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duas superpotências, resultando nos primeiros entendi mentos para a limitação de armamentos Esse clima perdurou até o início da década de 1960, embora acompanhado por claras manifestações de que a rivalidade não havia sido superada, estando apenas em um momento menos agudo. Prova disso é a disputa tecnológica entre as duas superpotências, que teve na corrida espacial sua grande vitrine Nesse setor, a primeira grande vitória foi da União Soviética, que colocou o primeiro satélite espacial, o Sputnik, em órbita ao redor do planeta, em 1957, e realizou o primeiro voo espacial tripulado, em 1961, com Yuri Gagarin Fig. 15 O satélite Sputnik. Entretanto, os soviéticos viam-se às voltas com con- testações ao seu poderio dentro de seu próprio bloco. Um exemplo foi a Iugoslávia, sob o governo de Josip Broz (Tito). O país, embora comunista, recusara-se a aderir ao Pacto de Varsóvia e a aceitar a tutela soviética. Na Hungria, em 1956, assumiu o poder Imre Nagy. Questionando a submissão do país à União Soviética, Nagy defendia a retirada da Hungria do Pacto de Varsóvia e a adoção de uma política econômica mais aberta, que resultasse em maior produção de bens de consumo e na melhoria das condições materiais de vida da população. Em novembro de 1956, tropas do Pacto de Varsóvia invadiram a Hungria, promovendo um massacre que resultou na morte de centenas de húngaros. Imre Nagy foi derrubado, tendo sido colocado no poder Janos Kadar, reconduzindo-se, assim, a Hungria à órbita soviética. Fig. 16 Tanque soviético em Budapeste, Hungria, em 1956, e a população mos- trando resistência à intervenção. A descolonização afro-asiática Um dos efeitos mais claros do final da Segunda Guerra Mundial e do advento da Guerra Fria foi o processo de descolonização da África e da Ásia Entre 1950 e 1960, mais de quarenta países desses continentes conseguiram a independência em função do crescimento das ideias na- cionalistas, do enfraquecimento da França e da Inglaterra, até então as principais potências coloniais, e também do apoio da União Soviética, que via nesses novos países independentes um espaço de crescimento internacional. Esse grande movimento de ideias anti-imperialis- tas integrava também líderes africanos, como Léopold Senghor, Aimé Césaire e David Dion, que tinham lançado um movimento de ideias conhecido como negritude, o qual proclamava a consciência do “eu negro”. Joseph Ki Zer bo, historiador da República de Alto Volta, afirma: “um dos aspectos fundamentais da negritude é a afirmação de si, após a longa noite de alienação, como aquele que sai de um pesadelo e apalpa o corpo todo para se reconhecer a si próprio, como o prisioneiro libertado que exclama bem alto: ‘estou livre!’, embora ninguém lhe pergunte nada.” Sob a iniciativa do estadunidense William Edward Du Bois e do advogado de Trindade e Tobago Henry Sylvester Williams, o pan africanismo promoveu uma campanha pela unidade e pela autonomia da África, a qual, apesar de muito criti- cada, preparou o terreno para a eclosão do nacionalismo negro. A independência de tais países foi conduzida nos moldes ocidentais: por uma elite modernista, educada nas universidades europeias, e por meio da formação de par- tidos políticos. Sendo assim, o nacionalismo veiculado por esses partidos não representava as aspirações de um povo oprimido e humilhado. Os processos de independência se deram de várias formas Em alguns casos, a independência foi negociada com as antigas metrópoles, as quais, sob o risco de verem sua influência totalmente eliminada nesses países, opta- ram por conceder o poder às elites locais. Outra forma foi a guerra aberta, na qual as colônias tiveram necessaria- mente que buscar apoio militar internacional contra suas metrópoles. Na maioria dos casos em que a independência foi obtida por meio de uma guerra, essas novas nações independentes tiveram na União Soviética uma aliada ou ao menos uma referência, adotando regimes socialistas. A independência dessas nações gerou profundas trans- formações na ordem internacional Era um grupo imenso de países recém-independentes, com todas as resistências possíveis ao colonialismo e à dependência internacional, resultantes de sua própria história. Assim, a supremacia dos Estados Unidos e da União Soviética foi colocada em xeque pela postura de boa parte desses países buscar uma solução que não passasse pela tutela de qualquer superpotência. Essa postura cristalizou-se na Conferência de Bandung, na Indonésia, em 1955, na qual vinte e nove nações recém independentes reuniram se para debater seus problemas gerais Essa conferência foi pautada pelo anticolonialismo e pelo combate ao racismo e ao Imperialis mo Econômico, firmando um novo conceito na geopolítica mundial: o Terceiro Mundo, composto de nações pobres N A T IO N A L S P A C E S C IE N C E D A T A C E N T E R N A S A S h u tt e rs to c k F R E N T E 2 127 que não se alinhavam ao lado soviético ou aos Estados Uni dos. É interessante frisar que, nessa conferência, estiveram ausentes não apenas as