Prévia do material em texto
1 USP - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO EESC – ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS SHS - DEPARTAMENTO DE HIDRÁULICA E SANEAMENTO PÓS-GRADUAÇÃO EM HIDRÁULICA E SANEAMENTO Disciplina Hidrologia Física – SHS 5874 Professor Responsável: Dr. Eduardo Mário Mendiondo REFLEXÕES SOBRE IMPACTOS DAS INUNDAÇÕES E PROPOSTAS DE POLÍTICAS DE PÚBLICAS MITIGADORAS Heloisa Ceccato Mendes Gerson de Marco Juliana Pontes M. Andrade Saulo Aires Souza Rodrigo F. Macedo São Carlos, Agosto de 2004 2 ÍNDICE Apresentação.................................................................................................3 Autores.............................................................................................................4 Capítulo 1 Expansão Urbana e Inundações: Histórico e Impactos Heloisa Ceccato Mendes.....................................................................................5 Capítulo 2 Alterações Climáticas e Seus Impactos Gerson de Marco...............................................................................................19 Capítulo 3 Medidas não Estruturais Juliana Pontes M. Andrade................................................................................44 Capítulo 4 Medidas Estruturais Extensivas Saulo Aires Souza.............................................................................................48 Capítulo 5 Medidas Estruturais Intensivas Rodrigo F. Macedo............................................................................................60 3 APRESENTAÇÃO O presente trabalho é produto de discussões e revisão bibliográfica realizadas na Disciplina Hidrologia Física, ministrada pelo Prof. Dr. Eduardo Mario Mendiondo pelo Programa de Pós –Graduação em Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos, da Universidade de São Paulo. No primeiro capítulo á apresentada uma abordagem histórica inundações, atentando para a maneira pela qual esse fenômeno foi compreendido e para os impactos ocasionados ao longo dos tempos, destacando a inserção da América do Sul e Brasil no panorama mundial. O segundo capítulo aborda a questão das mudanças climáticas e sua influência sobre o balanço hídrico de uma bacia de estudo, a partir da elaboração de cenários. No terceiro capítulo é abordada a importância da implementação de medidas estruturais como ferramenta para o planejamento do uso e ocupação do solo. 4 AUTORES Heloisa Ceccato Mendes – heloisacm@yahoo.com.br Mestranda, desde 2004, do PPG-SEA, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Engenharia Ambiental, Departamento de Hidráulica e Saneamento, EESC-USP, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. Arquiteta e Urbanista, graduada pela EESC-USP em 2000. Gerson de Marco – gersondm@yahoo.com.br Aluno especial no SHS, Engenheiro Civil, graduado pela Faculdades Integradas de Araraquara em 2003, pós-graduando em Engenharia de Segurança do Trabalho pela Faculdades Integradas de Araraquara. Juliana Pontes M. Andrade – jupontes@sc.usp.br Mestranda, desde 2004, do PPG-SHS, Programa de Pós-Graduação em Hidráulica e Saneamento, Departamento de Hidráulica e Saneamento, EESC-USP, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. Engenheira Civil, graduada pela UFC - Universidade Federal do Ceará em 2004. Saulo Aires de Souza – aires@sc.usp.br Mestrando, desde 2004, do PPG-SHS, Programa de Pós-Graduação em Hidráulica e Saneamento, Departamento de Hidráulica e Saneamento, EESC-USP, Escola de Engenharia de São Carlos, USP - Universidade de São Paulo. Engenheiro Civil, graduado pela UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte em 2003. Rodrigo F. Macedo - rodrigofmacedo@digizap.com.br Mestrando, desde 2004, do PPG-SHS, Programa de Pós-Graduação em Hidráulica e Saneamento, Departamento de Hidráulica e Saneamento, EESC-USP, Escola de Engenharia de São Carlos, USP - Universidade de São Paulo. Engenheiro Civil, graduado pela UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte em 2000. 5 CAPÍTULO 1 Expansão Urbana e Inundações: Histórico e Impactos Heloisa Ceccato Mendes Introdução O presente trabalho tem como objetivo estabelecer uma reflexão sobre o processo de ocupação territorial por meio da urbanização e sua relação com a ocorrência de inundações. Visando à contextualização do tema, foi realizada uma breve análise sobre o modo como as inundações foram compreendidas ao longo dos tempos, seguida pela avaliação dos impactos ocasionados em âmbito mundial, nas últimas décadas, e por uma abordagem mais específica sobre a experiência brasileira. O mesmo procedimento foi adotado com relação à questão da urbanização, partindo-se de uma primeira análise em âmbito mundial, complementado-a com uma abordagem mais específica sobre a urbanização no Brasil, atentando para possíveis influências de tal processo na ocorrência de inundações. Breve Histórico da Compreensão das Inundações A freqüente ocorrência de inundações em várias cidades de todo o mundo sinaliza para a necessidade de reflexão sobre seus processos históricos de expansão, gerando crescente impermeabilização do solo, ocupação de fundos de vale e invasão das Áreas de Proteção Permanente próximas às nascentes dos rios e córregos urbanos. Ainda que constatemos a ausência de efetiva implementação de medidas mitigadoras dos impactos gerados pelas inundações, observamos que tem sido cada vez mais difundido o entendimento de que a maneira como a ação antrópica se dá sobre o meio desempenha um importante papel neste processo. Porém, uma abordagem histórica nos mostra que tal entendimento nem sempre foi difundido. 6 Em um primeiro momento, abordaremos as inundações a partir de uma perspectiva histórica, visando à compreensão das maneiras pelas quais esse fenômeno foi interpretado ao longo dos tempos. Segundo Albrecht Hoffman (2000), o primeiro europeu a tentar explicar as inundações foi Konrad of Megenberg (1309 – 1374), no livro de sua autoria “The book of nature”, em que explicava este fenômeno como erupções de águas armazenadas no solo. Na Idade Média, as inundações eram compreendidas como fenômenos seguidos por morte e ruína. Tal pensamento teve certa extensão até o século XVI, quando as inundações eram vistas como produto de forças celestiais ou um julgamento divino. Observamos, portanto, que o entendimento das causas das inundações se modificou ao longo dos tempos. Do mesmo modo, esse processo ocorreu também com o desenvolvimento das medidas preventivas às inundações, como demonstra Frank Toensmann (2000) dividindo o desenvolvimento de tais medidas em Northern Hesse, na Alemanha, em três fases: de 1850 a 1945, de 1945 a 1980 e de 1980 a 2000. O primeiro período, de 1850 a 1945, foi marcado por obras hidráulicas nas cidades de Diemel e Eder e pelo levantamento de dados realizado na cidade de Kassel. A primeira fase se caracteriza, portanto, pelo desenvolvimento dos recursos hídricos a partir de uma visão apoiada no desenvolvimento técnico, crescente nesse período, mas sem nenhuma preocupação em estabelecer compatibilidade com o meio ou com o conceito de Desenvolvimento Sustentável 1. A segunda fase, de 1945 a 1980, foi marcada pela criação de associações e elaboração de projetos de desenvolvimento dos recursos hídricos e controle de vazões, mas poucos foram implementados. A forte ênfase nas medidas técnicas, característica da primeira fase, foi modificada com a lei ambiental de 1976, que definiu os impactos e medidas compensatórias a eles relacionados. 1 Sobre o tema, destaca-se: “ Para ser aplicado com sucesso, afirma ZHOU (1998), o desenvolvimento sustentável deve trazer a perspectiva de que um ambientesaudável é essencial para uma economia próspera. Tal enfoque encara sociedade, economia e meio ambiente como elementos essenciais de um sistema, que se suportam mutuamente (...) O desenvolvimento sustentável também afirma que os recursos do meio ambiente devem ser examinados tanto pelo seu valor atual quanto futuro, baseado nos princípios de vida dentro de parâmetros ecológicos globais de longo prazo” (ZHOU, 1998 (*) apud MONTAÑO, 2002, p.10) (*) ZHOU, C. GIS monitors our fragile Earth. In: GIS World. v.11, n. 10, Fort Collins – CO – USA, Outubro, 1998. 