelitas	 adotarem	 as	 histórias	 daqueles	 que
viviam	 na	 terra	 antes	 deles	 ou	 ao	 lado	 deles	 e	 que	 (afinal	 de	 contas)
supostamente	conheciam	a	terra	muito	melhor	do	que	eles	mesmos.	Muitos	dos
deuses	adorados	pelos	cananeus	estavam	fortemente	associados	à	fertilidade	da
terra.	 Os	 recém-chegados,	 tendo	 dificuldades	 para	 aprender	 a	 cultivar	 a	 terra,
ficariam	tentados	a	pedir	ajuda	a	esses	“deuses”	e	não	ao	SENHOR	Deus.
Temos	muita	informação	sobre	o	tipo	de	histórias	da	criação	que	circulavam
no	mundo	 antigo.	É	 fascinante	 ver	 como	 a	 história	 contada	 em	Gênesis	 1	 e	 2
contradiz	deliberadamente	alguns	componentes	importantes	delas.	Por	exemplo,
observe	como	Gênesis	1.16	descreve	o	sol	e	a	lua.	O	texto	não	se	refere	ao	sol
pelo	 seu	nome	hebraico	usual,	mas	em	vez	disso	meramente	como	“o	 luminar
maior”,	 que	 Deus	 criou	 para	 o	 dia.	 De	 modo	 similar,	 ele	 chama	 a	 lua	 de	 “o
luminar	menor”.	 Por	 quê?	 Provavelmente	 porque	 o	 sol	 e	 a	 lua	 eram	 adorados
como	deuses	com	tanta	frequência	pelas	pessoas	entre	as	quais	os	israelitas	agora
viviam.	Na	história	de	Gênesis,	os	leitores	não	podem	confundir	o	sol	como	uma
divindade	 a	 ser	 adorada.	As	Escrituras	 claramente	 descrevem	o	 sol	 como	 algo
criado,	um	objeto	colocado	nos	céus	com	o	simples	propósito	prático	de	prover
luz.	Assim,	 toda	a	atenção	está	dirigida	àquele	que	criou	essa	 luz	maravilhosa,
aquele	cujo	poder	é	tão	imenso	que	ele	pode	simplesmente	dizer	uma	palavra	e
todo	um	universo	passa	a	existir.	Nenhuma	simples	“luz”	nos	céus	merece	 ser
reverenciada.	 Somente	 Deus	 é	 divino;	 somente	 ele	 deve	 ser	 adorado.	 Embora
toda	a	criação	seja	“muito	boa”	(Gn	1.31),	ela	é	assim	porque	aquele	que	a	criou
é	infinitamente	superior	a	qualquer	coisa	que	criou.
E	esse	Criador	transcendente	não	é	como	os	deuses	caprichosos	descritos	na
história	 da	 criação	 babilônica	 (o	 Enuma	 Elish),	 que	 criam	 a	 humanidade
meramente	para	atuar	como	servos	dos	deuses,	estar	à	sua	disposição	e	mantê-
los	contentes.	Em	Gênesis,	o	Deus	que	criou	o	mundo	coloca	homens	e	mulheres
nele	como	o	ápice	do	que	trouxe	à	existência.	A	própria	criação	é	descrita	como
um	 lar	maravilhoso	 preparado	 para	 a	 humanidade,	 um	 lugar	 em	 que	 ela	 pode
viver,	prosperar	e	desfrutar	da	presença	e	companhia	íntimas	do	próprio	Criador.
Que	tipo	de	literatura	é	Gênesis	1?
As	 histórias	 da	 criação	 de	 Gênesis	 são,	 desse	 modo,	 argumentativas.	 Elas
afirmam	contar	a	verdade	sobre	o	mundo,	contradizendo	completamente	outras
histórias	desse	tipo,	comuns	no	mundo	antigo.	Israel	era	constantemente	tentado
a	adotar	essas	outras	histórias	como	base	para	sua	cosmovisão,	em	lugar	da	fé	no
SENHOR	Deus,	que	criou	os	céus	e	a	terra.	No	entanto,	a	narrativa	da	criação	de
Gênesis	 é	mais	 do	 que	 uma	 disputa.	 Ela	 também	 visa	 a	 nos	 ensinar	 de	modo
positivo	o	que	a	fé	em	Deus	significa	para	a	maneira	de	pensar	o	mundo	que	ele
criou	e	de	como	viver	nele.	Ela	faz	isso	na	forma	de	história.	E	é	precisamente	a
essa	 forma	 de	 história	 que	 precisamos	 estar	 atentos	 para	 não	 interpretá-la
equivocadamente.
