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Discussão sobre proles de famílias homoafetivas pela via da adoção, sob a ótica das jovens e dos jovens adotados

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE 
INSTITUTO DE PSIQUIATRIA 
PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONAL 
 
 
 
SILVANA DO MONTE MOREIRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DISCUSSÃO SOBRE PROLES DE FAMÍLIAS HOMOAFETIVAS PELA VIA DA 
ADOÇÃO, SOB A ÓTICA DAS JOVENS E DOS JOVENS ADOTADOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RIO DE JANEIRO 
2021 
Silvana do Monte Moreira 
 
 
 
 
 
 
DISCUSSÃO SOBRE PROLES DE FAMÍLIAS HOMOAFETIVAS PELA VIA DA 
ADOÇÃO, SOB A ÓTICA DAS JOVENS E DOS JOVENS ADOTADOS 
 
 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Atenção Psicossocial do Instituto de Psiquiatria 
da Universidade Federal do Rio de Janeiro como requisito 
parcial à obtenção do título de Mestre Profissional em Atenção 
Psicossocial. 
 
 
 
Orientadora: Profa. Dra. Maria Tavares Cavalcanti 
 
 
 
 
 
 
 
 
RIO DE JANEIRO 
2021 
CIP - Catalogação na Publicação
Elaborado pelo Sistema de Geração Automática da UFRJ com os dados fornecidos
pelo(a) autor(a), sob a responsabilidade de Miguel Romeu Amorim Neto - CRB-7/6283.
MM838d
Moreira, Silvana do Monte
 Discussão sobre proles de famílias homoafetivas
pela via da adoção, sob a ótica das jovens e dos
jovens adotados / Silvana do Monte Moreira. -- Rio
de Janeiro, 2021.
 151 f.
 Orientadora: Maria Tavares Cavalcanti .
 Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do
Rio de Janeiro, Instituto de Psiquiatria, Programa
de Mestrado Profissional em Atenção Psicossocial,
2021. 
 1. Adoção. 2. Homossexualidade. 3. Famílias. 4.
Minorias sociais e de gênero. 5. Diversidade. I.
Tavares Cavalcanti , Maria , orient. II. Título.
AGRADECIMENTOS 
 
Passarinho de toda cor 
Gente de toda cor 
Amarelo, rosa e azul 
Me aceita como eu sou 
Passarinho de toda cor 
Gente de toda cor 
Amarelo, rosa e azul 
Me aceita como eu sou 
Eu sou amarelo claro 
Sou meio errado 
Pra lidar com amor 
No mundo tem tantas cores 
São tantos sabores 
Me aceita como eu sou 
Passarinho de toda cor 
Gente de toda cor 
Amarelo, rosa e azul 
Me aceita como eu sou 
Eu sou ciumento, quente, friorento 
Mudo de opinião 
Você é a rosa certa 
Bonita e esperta 
Segura na minha mão 
Passarinho de toda cor 
Gente de toda cor 
Amarelo, rosa e azul 
Me aceita como eu sou 
Que o mundo é sortido 
Toda vida soube 
Quantas vezes 
Quantos versos de mim em minh’alma houve 
Árvore, tronco, maré, tufão, capim, madrugada, aurora, sol a pino 
e poente 
Tudo carrega seus tons, seu carmim 
O vício, o hábito, o monge 
O que dentro de nós se esconde 
O amor 
O amor 
A gente é que é pequeno 
E a estrelinha é que é grande 
Só que ela tá bem longe 
Sei quase nada meu Senhor 
Só que sou pétala, espinho, flor 
Só que sou fogo, cheiro, tato, plateia e ator 
Água, terra, calmaria e fervor 
Sou homem, mulher 
Igual e diferente de fato 
Sou mamífero, sortudo, sortido, mutante, colorido, surpreendente, 
medroso e estupefato 
Sou ser humano, sou inexato 
Passarinho de toda cor 
Gente de toda cor 
Amarelo, rosa e azul 
Me aceita como eu sou 
Eu sou amarelo claro 
Sou meio errado pra lidar com amor 
No mundo tem tantas cores 
São tantos sabores 
Me aceita como eu sou 
Passarinho de toda cor 
Gente de toda cor 
Amarelo, rosa e azul 
Me aceita como eu sou 
Eu sou ciumento, quente, friorento, mudo de opinião 
Você é a rosa certa, bonita e esperta 
Segura na minha mão 
Passarinho de toda cor 
Gente de toda cor 
Amarelo, rosa e azul 
Me aceita como eu sou 
(Renato Luciano. De toda cor) 
 
 
À minha orientadora Professora Maria Tavares Cavalcanti 
À minha família sem a qual eu não teria motivação para prosseguir na vida 
Aos companheiros dos grupos de apoio à adoção 
Aos meus amigos, minhas amigas e minhes amigues da diversidade de ser e 
de amar 
Aos jovens que aceitaram participar desse trabalho 
Ao meu amigo Lindomar Darós que me apoiou e incentivou a cada momento 
Aos meus colegas de turma que fizeram esse caminhar mais feliz 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Apesar de tudo estamos vivos 
Pro que der e vier prosseguir 
Com a alma cheia de esperanças 
Enfrentando a herança que taí 
(Meu deus do céu) 
Nós atravessamos mil saaras 
E eu nunca vi gente melhor resistir 
A tanta avidez, a tanta estupidez 
Ao cada um por si, ao brilho da ilusão 
Digo na maior - melhores dias virão 
É um desejo deste imenso coração 
E vamos cuidar da úlceras 
E vamos tratar dos pústulas 
Justiça remédio sensacional 
Pra recuperar nossa moral 
E pra fortalecer o ânimo 
E pra fortalecer o fôlego 
Um vinho constituinte popular cai legal 
(E cai então) 
(Gonzaguinha. Bom dia) 
 
 
RESUMO 
MOREIRA, Silvana do Monte. Discussão sobre proles de famílias homoafetivas 
pela via da adoção, sob a ótica das jovens e dos jovens adotados. Rio de Janeiro, 
2021. Dissertação (Mestrado Profissional em Atenção Psicossocial) – Instituto de 
Psiquiatria, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021 
 