7 Na terceira fase, de 1980 a 2000, as questões vinculadas ao Desenvolvimento Sustentável e compatibilidade com o ambiente ganharam maior destaque, representadas na prevenção e na implantação de retenções naturais, bastante enfatizadas. Porém, esse período foi também marcado por um certo distanciamento das medidas técnicas, fato ao qual o autor faz algumas ressalvas, alertando que a eficácia de um projeto depende de uma boa mistura desses três estágios de prevenção das inundações. As Inundações no mundo e seus impactos Os principais impactos causados por inundações são as perdas materiais e humanas, interrupção de atividade econômica e social nas áreas inundadas, contaminação por doenças de veiculação hídrica (leptospirose e cólera, por exemplo), contaminação da água (pela inundação de depósitos de material tóxico e estações de tratamento, por exemplo). Além disso, um fato relevante é o de que muitas cidades brasileiras apresentam ligações clandestinas de esgoto não tratado nas redes de águas pluviais, o que ocasiona, em uma situação de inundação, contato direto da população com a água misturada ao esgoto. Segundo Gerhard Berz (2000), mais de 250 bilhões de dólares foram empregados ,nos últimos dez anos, na compensação dos danos causados por inundações. Além disso, uma comparação entre as inundações e outros riscos naturais no período de 1985 a 1999, expressa na Figura 1, indica grande expressividade desses eventos: 8 Figura 1 – Catátrofes Naturais no mundo 1985 - 1999 Fonte: Adaptado de BERZ, 2000 Tais gráficos demonstram os seguintes dados sobre as inundações: • Correspondem a cerca de um terço 29% das ocorrências de catástrofes naturais • Causam mais da metade (53%) das mortes causadas por catástrofes naturais, o correspondente a 382.085 mortes. • São responsáveis por cerca de um terço (29%) das perdas econômicas causadas às catástrofes naturais, o que corresponde a US$ 275 bilhões. • As perdas asseguradas relacionadas às inundações correspondem a apenas 10% do total de perdas asseguradas O Gráfico D da Figura 1 indica que, dos prejuízos relacionados às inundações, apenas 8% são asseguradas, o que corresponde a um valor de US$ 15,12 bilhões. Portanto, relacionando esse valor aos US$ 275 bilhões, correspondentes aos prejuízos causados por inundações no mundo entre 1985 e 1999, verificamos que somente 5,5 % das perdas econômicas causadas por inundações no mundo são asseguradas. Tal fato, associado à constatação de que o número de pessoas afetadas pelas inundações tem aumentado nos 9 últimos tempos, de acordo com a Figura 2, constitui um quadro bastante preocupante. Figura 2 – Pessoas afetadas por desastres naturais (INTERNATIONAL FLOOD NETWORK, s/d) Outro fato relevante é o de que as inundações atingem várias localidades do planeta, em maior ou menor grau, como demonstra a Figura 3: Figura 3 - Ocorrência de secas, inundações e tempestades: uma visão geográfica dos últimos 30 anos (adaptado de INTERNATIONAL STRATEGY FOR DISASTER REDUCTION; UNITED NATIONS, 2003) 10 A análise da Figura 3 indica que a América do Sul foi a terceira região do mundo com maior número de incidência de inundações entre 1973 e 2002, com registro de 240 eventos, ou seja, 11,8% do total de inundações ocorridas no mundo nesse período. Nesse período, a região com o maior registro de enchentes foi a Ásia Central, com 337 eventos, seguida pela Ásia do Sudeste, com 250 eventos), conforme a Tabela 1. Esses dados indicam a necessidade de implementação de medidas mitigadoras dos grandes impactos sociais e econômicos gerados pelas inundações em todo o mundo, assim como a necessidade de realização de levantamentos de dados que subsidiem tal processo. Tabela 1 - Número de Inundações por Região no período de 1973 a 2002 Dados: INTERNATIONAL STRATEGY FOR DISASTER REDUCTION; UNITED NATIONS, 2003, Elaboração: Heloisa Ceccato Mendes Nota: Inclui as inundações com um dos seguintes critérios: dez ou mais mortes, cem pessoas afetadas, pedido de assistência internacional Região Número de Inundações entre 1973 e 2002 Porcentagem em relação ao Número Total de Inundações no Mundo entre 1973 e 2002 América do Norte 113 5,6% América Central 100 4,9% América do Sul 240 11,8% Caribe 68 3,4% Europa do Leste 92 4,5% Europa do Norte 24 1,2% Europa do Oeste 70 3,5% Europa do Sul 73 3,6% África Central 39 1,9% África do Leste 136 6,7% África do Norte 66 3,3% África do Oeste 87 4,3% África do Sul 28 1,4% Ásia Central 337 16,6% Ásia do Leste 173 8,5% Ásia do Oeste 55 2,7% Ásia do Sudeste 250 12,3% Malásia 9 0,4% Polinésia 1 0,0% Austrália e Nova Zelândia 63 3,1% Micronésia 2 0,1% 2026 100,0% 11 As Inundações no Brasil e seus impactos Segundo a ANA (Agência Nacional de Águas), vários municípios brasileiros foram atingidos por inundações de 1998 a 1999, conforme indica a Figura 4. Nota-se uma relativa concentração nas regiões Sul e Sudeste, da qual destacamos no mapa o estado de São Paulo, que apresenta a marcação de vários municípios atingidos por inundações nesse período. As chuvas recentes de janeiro a março de 2004 ocasionaram uma série de inundações nos municípios brasileiros. Nesse período, de acordo com a Figura 5 (publicada no jornal Folha de São Paulo em 10 de maio de 2004), 1.224 municípios brasileiros foram atingidos, sendo 64 localizados no estado de São Paulo. O balanço total dos prejuízos, conforme a figura a seguir, foi de 17.510 casas destruídas, 95.523 casas danificadas e 376.987 pessoas atingidas. Figura 4- Municípios atingidos por inundações (1998-1999) Fonte: ANA - Agência Nacional de Águas 12 Segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia, as inundações causam prejuízos anuais de aproximadamente US$ 1 bilhão no Brasil (MCT/CGE, 2002). A influência da urbanização na ocorrência de inundações Segundo Carlos Tucci (2003)2, o escoamento pluvial pode produzir inundações e impactos por meio de Inundações de áreas ribeirinhas e Inundações devido à urbanização, dois processos que podem ocorrer isoladamente ou combinados. Geralmente os rios apresentam dois leitos: o leito menor, onde a água escoa a maior parte do tempo, e o leito maior, que é inundado com risco geralmente entre 1,5 e 2 anos. As inundações de áreas ribeirinhas ocorrem pelo processo natural no qual o rio escoa pelo seu leito maior, sendo uma decorrência do processo natural do ciclo hidrológico. Com a ocupação urbana do leito maior, local caracterizado como área de risco, os impactos de inundações tornam-se freqüentes. Alguns dos aspectos do processo de urbanização que podem influenciar no aumento da freqüência e magnitude das inundações são: impermeabilização do solo e aumento de escoamento por canais (produzindo aumento nas vazões máximas), desorganização na implantação da infra- 2 TUCCI, C. E. M. Águas Urbanas. In: TUCCI, C. E. M.; BERTONI, J. C. (org). Inundações urbanas na América do Sul. Porto Alegre:, Associação Brasileira de Recursos Hídricos, 2003, 471 p. Fonte: (Folha de São Paulo, 10 de maio de 2004)Fonte: (Folha de São Paulo, 10 de maio de 2004) Figura 5 - Balanço da chuva de janeiro a março de 2004 Fonte: Folha de São Paulo, 10 de maio de 2004 13 estrutura urbana (como pontesque podem obstruir o escoamento), aumento da deposição de sedimentos em função da desproteção das superfícies e deposição de resíduos sólidos (obstruindo rios e canais), ocupação urbana e impermeabilização em áreas com risco de inundação (diminuição da capacidade de infiltração nas áreas alagáveis), além do processo de formação de ilhas de calor em áreas urbanas (produzindo precipitações intensas em área urbana e agravando a situação das inundações), entre outros. O processo de urbanização no mundo Segundo Carlos Tucci e Juan Carlos Bertoni (2003), no ano 1800 somente 1% da população mundial vivia em cidades. A partir do século XVIII, a revolução industrial teve como efeito um processo mundial de urbanização muito intenso e cada vez mais acelerado. Segundo Guglielmo (1996)3 apud TUCCI; BERTONI (2003), durante a primeira metade do século XX a população total do mundo aumentou em 49% e a população urbana em 240%. Na segunda metade do século essa evolução foi ainda mais expressiva, pois a população urbana passou de 1.520 milhões de habitantes em 1974 para 1.970 milhões em 1982. A Tabela 2 demonstra o crescimento da porcentagem da população urbana no mundo de 1955 a 1995, apresentado também uma estimativa para o período entre 1995 e 2015. Tabela 2 - Evolução da População Urbana 1955 a 2015 Fonte: FNUAP apud TUCCI; BERTONI, 2003, p.2 Año 1955 1975 1995 2015 % del total 32 38 45 54 Atualmente, a população mundial é de aproximadamente 6.100 milhões de habitantes, dos quais 2.850 milhões correspondem à população urbana. Portanto, 47% da população mundial é urbana na atualidade. Se o crescimento dos últimos tempos for mantido, em pouco tempo a população urbana terá superado a população rural mundial, pela primeira vez na história. 3 GUGLIELMO, R. Les grande métropoles du monde et leur crise. Paris: A Colin, 1996, 268p. 14 Em 1950, oito aglomerações urbanas alcançavam ou ultrapassavam a população de 5 milhões de habitantes: Nova York, Londres, La Ruhr, Tókio, Sahngai, Paris, Buenos Aires e Moscou, correpondendo a 7% da população mundial naquele momento. No ano 2000, a população mundial do planeta concentrada em metrópoles com pelo menos 10 milhões de habitantes já correspondia a 15% da população mundial (UNESCO apud TUCCI; BERTONI, 2003, p.2).A tendência de crescimento urbano é liderada pela América do Sul, onde a concentração urbana nas principais cidades tem o crescimento mais alto das regiões do mundo e o maior de todos os tempos. É importante atentar para o fato de que o processo de urbanização nos países em desenvolvimento se diferencia do ocorrido nos países desenvolvidos. A Figura 6 demonstra que o crescimento da população nos países desenvolvidos praticamente se estancou desde meados de 1950, enquanto a previsão para que isso ocorra nos países em desenvolvimento é somente para o ano 2150. Segundo Guglielmo (1996)4 apud TUCCI; BERTONI (2003), na segunda metade do século XIX - ou na primeira metade do século XX, de acordo com o caso - as metrópoles dos países desenvolvidos passaram por um crescimento demográfico intenso associado à industrialização. O desenvolvimento industrial nos países em desenvolvimento foi mais intenso, pelo contrário, na segunda metade do século XX. Em 1950, das 8 grande metrópoles do mundo, 6 se situavam em países desenvolvidos (75%) e em 1990, das 35 cidades com mais de 5 milhões de habitantes do mundo, somente 12 pertencem a países 4 GUGLIELMO, R. Les grande métropoles du monde et leur crise. Paris: A Colin, 1996, 268p. (**) INDEC – Instituto Nacional de Estadística y Censos. Anuário Estadístico. Buenos Aires, 1999. Figura 6 - Crescimento da População em países Desenvolvidos e Em Desenvolvimento Fonte: Nações Unidas apud TUCCI; BERTONI, 2003, p.3 15 desenvolvidos (35%), o que demonstra como o processo de urbanização nos países em desenvolvimento foi intenso nesse período. É interessante ressaltar também que das 15 cidades