Para	entender	a	história	da	criação	de	Gênesis,	precisamos	antes	entender	algo
sobre	 o	 tipo	 de	 composição	 literária	 que	 ela	 é.	 Os	 próprios	 estudiosos	 têm
dificuldade	em	descrevê-la.	Von	Rad	a	vê	 como	“doutrina	 sacerdotal”	 tão	 rica
em	 significado	 que	 “não	 se	 pode	 exagerar	 facilmente	 sua	 interpretação
teológica”.5	Blocher	 vê	 o	 relato	 da	 criação	 como	um	 exemplo	 de	 literatura	 de
sabedoria	cuidadosamente	elaborada.6	Mas	o	que	os	estudiosos	concordam	é	que
a	história	contada	nos	primeiros	capítulos	de	Gênesis	foi	redigida	de	modo	muito
cuidadoso:	a	evidência	de	habilidade	na	narração	é	clara.	Logo,	precisamos	nos
concentrar	 tanto	 no	modo	 com	 que	 a	 história	 é	 contada	 quanto	 nos	 próprios
detalhes	e	ponderar	se	esses	detalhes	devem	ou	não	ser	interpretados	conforme
um	historiador	ou	cientista	contemporâneo	os	interpretaria.	De	fato,	essa	é	uma
pergunta	difícil:	a	história	contada	aqui	é	da	 inauguração	misteriosa	da	própria
história.	Mas	as	linhas	gerais	da	história	de	Gênesis	estão	certamente	tão	claras
para	nós	quanto	estavam	para	aqueles	que	primeiro	a	ouviram.	Deus	é	 a	 fonte
divina	de	tudo	que	existe.	Ele	está	separado	de	todas	as	outras	coisas	na	relação
especial	 de	Criador	 para	 com	 a	 criação.	A	 formação	 da	 humanidade	 realizada
por	Deus	tinha	a	intenção	de	ser	o	ápice	de	todo	esse	trabalho	de	criar	e	formar.
E	Deus	 tinha	 em	mente	 um	 relacionamento	muito	 especial	 entre	 ele	 próprio	 e
essas	que	foram	criadas	por	último	dentre	todas	as	suas	criaturas.
Nestes	capítulos,	a	história	da	criação	nos	é	contada,	mas	não	para	satisfazer	a
nossa	 curiosidade	 do	 século	 21	 quanto	 aos	 detalhes	 de	 como	 Deus	 criou	 o
mundo.	 Por	 exemplo,	 indagamos	 se	 Deus	 criou	 durante	 um	 longo	 período	 de
tempo	 ou	 fez	 com	 que	 tudo	 que	 criou	 surgisse	 instantaneamente.	 Contudo,	 a
história	 de	 Gênesis	 é	 fornecida	 para	 que	 possamos	 ter	 uma	 compreensão
verdadeira	do	mundo	em	que	vivemos,	de	 seu	autor	divino	e	de	nosso	próprio
lugar	nele.	Como	John	Stek	corretamente	declara	sobre	os	relatos	em	Gênesis:
A	 intenção	 […]	 de	Moisés	 era	 proclamar	 o	 conhecimento	 do	 verdadeiro
Deus,	como	ele	revelou	a	si	mesmo	em	suas	obras	de	criação,	proclamar	um
entendimento	 correto	 da	 humanidade,	 do	 mundo	 e	 da	 história	 que	 o
conhecimento	do	verdadeiro	Deus	acarreta	e	proclamar	a	verdade	a	respeito
dessas	 questões	 em	 face	 das	 noções	 de	 falsas	 religiões	 que	 eram
predominantes	em	todo	o	mundo	de	sua	época.7
Contra	 noções	 religiosas	 pagãs	 que	 predominavam	 no	 Egito	 e	 em	 Canaã,
Gênesis	1	proclama	a	verdade	sobre	Deus,	sobre	a	humanidade	e	sobre	o	mundo.