Nas últimas décadas verifica-se no Brasil a crescente formação de famílias 
homoafetivas com base na adoção. Adoção é o processo legal de assunção dos 
direitos e deveres da família biológica pela adotiva. Ainda há escassez de 
conhecimento de como se dá o processo de filiação à nova família, principalmente na 
família formada por pessoas do mesmo sexo. O fato de casais do mesmo sexo 
constituírem prole tem gerado na sociedade civil, no direito, nas ciências sociais e na 
psicologia questionamentos sobre os pontos que permeiam tais vínculos parentais. A 
partir da constatação de que essas famílias existem e que sua inserção na sociedade 
é um fato inconteste, apresentamos uma pesquisa qualitativa envolvendo filhos e 
filhas com a capacidade civil suprida, de cinco casais homoafetivos, cuja filiação seja 
decorrente da adoção e realizada com base na Lei nº 8.069/90 – Estatuto da Criança 
e do Adolescente. As entrevistas foram realizadas através do aplicativo Zoom, em 
função da situação de pandemia em que se encontra o mundo, e revelou concepções 
de família e perspectivas de gênero, que subjazem às demandas formuladas pelos 
adotantes e passam para a realidade de filhos e filhas que se empoderaram desse 
lugar em tal configuração familiar. Na perspectiva desses casais, ter um filho ou uma 
filha é considerado um passo importante na afirmação de sua capacidade de constituir 
uma família. Nas entrevistas realizadas verificou-se uma visão de família sem 
qualquer tipo de preconceito ou diferenciação do modelo heteronormativo, onde filhos 
e filhas se entendem e colocam-se nesse lugar de pertencimento. Os resultados nos 
trazem a certeza de que pesquisas profundas precisam ser realizadas 
especificamente com os filhos e filhas na qualidade de sujeitos de direitos cujo instituto 
da adoção objetiva atender, sempre no superior interesse desses e dessas. Com 
pesquisa, que se constitui em importante dispositivo para o enfrentamento, inclusive 
abrangendo crianças e adolescentes em famílias homoafetivas, contemplando 
aspectos biopsicossociais desses filhos e filhas, conseguiremos romper a barreira do 
preconceito e da discriminação. 
Palavras-chave: adoção; homossexualidade; minorias sociais e de gênero; família.
ABSTRACT 
MOREIRA, Silvana do Monte. Discussão sobre proles de famílias homoafetivas 
pela via da adoção, sob a ótica das jovens e dos jovens adotados. Rio de Janeiro, 
2021. Dissertação (Mestrado Profissional em Atenção Psicossocial) – Instituto de 
Psiquiatria, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021 
In recent decades we have seen in Brazil the growing formation of homo-affective 
families based on adoption. Adoption is the legal process of assuming the rights and 
duties of the biological family for the adoptive one. There is still a lack of knowledge on 
how the process of affiliation to the new family takes place, especially in families 
formed by people of the same sex. The fact that same-sex couples have offspring has 
raised questions in the civilsociety, in law, in social sciences, and in psychology about 
the issues that permeate such parental bonds. Based on the verification that such 
families exist and that their insertion in society is an undeniable fact, we present 
qualitative research involving sons and daughters with civil capacity, from five 
homosexual couples, whose filiation is a result of adoption and based on the Law no. 
8069/90 - Child and Adolescent Statute. The interviews were carried out through the 
Zoom application, due to the pandemic situation in which the world finds itself, and 
revealed conceptions of family and gender perspectives, which underlie the demands 
formulated by the adopters and pass on to the reality of sons and daughters who have 
empowered themselves in such a family configuration. From the perspective of these 
couples, having a child is considered an important step in the affirmation of their ability 
to form a family. In the interviews carried out, we verified a vision of family without any 
kind of prejudice or differentiation from the heteronormative model, where sons and 
daughters understand and place themselves in this place of belonging. The results 
bring us the certainty that in-depth research must be carried out specifically with sons 
and daughters as subjects of rights whose adoption institute aims to attend, always in 
their best interest. Through research, which constitutes an important device including 
for coping, research that covers children and adolescents in homo-affective families, 
contemplating biopsychosocial aspects of these children, will we be able to break the 
barrier of prejudice and discrimination. 
Keywords: adoption; homosexuality; social and gender minorities; family. 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
a.C. Antes de Cristo 
ABRAFH Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas 
ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade 
ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 
ADO Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 
ANGAAD Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção 
APA Associação Americana de Psicologia 
Art. Artigo 
CCB Código Civil Brasileiro 
CDHO Comissão de Direito Homoafetivo 
CEJA Comissão Estadual Judiciária de Adoção 
CF Constituição Federal 
CFM Conselho Federal de Medicina 
CID-9 Classificação Internacional de Doenças e Problemas 
Relacionados à Saúde 
CID-10 Classificação Internacional de Doenças e Problemas 
Relacionados à Saúde 
CIJ Coordenadoria da Infância e Juventude do Estado 
CND Comissão Nacional de Adoção 
CNJ Conselho Nacional de Justiça 
DJ Dia do julgamento 
DNA Ácido desoxirribonucleico 
Dr. Doutor 
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente 
EGHO Encontro de Grupos Homossexuais Organizados 
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio. 
GAA Grupos de Apoio à Adoção 
GGB Grupo Gay da Bahia 
GRAAU Grupo de Apoio a Adoção em Uberaba 
HIV Human Immunodeficiency Virus 
IBDFAM Instituto Brasileiro de Direito de Família 
INAMPS Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Nacional 
 
 
 
LGBT+ Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgênero 
LGBTQI+ Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgênero e Queer 
LINDB Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro 
MHB Movimento Homossexual Brasileiro 
MP Ministério Público 
OAB-RJ Ordem dos Advogados do Brasil secção do estado do Rio de 
Janeiro 
OEA Organização dos Estados Americanos 
OMS Organização Mundial de Saúde 
ONU Organização das Nações Unidas 
PLS Projeto de Lei do Senado 
REsp Recurso Especial 
SBPC Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência 
SNA Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento 
SP Estado de São Paulo 
STF Supremo Tribunal de Federal 
STJ Supremo Tribunal de Justiça 
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 
TJES Tribunal de Justiça do Espírito Santo 
TJRJ Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro 
TJRS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul 
TJSP Tribunal de Justiça de São Paulo 
UOL Universo Online 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 13 
 1 PARENTALIDADE ................................................................................................ 26 
1.1 SOBRE SEXUALIDADES, PARENTALIDADES E LEGALIDADES .................. 26 
1.2 CONSECUÇÃO DO AFETO ............................................................................... 34 
1.3 AVANÇOS E PRECONCEITOS ......................................................................... 37 
1.4 ADOÇÃO ............................................................................................................ 40 
1.4.1 A Evolução Histórica da Adoção .................................................................. 41 
1.4.2 A Adoção e o Abandono no Brasil................................................................ 44 
1.4.3 Do Conceito e da Natureza Jurídica da Adoção .......................................... 48 
1.4.4 Legitimidade para Postular a Adoção .......................................................... 48 
1.4.5 Consentimento dos Detentores do Poder Familiar ..................................... 51 
1.4.6 Concordância do Adotando .......................................................................... 52 
1.4.7 Reais Benefícios para o Adotando ............................................................... 53 
1.5 ADOÇÃO POR CASAIS HOMOAFETIVOS – RESGATE HISTÓRICO ............. 54 
1.6 ADOÇÃO HOMOAFETIVA NA ATUALIDADE ................................................... 58 
1.7 ADOÇÃO TRANSAFETIVA ................................................................................ 62 
 2 CONTAÇÂO DE HISTÓRIAS OU DAS HISTÓRIAS DE FAMÍLIAS ................... 64 
2.1 O EUROPEU ....................................................................................................... 66 
2.2 REVERENDA ALEXYA, A HISTÓRIA DE UMA FAMÍLIA HOMOTRANSAFETIVA
 .................................................................................................................................. 67 
2.3 A VIDA NA VISÃO DE LINDA ............................................................................ 71 
2.3.1 Sobre os pais .................................................................................................. 74 
2.4 NOS BAILES DA VIDA DA MENINA BAILARINA ............................................. 78 
2.5 NOS CAMINHOS DO PENSAMENTO DA MENINA PENSATIVA ..................... 82 
2.6 A MODELO ......................................................................................................... 86 
2.7 O ESCRITOR ...................................................................................................... 92 
CONSIDERAÇÕES FINAIS É PAU, É PEDRA, É O FIM DO CAMINHO............... 107 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 117 
 
 
 
ANEXO A PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP ......................................... 126 
ANEXO B ENTREVISTA SEMI ESTRUTURADA COM JOVENS PROLE DE 
FAMÍLIAS HOMOAFETIVAS PELA VIA DA ADOÇÃO ......................................... 128 
ANEXO C HISTÓRIAS EM QUADRINHOS ............................................................ 129 
ANEXO D E-BOOK “QUANTAS FAMÍLIAS TÊM NO MUNDO?” ......................... 134 
 
13 
 
 
INTRODUÇÃO 
Minha experiência profissional nas áreas do Direito da Criança – aqui 
consideradas de 0 a 18 anos incompletos, na forma dos normativos internacionais – 
e da diversidade sexual e de gênero, notadamente no trabalho em processos de 
adoção há mais de vinte anos, tem me propiciado a oportunidade de observar e 
participar das questões relacionadas com o exercício da parentalidade. Em especial, 
me requerem um olhar para além do jurídico as transversalidades que constituem o 
modo como chegam ao sistema de justiça às famílias constituídaspela adoção. 
Entendo que minha atuação profissional como membro fundador da Comissão de 
Direito Homoafetivo (CDHO) e presidente da Comissão de Direitos da Criança e do 
Adolescente (CDCA) da Ordem dos Advogados do Brasil secção do estado do Rio de 
Janeiro (OAB-RJ), da Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas 
(ABRAFH), presidente da Comissão Nacional de Adoção do Instituto Brasileiro de 
Direito de Família (IBDFAM), advogada, mãe por adoção, me qualifique para a 
realização desta pesquisa. A presente pesquisa delineou-se na perspectiva de 
entender que as famílias, todas elas, existem dentro de sua pluralidade e que para 
algumas os caminhos a serem percorridos são mais áridos e tortuosos. A presente 
pesquisa delineou-se na perspectiva de entender que as famílias, todas elas, existem 
dentro de sua pluralidade e que para algumas os caminhos a serem percorridos são 
mais áridos e tortuosos. 
Caminho pela justificativa e fundamentação teórica, adentrando na 
metodologia, local da pesquisa, participantes, instrumentos e análise de dados, no 
capítulo 2, onde o leitor terá uma visão da forma de realização da pesquisa. Passo 
pela indispensável consecução do afeto, tratando-se do elo formador das famílias. 
Foco nos avanços e nos preconceitos que permeiam as questões das parentalidade 
LGBTQIAP+, traçando o percurso das famílias homoafetivas no seu caminho para a 
legitimação frente ao Estado para o exercício homoparental na sua plenitude. 
Passamos à adoção como instituto, com as observações de natureza legal, abordando 
a história da adoção de forma suscinta, sua evolução histórica, sem perder de vista o 
histórico do abandono no Brasil; passamos ao conceito e à natureza jurídica da 
adoção, que é medida protetiva de colocação em família substituta que estabelece o 
parentesco civil de primeiro grau entre adotantes e adotados; à legitimidade para 
postular a adoção, ao consentimento dos detentores do poder familiar, sobre a 
14 
 