mais povoadas do mundo, 4 se localizam na América Latina, sendo duas no Brasil. São elas: São Paulo, Cidade do México, Buenos Aires e Rio de Janeiro. O prognóstico é de que por volta do ano 2010 existirão 60 cidades com população superior a 5 milhões de habitantes, sendo a maioria em países em desenvolvimento. A Figura 7 demonstra que, a partir de 1975, as cidades de países desenvolvidos (Paris, Londres e Nova York) apresentaram diminuição representativa do aumento da população, enquanto as cidades de países em desenvolvimento (São Paulo e Buenos Aires) apresentaram comportamento contrário: crescimento populacional acentuado. Esse fato se deve ao próprio aumento do crescimento da população e também ao êxodo rural intenso. O processo de urbanização no Brasil As décadas de 1960 e 1970 foram caracterizadas no Brasil por um processo muito intenso de urbanização. Segundo Instituto Polis et al (2001), em 1960 a população total do Brasil era composta por 44,7% de população urbana e 55,3% de população rural. Dez anos depois essa relação se inverteu, com números quase idênticos: 55,9% de população urbana e 44,1% de população rural. Entre 1960 e 1996, a população urbana brasileira aumentou em mais do que quatro vezes, passando de 31 milhões de habitantes para 137 milhões, recebendo, portanto, 106 milhões de novos moradores nesses 36 anos. Figura 7 - Evolução da População de grandes metrópoles da Europa e da América Fonte: Adaptado de GUGLIELMO,1996 (5) ; INDEC,1999 (**) apud TUCCI; BERTONI, 2003, p.4 Anos Po pu la çã o (m ilh õe s de h ab ) Anos Po pu la çã o (m ilh õe s de h ab ) 16 Esse processo produziu uma ocupação urbana com infra-estrutura inadequada e gerou o surgimento de favelas e periferias situadas em áreas de risco. Tal processo fez com que as cidades brasileiras se caracterizassem pela existência de territórios urbanos legais e ilegais ou irregulares. Desse modo, passaram a existir no cenário urbano brasileiro a cidade legal e a cidade ilegal. “No final dos anos cinqüenta mais de sessenta por cento da população estava no campo, agora temos mais de setenta e cinco por cento da população na cidade, com muitos desterritorializados de várias partes, que constituíram as imensas periferias, favelas e as cidades precárias, irregulares e ilegais existentes em todas as localidades brasileiras”. (ROLNIK, 1995, p. 8) Segundo Carlos Tucci (2003)5, quase a totalidade das cidades da América do Sul não apresenta em seus planos diretores restrições que impeçam efetivamente o loteamento de áreas com risco de inundação, o que contribui para a exposição da população aos riscos das inundações urbanas. No entanto, é importante considerar também a dinâmica da cidade ilegal, já que nos casos em que se aplica uma restrição às áreas ribeirinhas - não permitindo o loteamento por tratar-se de uma área com risco de inundação -, ou no caso de áreas ribeirinhas pertencentes ao poder público, é freqüente a ocorrência de invasões por população de baixa renda. Desse modo, nos deparamos com um impasse bastante freqüente nas cidades brasileiras. É necessário impedindo a ocupação urbana em áreas alagáveis; porém, não se pode ignorar a existência de duas dimensões urbanas: a cidade legal e a cidade ilegal, cada uma com o seu mercado. Segundo Raquel Rolnik (1995) há uma interação entre o mercado formal e o informal: “O mercado formal, que aprova planta na prefeitura, segue a lei, etc..., é apenas um dos mercados. E quando a lei diz, o mercado formal não pode lotear até a beira do córrego (...) a beira do córrego perde valor para o mercado imobiliário formal, virando, automaticamente, reserva de terra do mercado clandestino. Onde estão todas favelas? Na beira dos córregos, ou nas áreas de maior declividade.”(ROLNIK, 1995, p. 17) 5 TUCCI, C. E. M. Águas Urbanas. In: TUCCI, C. E. M.; BERTONI, J. C. (org). Inundações urbanas na América do Sul. Porto Alegre:, Associação Brasileira de Recursos Hídricos, 2003, 471 p. 17 Além da ocupação informal das áreas alagáveis, a implantação de avenidas marginais aos rios urbanos, intervenção bastante recorrente nas cidades brasileiras, subjugou os sistemas das águas a um padrão de ocupação pré-determinado pelo homem, sem considerar sua compatibilidade com o meio, como um reflexo do pensamento positivista no processo de ocupação do território, de sobreposição do homem ao meio. O pensamento amplamente difundido no Brasil, baseado na adaptação da hidrografia ao sistema de mobilidade urbana, fez com que vários rios urbanos sofressem intervenções drásticas de retificação de seus meandros. Exemplos bastante representativos deste tipo de intervenção são as avenidas marginais aos rios Tietê e Pinheiros, em São Paulo-SP. Nesse contexto, em que as várzeas foram aproveitadas como terreno barato, foi realizada a retificação do Rio Pinheiros para a ampliação de avenidas, em 1927, retratada na Figura 8 (GUERRA, 2003). Figura 8 - Rio Pinheiros antes e depois da retificação Fonte: GUERRA, 2003, p. 32 e 33 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERZ, Gerhard. Flood Disasters: Lessons form the Past – Worries for the Future. Symposium on River Flood Defence. v2. Kassel: Herkules Verlag, 2000, p. F1-F10 FOLHA DE SÃO PAULO. FGTS atende só 6% das vítimas das cheias. São Paulo. 10 de maio de 2004 GUERRA, Abílio et al. Rios Urbanos: Workshop – Intervenção Urbanística na região do Rio Pinheiros em São Paulo. São Paulo: FAU-SP, 2003, 96 p. HOFFMAN, Albrecht. Floods and their Origin in the Medieval World of Thought. Symposium on River Flood Defence. v1. Kassel: Herkules Verlag, 2000, p.B1 – B9 INSTITUTO PÓLIS et al. Estatuto da Cidade: guia para implementação pelos municípios e cidadãos. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2001. 18 INTERNATIONAL FLOOD NETWORK. Effective Flood Management for Precious Water and Life. Tokyo: International Flood Network, s/d. INTERNATIONAL STRATEGY FOR DISASTER REDUCTION; UNITED NATIONS. Living with Risk: Turning the tide on disasters towards sustainable development - World Disaster Reduction Campaign. Geneva, 2003 MCT/CGE – Ministério de Ciência e Tecnologia / Centro de Estudos e Gestão Estratégica; Diretrizes estratégicas para o Fundo de Recursos Hídricos de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Brasília, 2002. Disponível em http://www.ana.gov.br, capturado em 11/08/2004. MONTAÑO, Marcelo. Os recursos hídricos e o zoneamento ambiental: o caso do município de São Carlos. São Carlos: EESC- USP- Depto de Hidráulica e Saneamento, Dissertação de Mestrado, 2002. ROLNIK, Raquel. Planejamento Urbano nos anos 90: novas perspectivas para velhos temas. In: SILVA, Kleber Pinto. A cidade contemporânea: tendências e conceitos. Bauru: UNESP: Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação: Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo, 1995. TOENSMANN, Frank. About the History of Flood Defence: The Northern Hesse Example. Symposium on River Flood Defence. v1. Kassel: Herkules Verlag, 2000, p.B63 – B85 TUCCI, C. E. M.; BERTONI, J. C. (org). Inundações urbanas na América do Sul. Porto Alegre:, Associação Brasileira de Recursos Hídricos, 2003, 471 p. 19 CAPÍTULO 2 Alterações Climáticas e Seus Impactos Gerson de Marco Resumo No presente artigo reúnem-se, em síntese apertada, estudos relativos às alterações climáticas globais, suas conseqüências nas precipitações pluviométricas e seus impactos e a adoção de medidas mitigadoras aos fenômenos que provocam essas alterações climáticas. O aumento de CO2 e de outros gases na atmosfera provoca o “efeito estufa”, responsável, em grande parte, pelas alterações climáticas globais, que afetam o regime das precipitações pluviométricas, aumentando-as ou diminuindo-as. Outros fenômenos, como El Niño e La Niña, também influenciam essas precipitações. Os impactos das alterações climáticas têm várias repercussões: no escoamento dos rios; no volume e disponibilidade das águas, superficiais ou subterrâneas; na qualidade das águas; na ocorrência de cheias e secas e de mudanças ambientais, e de mudanças econômicas e sociais. Entre as mais importantes medidas mitigadoras, a comunidade internacional recomenda a redução da emissão de gases “efeito estufa”, meta do Protocolo de Quioto, ainda não implantado. Introdução Há registros da ocorrência de alterações climáticas na Terra desde sempre, sendo assim um fenômeno natural. Atualmente são consideradas como um problema sério, devido ao ritmo acelerado em que acontecem. Um dos fatores que contribuíram para as mudanças climáticas foi a revolução industrial, por volta do século XVIII, quando passou-se a emitir CO2 para a atmosfera, resultante da queima dos combustíveis fósseis (carvão, petróleo, gás natural). Atualmente, as fontes de energia fóssil representam 80% 20 do consumo mundial. Segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), o homem joga cerca de 23.400 toneladas de carbono para a atmosfera por ano. Também os desflorestamentos contribuíram para um aumento de 30% na concentração atmosférica de CO2. Além do CO2, houve também grande aumento da concentração de determinados gases na atmosfera, como CH4, N2O, CFC, HFC, PFC e SF6. Estes gases também absorvem parte das radiações infravermelhas que a terra irradia para o espaço, provocando uma retenção de calor. Tal fenômeno, chamado de “efeito estufa”, é responsável por um aumento de cerca de 0,5 oC, no último século, das temperaturas médias da atmosfera terrestre. A figura 1 ilustra o aumento de CO2 na atmosfera ao longo dos anos. Figura 1. Variação da emissão de CO2. (Fonte: Santos) O CH4 apresenta um GWP (Global Warming Potential ou Potencial de Aquecimento Global) 21 vezes superior ao do CO2 e o N2O um GWP 310 vezes superior ao do CO2. Outros gases naturais que provocam o “efeito estufa” são o H2O e o O3. A temperatura global tem crescido constantemente, em decorrência do acúmulo dos gases “efeito estufa” como mostra a figura 2. 