Quando	 contrastado	 com	 os	mitos	 do	 antigo	Oriente	 Próximo,	 a	 descrição	 de
Deus,	 da	 humanidade	 e	 do	 mundo	 torna-se	 clara.	 Esse	 ato	 introdutório	 nos
apresenta	os	atores	principais	na	peça	—	Deus	e	a	humanidade	—	e	o	mundo	no
qual	a	história	bíblica	se	desenrola.
Mitos	pagãos Gênesis	1
deuses Deus
humanidade humanidade
mundo mundo
Figura	5:	Mitos	pagãos	versus	Gênesis	1
O	Deus	que	traz	à	existência	todas	as	coisas
Ler	o	primeiro	capítulo	de	Gênesis	é	em	parte	similar	ao	que	poderia	acontecer
com	você	em	uma	exposição	de	arte	realmente	significativa.	Imagine	que	você
está	sentado	 tranquilamente,	estupefato	com	a	beleza	e	o	poder	das	magníficas
pinturas.	 Então	 alguém	 se	 aproxima	 de	 você	 e	 diz:	 “Gostaria	 de	 conhecer	 o
artista?”.	 Gênesis	 1	 é	 uma	 apresentação	 do	 Artista.	 E	 que	 apresentação!	 As
primeiras	 três	 palavras	 da	 Bíblia	 hebraica	 podem	 ser	 traduzidas:	 (1)	 “no
princípio”,	 (2)	 “[ele]	 criou”,	 (3)	 “Deus”	 (sujeito	 da	 ação).	 Por	 meio	 de	 três
palavras	hebraicas	curtas	somos	transportados	de	volta	à	origem	de	tudo,	à	Fonte
misteriosa	e	pessoal	de	tudo	o	que	existe:	o	Deus	eterno	e	incriado.	Esse	Deus,
sem	início	e	sem	fim,	meramente	profere	uma	palavra	de	ordem	a	fim	de	trazer	à
existência	todoo	restante	que	existe.
A	ideia	de	criação	pela	palavra	preserva	antes	de	tudo	a	distinção	mais	radical
entre	 Criador	 e	 criatura.	 A	 criação	 nem	 mesmo	 remotamente	 pode	 ser
considerada	uma	emanação	de	Deus.	Ela	não	é	de	algum	modo	um	transbordar
de	 seu	 ser,	 sua	 natureza	 divina.	 Em	 vez	 disso,	 é	 um	 produto	 de	 sua	 vontade
pessoal.	A	única	continuidade	entre	Deus	e	sua	obra	é	a	sua	palavra.
Gênesis	 1	 nos	 apresenta	Deus	 como	 a	 pessoa	 infinita,	 eterna	 e	 incriada	 que
pelas	suas	ações	criativas	traz	toda	a	criação	à	existência.	Os	“céus	e	a	terra”	(Gn
1.1)	se	referem	à	totalidade	da	criação.	Luz	e	escuridão,	dia	e	noite,	mar,	céu	e
terra,	 plantas,	 animais	 e	 a	 humanidade	—	 tudo	 isso	 vem	 desse	 Deus,	 de	 sua
atividade	 criadora	 poderosa	 e	 boa.	 Von	 Rad	 afirma:	 “A	 ideia	 de	 criação	 pela
palavra	expressa	o	conhecimento	de	que	o	mundo	inteiro	pertence	a	Deus”.8
Isso	é	de	fato	um	dos	aspectos	pelos	quais	a	lógica	mal	consegue	vadear,	ao
passo	que	a	fé	consegue	nadar.	“O	lugar	onde	a	Bíblia	começa	é	onde	as	nossas
mais	fervorosas	ondas	de	pensamento	se	quebram,	são	jogadas	de	volta	sobre	si
mesmas	e	perdem	sua	força	em	gotas	e	espuma.”9	No	livro	de	Apocalipse,	uma
das	razões	mais	fortes	para	a	adoração	contínua	de	Deus	é	sua	obra	na	criação:
Tu	és	digno,	nosso	Senhor	e	Deus
de	receber	glória,	honra	e	poder,
porque	tu	criaste	todas	as	coisas
e	por	tua	vontade	elas	foram	criadas
e	têm	a	sua	existência	(Ap	4.11).