 
concordância do adotando – sujeito de direitos a quem a adoção deve atender -, daí 
a abordagem dos reais benefícios que a adoção traz para o adotando, fechando com 
a adoção por casais homoafetivos realizando um necessário resgate histórico até a 
atualidade, perpassando brevemente pela adoção transafetiva. 
Nessa parte o leitor e a leitora poderão assimilar e compreender o modo como 
a pesquisa foi construída, a partir de quais pontos e apercebendo-se da visão 
particular da pesquisadora. A abordagem histórica da adoção e de suas diversas 
finalidades ao longo dos séculos, passando para o fechamento com o direito na 
relação de cuidados e proteção de crianças e adolescentes, o percurso longo e sofrido 
da homoparentalidade que encontra, em 2011, seu reconhecimento na esfera jurídica, 
mas que continua rotineiramente a lutar pelo seu não apagamento, usando o termo 
mais adequado e moderno para a invisibilização dos seres diversos, dos afetos 
transversais e que não seguem a regra da heteronormatividade e do binarismo. 
Adentro então, no segundo capítulo, na contação de histórias. Não há nada 
mais adequado do que o título contação de histórias e muito bem poderia começar 
com “era uma vez” e, eventualmente, findar com “e foram felizes para sempre”. O que 
faço é contar histórias de 5 jovens filhos e filhas de pais e mães do mesmo sexo, 
famílias homoparentais que passaram a exercer a parentalidade adotiva enquanto 
seus filhos e filhas ainda eram crianças, ou seja, adoções judiciais realizadas na forma 
do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990). A contação se faz com 
músicas iniciais que traduzem um pouco as personagens, todas as melodias 
escolhidas de conformidade com a natureza e singularidades de cada um e cada uma 
e do bojo das famílias, tal qual Paula e Bebeto de Milton Nascimento. 
Contar histórias é algo que aprendi ou apreendi ainda no curso de letras, que 
me deu algo que considero um dom: gostar de escrever. Trago a história não contada 
do Europeu, onde não pude concluir com um happy end ou não, porque isso ficou no 
campo da imaginação de que esteja feliz, bem-sucedido em algum lugar da Europa, 
ou não, como no famoso romance aberto. Passo a Alexya, mulher trans, seu marido 
e um filho e duas filhas, a partir de sua própria visão e não como fruto da pesquisa. 
Sigo com a música para trazer Linda, menina negra, empoderada, adotada por dois 
pais juntamente com seus três irmãos. Linda conta seus segredos no balanço da 
música escolhida para homenageá-la. E vamos para Bailarina que se encontra envolta 
em um mundo cor-de-rosa, traspassado pelo azul de seus pais e irmão. Não há aqui 
conotação de “meninas vestem rosa e meninos vestem azul”, mas sim a vontade de 
15 
 
 
brincar com as cores que terminam, sempre, em um belo arco-íris. Bailarina é aquela 
que podemos definir com o foram felizes para sempre, pois esse é o sentimento que 
expressa, afinal, todo mundo tem perebas, só a bailarina que não tem. Passamos para 
Pensativa, filha de duas mães, negra, consciente de sua negritude, com mais três 
irmãos. Para Pensativa é um momento que nos leva a emoção, pensamento positivo 
que faz bem ao coração. Em seguida encontramos a Modelo, filha de duas mães 
divorciadas, negra, vaidosa, empoderadíssima não apenas com relação à postura 
antirracista, mas, também, com relação à LGBTfobia. A modelo realmente não anda, 
ela desfila. Ela é top, capa de revista. É a mais mais, ela arrasa no look. Tira foto no 
espelho, pra postar no Facebook. Continuo a contação com o Escritor, jovem negro, 
gay, adotado por dois pais. Escritor tem dois irmãos não naturais entre si. Escreve 
pelo exemplo de seus pais, ambos acadêmicos. Escritor empunha a bandeira da 
diversidade, traz questionamentos, daí seu espírito em ebulição. É necessário quebrar 
os padrões, é necessário abrir discussões. Alento pra alma, amar sem portões; 
Amores aceitos sem imposições, Singulares, plural. Fecho com música a quinta e 
última contação de histórias de vidas. 
Nas considerações finais, faço alusão à música de Antonio Carlos Jobim, 
eternizada na Voz de Elis Regina: É PAU, É PEDRA, É O FIM DO CAMINHO... (Águas 
de Março), oportunidade na qual me debruço sobre o meu próprio lugar de fala. E 
busco inspiração na fala de Darós1: Assim, aposto no devir, inclusive no devir família, 
em seu constante vir a ser... Considero ainda que os encontros com a Professora 
Orientadora produziram fortes efeitos no delineamento da metodologia da pesquisa 
realizada. 
Existem distintos posicionamentos sobre as particularidades da forma de 
parentar homoafetiva e seus impactos psicológicos nas crianças perfilhadas. Existem, 
ainda, raras pesquisas científicas sobre a questão focada nas filhas e filhos de casais 
homoafetivos. Ou seja, como se portam as crianças, adolescentes e jovens que têm 
dois pais ou duas mães? As filhas e filhos por adoção judicial estão confortáveis com 
o modelo parental de inserção? Quais são as dificuldades experimentadas? Parte da 
maior visibilidade de pessoas LGBT+ como pais e mães resulta de uma crescente 
aceitação pública para essa realidade. Busco partir de situações de estabelecimento 
 
1 DARÓS, L. E. S. http://ppfh.com.br/wp-content/uploads/2018/05/Tese-NORMALIZADA-1.pdf 
16 
 
 
de maternidade ou paternidade com pessoas casadas ou em união estável2. Desejo 
também apreender as experiências de jovens que são filiados por casais 
homotransafetivos. Isto porque devido a minha experiência profissional com pessoas 
homotransafetivas, pude observar que, majoritariamente, buscam por perfis de 
crianças e adolescentes tidos como “inadotáveis”. 
Na minha percepção, grande parte dos casais homotransafetivos, por terem 
sofrido agruras e se mantido à margem da sociedade, teriam uma capacidade maior 
de parentar aquelas crianças e adolescentes que também não são vistos pela grande 
maioria dos habilitados, ou seja, que estão “dentro do armário” dainvisibilidade. Esse 
é um sentimento pessoal baseado na prática. Mas, é necessário pontuar que o desejo 
e o exercício da parentalidade de recém-natos saudáveis, são realidades existentes 
entre os casais homotransafetivos, não sendo, portanto, uma regra absoluta a adoção 
de “invisíveis”. 
Na minha percepção, grande parte dos casais homotransafetivos, por terem 
sofrido agruras e se mantido à margem da sociedade, teriam uma capacidade maior 
de parentar aquelas crianças e adolescentes que também não são vistos pela grande 
maioria dos habilitados, ou seja, que estão “dentro do armário” da invisibilidade. Esse 
é meu sentimento, baseado na em minha prática profissional. Mas, é necessário 
pontuar que o desejo e o exercício da parentalidade de recém-natos saudáveis, são 
realidades existentes entre os casais homotransafetivos, não sendo, portanto, uma 
regra absoluta a adoção de “invisíveis”. 
Partindo da prática profissional onde os filhos e filhas já são, em pequena parte, 
adultos, procurei aquelas e aqueles em que atuei direta ou indiretamente das adoções. 
Explicando: diretamente para aqueles que atuei como advogada do processo de 
adoção; indiretamente por conhecer e acompanhar o procedimento mesmo sem atuar 
no caso. Sendo assim, a proposta é perceber as experiências de subjetivação dos 
jovens e das jovens que foram adotadas por famílias não normativas. 
 