superpotências, mas também na- ções europeias e mesmo da América Latina, a qual, mesmo sendo uma região pobre, estava sob direta influência do capitalismo estadunidense. Fig 17 Reunião na Conferência de Bandung, em 1955 Embora não tenha apresentado uma proposta concreta para eliminar as mazelas do chamado Terceiro Mundo (a dependência econômica, o subdesenvolvimento e a po- breza), a Conferência de Bandung era um sintoma claro de uma nova realidade mundial, marcada pela emergência de países com sérias contradições internas, que o conflito entre Estados Unidos e União Soviética não seria capaz de resolver. Seria inviável analisar todos os movimentos de inde- pendência que assinalaram o pós-Segunda Guerra Mundial. Assim, limitaremos nossa análise aos principais desses mo- vimentos, levando-se em consideração sobretudo o quanto eles alteraram a ordem mundial. Índia Desde o século XIX, a Índia era um palco de reações contra o domínio colonial inglês Às ações inglesas no sen- tido de ampliar sua presença na região, inclusive coroando a Rainha Vitória como imperatriz da Índia, correspondeu um sentimento antibritânico crescente, que levou à fundação do Partido do Congresso (ou Congresso Nacional Indiano), em 1885. Entretanto, nesse momento, as divergências étnicas e religiosas entre a população indiana, que iriam impe dir a unidade do país após a independência, já se faziam presentes. Considerando que o Partido do Congresso representava a maioria hindu da população, em 1906, foi fundada a Liga Muçulmana, que representava a população islâmica. Já nesse momento destacava-se a figura de Mahatma Gandhi. Direcionando sua luta a partir do que ele chamava de não violência e de desobediência civil, Gandhi passou a liderar um boicote aos manufaturados ingleses, defendendo o uso, pela população, de tecidos rústicos de fabricação in diana, como forma de atingir os interesses britânicos. Preso várias vezes, Gandhi teve sua liderança reforçada a partir da década de 1920, quando passou a comandar o boicote ao sal, produto monopolizado por companhias inglesas. Fig. 18 Gandhi (ao centro, sem camisa) e outros manifestantes durante a Marcha do Sal, em 1930. O enfraquecimento inglês após a Segunda Guerra tor nou impossível a manutenção do domínio sobre o país; assim, a Inglaterra adotou a política de conceder uma inde- pendência gradual à Índia, culminando com a formalização definitiva em 1947 Contudo, as rivalidades étnicas e religiosas já pre- sentes ampliaram-se com a edificação do novo Estado independente. Assim, a população muçulmana passou a se concentrar no norte do país, dando origem ao Paquistão, sob o governo de Ali Jinnah. A maioria hindu criou a União Indiana, sob governo de Jawaharlal Nehru. A população budista recusou a supremacia hindu e concentrou-se na ilha do Ceilão, onde, em 1948, surgiu o terceiro Estado au- tônomo da região, o Sri Lanka. Essa divisão atestou uma das maiores chagas que en- frentariam as novas naçõesindependentes. Os conflitos étnico-religiosos, até então ocultos sob o manto da violenta dominação internacional, vieram à tona quando da edificação dos novos Estados, ainda frágeis e sem condições de acomo dar a gama de diversidades interna. Na Índia, esses conflitos ampliaram-se, gerando cerca de um milhão de mortes. Foi inclusive em uma manifestação desse conflito que Gandhi foi assassinado, em 1948, por um fanático hindu, descontente com sua política conciliatória em relação aos muçulmanos. A independência da Índia não solucionou, portanto, as condições inerentes ao colonialismo e as próprias caracte rísticas da Índia, ou seja: a miséria, as desigualdades sociais profundas, agravadas pelo rígido sistema de castas, e os conflitos étnicos e religiosos. Ao contrário, o clima de extre- mismo ampliou-se, ao mesmo tempo que as contradições de sua estrutura interna convergem para uma situação na qual o país é hoje um polo de desenvolvimento tecnológico em áreas como a informática e a indústria aeroespacial Por outro lado, conta com uma das populações mais miseráveis do mundo. Embora não consiga lidar com as contradições internas, a Índia desenvolve, desde 1974, um programa nuclear que possibilitou a fabricação da bomba atômica. Sintomaticamente, nessa mesma década de 1970, a região era palco da guerra de independência do Paquistão Oriental, dando origem à República de Bangladesh, em um conflito no qual a reação do Paquistão Ocidental provocou um dos maiores genocídios do século XX. U N E S C O V IT H A L B H A J H A V E R I/ G A N D H IS E R V E HISTÓRIA Capítulo 11 A Segunda Guerra Mundial e o mundo pós-guerra128 Ainda hoje, os conflitos étnicos e religiosos ameaçam a unidade do país e a estabilidade política As lutas do funda- mentalismo hinduísta em oposição ao islamismo provocaram os assassinatos da primeira-ministra Indira Gandhi, em 1984, e de seu filho Rajiv Gandhi, em 1991, ambos mortos por terroristas sikhs (hindus da região norte do país). Crescem também os atentados terroristas e a luta pela independência da minoria tâmil (hindus) no Sri Lanka, gerando um conflito responsável pela