Esse	hino	de	louvor	no	último	livro	da	Bíblia	ocorre	na	própria	sala	do	trono
do	céu.	Isso	é	apropriado,	pois	ecoa	uma	verdade	acerca	de	Deus	subentendida
desde	o	início	do	relato	da	criação	em	Gênesis.	Ao	fazer	a	criação	surgir	pela	sua
palavra	de	poder,	Deus	a	estabelece	como	seu	próprio	vasto	reino.	Dessa	forma
ele	estabelece	a	si	mesmo	como	o	grande	Rei	sobre	toda	a	criação,	sem	limites
de	 qualquer	 tipo,	 e	 digno	 de	 receber	 toda	 glória,	 honra	 e	 poder	 por	 meio	 da
adoração	do	que	ele	criou.
No	 antigo	 Oriente	 Próximo,	 as	 pessoas	 conheciam	 muito	 bem	 o	 que	 é
autoridade.	 Entre	 elas,	 o	 poder	 até	 mesmo	 de	 líderes	 tribais	 ou	 nacionais	 era
quase	 absoluto.	 E	 de	 vários	 modos	 em	 Gênesis	 1,	 Deus	 é	 descrito	 como	 o
Monarca,	 a	 figura	 real	 cuja	 soberania	 se	 estende	por	direito	 e	por	 poder	 sobre
toda	 a	 sua	 criação.	A	 palavra	mais	 insignificante	 de	 um	 rei	mortal	 no	mundo
antigo	 precisava	 ser	 entendida	 como	 uma	 ordem	 por	 qualquer	 pessoa	 que	 a
ouvisse.	Mas	esse	Rei	imortal	fala	e	por	sua	ordem	divina	toda	a	criação	passa	a
existir	exatamente	como	ele	tenciona.	À	medida	que	Deus	cria,	ele	dá	nome	ao
que	cria	e	isso	novamente	é	uma	expressão	de	sua	soberania.	“O	ato	de	dar	um
nome	significava,	acima	de	tudo,	o	exercício	de	um	direito	soberano	[…]	Assim,
a	 nomeação	 disso	 e	 de	 todas	 as	 obras	 de	 criação	 subsequentes	mais	 uma	 vez
expressa	vividamente	a	reivindicação	divina	de	senhorio	sobre	as	criaturas.”10
Em	Gênesis	1,	a	palavra	divina	de	ordem	—	a	expressão	repetida	“Haja”	—
traz	à	existência	uma	criação	caracterizada	por	precisão,	ordem	e	harmonia:
Assim	como	Deus	é	aquele	que	coloca	o	tempo	em	movimento	e	estabelece
o	clima,	ele	também	é	responsável	por	estabelecer	todos	os	outros	aspectos
da	existência	humana.	A	disponibilidade	de	água	e	a	capacidade	de	a	terra
produzir	vegetação;	as	leis	da	agricultura	e	os	ciclos	sazonais;	cada	uma	das
criaturas	 de	Deus,	 criadas	 com	um	papel	 a	 desempenhar	—	 tudo	 isso	 foi
ordenado	por	Deus	e	era	bom,	não	tirânico	ou	ameaçador.11
A	 criação	 de	 Deus	 é	 “boa”	 e	 a	 virtude	 de	 sua	 criação	 só	 realça	 as
incomparáveis	bondade,	sabedoria	e	justiça	do	próprio	Criador.	Somente	ele	é	o
Rei	sábio	sobre	o	grande	reino	de	tudo	que	existe.
No	entanto,	na	posição	de	Rei,	Deus	não	se	mantém	distante	de	sua	criação.
Ele	não	é	o	tipo	de	monarca	que	governa	de	longe	sem	interesse	algum	em	seus
territórios	e	súditos.	Tendo	construído	seu	reino,	Deus	reina	sobre	ele	de	modo
profundamente	 pessoal.	 Gênesis	 1	 e	 2	 descrevem	 Deus	 como	 altamente
relacional.	Ele	fala,	não	somente	para	dar	ordens,	mas	também	para	expressar	o
seu	 próprio	 envolvimento	 na	 criação	 do	 cosmo.	 Há	 a	 expressão	 misteriosa
“Façamos…”	 em	Gênesis	 1.26	 (que	 interpretamos	 como	Deus	 se	 dirigindo	 ao
conselho	celestial	de	anjos).	Isso	chama	a	atenção	para	a	pessoa	de	Deus	e	sua
vontade	de	que	haja	outras	entidades	distintas	de	(e,	ainda	assim,	relacionadas	a)
si	mesmo.12	Contudo,	de	forma	mais	dramática,	quando	Deus	cria	a	humanidade,
ele	a	abençoa	e	fala	a	ela	diretamente:	“Sejam	férteis	e	multipliquem-se;	encham
e	 subjuguem	 a	 terra”	 (Gn	 1.28).	 Há	 um	 relacionamento	 pessoal	 entre	 o	 Rei
divino	e	seus	súditos	humanos.	Deus	tem	uma	tarefa	específica	e	os	convida	para
participar	com	ele,	enchendo	e	ordenando	o	mundo,	que	ele	lhes	deu	como	seu
lar.	Gênesis	2	e	3	mostram	a	natureza	pessoal	de	Deus	ainda	mais	claramente.	O
SENHOR	Deus	(Yahweh	Elohim)	caminha	no	jardim	com	Adão	e	Eva	e	mostra	o
interesse	 mais	 íntimo	 e	 pessoal	 neles,	 em	 suas	 necessidades	 e	 em	 suas
responsabilidades.