2WESTON, K. Families we choose: lesbian, gays, kinship. New York: Columbia University Press, 1991. 
HAYDEN, C. Gender, genetics and generation: reformulating biology in lesbian kinship. Cultural 
Anthropologie, v. 10, n. 1, p. 41-63, 1995; DUNNE, G. A. Opting into motherhood: lesbians blurring 
the boundaries and transforming the meaning of parenthood and kinship. Gender & Society, v.14, n. 
1, p. 11-35, 2000; HAIMES, E.; WEINER, K. 'Everybody's got a dad. Issues for lesbian families in the 
management of donor insemination. Sociology of Health and Illness, v. 22, n. 4, p. 477-499, 
2000.LUCE, J. Beyond expectation: lesbian/bi/queer women and assisted reproduction. Toronto: 
University of Toronto Press, 2010; DARÓS, L. E. S. Adoção judicial de filhos e/ou filhas em 
conjugalidades LGBTTIQ – rupturas com a heteronormatividade. Curitiba: Editora Appris, 2021. 
17 
 
 
O momento político atual, no meu perceber, tem gerado um enorme receio na 
população LGBT+, que tem se retraído em seus projetos parentais por temor que os 
filhos venham a ser perseguidos por terem duas mães ou dois pais, por exemplo. Não 
se trata de não buscarem mais a parentalidade adotiva, mas de analisarem mais 
profundamente a questão. 
Baseando-me em Zambrano 3 , utilizarei o termo homoparentalidade e em 
Darós4, adoção por casais não normativos, sem perder de vista as singularidades de 
cada modo de ser da existência. Faz-se necessário colocar em análise as 
especificidades que atravessam os arranjos familiares possíveis. 
Os processos de adoção são todos eles complexos e singulares, dificílimo 
trabalhar friamente sem que ocorra envolvimento emocional com os adotantes ou com 
os filhos e filhas. Minha aposta ético-político-metodológica constitui-se a partir da 
ruptura com o conceito de neutralidade, uma vez que todos estamos implicados. No 
lugar de afirmar uma farsa que é a premissa da neutralidade, ouso afirmar a 
necessidade da análise de implicações tanto da escolha do tema a ser pesquisado 
quando do caminhar metodológico. 
No Brasil, o reconhecimento de direitos para a população LGBT+ ainda se 
encontra em uma fase muito embrionária. Vemos, a cada dia, que tais direitos podem 
ser amputados. No caso específico da adoção, os proponentes de projetos de lei5 que 
visam proibir a adoção por casais homoafetivos têm em mente o direito dos adotantes 
(adultos) e não das crianças de terem uma família e terem respeitados os princípios 
insertos no artigo 227 da Constituição Federal (CF)6. 
A razão de buscar a pesquisa dentro do universo homotransafetivo, no presente 
momento sociopolítico do país, visa problematizar a ideia de que filhos de casais 
LGBT+ tendem a ter algum tipo de patologia de ordem social ou psíquica. Sendo 
assim, pretendo, por meio de entrevistas com esses jovens, buscar apreender seus 
processos de subjetivação, os olhares sobre suas mães e pais, sobre a adoção e 
 
3ZAMBRANO, E. Parentalidades “impensáveis”: pais/mães, homossexuais e travestis. Horizontes 
Antropológicos, Porto Alegre, ano 12, n. 26, p. 123-147, jul./dez. 2006. Disponível em: 
https://www.scielo.br/pdf/ha/v12n26/a06v1226.pdf. Acesso em: 01 mar. 2021. 
4DARÓS, op.cit. 2021. 
5 PL 4.508/2077. Disponível em: 
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=420940. Acesso em: 01 
mar.2021. 
6 BRASIL. Constituição Federal de 1988. art. 227. Disponível em: 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 01 mar. 2021. 
18 
 
 
sobre a família. Nesta perspectiva, a pesquisa objetivou conhecer a questão social e 
jurídica de adoção de um ponto de vista dos jovens e das jovens que se tornaram 
filhos e filhas pela adoção judicial por casais que rompem com a tríade 
heterossexualidade-casamento-filiação 7 , ou seja, a adoção de crianças e 
adolescentes, hoje jovens, por modos de se ser família que não atendem à 
heteronormatividade, pontuando a situação atual dessas filhas e filhos adotados por 
casais LGBT+. 
Logo, a relevância do trabalho reside nas razões e no sentir dos jovens por 
meio do uso de informações construídas diretamente com eles. As jovens e os jovens 
adotados precisam ser vistos como participantes ativos do processo, ao invés de 
meros coadjuvantes. Além disso, esta pesquisa justifica-se socialmente porque traz 
para discussão aspectos nem sempre considerados por aqueles responsáveis pela 
formalização do processo de adoção e através dela podem entender como é sua 
vivência no processo de filiação, sendo importante não apenas pelas questões já 
mencionadas, mas por abordar outras que ainda necessitam de aprofundamento e 
divulgação. Devem incentivar a realização de novas pesquisas incluindo crianças e 
adolescentes, assim como a visão dos pais quanto aos filhos e às filhas que, por sua 
vez, também rompem com os critérios da normatividade. 
Em termos pessoais, as vulnerabilidades como um todo sempre tiveram papel 
preponderante, as exclusões e invisibilidades jamais permitiram que me aquietasse 
diante de injustiças. Sempre optei por dar voz a crianças e adolescentes 
invisibilizados, literalmente varridos para debaixo do tapete da sociedade. Assim, 
como lutar por todas as letras do LGBTQIAP+ ao infinito. Não posso, no exercício 
pleno da minha cidadania, calar-me diante do genocídio de crianças e adolescentes 
negros de periferia, do extermínio de crianças, adolescentes e jovens LGBTQIAP+ e 
muito menos diante daqueles que desejam suprimir os poucos direitos que tais 
sujeitos conquistaram a duras penas. 
O objetivo geral desta pesquisa consiste em colocar em análise a situação dos 
filhos e das filhas de famílias homoafetivas constituídas pela adoção judicial. Como 
objetivos específicos, temos: 
 
7ÁRAN, M. Políticas do desejo na atualidade; o reconhecimento social e jurídico do casal homossexual. 
In: PRATA, Maria Regina. Sexualidade. Rio de Janeiro: Espaço Brasileiro de Estudos Psicanalíticos, 
2010. 
19 
 
 
•Situar as famílias pesquisadas em recortes éticos, sociais e econômicos, 
assim como de gênero e formação; 
•Analisar de que forma os jovens e as jovens vivenciam a parentalidade 
homoafetiva; 
•Analisar de que forma os filhos dessas famílias homoafetivas se comportam 
nessa formação familiar que foge a heteronormatividade 
•Analisar noções conceituais importantes para se pensar a adoção homoafetiva 
no Brasil; 
•Pensar as concepções de parentalidade, filiação, infância e sexualidade; 
•Obter dados para fundamentar a assertiva de que casais homoafetivos 
buscam parentar os perfis menos procuradose com menos visibilidade; 
•Obter informações sobre o estado de felicidade de filhos e filhas já adotados 
por famílias homoafetivas. 
O presente trabalho consiste em uma pesquisa qualitativa, a partir de 
entrevistas abertas e a posterior narração das histórias a mim contadas durante os 
encontros destinados às entrevistas, ou seja, trata-se de uma pesquisa voltada aos 
aspectos da parentalidade homotransfetiva, considerando a reflexividade enquanto 
pesquisador dos vieses que perpassam tal forma constitutiva de família, e utiliza-se 
do ideário de Rey (2005), ao dizer que o conhecimento é construção e produção 
humana, tendo, assim, caráter construtivo-interpretativo. Assim trata o autor: 
A epistemologia qualitativa defende o caráter construtivo interpretativo do 
conhecimento, o que de fato implica compreender o conhecimento como 
produção e não como apropriação linear de uma realidade que se nos 
apresenta. A realidade é um domínio infinito de campos interrelacionados 
independente de nossas práticas; no entanto, quando nos aproximamos 
desse complexo sistema por meio de nossas práticas, as quais, neste caso, 
concernem à pesquisa científica, formamos um novo campo de realidade em 
que as práticas são inseparáveis dos aspectos sensíveis da realidade. São 
precisamente esses os aspectos suscetíveis de serem significados em nossa 
pesquisa8 . 
O autor trata a Epistemologia Qualitativa como um método que não traz 
preocupação específica com determinados aspectos geralmente focados na pesquisa 
Quantitativa, tais como a generalização dos resultados e o tamanho da amostragem, 
dando maior peso a outros aspectos, tais quais: 
 