21 Figura 2. Variações da temperatura superficial da Terra nos últimos 140 anos e no último milênio. (Fonte: IPCC) Existem sumidouros naturais de CO2, que contribuem para seu equilíbrio ao absorverem este gás (como é o caso da floresta) ou ao fixarem-no ao solo (como é o caso da agricultura). Esses sumidouros assumem papel importante para a redução ou estabilização da concentração de CO2 na atmosfera (Relatório do Estado do Ambiente 1999 – Alterações Climáticas, Portugal). Também contribuem para alterações climáticas os fenômenos El Niño e La Niña. O primeiro, que é a interação atmosfera-oceano, associado a alterações dos padrões normais da temperatura da superfície do mar, assume dimensões continentais e planetárias, à medida que provoca desarranjos de toda ordem em vários climas da Terra. Cientistas, estudando as variações climáticas do planeta, descobriram que ele tem relação com o “efeito estufa”, como indicam modelos climáticos. Já o La Niña se caracteriza por ser o oposto do El Niño e pode também ser chamado de episódio frio, pois traz o aumento de chuvas em várias regiões da Terra. Fenômeno ligado à ação humana, mas de efeito mais localizado, é o chamado “ilhas de calor”, que acontece nas grandes metrópoles, onde a excessiva pavimentação e verticalização urbana provocam aquecimento do ar, fazendo-o subir e causando maior instabilidade atmosférica, com tendência para a ocorrência de temporais e granizo. A partir de 1972, registrou-se uma tendência global de alteração da temperatura média doar, com seu aquecimento, conforme demonstram pesquisas realizadas por vários países, inclusive Portugal (Relatório do Estado do Ambiente 1999 – Alterações Climáticas). 22 Conseqüências das mudanças climáticas no mundo Uma maior quantidade de energia armazenada na atmosfera, em razão do aquecimento global, implica uma intensificação do ciclo hidrológico, acarretando profundas assimetrias espaciais e temporais da precipitação nas diferentes regiões do globo. As distribuições sazonais das precipitações, ao longo dos anos hidrológicos, vêm sofrendo importantes alterações. Há locais em que, dependendo do mês, tem diminuído a precipitação, e há locais em que, dependendo do mês, está aumentando. Os ciclos poderão variar, com longos períodos de secas intensas ou grandes períodos de chuvas carregadas. Assim, havendo um maior risco de cheias nas regiões onde está projetado um aumento das precipitações, serão necessárias medidas de médio e longo prazo, incluindo ações estruturais (como construção de reservatórios e de sistemas de transporte de águas, ações reguladoras do uso do solo e de florestação) e outras não estruturais (como gestão de riscos e previsão de fenômenos climáticos extremos). As áreas onde ocorrerá esse aumento das precipitações estão nas latitudes mais elevadas, em algumas regiões equatoriais e no Sudoeste da Ásia. A diminuição das precipitações ocorrerá nas latitudes médias, em particular na região do Sul da Europa e no Mediterrâneo. O escoamento dos rios tenderá a aumentar nas latitudes elevadas e a decrescer nas latitudes médias, em algumas regiões tropicais, como por exemplo, o Brasil. Como conseqüência, haverá um agravamento da assimetria Norte-Sul no que se diz respeito aos recursos hídricos. A subida do nível médio das águas do mar é considerada como uma das potenciais conseqüências do aquecimento global, com projeção desse aumento de 9 a 88 cm, até 2100, sendo o valor mais provável da ordem de 50 cm (Santos, 2003). Outros impactos das alterações climáticas 23 Os impactos das alterações climáticas, como exposto, afetam vários domínios, mas, naquele dos recursos hídricos, certamente tais impactos serão mais significativos, quer pela relação direta da água com o clima, quer pelas disponibilidades de água condicionarem muitos setores da atividade sócio- econômica. Os impactos das alterações climáticas sobre os recursos hídricos fazem- se sentir tanto do lado da oferta, como do lado da procura de água. No que respeita à oferta, as alterações climáticas provocam uma modificação do regime de precipitações, que conduz a variações do volume e da distribuição temporal das disponibilidades de água, quer superficiais, quer subterrâneas. A estes impactos sobre a quantidade da água há que acrescentar os impactos sobre a qualidade, devidos a variações das disponibilidades de água, ao aumento da temperatura e à subida do nível médio do mar. Do lado da procura de água, são de esperar alterações nos volumes de água consumidos, sobretudo na irrigação, mas também na produção de energia, em particular devido ao aumento das necessidades de refrigeração. Os impactos das alterações poderão vir a fazer-se sentir sobre a intensidade e a freqüência de situações de cheias e de secas. Impactos das Alterações Climáticas sobre o Escoamento Uma diminuição da precipitação, acompanhada por um aumento da evapotranspiração potencial, relacionada com o aumento da temperatura, tenderá a provocar uma diminuição das disponibilidades anuais de água. As variações sazonais das alterações da temperatura e precipitação podem, no entanto, não confirmar esta tendência. Impactos sobre a qualidade da água As modificações da quantidade da água, resultantes das alterações climáticas, terão, obviamente, conseqüências indiretas sobre a qualidade da água, em virtude da modificação das condições de absorção das cargas poluentes pelos meios hídricos. Além disso, o aumento de temperatura, associado às alterações climáticas, terá também impactos diretos sobre a 24 qualidade da água, como por exemplo, diminuir o nível de saturação de oxigênio dissolvido na água ou condicionar os processos químicos e biológicos que ocorrem nos meios hídricos, influenciando nos fenômenos de eutrofização e no comportamento dos ecossistemas. Impactos sobre as águas subterrâneas Em termos gerais, parece aceitável que a recarga dos aqüíferos siga de perto as variações de precipitação relacionadas com as alterações climáticas. Mas existe alguma incerteza relativamente à forma como os aqüíferos reagirão às modificações dos regimes sazonais e interanual de precipitações. Por outro lado, os aumentos de evapotranspiração, associados a acréscimos de temperatura, podem conduzir à salinização dos solos e posterior lixiviação nos aqüíferos. Por fim, as esperadas subidas do nível do mar, associadas ao aquecimento global, são capazes de afetar os recursos hídricos subterrâneos, como resultado do fenômeno de intrusão salina costeira. Impactos sobre a procura de água As mudanças de temperatura, associadas às alterações climáticas, além de condicionarem as disponibilidades de água, podem também ter impactos sobre a procura de água. Estes impactos podem ser particularmente significativos no caso da utilização da água para a agricultura, em conseqüência da modificação da evapotranspiração e da umidade do solo. Podem também ocorrer impactos significativos sobre a procura de água para certas utilizações industriais, como no caso, por exemplo, dos sistemas de arrefecimento hidráulico, ou para determinadas utilizações domésticas e municipais, como as ligadas à alimentação humana, aos banhos, ou à rega de parques e jardins (Chunha, Oliveira e Nunes). Impactos sobre a ocorrência de cheias e secas As alterações climáticas não determinam apenas modificações dos valores médios do escoamento, mas também dos seus valores extremos, 25 provocando alterações dos regimes de cheias e secas. Em particular, podem ocorrer alterações da intensidade, duração e períodos de ocorrência das cheias e secas. Estudos evidenciam uma tendência geral para um acréscimo da precipitação na época úmida e um decréscimo da precipitação na época seca. O regime de escoamento deverá, normalmente, seguir esta tendência geral, sendo assim de se esperar uma intensificação das cheias e secas, em conseqüência das alterações climáticas. É de se esperar ainda que as inundações provocadas pelas cheias, nos trechos dos rios, nas regiões costeiras, possam ser agravadas pela subida do nível do mar, associada às alterações climáticas. Às secas alie-se o processo de desertificação, como conseqüência do aquecimento global, fatos que afetam atualmente cerca de 1/6 da população mundial, comprometendo uma superfície de cerca de 3.600 milhões de hectares, ou seja, aproximadamente 30% das zonas continentais do planeta. Impactos ambientais, econômicos e sociais Apesar da modelação da variabilidade da alteração climática ser um domínio ainda não amadurecido, são previsíveis, ainda com grandeza incerta, impactos ambientais significativos: deslocação de zonas bióticas, extinção de biodiversidades, adulteração dos recursos renováveis. Tudo isto levará a grandes impactos econômicos, devido à mudança da disponibilidade de recursos naturais, e a impactos sociais, que influenciarão na habitabilidade, nas migrações e na saúde pública. Como grande parte das espécies de árvores conhecidas são sensíveis às variações de clima, podendo sobreviver apenas dentro de uma pequena faixa de temperatura e umidade, um aquecimento de apenas 1°C poderia acabar com mais de 200 km de zonas florestais, e se o aquecimento prosseguisse tão rapidamente, florestas inteiras poderiam estar ameaçadas. Árvores de climas mais secos e quentes tornar-se-iam mais suscetíveis adoenças, insetos, como também a outros desgastes. Espécies tropicais, mais adaptadas ao novo clima, poderiam, por fim, mover-se e substituir aquelas, ainda que lentamente. 