A	humanidade	como	a	imagem	de	Deus
O	ápice	da	história	da	criação	em	Gênesis	é	a	criação	da	humanidade	(1.26-28).
Na	 Bíblia,	 um	 homem	 ou	 uma	mulher	 é	 uma	 criatura	 concebida	 e	 criada	 por
Deus	 como	 parte	 do	 mundo	 de	 Deus.	 Não	 importa	 como	 relacionamos	 a
atividade	divina	de	criação	a	teorias	científicas,13	se	formos	fiéis	ao	que	a	Bíblia
tem	a	dizer	sobre	quem	somos,	não	podemos	nos	considerar	meramente	produtos
aleatórios	do	tempo	e	do	acaso	(como	fazem	os	defensores	da	evolução	ateísta).
A	humanidade	é	criada	e,	de	acordo	com	Gênesis	(e	o	restante	da	Bíblia),	cada
ser	humano	realmente	é,	além	do	ser	criado,	uma	criatura	especial.
Em	Gênesis	 1	 e	 2,	 o	 ensino	 sobre	 a	 humanidade	 é	 rico	 e	 variado.	 Singular
entre	as	criaturas	que	Deus	cria,	a	humanidade	é	pessoal.	Deus	se	dirige	somente
ao	homem	e	à	mulher:	eles	desfrutam	de	um	relacionamento	pessoal	ímpar	com
Deus.	Como	Agostinho	observou	há	muito	 tempo	em	suas	Confessions,	 fomos
criados	 para	Deus	 e	 o	 nosso	 coração	 está	 inquieto	 enquanto	 não	 encontramos
nosso	 descanso	 nele.14	 Gênesis	 3.8	 evoca	 de	 modo	 impressionante	 esse
relacionamento	 entre	 o	 Deus	 criador	 e	 suas	 criaturas	 humanas.	 Deus	 tem	 o
hábito	de	“andar	pelo	jardim	no	frescor	do	dia”	e	se	encontrar	com	o	homem	e	a
mulher	 que	 colocou	 ali.	 Gordon	Wenham	 observou	 como	Gênesis	 descreve	 o
jardim	de	um	modo	semelhante	ao	tabernáculo,	no	qual	Deus	habita	entre	o	seu
povo.15	 Homens	 e	 mulheres	 são	 criados	 para	 um	 relacionamento	 íntimo	 com
Deus	e	nossa	natureza	terrena	não	é	obstáculo	algum	para	esse	relacionamento.
Deus	caminha	com	regularidade	com	Adão	e	Eva	no	enorme	jardim	que	separou
para	 eles.	 Discute	 com	 eles	 como	 esse	 grande	 parque	 está	 se	 desenvolvendo,
como	 suas	plantas	 estão	 crescendo	 sob	o	 seu	 cuidado	 e	 como	está	 a	 harmonia
entre	os	animais.
Estudiosos	modernos	muitas	vezes	se	referem	a	duas	histórias	da	criação	em
Gênesis,	enxergando	uma	distinção	entre	o	que	é	narrado	em	1.1—2.4a	e	2.4b-
25.	 Isso	é	um	pouco	enganoso.	Embora	essas	duas	seções	sejam	distintas,	elas
estão	 estreitamente	 relacionadas.	 Gênesis	 1	 examina	 a	 humanidade	 em	 seu
relacionamento	 com	o	mundo.	Gênesis	 2	 concentra-se	 no	homem	e	na	mulher
em	seu	 relacionamento	um	com	o	outro	e	com	Deus.	As	duas	passagens	usam
imagens	 e	 metáforas	 diferentes,	 pois	 estão	 colocando	 em	 foco	 aspectos
diferentes	do	que	significa	ser	humano.