8 REY, F. G. O compromisso ontológico na pesquisa qualitativa. In. REY., F. G. Pesquisa Qualitativa 
e Subjetividade: os processos de construção da informação. São Paulo, Pioneira Thomson 
Learning, 2005. p. 5. 
20 
 
 
 [...] a legitimização do singular como instância de produção do conhecimento 
científico, [...] o valor singular está estreitamente relacionado a uma nova 
compreensão acerca do teórico, no sentido de que a legitimação da 
informação proveniente do singular se dá através do método teórico que o 
pesquisador vai desenvolvendo no curso da pesquisa9. 
A Epistemologia Qualitativa como possibilidade de estudar a subjetividade, 
tanto individual como social, surge como um caminho que assim foi concretizando-se, 
e com isto, a superação de diferentes limitações resultantes de modelos hegemônicos 
foi possível a partir da junção de uma nova base epistemológica, em que se uniram 
novos recursos teóricos da Teoria da Subjetividade numa perspectiva cultural 
histórica. 
Assim, com base na análise das citadas informações singulares e com o 
objetivo de conhecer como se constituem as famílias homotransafetivas 
reconfiguradas a partir da adoção, com o intuito de conhecer os agora jovens que 
foram inseridos em tais famílias ainda crianças, busco o universo onde atuo como 
advogada nas adoções e pessoas com as quais tenho contato através das várias 
redes LGBT+ que componho, além da própria militância pela causa da adoção. O 
presente estudo identifica e analisa dados que não podem simplesmente ser 
mensurados em termos numéricos, como exemplo a observação e análise de 
sentimentos, percepções, intenções, comportamentos, adequações etc. Os 
resultados serão apresentados a partir do enfoque do público pesquisado, com 
rompimento da pretensa noção de neutralidade da pesquisadora na relação com um 
dado objeto a ser desvelado. 
Esta pesquisa objetiva compreender fenômenos e descrevê-los de acordo com 
o ponto de vista dos sujeitos, no caso, pessoas que foram adotadas por famílias 
homoparentais enquanto eram crianças; sendo uma pesquisa com abordagem 
qualitativa, através de 5 (cinco) histórias. Nesta perspectiva metodológica, as 
pesquisas adquiriram contribuições originais e, assim, ampliam nosso conhecimento, 
são apresentadas as etapas a serem seguidas nesta abordagem, elucidando-as com 
alguns exemplos de parte de entrevistas realizadas numa pesquisa que teve como 
objetivos verificar a situação atual de pessoas adotadas por famílias homoafetivas, 
além de desenvolver e validar um modelo teórico representativo dessa experiência. 
A pesquisa qualitativa permite a elaboração de questões que buscam verificar 
o estágio atual das famílias não normativas já constituídas, buscando quebrar 
 
9 Ibidem. p. 6 
21 
 
 
preconceitos, paradigmas e “lendas urbanas”, rompendo com a perspectiva de coleta 
de dados e investir na produção de dados com os sujeitos partícipes do processo de 
investigação10. 
As pessoas entrevistadas relataram suas experiências individuais na 
constituição parentalidade-filiação, permitindo-me elaborar questões e relatar tais 
experiências de cunho individual, através de dados obtidos por meio de entrevistas 
abertas, pela descrição estrutural de suas experiências, baseadas em “análises 
reflexivas, interpretações ou histórias dos participantes da pesquisa” 11 , além de 
conversar com os pais ou mães, eventualmente através da leitura do próprio processo 
de adoção. 
No que tange aos procedimentos metodológicos foi realizado levantamento 
bibliográfico sobre adoção de crianças por casais que rompem com o modelo 
heteronormativo, no sentido de produzir diálogos possíveis, à semelhança do trabalho 
levado a termo por Uziel (2007) 12 em processos referente à homoparentalidade 
adotiva de homossexuais masculinos solteiros e em Darós (2021) 13 que contou 
diversas histórias de famílias não normativas, que adotaram judicialmente seus filhos. 
Buscarei, ainda, romper as fronteiras dos saberes instituídos sendo necessário, 
muitas vezes, uma aproximação entre diferentes disciplinas, tais como Direito, 
linguística, Literatura, Psicologia, Antropologia, Filosofia, Sociologia, História e 
Serviço Social, baseando-me em Darós (2021)14. Igualmente ressalto que trabalho em 
uma perspectiva transdisciplinar, em que não há hierarquizações entre os saberes. 
Tentarei evitar termos eminentemente jurídicos, mas até por vício profissional posso 
cair nessa armadilha. 
Esther Maria de Magalhães Arantes15 traz no início de seu texto “Mediante 
quais práticas a Psicologia e o Direito pretendem discutir a relação? Anotações sobre 
o mal-estar”, duas inserções totalmente adequadas ao rumo do presente trabalho: 
O que vem a ser a Psicologia? Para que ela serve?” Ante a nossa confusão, 
perplexidade e demora, Cláudio Ulpiano nos disse: “- Depende das forças 
que se apoderam dela! Coloquem suas forças em batalha para produzirem 
 
10 KASTRUP, 2005 apud DARÓS. op. cit. 2016. p. 28. 
11 HOLANDA. op. cit. 2006. 
12 UZIEL, A. P. Homossexualidade e adoção. Rio de Janeiro: Garamond, 2007. 
13 DARÓS. op. cit. 2021. 
14 DARÓS. op. cit. 2021. 
15 ARANTES, E. M. M. Mediante quais práticas a Psicologia e o Direito pretendem discutir a 
relação? Anotações sobre o mal-estar. [s.d.]. Disponível em: http://www.aasptjsp.org.br/. Acesso em: 
15 jun. 2021. 
22 
 
 
uma Psicologia afirmativa”. Sobre o tema do debate de hoje, “Psicologia e 
Direito: um encontro possível?” eu gostaria de refletir sobre algumas 
preocupações que tenho com esse encontro. Que encontro é esse? O que se 
pretende encontrar, quando se fala em Direito e Psicologia? A Psicologia 
deseja encontrar qual Direito? 
Utilizo-me de entrevistas escritas realizadas pelo aplicativo WhatsApp e tele 
presenciais pelo aplicativo Zoom com os jovens e as jovens que aceitaram participar 
desta pesquisa. 
Quanto às etapas: 1) A abertura de diálogo com os jovens e as jovens que 
aceitarem participar da pesquisa, sendo a etapa seguinte, a partir da identificação das 
pessoas que aceitaram essa participação, foi composta de perguntas a serem 
dirigidas aos filhos e filhas dessas famílias homoconjugais; 2) conversa com os pais 
para a verificação do interesse em participar da pesquisa. A partir da assinatura do 
Termo de ConsentimentoLivre e Esclarecido (TCLE), apresentado no Anexo A, 
realizei as entrevistas propriamente ditas. 
Pretendo com esta pesquisa dar visibilidade ao exercício materno-paterno-filial 
em arranjos familiares que rompem com os marcos do patriarcado, a partir do 
exercício do cuidado com a infância. Foco nas vidas de jovens que já encontram com 
suas adoções judiciais concluídas. A ideia foi entrevistar diferentes jovens percorrendo 
diversas etapas de suas experiências de vida: dizerem de suas origens e a percepção 
que têm da intervenção estatal da retirada de suas famílias de origem ou de suas 
entregas; a chegada na família; a adaptação; a convivência. Para tanto, realizei os 
encontros com os jovens através de conversas, contando as histórias de vida a partir 
das narrativas das/dos protagonistas, possibilitando afirmar uma família outra que não 
exclusivamente aquela delineada pelo patriarcado e pela heteronormatividade 16 
(BENTO, 2006; BUTLER, 2003). Busquei apreender seus processos de subjetivação, 
os olhares sobre suas mães e seus pais, sobre a adoção e sobre suas famílias. 
Desta forma, a pesquisa tem como objetivo lançar um olhar sobre a questão 
social, jurídica e emocional da adoção homoparental de um ponto de vista das 
pessoas adotadas por famílias que rompem com a perspectiva fundada na tríade 
 