26 A agricultura também seria afetada, uma vez que as plantações, também, são sensíveis ao clima. A mudança de clima exigiria grandes mudanças nas práticas agrícolas. Apenas o ajuste dos sistemas de irrigação mundiais poderia custar aproximadamente US$ 200 bilhões. Índices mais altos de dióxido de carbono beneficiariam as plantas, acelerando o processo da fotossíntese, embora algumas espécies se adaptem melhor que outras a esse gás. Plantas daninhas poderiam prosperar em uma atmosfera rica em carbono, invadindo áreas de cultivo de alimentos e de outras plantas, destituindo-as de nutrientes. O aquecimento global favoreceria insetos que vivem em áreas quentes, que apresentam um curto tempo de vida e que podem adaptar-se e evoluir rapidamente. Pestes de insetos e parasitas patogênicos tenderiam a proliferar sob essas condições de rápido aquecimento. Acredita-se que as perdas nas safras devido aos insetos aumentariam, e que os países em médias latitudes experimentariam um influxo de doenças tropicais. As espécies animais que pudessem migrar, enfrentariam obstáculos que não existiram em mudanças climáticas anteriores. À medida que o aquecimento global progredisse, a vida selvagem poderia tornar-se "presa da civilização", em refúgios e áreas não selvagens, que já não representam hábitats apropriados. Cidades, estradas, áreas de cultivo, além de outras barreiras humanas, dificultariam o processo de migração. Para preservar a vida selvagem, seria necessário criar "corredores de migração" ou promover grandes esforços de relocação. Cenários das mudanças climáticas na América do Sul Em razão dos pesquisadores não saberem qual será o índice de emissão de gases de efeito estufa, foram apresentados vários cenários de mudanças climáticas para o nosso país. Nos modelos climáticos computacionais foi suposto que ocorrerá um aumento na temperatura de 4 a 6 oC. Análises feitas indicaram um aumento das temperaturas do ar à superfície terrestre, durante o século XX, no Brasil, compatíveis com o aquecimento global. 27 Relativamente às precipitações, não é apontada uma alteração clara, mas é observada uma mudança na variabilidade climática nas escalas interanual e interdecadal. O IPCC (Intergovernamental Painel on Climate Change) concluiu, em pesquisa realizada no ano de 2000, baseada nos resultados obtidos em 11 simulações realizadas, cobrindo o período de 1870 a 2100, que houve alterações climáticas em várias regiões do globo, incluindo a América do Sul (Carter and Hulme, 2000). E as projeções do estudo do IPCC para a América do Sul mostram, de maneira geral, aumento de temperatura, até 2080, de cerca de 1 oC (cenário B1 de baixa emissão), podendo subir para mais de 6 oC, no norte da América do Sul, e aproximadamente para 4 oC, no sul da América do Sul (cenário A2 de alta emissão), em 2080. No que se refere à precipitação, a incerteza é ainda muito grande. Figura 3. Mapa mostrando as duas regiões da América do Sul. As regiões são definidas na grade do modelo climático HadCMS. Os domínios regionais são ligeiramente diferentes para cada um dos outros modelos climáticos. (Adaptado de Carter and Hulme, 2000) 28 Figura 4. Variação da temperatura média anual, 1901-1998 (painel superior), e da precipitação anual, !901-!998 (painel inferior), no Brasil. A variação é relativa às médias do período 1961-90 (com valores médios de 25,0 oC e 1780mm, respectivamente. (Hulme, M. e Sheard, N. (1999) Cenários de Alterações Climática para o Brasil Climatic Research Unit, Reino Unido, 6pp) Para o norte da América do Sul, há simulações que apontam aumento de precipitação, enquanto outras, reduções. Isso se repete para o sul da América do Sul, embora haja uma predominância de simulações indicando aumento de precipitação. O nível de incerteza sobre as mudanças da freqüência de ocorrência de extremos climáticos é maior do que para a distribuição das precipitações pluviométricas. Todavia, espera-se que a atmosfera, em virtude do aumento da temperatura nas suas camadas mais próximas da superfície, reterá mais vapor de água, podendo provocar um aumento do ciclo hidrológico, talvez aumentando a ocorrência de situações extremas, como tempestades intensas. No entanto, apesar de razoável essa hipótese sob o ponto de vista físico, há necessidade de efetiva comprovação. 29 Figura 5. Características principais dos diagramas de espalhamento (“Scatter Plots”) das mudanças sazonais de temperatura e precipitação para os cenários de emissões SRES. Adaptado de Carter and Hulme, 2000 Figura 6. Caracterização das mudanças de temperatura anual com relação a média do período 1961-90 para o cenário B1 de baixa emissão. Mapas para as décadas de 2020 (superior), 2050 (meio) e 2080 (inferior). Os painéis à esquerda mostram as mudanças medianas a partir de resultados de 10 Modelos Climáticos Globais (MCG). Os painéis à direita mostram faixa de variação dos resultados dos diferentes MCG. Adaptado de Carter e Hulme, 2000. 30 Figura 7. Caracterização das mudanças de precipitação anual com relação a média do período 1961-90 para o cenário B1 de baixa emissão. Mapas para as décadas de 2020 (superior), 2050 (meio) e 2080 (inferior). Os painéis à esquerda mostram as mudanças medianas a partir de resultados de 10 Modelos Climáticos Globais (MCG). Os painéis à direita mostram faixa de variação dos resultados dos diferentes MCG. Adaptado de Carter e Hulme, 2000. 31 Figura 8. Caracterização das mudanças de temperatura anual com relação à média do período 1961-90 para o cenário A2 de alta emissão. Mapas para as décadas de 2020 (superior), 2050 (meio) e 2080 (inferior). Os painéis à esquerda mostram as mudanças medianas a partir de resultados de 10 Modelos Climáticos Globais (MCG). Os painéis à direita mostram a faixa de variação dos resultados dos diferentes MCG. Adaptado de Carter e Hulme, 2000. 32 Figura 9. Caracterização das mudanças de precipitação anual com relação a média do período 1961-90 para o cenário A2 de alta emissão. Mapas para as décadas de 2020 (superior), 2050 (meio) e 2080 (inferior). Os painéis à esquerda mostram as mudanças medianas a partir de resultados de 10 Modelos Climáticos Globais (MCG). Os painéis à direita mostram a faixa de variação dos resultados dos diferentes MCG. Adaptado de Carter e Hulme, 2000. Simulação através do VWP A fim de enriquecer o presente artigo, simulou-se, com os dados citados, através do VWP (Virtual Water Problem), que se constitui em um exemplo narrativo virtual, com ferramentas relacionadas à hidrologia, para fins unicamente pedagógicos. Através dos enredos criados, aproximou-se do comportamento da bacia de um rio, observando-se políticas de águas globais, problemas relacionados à bacia de um rio, enredos de água, resumos executivos, projeções com outros dados aleatórios e o ajuste com equações e outros elementos. Enunciado do VWP: PROBLEMA de ÁGUA VIRTUAL 33 Assunto: “Hidrologia Física” Autor: Prof. Dr. E. Mario Mendiondo, Univ. São Paulo, Brasil, Contatos: emm@sc.usp.br, www.shs.eesc.usp.br/pessoal/docentes/docente Um Problema de Água Virtual (VWP) é um exemplo narrativo virtual com o uso de ferramentas de hidráulica e hidrologia somente para fins pedagógicos. Um VWP permite que os estudantes e cientistas utilizem enredos de água através de enredos criados, com aproximação de bacia de rio, mas sem endossos nem compromissos para com as instituições a que pertençam. O VWP seguinte é o primeiro de umas sériesde VWPs. Suas narrativas compreendem: 1) políticas globais de água, 2) o estudo de um caso de bacia de rio relacionado ao problema, 3) a força-tarefa internacional, 4) forças motrizes, 5) enredos de água, 6) resumos executivos, 7) protocolos de intervenção adaptáveis e 8) equações, dados, etc., apresentando referências e ligações ao término da narrativa do VWP. Narrativas de Problema de Água virtuais As Nações Unidas estimulam a geração de novos projetos de uso sustentável de água em pequenas localidades. O Banco Mundial financiará Organizações Não Governamentais (ONGs) para desenvolver políticas de água, com o emprego de conhecimentos aplicáveis às megalópoles a áreas rurais. Autoridades de vários países submeteram à ONU e ao Banco Mundial a questões relativas à ocupação humana ocorrentes nas comunidades rurais. Todos estes projetos deveriam ser unificados em termos de impacto regionais (de espaço), gerenciamento sustentável (tempo) e situados em latitudes diferentes (relevância internacional). Um caso-estudo: um problema de bacia de rio Além de patrocinar a Década 2003-2012 Internacional de BAR do ‘' Program-Prediction em Bacias de Ungauged, a ONU e o Banco Mundial decidiram conceder o benefício a outras comunidades rurais, até o ano 2050. Isso atingirá uma bacia de rio de até um 20 km2 de área e sem urbanização 34 prévia. Para permitir que uma comunidade se aproxime da ONU se aproxime, o Programa de BAR recomendado Turcato como bacia de rio como um caso- estudo por VWP. Representante de um bioma tropical, no Brasil, a Bacia do Rio Turcato teve grande uso da terra no período 1950-2004, sem a adoção de práticas conservacionistas, resultando em altas taxas de erosão na bacia. Práticas conservadoras em toda bacia do rio Turcato, na tentativa mitigar as altas taxas de erosão cota mais alta do córrego, resultou na formação de encostas. Uma tarefa de força Internacional Um problema apontado por programa de BAR é a alta incerteza relacionada ao capacidade Smax de armazenamento total de água da bacia de rio. O Smax sofre mudança anuais desde 1950 a 2004 e, claro que, mudará novamente para um limiar novo até as 2050. Selecionado enredos de bacia de rio foram enfileirados de acordo com: 1) armazenamento de capacidade total variado, 2) distintas opções de projeto hidráulico até o ano 2050 e 3) com grupos de perícias de Investigadores mundiais do assunto “Hidrologia Física”, SHS-5874, de um curso pós-graduado da Escola de Engenharia o São Carlos, da Universidade o São Paulo, Brasil, com treinamento em hidrologia e hidráulica, foi selecionado, inicialmente, uma Força-tarefa Internacional para trabalhar este VWP. Cada grupo trabalhará em zonas rurais de Pejuçara, enredos discrepantes de bacia de rio. Forças motrizes em bacia de rio de zona rural Forças motrizes principais são as mudanças de uso da terra devido a ação humana em bacia de rio de zona rural. Até o ano 2050, ONGs locais estão procurando uma concentração de 25.000 (vinte cinco milhares) pessoas que vivam em zona rural. A demanda de água para setores como habitações, pequenas casas comerciais, agricultura (irrigação), micro-indústria e pecuária aparecerão. 