Em	Gênesis	1.26-28,	Deus	cria	a	humanidade	à	sua	imagem,	conforme	a	sua
semelhança.	Note	que	as	palavras	“imagem”	e	“semelhança”	enfatizam	a	mesma
ideia.	 Embora	 Deus	 seja	 o	 Criador	 infinito	 e	 a	 humanidade	 meramente	 sua
criação	 finita,	 há	 algo	 essencialmente	semelhante	 entre	 eles.	 “Imagem”	 é	 uma
metáfora.	 À	 medida	 que	 a	 destrinçamos,	 precisamos	 ter	 em	 mente	 que	 sua
função	como	metáfora	é	chamar	a	nossa	atençãopara	uma	semelhança	notável
entre	seres	humanos	e	Deus,	ao	mesmo	tempo	em	que	de	forma	alguma	nega	que
somos	radicalmente	diferentes	de	Deus.	Anteriormente,	reconhecemos	que	Deus
como	Criador	é	radicalmente	diferente	de	tudo	que	criou:	o	que	nos	inclui.	Mas
se	 a	 humanidade	 é	 criada	 “à	 imagem	 de	Deus”,	 então	 de	 algum	modo	 somos
como	aquele	que	nos	criou.	Os	versículos	seguintes	esclarecem	essa	semelhança.
Em	 Gênesis	 1.26,	 Deus	 afirma:	 “Façamos	 o	 homem	 à	 nossa	 imagem	 […]
Domine	ele	[…]	sobre	toda	a	terra”.	Ele	então	diz	aos	seres	humanos	que	criou:
“Sejam	 férteis	 e	 multipliquem-se;	 encham	 e	 subjuguem	 a	 terra.	 Dominem
sobre…”	(1.28).	A	partir	disso,	deve	estar	claro	que	a	semelhança	fundamental
entre	Deus	e	a	humanidade	é	a	vocação	singular	da	humanidade,	seu	chamado	ou
comissão	feitos	pelo	próprio	Deus.	Sob	Deus,	a	humanidade	deve	dominar	sobre
as	partes	não	humanas	da	criação	na	terra,	no	mar	e	no	ar,	do	mesmo	modo	que
Deus	é	o	dominador	supremo	sobre	tudo.	Como	von	Rad	explica:
Do	 mesmo	 modo	 que	 poderosos	 reis	 terrenos,	 para	 indicar	 sua
reivindicação	 de	 domínio,	 erigem	 uma	 imagem	 de	 si	 mesmos	 nas
províncias	de	 seu	 império	em	que	não	aparecem	pessoalmente,	 também	o
homem	 é	 colocado	 na	 terra	 à	 imagem	 de	Deus	 como	 emblema	 soberano
dele.	Ele	na	realidade	é	somente	o	representante	de	Deus,	convocado	para
manter	e	impor	a	reivindicação	divina	de	domínio	sobre	a	terra.	A	questão
crucial	na	semelhança	do	homem	a	Deus,	portanto,	está	em	sua	função	no
mundo	não	humano.16
No	 reino	 de	 Deus,	 o	 qual	 estabeleceu	 criando-o,	 o	 papel	 especial	 que	 ele
atribuiu	à	humanidade	é	que	devemos	servir	como	seus	“sub-reis”,	vice-regentes
ou	administradores.	Devemos	dominar	sobre	a	criação	a	fim	de	que	a	reputação
de	Deus	seja	realçada	em	seu	reino	cósmico.