16BENTO. op. cit. 2006. 
BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: 
Civilização Brasileira, 2003. 
23 
 
 
heterossexualidade-casamento-filiação17, ou seja, a adoção de crianças por modos 
de ser família que não atendem à heteronormatividade18 
As metodologias utilizadas partiram do próprio percurso enquanto 
pesquisadora, sem que as direções fossem pré-determinadas, diferentemente de uma 
dissertação eminentemente jurídica. 
Não busquei a realização de uma pesquisa aberta através dos formulários 
públicos geralmente utilizados, e sim a partir daquelas adoções a mim relacionadas 
pelo trabalho e/ou pelo afeto. Explico: Linda, atuei em seu processo de adoção; 
Escritor, atuei em seu processo de adoção e, posteriormente, no dos irmãos; Modelo, 
atuei no processo de adoção do irmão caçula; Bailarina, atuei no processo de adoção 
do irmãos caçula e, Pensativa, sou amiga das mães. 
Minha vida pessoal e profissional é atravessada pelas vulnerabilidades do ser 
humano, tanto que coordeno um curso de pós-graduação em direito das 
vulnerabilidades. Dentre essas parcelas vulneráveis da população cresceu a 
preferência, inicialmente, por crianças e adolescentes e, quase que simultaneamente, 
pela população LGBT+. 
Pontuo que minha pretensão original era de tratar do universo de crianças e 
adolescentes adotados judicialmente por casais homo e transafetivos, contudo o 
caminhar da pesquisa estabeleceu jovens com a capacidade civil suprida, excluindo, 
nesse momento do estudo, as famílias homotransafetivas. Pretendia, também, antes 
do nosso estágio pandêmico, viajar para ter conversas reais com as jovens e com os 
jovens entrevistados, o que foi impossível. Dessa forma, a presente dissertação traz 
uma contação de histórias de vidas de cinco jovens e de suas famílias 
Posso afirmar que foi um caminhar metodológico feliz, mas a construção não 
foi fácil, talvez em função da formação jurídica, mas, acredito, que eu tenha 
conseguido sobrevoar de forma razoável pelos vários saberes. 
O presente estudo foi realizado em uma instituição pública de Ensino Superior, 
no município do Rio de Janeiro, estado do Rio de Janeiro, envolvendo jovens 
residentes em vários locais do Brasil e no exterior. A escolha do locus deu-se em 
razão da existência de pessoas perfilhadas pela adoção já com a capacidade civil 
suprida, evitando questionamentos possíveis quanto à realização com crianças e 
 
17 ÁRAN. op. cit. 2005. 
18 BENTO. op. cit. 2006; BUTLER. op. cit. 2006. 
24 
 
 
adolescentes. Participaram da pesquisa 5 (cinco) jovens cuja filiação deu-se pela via 
da adoção judicial enquanto eram crianças. Assim, participaram desta pesquisa 4 
(quatro) mulheres e 1 (um) homem, sendo 3 (três) filhos de casais formados por 
homens e 2 (dois) filhos de casais formados por mulheres. Devido ao sigilo da 
pesquisa, os jovens, assim como seus pais e mães, tiveram seus nomes modificados. 
Os codinomes são inspirados na realidade de cada jovem, nas aptidões e sonhos de 
cada um. 
As entrevistas foram realizadas em fevereiro e março de 2021 partindo de 
perguntas previamente enviadas. As respostas foram rápidas, e as conversas muito 
prazerosas. As conversas duraram entre 45 minutos e 1 hora, abrindo espaço para 
que se expressassem da melhor maneira sobre seus sentimentos. As entrevistas 
foram realizadas a partir de questionário semiestruturado – conforme Anexo B - pelos 
aplicativos WhatsApp e Zoom Meeting. 
Entrevistar é apreender narrativas com o objetivo de obtenção de matéria para 
conhecimento e análise de um determinado processo social do sujeito entrevistado, 
auxiliando os estudos acerca da identidade, inclusive da memória cultural. 
Nas palavras de Muylaert (201419): 
As entrevistas narrativas se caracterizam como ferramentas não 
estruturadas, visando a profundidade, de aspectos específicos, a partir das 
quais emergem histórias de vida, tanto do entrevistado como as 
entrecruzadas no contexto situacional. Esse tipo de entrevista visa encorajar 
e estimular o sujeito entrevistado (informante) a contar algo sobre algum 
acontecimento importante de sua vida e do contexto social (1). Tendo como 
base a ideia de reconstruir acontecimentos sociais a partir do ponto de vista 
dos informantes, a influência do entrevistador nas narrativas deve ser mínima. 
Nesse caso, emprega-se a comunicação cotidiana de contar e escutar 
histórias. Jovchelovich e Bauer (1) ainda alertam para a importância de o 
entrevistador utilizar apenas a linguagem que o informante emprega sem 
impor qualquer outra forma, já que o método pressupõe que a perspectiva do 
informante se revela melhor ao usar sua linguagem espontânea. Essas 
asserções se assentam na compreensão de que a linguagem empregada 
constitui uma cosmovisão particular e, portanto, é reveladora do que se quer 
investigar: o “aqui” e o “agora” da situação em curso 
Durante as entrevistas, de forma simultânea, fiz anotações sobre as falas 
pontuando aquelas com maior ênfase e onde ocorreram as demonstrações de 
sentimentos de forma mais expressiva. Em alguns casos foram verificados os 
processos de adoção em si, casos nos quais, como advogada, mantenho os arquivos 
por mim escritos quando do ajuizamento das ações. 
 
19 MUYLARTE, C.J. et ali. Entrevistas narrativas: um importante recurso em pesquisa qualitativa. 
Rev Esc Enferm USP 2014; 48(Esp2):193-199 www.ee.usp.br/reeusp, Acesso 19 Jul 2021. 
25 
 
 
As entrevistas passaram pela transcrição e inserção no texto histórico dos 
relatos familiares – textos obtidos em processos originalmente ajuizados por mim 
como advogada dos pais ou das mães – e, posteriormente, incluído o texto referente 
à entrevista com os(as) jovens. 
Para os jovens e as jovens para os(as) quais não atuei no processo de adoção, 
a partir de relatos históricos dos pais e das mães, fazendo o fecho com a entrevista 
do(a) jovem. Houve dificuldade na localização de jovens em idade adulta para a 
participação na pesquisa, pois a grande maioria dos filhos e filhas de casais 
homoparentais ainda se encontra na adolescência. 
 
26 
 
 
CAPÍTULO 1 
PARENTALIDADE 
1.1 Sobre sexualidades, parentalidades e legalidades 
Homoafetividade é o termo escolhido para tratar relações afetivas entre casais 
do mesmo sexo – remonta à Grécia Antiga, e inspirou outras culturas, culminando sua 
influência na conhecida expressão “amor grego”20. Foi com o advento do cristianismo 
que se reforçou a dicotomia prazer/pecado, favorecendo o surgimento da intolerância 
social em relação às práticas homossexuais e em relação às pessoasque as 
praticavam21. 
A sexualidade humana sempre foi algo contido, escondido, conforme nos 
ensina Foucaut22: 
Parece que, por muito tempo, teríamos suportado um regime vitoriano e a ele 
nos sujeitaríamos ainda hoje. A pudicícia imperial figuraria no brasão da 
nossa sexualidade contida, muda, hipócrita. Diz-se que no início do século 
XVII ainda vigorava uma certa franqueza. As práticas não procuravam o 
segredo, as palavras eram ditas sem reticência excessiva e, as coisas, sem 
demasiado disfarce, tinha-se com o ilícito uma tolerante familiaridade. Eram 
frouxos os códigos da grosseria, da obscenidade, da decência, se 
comparados como século XIX. Gestos diretos, discursos sem vergonha, 
transgressões visíveis, anatomias mostradas e facilmente misturadas, 
crianças astutas vagando, sem incômodo nem escândalo, entre risos dos 
adultos: os corpos “pavoneavam”. 
A Medicina, notadamente a Psiquiatria, teve papel preponderante na formação 
de crenças estereotipadas acerca da homossexualidade. Durante um longo período – 
demasiado, inclusive – em seus códigos internacionais de doenças, a Medicina 
classificava a homossexualidade como homossexualismo, tipificando-a como desvio 
ou transtorno sexual23. O sufixo ismo, de origem grega, denota, dentre outras coisas, 
“condição patológica”, ou seja, uma doença. 
A Sexualidade, a partir de Freud e de sua revelação do inconsciente, passou a 
ter, no início do século XX, uma dimensão de maior amplitude. Nos séculos XX e XXI 
os questionamentos cresceram junto com a maior visibilidade da expressão individual 
 