35 Previsão de enredos de futura escassez de água mais alta neste bioma tropical limitará o potencial de uso de água para os habitantes e setores que demandam a água-demanda na comunidade rural. Um Comitê Regional de Bacia de Rio fez um relatório interno sobre Avaliação de ecossistema (www.millenniumassessment.org). Resumo executivo de enredos futuros durante ano 2050: 1. embora com avaliação incerta em valores absolutos, está seguro que propôs a urbanização e o uso da terra, que 2050 provocarão uma diminuição de 30% em Smax (2050), com relação ao Smax(2004); porém, no ano de 1950, anterior às atividades de aquecimento Smax (1950) era de ca. 50% mais alto que Smax (2004).Enredos diferentes de Tabela 1 descrevem o Smax (1950). Para fins práticos, Smax [mm] = (máximo água armazenamento volume) / (área da bacia). 2. clima mudança enredos previsão global um aumento em temperatura nesta região até as 2050. Este aumento de temperatura produzirá o mesmo incremento para temperaturas mensais do ano 2050 comparado com as temperaturas mensais do ano 2004. Esta mudança de clima vai produzir uma mudança no regime de evapotranspiração e precipitação pelo ano; por conseguinte, o regime de déficits de água e excessos de água diferirá entre enredos. Mensalmente, temperaturas no ano de 1950 eram aproximadamente - 1,0 o C em comparação a valores mensais em 2004. Nota: a temperatura muda em valores absolutos é o mesmo durante todos os meses pelo ano. 3. estudos previdentes apontaram que a pressão de vapor de água (ea) em ano 2050 vá permanecer aproximadamente igual, comparado com valores de ea mensais em 1950 e 2004 (Tabela 2). 4. porém, a temperatura é diferente, respectivamente no período 1950- 2004 e 2004-2050, afetando e afetará o limiar físico de condensação de vapor de água da atmosfera do habitante da bacia. É assim porque a pressão de vapor de água saturada (eas), o máximo valor de pressão de água a uma determinada temperatura, é uma função de temperatura ambiente. Em resumo, temperaturas de orvalho-ponto mensais serão diferentes em 2050 em relação aos anos 1950 e 2004, de acordo com os enredos apontados na Tabela 1. 5. devido a mudança do clima (temperatura), a umidade relativa RH (% = ea / eas · 100) é diferente para todos os meses dos anos 1950, 2004 e 2050. 36 6. de acordo com valores diferentes de T, eas e RH nos anos 1950, 2004 e 2050, também, padrões de precipitação mudam de 1950 a 2004 e de 2004 a 2050 durante todos os meses. Poderiam ser avaliadas mudanças de uma relação física de RH mensal (%) com a precipitação mensal P (mm), computada em 2004, e válida para 1950 e 2050. Computações exatas são esboçadas na seção “Equações.” 7. evapotranspiração potencial mensal (ETp) durante anos 1950, não será a mesma de 2004 e 2050, porque ela depende da temperatura. Assim ETp é calculado através de procedimentos comuns, usando a fórmula de Thornthwaite, da qual é função latitude, temperatura e coeficientes locais. 8. até ano 2050, retiradas de água mensais (Dem) para consumo de vários setores vão aparecer e afetar o equilíbrio hidrológico na bacia de rio. Estimativas preliminares calcularam um total de 250 litros / (capita.dia). Porém, há uma incerteza alta desta estimativa devido a conflitos de água entre o uso de água nesses setores que esperaram acontecer em 2050. É divergente retiradas de água são propostas de acordo com enredos da Tabela 1. A retirada de água selecionada será constante durante todos os meses em 2050. Esta retirada de água é desprezível em ano 1950 e 2004, respectivamente. A Aplicação do VWP O VWP considera resultados relacionados ao armazenamento de água, como também a possível escassez hídrica em bacia e como pode isto refletir nas populações no que se relaciona às necessidades de consumo, determinando projetos de sustentabilidade da disponibilidade de água. Os resultados de VWP comportam alterações, de conformidade com as mudanças climáticas que alimentarem seus dados informativos. Utilizou-se na simulação, através do VWP, dados atuais relativos à temperatura, à área da bacia (20 km2), ao Smáx (volume máximo de armazenamento de água dividido pela área da bacia), à ea (pressão de vapor de água), à eas (pressão de vapor de água saturada) e à P (precipitação), e, considerou-se a elevação global de 0,5 oC no último século, diminuindo-se esse aumento para projeção no ano de 1900; e a projeção para o sul da 37 América do Sul, em 2080, pressupõe um aumento de 4 oC, em cenário de alta emissão. Concluiu-se, em comparação com as temperaturas mensais do ano de 2004, que a mudança do climavai produzir uma alteração do regime de evapotranspiração e precipitação em 2080 e, em conseqüência, o regime de déficits e excessos de água diferirá, conforme se vê nas figuras 10, 11, e 12, que evidenciam aumento da evaporação nos períodos 1900-2004 e 2004-2080, enquanto que a precipitação diminui nesses mesmos períodos. A pressão de vapor de água (ea), em 2080, permaneceria igual aos valores da ea referente aos meses de 1900 e de 2004, porém haveria diferença de temperatura nos períodos 1900-2004 e 2004-2080, afetando o limite físico de condensação de vapor de água, na atmosfera da bacia. A ETR (evapotranspiração real) sofreria pouca variação nos período de 1900-2004, com tendência à diminuição no período entre 2004-2080. Em resumo, as temperaturas seriam diferentes em 2080 em relação ao período 1900-2004, de acordo com a simulação realizada. Devido à mudança do clima, a umidade relativa (RH) será diferente em todos os meses dos anos de 1900, 2004 e 2080. Também, de acordo com os valores diferentes de T, eas e RH nos anos de 1900, 2004 e 2080. A simulação realizada consta das tabelas 1, 2 e 3. Observando-se as figuras 10,11 e 12 e as tabelas anexas, pode-se concluir que o excesso da disponibilidade de água, no período 1900-2004 apresenta uma pequena diferença entre seus valores anuais, sendo a somatória correspondente ao ano de 1900 maior, enquanto que o déficit desse mesmo período cresce em 2004 aproximadamente dez vezes mais do que era no ano de 1900. Comparando-se os valores correspondentes aos excessos de água no período 2004-2080, fica bem claro que, se em 2004 havia excesso na somatória anual, já em 2080 a disponibilidade cai para zero, de forma que se pode afirmar, que haverá um comprometimento da reservação de água da bacia. O déficit de água nesse mesmo período sofrerá uma alteração assustadoramente elevada, tendo em vista que, se observado o ano de 2004, o valor é relativamente baixo. Essas mudanças significativas no excesso e no déficit de água provocarão sérias conseqüências para o consumo para a população, o exercício de atividades industriais, agropecuárias, e de outras que 38 dependem da água dessa bacia. Para amenizar o problema, deverão ser adotadas providências eficazes, entre elas, melhor aproveitamento das águas pluviais, através da reservação, o uso racional da água disponível e o reaproveitamento de águas servidas. O excedente hídrico acumulado no ano de 1900 correspondia a um ativo de US$ 14.599.096,73, enquanto o déficit era de US$ 590.963,53, havendo portanto um balanço positivo. No ano de 2004, o excedente hídrico indica um ativo de US$ 14.104.641,33, aproximadamente igual ao de 1900, enquanto que o déficit representa um passivo de US$ 6.017.420,03, aproximadamente 10 vezes maior que o de 1900. Em 2080, sendo a disponibilidade de água equivalente a zero, também o ativo será de US$ 0, enquanto que o passivo será de US$ 59.375.513,07. Comparando-se os resultados do VWP para o ano de 2080, mencionado no trabalho, em que se registra aumento de 4 oC em relação a 2004, com os dados obtidos para 2050, em que se verifica aumento de 2 oC, também em relação a 2004, conclui-se: 1 - A ETP (Evapotranspiração Potencial) em 2080 será ligeiramente maior que em 2050, em razão do aumento da temperatura; 2 - A precipitação em 2050 será maior do que em 2080; 3 - A ETR (Evapotranspiração Real) em 2050 será maior do que em 2080; 4 - Não haverá excesso de recurso hídrico em 2050 e em 2080, pois que,em ambos, os anos equivalerá a zero; 5 - O déficit hídrico em 2080 será maior que em 2050, importando, assim, em prejuízos maiores de natureza econômica e financeira, além de outros decorrentes da demanda pela água. 39 Simulação VWP (2004) 0 50 100 150 200 250 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Tempo V ar iá ve is ETP (mm) P (mm) ETR (mm) Excess (mm) Deficit (mm) Figura 10. Simulação VWP das variáveis apresentadas na figura em relação ao tempo, referente ao ano de 2004. Sumulação WWP (1900) 0 50 100 150 200 250 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Tempo Va riá ve is ETP (mm) P (mm) ETR (mm) Excess (mm) Deficit (mm) Figura 11. Simulação VWP das variáveis apresentadas na figura em relação ao tempo, referente ao ano de 1900. 