Gênesis	1.26-28	se	tornou	notório	em	alguns	círculos	ambientalistas	por	causa
do	argumento	de	Lynn	White	de	que	esse	ensino	foi	usado	para	justificar	grande
parte	 da	 destruição	 ambiental	 que	 caracteriza	 o	mundo	 contemporâneo.17	 Essa
passagem	entende	 que	 a	 vocação	 da	 humanidade	 é	 para	 governar	 ou	 dominar,
mas	é	incorreto	interpretá-la	como	se	legitimasse	o	senhorio	implacável	sobre	a
natureza	 e	 sua	 exploração.	Na	própria	 obra	 criacional	 de	Deus,	 ele	 age	para	 o
bem	do	que	criou	e	não	para	o	seu	próprio	prazer	egoísta.	Por	exemplo,	ele	cria
um	lar	perfeito	para	a	humanidade.	Em	todas	as	etapas	da	obra	divina	nessa	lar,	a
criação	é	descrita	como	“boa”	e	“muito	boa”.	Sobre	essa	criação	Deus	chama	o
“dominador”	 humano	 para	 servir	 de	 administrador	 ou	 subsoberano,	 com	 o
intuito	de	concretizar	o	próprio	cuidado	e	proteção	de	Deus	para	com	sua	boa
criação	em	seu	próprio	domínio	soberano	sobre	a	terra.	Salmos	8.6	expressa	isso
de	 modo	 maravilhoso:	 a	 glória	 de	 seres	 humanos	 é	 que	 Deus	 os	 fez
“dominadores	 sobre	 as	 obras	 das	 [suas]	 mãos”.	 É	 impossível	 interpretar	 esse
texto	para	justificar	que	os	seres	humanos	estão	livres	para	fazer	o	que	quiserem
com	a	obra	de	Deus.	Acima	de	qualquer	coisa,	os	guardadores	humanos	prestam
contas	ao	Criador	divino	acerca	do	mundo	confiado	ao	seu	cuidado.
Ser	 humano	 significa	 ter	 liberdade	 e	 responsabilidade	 enormes,	 responder	 a
Deus	e	prestar	contas	por	essa	 resposta.	Assim,	a	melhor	 forma	de	expressar	o
conceito	 de	 “domínio”	 da	 humanidade	 sobre	 a	 criação	 pode	 ser	 afirmar	 que
somos	os	mordomos	reais	de	Deus,	colocados	aqui	para	desenvolver	o	potencial
não	revelado	na	criação	divina,	a	fim	de	que	toda	ela	possa	celebrar	a	glória	de
Deus.
Imagine	que	você	é	um	escultor	do	século	15	e	um	dia	recebe	um	e-mail	de
Michelangelo	 lhe	 perguntando	 se	 estaria	 disposto	 a	 vir	 ao	 seu	 estúdio	 para
concluir	uma	obra	que	ele	começou.	Ele	menciona	que	sua	tarefa	será	continuar
a	 obra	 dele	 de	 tal	 modo	 que	 o	 produto	 final	 realçará	 a	 própria	 reputação	 de
Michelangelo!	O	chamado	de	Deus	a	nós	para	“ter	domínio”	sobre	a	sua	criação
acarreta	 esse	 tipo	 de	 elogio	 ao	 que	 somos	 capazes	 de	 realizar	 como	 seus
mordomos.	Também	acarreta	uma	grande	responsabilidade	correspondentemente
pelo	que	resulta	dessa	mordomia.	Se	isso	é	o	que	ser	“à	imagem	de	Deus”	inclui,
então	claramente	nosso	serviço	para	Deus	deve	ser	 tão	amplo	quanto	a	própria
criação	 e	 incluirá	 cuidar	 bem	do	meio	 ambiente.	A	 passagem	que	 começa	 em
Gênesis	 1.26	 muitas	 vezes	 é	 proveitosamente	 designada	 como	 o	 “mandato
cultural	ou	criacional”.	Ela	nos	ordena	a	usar	todos	os	tipos	de	atividade	cultural
a	serviço	de	Deus.	De	fato,	há	um	elemento	dinâmico	“na	imagem	de	Deus”.
O	 próprio	 Deus	 é	 revelado	 ou	 sua	 imagem	 “é	 refletida”	 em	 sua	 criação
precisamente	 conforme	 estamos	 ocupados	 na	 criação,	 desenvolvendo	 seu
potencial	 não	 revelado	 na	 agricultura,	 na	 arte,	 na	 música,	 no	 comércio,	 na
política,	no	estudo	acadêmico,	na	vida	familiar,	na	 igreja,	no	 lazer	e	assim	por
diante,	 de	 modo	 que	 honre	 a	 Deus.	 Conforme	 nos	 apropriamos	 as	 ordens
criativas	 de	 Deus	 de	 “Haja…”	 e	 desenvolvemos	 os	 potenciais	 nelas,
continuamos	espalhando	a	fragrância	de	sua	presença	em	todo	o	mundo	que	ele
criou.