20SOUZA, I. M. Homossexualismo, uma construção reconhecida em duas grandes civilizações. In: 
Instituto Interdisciplinar de Direito de Família (IDEF) (Coord.).Homossexualidade − Discussões 
jurídicas e psicológicas. Curitiba: Editora Juruá, 2001. p. 101-113. 
21GRAÑA, R. B. É a homossexualidade um problema "clínico"? In: IDEF. Homossexualidade − 
discussões jurídicas e psicológicas. Curitiba: Editora Juruá, 2001. p. 157-168 
22FOUCAUT, M. História da sexualidade I – a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal Ltda, 
1979. p. 9 
23DIAS, M. B. União homoafetiva – o preconceito & a justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 
2009. 
27 
 
 
da sexualidade, da orientação sexual e da própria identidade de gênero, conforme nos 
ensina Jorge (2007)24. Trata-se, na psicanálise, do advento de um novo conceito de 
sexualidade. Freud fala de uma “teoria da sexualidade”, na qual os autores só 
expunham longamente seus casos clínicos sem qualquer teorização a respeito deles. 
Antes de Freud, não há propriamente um conceito clínico sobre a sexualidade. 
A degenerescência de Krafft-Ebing e a psicologia associativa de Binet, que se opunha 
a ela, são duas concepções extremamente simplistas, que apenas aplicam a antiga 
dicotomia médica hereditário/adquirido aos problemas levantados pela sexualidade. 
Mas nenhum conceito emana dessas discussões que os sexólogos freudianos 
empreenderam. O mérito desses autores foi, em primeiro lugar, o de ter aberto o 
diálogo sobre a sexualidade para o campo da ciência, e, em segundo, o de ter tornado 
evidente, com seus trabalhos, a enorme frequência das chamadas “aberrações 
sexuais”. Não é à toa que este é o título do primeiro ensaio que abre a obra de Freud, 
fazendo referência aos autores mais importantes de sua época que tratavam do 
assunto. É sobre eles que Freud vai instaurar um corte. Este corte é conceitual e tem 
um nome: pulsão25. 
As letras que indicam a enormidade de orientações sexuais e identidades de 
gênero passaram das famosas LGBT, para LGBTQI+, atualmente LGBTQIAP+ 
indicando o “mais” que não se trata de uma identificação estanque, e que a partir da 
saída do exílio da heteronormatividade, as letras tendem ao infinito, assim como 
infinitos somos em nossas próprias individualidades. Essa denominação LGBTQI+ é 
utilizada para denominar Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou 
Transgêneros, Queer, Intersexo, Assexual e Pansexual. Sendo utilizada desde 
meados dos 1990, a sigla é considerada uma adaptação de LGB, em inglês, e GLS, 
no Brasil, utilizada desde então para substituir o termo “gay” ao fazer referência à 
comunidade LGBT no fim dos anos 198026. 
A teoria psicanalítica da sexualidade humana caminha pelos estudos do desejo 
e do pertencimento, analisado em conjunto com os fenômenos de ordem sexual e 
 
24JORGE, M. A. C. A teoria freudiana da sexualidade 100 anos depois (1905-2005). Psyche (São 
Paulo), São Paulo, v. 11, n. 20, p. 29-46, jun. 2007. Disponível em 
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141511382007000100003&lng=pt&nrm=i
so. Acesso em: 02 mar. 2021. 
25 Ibidem 
26 MOVIMENTO LGBT: o que é, história e muito mais. 6 maio 2021. Disponível em: 
https://www.stoodi.com.br/blog/atualidades/movimento-lgbt-o-que-e/. Acesso em: 28 fev. 2021. 
28 
 
 
afetiva. Todos, nós humanos, somos seres essencialmente desejantes e nossos 
desejos se expressam com o outro, com o mundo27, assim fala do desejo: 
Segundo Rajchman (1993, p.47), a psicanálise lança seu olhar para o 
problema moderno "de haver algo em nosso desejo que vai além do que 
dirigiria para o que pensamos querer para nós". Esse imprevisto que nos 
interpela vindo de nós mesmos não pode ser conhecido de antemão, de 
forma que não podemos, através do conhecimento, formular um princípio que 
oriente nossas ações, "é que a lei do desejo não constitui um princípio geral 
de que sejamos desconhecedores; ao contrário, ela reside, precisamente, 
nos efeitos de ocorrências que não podemos situar dentro de nenhuma regra 
geral”28. 
 
A partir da publicação de “Psychopatia Sexualis”, de Kraft-Ebing, em 1886, os 
pensamentos e direcionamentos no campo da medicina foram influenciados. Kraft-
Ebing considerou as relações homossexuais como perversas, uma vez que não 
objetivavam a procriação, sendo tal conduta decorrente da “degeneração do sistema 
nervoso central ou de indicadores de doença cerebral hereditária29. 
 Em 1973, a associação entre homossexualidade e patologia foi abandonada 
pela Associação Americana de Psiquiatria e, em 1990, pela Organização Mundial de 
Saúde (OMS). O Conselho Federal de Medicina (CFM), por sua vez, realizou a 
adequação em 1985, retirando a homossexualidade da condição de “transtorno 
sexual”. Importante mencionar que se tratou de uma vitória dos movimentos sociais30. 
Desde dezembro de 1973, a homossexualidade deixou de ser classificada 
como transtorno mental pela Associação Americana de Psiquiatria (APA), 
sendo retirada do Manual de Diagnóstico e Estatística de Desordens 
Psiquiátricas; em 1975, a Associação Americana de Psicologia adotou o 
mesmo procedimento, deixando de considerar a homossexualidade como 
doença, distúrbio ou perversão. 
No Brasil, em 1985, o Conselho Federal de Medicina (CFM) deixa de 
considerar a homossexualidade como desvio sexual, esclarecendo aos 
médicos, em particular aos psiquiatras, que homossexualismo não pode ser 
aplicado nem sustentado como diagnóstico médico. 
 A 43ª Assembléia Geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), no dia 17 
de maio de1990, retirou a homossexualidade da sua lista de doenças ou 
transtornos mentais, suprimindo-a do Código Internacional de Doenças (CID-
10), a partir de 199331. 
 
27SILVA, M. M. Para além da saúde e da doença: o caminho de Freud. Ágora, Rio de Janeiro, v. 12, n. 
2, dez 2009. doi.org/10.1590/S1516-14982009000200007. Acesso 15 mar. 2021. 
28Ibidem. 
29GRAÑA, op. cit. 2001. 
30GONÇALVES, A. O. Religião, política e direitos sexuais: controvérsias públicas em torno da “cura 
gay”, Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, v. 39, n. 2, p. 175-199, 2019. 
31 CFP (Conselho Federal de Psicologia). Nota Pública – Comissão Nacional de Direitos Humanos 
apoia decisão do CFP, 06/08/2009. Disponível em: https://site.cfp.org.br/nota-pblica-comisso-
nacional-de-direitos-humanos-apia-deciso-do-cfp/. Acesso em: 30 jul. 2021. 
29 
 
 
 