40 Simulação VWP (2080) 0 50 100 150 200 250 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Tempo Va riá ve is ETP (mm) P (mm) ETR (mm) Excess (mm) Deficit (mm) Figura 12. Simulação VWP das variáveis apresentadas na figura em relação ao tempo, referente ao ano de 2080. Simulação VWP 2050 0 50 100 150 200 250 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Tempo Va riá ve is ETP (mm) P (mm) ETR (mm) Excess (mm) Deficit (mm) Figura 13. Simulação VWP das variáveis apresentadas na figura em relação ao tempo, referente ao ano de 2050. Conclusões e Recomendações A maior parte dos esforços internacionais tem se dirigido a políticas de mitigação e redução de gases de “efeito estufa”. Uma das que têm alta prioridade é a busca de alternativas às fontes fósseis, que são limitadas, diferentemente das energias renováveis (hidreletricidade, energia eólica, fotovoltaica, geotérmica e biomassa usada com tecnologia moderna), muito menos poluentes e que são, sob vários pontos, superiores às fontes 41 convencionais. As fontes renováveis representam hoje, no seu conjunto, 5% do total mundial, e são elas que precisam crescer, reduzindo a participação da energia fóssil. O Brasil tem extraordinário programa de energias renováveis (hidrelétricas, biomassa, Proinfa e outros). Contudo, alguns cientistas começam a sugerir uma estratégia de adaptação às alterações climáticas, uma vez que, mesmo com a redução das emissões de gases de “efeito estufa”, não haverá maior diminuição dos efeitos nefastos provocados, pois, tanto os países em desenvolvimento, como os desenvolvidos, não atuam no sentido da redução e ainda, em razão da inércia do próprio sistema climático, que provocará sempre alterações climáticas, ainda que haja grande redução num futuro próximo. Outros cientistas sugerem que os países desenvolvidos que se mostram resistentes, como os Estados Unidos e a Rússia, devem tornar-se mais flexíveis, para que entre em vigor o Protocolo de Quioto, que visa a sucessivas reduções de emissões de GEE (Gases de “Efeito Estufa”). Medida de grande efeito é a compensação das emissões de gases através do reflorestamento. Entretanto, mais econômico é diminuir o desmatamento, o que também é mais correto sob o ponto de vista ecológico. A alteração do clima está aí. Ainda há os que não acreditam, mas, ou têm motivos escondidos, ou então são uma minoria pouco significante. Fomos nós que a provocamos: conclusão controvertida, mas cada vez com mais adeptos. O efeito estufa não é a única alteração, nem talvez a mais importante, porque não conhecemos tudo, mas sabemos que a estrutura de transferência energética é complexa, muito complexa para que a percebermos por enquanto. Temos de agir, se quisermos que não seja “o fim do mundo, tal como o conhecemos”. Embora os impactos das alterações climáticas sobre os recursos hídricos não sejam ainda completa e rigorosamente conhecidos, já existe um elevado grau de confiança sobre algumas tendências que deverão implicar alterações nas estratégias de gestão da água. É por isso fundamental que se prepare para estas alterações, a par com a continuidade dos esforços de investigação nesta matéria. Além disso, é necessário reconhecer a importância 42 da avaliação dos impactos das alterações climáticas sobre os recursos hídricos das bacias hidrográficas e procurar avaliar devidamente esses impactos. O planejamento e a gestão dos recursos hídricos sempre exigiu uma capacidade de previsão e a adoção de políticas adequadas à incerteza e variabilidade do regime hidrológico. Esse sistema tradicional de planejamento e gestãoestá bem preparado para adaptar as suas metodologias e técnicas à necessidade de ter em conta os impactos das alterações climáticas. Mas mudança conceitual que é necessário introduzir diz respeito a descartar a hipótese tradicional da engenharia que o registro hídrico é um bom indicador das futuras condições climáticas. Os agentes de planejamento e gestão dos recursos hídricos têm que começar a entender as mudanças climáticas como uma das variáveis a considerar, acarretando incertezas adicionais sobre a oferta e procura de água. Se, por um lado, as alterações climáticas não impõem alterações profundas na filosofia de gestão dos recursos hídricos, o certo é que é bastante provável que venham acentuar o desafio permanente que é gerir a água. A previsível diminuição das disponibilidades hídricas e o aumento da sua assimetria sazonal e espacial, acompanhada pela degradação da qualidade da água, o aumento de sua procura e o agravamento dos problemas das cheias, reflete na importância da existência de políticas de planejamento e gestão das águas estabelecidas no profundo conhecimento dos recursos hídricos, que explorem a complementaridade dos recursos superficiais e subterrâneas, e a necessidade de criteriosa gestão e utilização da água, incluindo ações estruturais, tais como a construção de reservatórios e sistemas de transporte de água, ações reguladoras do uso dos solos, de florestação, de gestão de riscos e de previsão de fenômenos climáticos extremos. Referências Bibliográficas CORSON, W.H., Manual Global de Ecologia, Augustus Editora (1996), 2a ed, São Paulo - http://quimica.fe.usp.br/global/ca4/estima.htm CUNHA, L.V.; OLIVEIRA, R.; NUNES, V.B. (2003) Impactos das Alterações Climáticas sobre os Recursos Hídricos de Portugal, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 13pp. 43 DESSAI, S.; TRIGO, R. (1999) Ciências das Alterações Climáticas, School of Environmental Sciences, University of East Anglia, Norwich, 13pp. DIREÇÃO GERAL DO AMBIENTE (DGA)-GOVERNO DE PORTUGAL, Relatório do Estado do Ambiente 1999, Alterações Climáticas, Portugal - www.iambiente.pt/rea99/docs/21altclim.pdf MENDIONDO, E.M. (2004) Virtual Water Problem Reloaded, 12pp- http://www.shs.eesc.usp.br/laboratorios/hidraulica/ NOBRE, C.A. (2002) Mudanças climáticas globais: possíveis impactos nos ecossistemas do país, 20pp., Revistas Parcerias Estratégicas– Ministério da Ciência e Tecnologia Brasil, www.mct.gov.br/CEE/revista/ Parcerias12/13 CarlosNobre.pdf PEIXOTO, J.P.; ABRAHAM, H.O. (1991) Physics of Climate, American Institute of Physics, New York, 52Opp. RINO, B.L. (1998) A alteração do clima pelo homem, Universidade de Coimbra, 8pp. SANTOS, F.D. (2003) Água e Alterações Climáticas, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Lisboa, 24pp. TUCCI, C.E.M., CLARKE, R.T, COLLISHONN, W., SILVEIRA, A., VILLANUEVA, A., (2004) Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://www.iph.ufrgs.br/pesquisa/climaerechidricos/conceitos/default.htm WMO (1995) Climatic Change, Technical Note N° 79, WMO-N° 195.TP100, 79pp 44 CAPÍTULO 3 Medidas não-estruturais Juliana Pontes M. Andrade Introdução A exposição de uma comunidade ou empreendimento ao risco de enchente é uma combinação de dois fatores: a probabilidade de ocorrência de enchentes na área e a vulnerabilidade da área a conseqüências indesejáveis e perdas econômicas causadas pelas enchentes. (Samuels, 2000) Deste modo, pode-se combater as enchentes em duas frentes: uma que atue na diminuição da ocorrência (medidas estruturais) e outra que busque a redução das perdas (não estruturais). Dentre as medidas não estruturais, podem ser citadas: - zoneamento das áreas de risco; - planejamento do uso do solo; - sistemas de previsão e alerta; - seguro contra enchentes; - evacuação temporária da área da várzea; - aumento da capacidade de escoamento do canal; - controle da erosão e reflorestamento. Neste capítulo, apenas as duas primeiras medidas serão abordadas. Zoneamento Segundo Schubart (1999), ”zoneamento envolve o resultado de um processo político-administrativo, em que o conhecimento técnico, ao lado de outros critérios, é utilizado para fundamentar a adoção de diretrizes e normas legais, visando atingir objetivos socialmente negociados, que implicam em um conjunto de sanções ou incentivos sociais que restringem o uso de recursos e a ocupação do território”. Tomando esse conceito para o âmbito de ações de combate a enchentes, pode-se dizer que o zoneamento das áreas de risco consiste 45 delimitar áreas associadas a enchentes com diferentes períodos de retorno (conhecimento técnico). A determinação dos limites destas áreas, no entanto, é função do grau de risco que se assume como aceitável em cada uma delas (processo político-adminsitrativo). Assim, tem-se o conhecimento do grau de susceptibilidade de cada zona permitindo a elaboração do planejamento de sua ocupação (diretrizes e normas legais). Tucci (2002) considera a divisão em três faixas decrescentes de riscos: zona de passagem da enchente, zona com restrições e zona de baixo risco. A zona de passagem tem alto risco de inundação, portanto deveria ser proibido qualquer tipo de construção nestas áreas. No entanto, em muitos casos, essas áreas já se encontram ocupadas principalmente por populações de baixa renda através de invasões. O que se pode fazer é um remanejamento desta população para áreas mais seguras, devendo-se também garantir uma forma de não ocupação das áreas ribeirinhas. Menescal et al (2001) propõe que entre as áreas de inundação e os limites da planície poderiam ser ocupadas por parques; áreas de esportes; áreas de preservação; vias de transporte que possam ser fechadas temporariamente; construções com estruturas abertas para suportar as inundações. Na zona com restrições seriam permitidas construções que levem em consideração a possível ocorrência de enchentes. Para isso seria redigido um código de obras para a regulamentação dessas construções. Já na zona de baixo risco, maiores precauções podem ser dispensadas. É necessário no entanto que a população seja orientada de como proceder no caso de uma enchente. Como toda ação de caráter restritivo, o zoneamento só se torna efetivamente útil quando acompanhado de uma fiscalização. Tendo em vista que a população poderá retornar à área nos períodos de estiagem e, sendo os custos de construção na zona com restrições mais elevados, as construtoras poderão tender à desobediência de algumas imposições. Planejamento do uso e ocupação do solo O zoneamento determina quais áreas podem ser ocupadas, já o planejamento do uso e ocupação diz respeito a como essas áreas devem ser ocupadas. 