morte de mais de 50 mil pessoas. Sudeste Asiático A região, pela proximidade com a China (que era um país socialista desde 1949), concentrou um interesse funda- mental das superpotências, que se manifestou basicamente na Indonésia e na Indochina, que hoje compreende o Viet- nã, o Camboja e o Laos Na Indonésia, região que compreende as ilhas de Java e Sumatra e que estava sob domínio da Holanda desde o século XVII, a independência foi formalizada em 1949, com o governo do país recém-independente entregue ao gene- ral Ahmed Sukharno. Aproximando-se da China, Sukharno instalou um governo autoritário internamente, ao mesmo tempo que, externamente, buscava firmar uma posição de liderança junto aos países pobres que acabavam de sair do colonialismo. Foi durante seu governo que se realizou a Conferência de Bandung. A proximidade de Sukharno em relação ao governo chinês provocou a reação ocidental, temerosa quanto ao “perigo vermelho” na região, representado pela China, pelo Vietnã e pelo Camboja. Foi com apoio ocidental que o general Suharto tomou o poder em 1965, criando um regime de aproximação com o Ocidente e de abertura aos investimentos dos países capitalistas, ao mesmo tempo que impunha uma violenta repressão interna e adotava uma política expansionista, cristalizada na anexação do Timor Leste, antiga colônia portuguesa. A Indochina, região sob domínio francês desde o século XIX, era palco, desde a década de 1930, de uma luta anticolonialista, liderada por Ho Chi Minh, fundador da Frente de Libertação do Vietnã e de seu braço armado, o Viet Minh. Entretanto, em 1941, com a rendição da França perante o Eixo, a região passou para o domínio japonês, que instalou um governo de fachada nas mãos do impera- dor Bao Dai. Assim, a luta do Viet Minh passou a ser contra o domínio japonês até o ano de 1945, quando o Japão rendeu-se aos aliados ao final da Segunda Guerra Mundial A rendição japonesa promoveu a retomada do domí nio da região pela França. Bao Dai, que havia servido aos franceses e depois aos japoneses, tornou-se novamen- te um títere dos franceses. Com isso, a luta do Viet Minh voltou a ter a presença francesa como alvo. Diante do ris co de queda da França em uma região já convulsionada pela Revolução Chinesa e pela ascensão de Sukharno na Indonésia, a Indochina passou a atrair a preocupação do governo dos Estados Unidos. Foram inúmeras as propostas de intervenção militar estadunidense na região naquele momento, até mesmo com a possibilidade de utilização de uma bomba atômica, então vista como a grande arma para vencer a Guerra Fria, para acabar com a luta do Viet Minh Em 1953, os franceses acabaram sendo derrotados na batalha de Dien Bien Phu, confirmando sua saída da Indo- china Para negociar a paz, o governo francês convocou a Conferência de Genebra, em 1954. Formalmente, o objetivo dessa conferência era o de reconhecer a independência do Vietnã e também do Laos e do Camboja, além de formalizar a instalação de novos governos naqueles países. Entretanto, a posição dos Estados Unidos, que viam o risco representado pelo crescimento do comunismo na região, foi decisiva para que se frustrasse a independência efetiva desses países. Assim, os estadunidenses propuse- ram que o Vietnã fosse dividido em duas partes, com base no paralelo 17° N A porção ao norte, onde o Viet Minh era mais forte, ficaria sob controle de Ho Chi Minh, tendo Ha- nói como capital No sul, com capital em Saigon, Bao Dai permaneceria no poder, com um governo pró-Ocidente O acordo previa a realização de eleições em 1956, com um candidato indicado pelo governo do norte e outro pelo do sul, de modo que quem ganhasse a eleição unificaria o país Tal eleição, entretanto, jamais foi realizada, motivando a reação do governo do Vietnã do Norte, o que provocou a Guerra do Vietnã No Camboja, a Conferência de Genebra reconheceu a independência do país como um regime monárquico, tendo à frente do governo o príncipe Sihanouk Sua aproximação com a China comunista provocou um golpe, apoiado pelo governo dos Estados Unidos em 1970, quando Sihanouk foi derrubado e o general Lon Nol assumiu o poder A rea- ção que se seguiu ao golpe teve no Khmer Vermelho, um grupo de guerrilheiros comunistas apoiado pela China, sua principal expressão Em 1975, o Khmer Vermelho liderado por Pol Pot, tomou o poder do país Pot instalou no país uma ditadura sanguinária, carac- terizada pela violentíssima repressão a todos os focos de oposição ao regime, gerando uma matança sem preceden- tes em toda a região. Em cerca de cinco anos, a violência do regime reduziu a população do país à metade, ao mesmo tempo que o governo impunha um processo de socializa- ção forçada e de adoção de uma política de ruralização, priorizando a agricultura como praticamente a única ativi- dade econômica no país Com a transferência forçada da população para o campo, a capital do país, Phnom Penh, passou a contar com cerca de 20 mil habitantes apenas. Fig. 19 Ossário com crânios de vítimas do Khmer Vermelho. Títere: sem vontade própria; fantoche. B ra d B a rn e s F R E N T E 2 129