Gênesis	1	descreve	a	humanidade	não	segundo	tiranos	que	exploram	a	terra,
mas,	sim,	conforme	mordomos	que	dominam	coram	deo,	diante	da	presença	de
Deus.	A	natureza	de	nossa	relação	com	Deus	é	expressa	em	como	cuidamos	de
sua	 boa	 criação.	 E	 não	 fazemos	 isso	 meramente	 como	 indivíduos,	 mas	 como
parceiros.
Em	 Gênesis	 1,	 os	 seres	 humanos	 são	 criados	 “homem	 e	 mulher”.	 Uma
distinção	de	gênero	está	fixada	na	criação	de	modo	que	os	que	portam	a	imagem
de	Deus	são	sempre	macho	ou	fêmea,	homem	ou	mulher.	Isto	é,	sempre	estamos
em	uma	relação	uns	com	os	outros,	bem	como	numa	relação	com	Deus.	Nenhum
de	 nós	 consegue	 ser	 plenamente	 humano	 sozinho:	 sempre	 estamos	 em	 uma
variedade	de	relacionamentos.	Os	seres	humanos	são	criados	para	Deus.	Gênesis
2	se	concentra	mais	fortemente	nisso	e	nos	outros	relacionamentos	em	que	seres
humanos	 conduzem	 sua	 vida	 como	 resultado	 do	 modo	 como	 Deus	 criou	 o
mundo.	Gênesis	 2.18-25	 conta	 a	 história	 da	 criação	 divina	 de	 Eva	 como	 uma
auxiliadora	 e	 companheira	 adequada	 para	 Adão,	 ilustrando	 mais	 uma	 vez	 a
natureza	especial	do	amor	de	Deus	por	suas	criaturas.	Deus	expressa	seu	amor
provendo	o	que	é	melhor	para	as	próprias	pessoas.	O	domínio	de	Adão	sobre	a
terra	 é	 representado	 em	 sua	 nomeação	dos	 animais:	 do	mesmo	modo	que	 (em
Gênesis	1)	Deus	nomeou	a	criação	à	medida	que	a	formava,	também	aqui	Adão
tem	a	permissão	de	nomear	os	animais	que	Deus	criou.	Adão,	portanto,	tem	um
relacionamento	 com	Deus	 e	outro	 com	o	mundo	animal.	Mas	Adão	 também	é
criado	para	a	companhia	humana.	Isso	é	expresso	no	nível	mais	profundo	em	seu
relacionamento	matrimonial	com	Eva,	uma	união	cuja	intimidade	é	expressa	na
observação	de	que	esses	dois	indivíduos	se	tornam	“uma	só	carne”	(2.24).
O	chamado	de	Adão	e	Eva	para	ter	domínio	sobre	a	criação	se	manifesta	em
Gênesis	2	em	sua	responsabilidade	de	trabalhar	e	cuidar	do	jardim	(2.15).	Com
base	 na	 descrição	 fornecida	 em	Gênesis	 2.8-14,	 esse	 “jardim”	 tem	mais	 a	 ver
com	um	grande	parque	nacional	do	que	com	um	dos	jardins	de	nossa	casa.	Ele	é
imenso,	 com	 rios	que	o	percorrem	e	muitas	 árvores	 e	 animais.	Assim,	Adão	e
Eva	 são	 os	 primeiros	 agricultores	 e	 agentes	 encarregados	 de	 zelar	 pela
conservação	do	meio	ambiente.	Mais	uma	vez,	vemos	que	ser	humano	significa
se	relacionar	de	algum	modo	com	a	criação,	alguém	que	trabalha,	explora	o	seu
respectivo	 potencial	 e	 cuida	 dela.	 Os	 seres	 humanos	 são	 criados	 para	 Deus	 e
também	uns	para	os	outros	e	para	a	criação,	a	fim	de	trabalhar	nela.	Conforme
Salmos	8,	é	a	nossa	glória	trabalhar	e	assim	apresentar	a	imagem	de	Deus.
Os	 diferentes	 relacionamentos	 em	 que	 Gênesis	 1	 e	 2	 contemplam	 a
humanidade	podem	ser	mostrados	assim:
Figura	6:	Uma	compreensão	bíblica	da	humanidade
O	mundo	como	reino

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