46 Uma das principais preocupações é com a impermeabilização do solo. Um percentual mínimo de área permeável deve ser mantido para proporcionar a infiltração e dificultar o escoamento superficial. O Código de Obras da capital paulista estipula em 15% a área do terreno que deve ficar permeável (Campanili 2003). Segundo a mesma autora, há ainda uma lei municipal que obriga terrenos com mais de 500 m² de área construída ou cobertura impermeável (incluindo estacionamentos), a deixar pelo menos 30% de sua área com piso drenante ou construir reservatórios temporários de água pluvial, chamados de piscininhas. Nem mesmo as calçadas ficaram livres das restrições, outra lei prevê que as calçadas, em projetos ou reformas deverão ter uma faixa de grama ou pedregulho para melhorar a absorção das águas pluviais. Assim como estas, existem inúmeras outras leis em diversas cidades brasileiras, no entanto o seu cumprimento não é verificado em sua maioria. Medidas Não Estruturais x Medidas Estruturais As medidas não estruturais, geralmente, possuem custos menores quando comparadas com as estruturais.E seus resultados se apresentam em um prazo mais curto que os das outras. De acordo com a Constituição Federal, as ações de combate a enchentes são de responsabilidade da União (TUCCI et al, 2000). Porém, algumas das medidas não estruturais são realizadas pelo poder municipal. As leis de uso e ocupação do solo, restringindo a área a ser construída e seu máximo grau de impermeabilização, e os planos diretores exemplificam a ação dos municípios. Como o município tem verba bastante inferior às dos Estados, e muito menores ainda em comparação à da União, o poder municipal tem mais possibilidade de adotar medidas não estruturais. Pois estas carecem de menores montantes para serem implementadas. Entretanto, no âmbito político dá-se preferência pelas medidas estruturais, pois estas são mais facilmente perceptíveis pela população. 47 Referências Bibliográficas Campanili, M. (2003) Cidades x enchentes: uma guerra pelo uso do solo. http://www.estadao.com.br/ciencia/noticias/2003/mar/09/89.htm, acessado em 18 de abril de 2004 Menescal, R. A., Figueredo, N. N., Franco, S. R. (2001) A Problemática das Enchentes na Região Metropolitana de Fortaleza. In: Anais eletrônicos do XIV Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, Aracaju, 25-29/11/2001. Samuels, P.G. (2000) An Overview of Flood Estimation and Flood Prevention, In: F. Toensmann & M. Koch (eds.) River flood defence, Herkules Vg, Kassel, Alemanha, v.2, pp.G1 – G9 (Kassel Reports of Hydraulic Eng. No. 9/2000). Schubart, H. O. R.(1999) Zoneamento Ecológico-Econômico e a Gestão dos Recursos Hídricos In: Interfaces da Gestão de Recursos Hídricos: Desafios da Lei de Águas de 1997. Parte 3: Gestão dos Recursos Hídricos e Gestão do Uso do Solo. Tucci, C.E.M. (2002) Controle de Enchentes, In: Tucci, C. E. M. (org): Hidrologia: Ciência e Aplicação, 3ª ed., Editora da Universidade, 621-652. 48 CAPÍTULO 4 4 Medidas Estruturais Extensivas Saulo Aires Souza Introdução As medidas estruturais são obras da engenharia hidráulica implementadas para mitigar os impactos causados pelas enchentes, podem ser extensivas ou intensivas. Segundo Tucci (1993), As extensivas são as medidas que agem na bacia, modificando as relações entre precipitação e vazão, fazendo com que através de medidas físicas diretas na bacia possa reduzir o coeficiente de escoamento e diminuir os efeitos da erosão e como conseqüência a diminuição dos riscos de enchente, Tucci (1993) também menciona que essas medidas extensivas são na maioria das vezes inviável para bacias médias e grandes sendo geralmente aplicável para pequenas bacias. Como medidas extensivas podem ser citados vários tipos de exemplos, como: o controle da cobertura vegetal, obras de microdrenagem, obras (dispositivos) que aumentem a capacidade de infiltração e de percolação (pavimentos permeáveis, valos de infiltração, bacias de percolação, dispositivos hidráulicos permeáveis e etc.), armazenamento (telhados) e o controle da erosão do solo (obras que englobam todas as mencionadas acima). Medidas Estruturais Extensivas de Controle da Cobertura Vegetal A implementação de políticas públicas no tocante ao aumento da cobertura vegetal (reflorestamento) na bacia reside na questão econômica, pois o reflorestamento de bacias envolve um custo significativo. É importante fazer um planejamento integrado com a população para que haja uma diminuição substancial dos custos e viabilizando a medida ao longo da bacia. A vegetação exerce várias funções nas áreas das bacias, entre as quais se destaca a de interceptação de parte da precipitação. Ela retém água principalmente nas copas arbóreas e arbustivas, dando tempo para efetivação do processo de evapotranspiração. A capacidade de interceptação está relacionada às 49 características da cobertura vegetal, como tipo, forma e densidade, e é inversa ao volume e duração das chuvas - quanto mais intensas e/ou mais longas as chuvas, menor a capacidade relativa de interceptação. Quanto menor a cobertura vegetal, menor a infiltração e maior volume de água irá escorrer superficialmente, ocasionando erosão, destruindo e desagregando o solo, enchendo os cursos d’água de detritos que irão impedir ou dificultar seu escoamento. Quando o terreno encontra-se revestido por cimento, pedra ou asfalto, o escoamento superficial é praticamente inevitável, não há infiltração. A força destrutiva da água é aumentada e uma rede eficaz de esgotos e tubulações subterrâneas são indispensáveis. Como foi dito acima, o aumento da cobertura vegetal (reflorestamento) na bacia é uma medida muito dispendiosa e muitas vezes inviável, principalmente para bacias médias e grandes, é aplicável para pequenas bacias onde contribui sensivelmente na diminuição das vazões máximas amortecendo o escoamento, aumentando a permeabilidade do solo, pois mantém a cobertura natural do solo, aumentando a capacidade de infiltração do solo na qual parte da água que infiltra é transferida para atmosfera por transpiração dos vegetais, evita que nessas áreas faça-se uso e ocupação indevida do solo e reduz a erosão do solo, propiciando a diminuição da freqüência de cheias pequenas e médias. Diante das vantagens mencionadas acima, se nota a importância da implementação do reflorestamento como forma de políticas públicas voltadas para enchentes. Já existem vários projetos sendo implementados na América do Sul e no Brasil, pode-se destacar o projeto que está sendo desenvolvido no Rio de Janeiro que é o projeto Mutirão Reflorestamento na qual os objetivos principais do projeto são a recomposição da cobertura florestal do município e a ampliação da oferta de trabalho em comunidades de baixa renda (SMAC, 1999). Dentre os objetivos específicos estão a promoção da estabilidade do solo, garantindo maior segurança a população; prevenção da obstrução da rede de drenagem e o assoreamento dos canais, reduzindo a ocorrência de enchentes; limitação da expansão da comunidade sobre área de risco ou de proteção ambiental, e recuperação do ecossistema da floresta atlântica 50 revertendo o processo de perda de cobertura vegetal. Até janeiro de 2001, o projeto reflorestou uma área de aproximadamente, 1200 hectares, totalizando 2,6 milhões de mudas plantadas, atendendo a mais de 70 comunidades, com uma população estimada de 150.000 mil pessoas. Cerca de 500 pessoas trabalham no projeto em regime de mutirão remunerado. No entanto, cerca 1300 pessoas são diretamente dependentes da remuneração oferecida aos integrantes do projeto. Apesar do caráter temporário do trabalho, essa remuneração, é a única fonte de renda para cerca de 40 % das famílias. A mão de obra empregada no projeto pertence a uma faixa da população economicamente ativa desempregada, principalmente do setor da construção civil, com idade média de 29 anos. A política de reflorestamento ilustrada é um exemplo de resposta governamental que atua principalmente sobre o estado/impactos no meio ambiente (áreas vulneráveis a desastres provocados por ação antrópica – enchentes e escorregamento). Este projeto, apesar de apresentar resultados positivos quantos às áreas reflorestadas, não é suficiente para atuar na pressão “redução da cobertura vegetal” – que corresponde a diminuição de 6.400 hectares no período entre 1984 e 1989 -, nem na fiscalização e controle da ocupação urbana. Medidas Estruturais Extensivas de Controle da Erosão O controle da erosão do solo é uma das principais medidas extensivas, principalmente em áreas urbanas já que os principais problemas de inundações nas regiões metropolitanas estão no tocante á problemas com erosão do solo que causa o assoreamento dos rios. As autoridades responsáveis pelas políticas públicas devem ter mente a necessidade de planejar e projetar obras de controle a erosão que resultem em uma solução racional e definitiva para o problema, sendo