Segundoa antropóloga Regina Facchini, com os primeiros indícios de abertura 
política no final da década de 1970 e início da década de 1980, o Movimento 
Homossexual Brasileiro (MHB), impulsionado pela fundação e atuação do grupo 
Somos - Grupo de Afirmação Homossexual e, posteriormente, pelo Grupo Gay da 
Bahia (GGB), começou a se organizar para reivindicar, por meio de ações políticas, 
direitos universais e civis plenos. Foi neste momento que o ativismo homossexual 
iniciou a luta pela revogação do Código de Saúde do Instituto Nacional de Assistência 
Médica da Previdência Nacional, o INAMPS, que seguia a orientação do Código 
Internacional de Doenças em classificar a homossexualidade como desvio e 
transtorno sexual32. 
A título de ilustração do envolvimento político em relação ao tema, destaca-se 
a realização do I Encontro de Grupos Homossexuais Organizados (EGHO) e o I 
Encontro Brasileiro de Homossexuais, organizado pelo grupo Somos, em São Paulo, 
em 1980. Com a participação de organizações homossexuais em nível nacional, 
firmou-se o compromisso das organizações e grupos participantes na ação pela 
alteração do código de doenças referentes a transtornos sexuais e a proposta de 
extinção do parágrafo 302.0 da CID-9 da OMS. 
Com a dissolução do grupo Somos-SP em 1983, as deliberações apanhadas 
não foram levadas adiante. Entre 1981 e 1985 a campanha pela despatologização foi 
articulada principalmente pelo Grupo Gay da Bahia, tendo como principal liderança o 
antropólogo Luiz Mott. Em 1985, a campanha pela despatologização e pela extinção 
do parágrafo 302 contava com o apoio de diversas organizações e associações 
científicas, como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a 
Associação Brasileira de Antropologia, a Associação Brasileira de Estudos 
Populacionais, a Associação Nacional de Pós-graduação em Ciências Sociais, a 
Associação Brasileira de Psiquiatria, 308 políticos, além de mais de 16 mil assinaturas 
de cidadãos brasileiros de todo o país33. Após intensos debates e negociações, em 9 
 
32FACCHINI, R. Histórico da luta de LGBT no Brasil. Psicologia e diversidade sexual. In: Psicologia e 
diversidade sexual. 6. ed. São Paulo: CRPSP, 2011. 
33 CARNEIRO, A. J. S. Salvador dos homossexuais: militância homossexual e homossociabilidade na 
Bahia nos anos 1980. Temporalidades – Revista Discente do Programa de Pós-Graduação em 
História da UFMG. v. 7, n. 3, 2015. Disponível em: 
https://periodicos.ufmg.br/index.php/temporalidades/article/view/5593/3526. Acesso em: 20 jan. 2021. 
30 
 
 
de fevereiro de 1985 o Conselho Federal de Medicina atendeu às reivindicações e 
retirou a homossexualidade do código 302. 
A CID-9 inclui a "Homossexualidade" como sub-categoria (302.0) da 
categoria "Desvios e Transtornos Sexuais" (302), no Capítulo dos 
"Transtornos Mentais" (Capítulo V).34 
Com a extinção do parágrafo 302, o Código de Saúde do INAMPS, seguido o 
mesmo posicionamento pela OMS, em maio de 1990, a luta institucional contra a 
patologização parecia ser uma causa ganha, de modo que as frentes de atuação do 
movimento LGBT foram direcionadas a outros setores. No entanto, em 11 de julho de 
1998, oito anos após a OMS retirar a homossexualidade da Classificação 
Internacional de Doenças, o jornal Folha de São Paulo publicou a matéria intitulada 
“Encontro em Minas quer ‘curar’ homossexuais, que versava sobre o 3º Encontro 
Cristão sobre Homossexualismo promovido pela organização Interdenominacional 
Exodus Brasil. De acordo com a matéria, o objetivo do encontro, ocorrido em Viçosa, 
Minas Gerais, seria “oferecer saídas a homossexuais que desejam retornar ao 
heterossexualismo”35. 
O Conselho Federal de Psicologia, em 1999, através da Resolução CFP n° 
001/99, assevera: “a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem 
perversão”, estabelecendo orientações para nortear a prática dos psicólogos em suas 
práxis. Desde então a “cura gay” passou a ser banida (CFP, 1999), por mais que 
presente até os dias de hoje. 
Da referida Resolução, transcrevemos: 
Art. 2° - Os psicólogos deverão contribuir, com seu conhecimento, para uma 
reflexão sobre o preconceito e o desaparecimento de discriminações e 
estigmatizações contra aqueles que apresentam comportamentos ou práticas 
homoeróticas. 
Art. 3° - os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a 
patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão 
ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não 
solicitados. Parágrafo único - Os psicólogos não colaborarão com eventos e 
serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades. 
Art. 4° - Os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão de 
pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a 
 
34 PC/CFM/Nº 05/1985 PROCESSO CONSULTA CFM-CONS. Nº 32/84, Consulta referente à 
orientação para a correta aplicação da CID, questão a que interessa o pleito formulado pelo auto-
denominado "GRUPO GAY DA BAHIA". Disponível em: 
https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/pareceres/BR/1985/5_1985.pdf. Acesso em 30 jul. 2021. 
35BIANCARELLI, A. “Encontro em Minas quer ‘curar’ homossexuais”. Folha de São Paulo, 11 de jun. 
1998. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff11069830.htm. Acesso em: 09 mar. 
2021. 
31 
 
 
reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais 
como portadores de qualquer desordem psíquica36. 
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi alterado em 2009 pela Lei 
12.010, que ficou conhecida como a Lei Nacional da Adoção e em 2017, pela Lei nº 
13.509, denominada Lei dos Prazos, dentre outras várias alterações. O aludido 
Estatuto, mesmo antes das alterações referidas, afirmava ser o acolhimento 
institucional ou familiar medida provisória e excepcional, constituindo-se, deste modo, 
instrumento legal suficiente para atender aos direitos humanos de crianças. Contudo, 
inúmeras delas ficaram, e ficam, acolhidas até a maioridade. Segundo Lourau, “isto 
tem conexão com uma miríade de instituídos atinentes aos (des)cuidados com a 
infância, considerando as referências teóricas da análise institucional”37. 
A partir das alterações legislativas supracitadas (2009 e 2017) crianças não 
poderiam, em tese, permanecer em situação de acolhimento, familiar ou institucional, 
por período superior a dois anos (2009)38 e dezoito meses (2017)39, excetuando-se 
àquelas situações, baseadas em parecer técnico fundamentado das equipes 
interprofissionais dos programas de acolhimento (familiar ou institucional) e das Varas 
com Competência em Infância, Juventude e Idoso (VIJI), bem como de promoções 
ministeriais e decisões dos juízes, as quais também têm que expressar os motivos da 
continuidade do acolhimento. Assim, passados mais de vinte e oito anos, o Congresso 
Nacional, provocado por movimentos da sociedade civil organizada e pelo próprio 
Ministério da Justiça, produziu alterações no ECA, no tocante à convivência familiar e 
comunitária e nos prazos que afetam drasticamente o transcorrer saudável da 
infância. 
Em 1 de junho 2021, são 4.956 crianças disponibilizadas à adoção, ou seja, 
com a ação de destituição do poder familiar com trânsito em julgado, enquanto o 
 
36CONSELHO FEDERAL DE PSICOLLOGIA. Resolução CFP n° 001, de 22 de março de 1999. 
Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/1999/03/resolucao1999_1.pdf. Acesso em: 09 
mar. 2021. 
37 LOURAU, R. Análise Institucional e práticas de pesquisa. Rio de Janeiro: UERJ, 1993. 
38 BRASIL. Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. Dispõe sobre adoção; altera as Leis nos 8.069, de 
13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente, 8.560, de 29 de dezembro de 1992; 
revoga dispositivos da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, e da Consolidação 
das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943. Disponível 
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12010.htm.Acesso em: 15 jun. 2021. 
39 BRASIL. Lei n. 13.509, de 22 de novembro de 2017. Dispõe sobre adoção e altera a Lei nº 8.069, 
de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), a Consolidação das Leis do 
Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e a Lei nº 10.406, de 
10 de janeiro de 2002 (Código Civil). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2017/lei/l13509.htm. Acesso em: 15 jun. 2021. 
32 
 
 
número total de crianças acolhidas é de 30.27240. Os números não fecham não em 
razão, apenas, do perfil dos 32.876 habilitados, e sim em função da extrema 
morosidade da máquina do judiciário que leva até 7,6 anos para destituir o poder 
familiar, enquanto o próprio ECA determina que a tramitação total da ação seja de 120 
dias. 
As alterações legislativas, notadamente a que culminou com a promulgação da 
Lei nº 13.509/2017, surgiram do próprio executivo através do lançamento de pesquisa 
pública do Ministério da Justiça com proposição de Anteprojeto de Lei de alteração ao 
ECA, com base, inclusive, na demora exacerbada dos processos de adoção. O 
Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a Associação Nacional de Grupos 
de Apoio à Adoção (ANGAAD), dentre outras entidades formadoras da rede de 
proteção à criança, atuaram ativamente nas etapas que se sucederam, seja na 
realização de audiências públicas, seja como consultores convidados pelo próprio 
Ministério da Justiça. 
A adoção judicial é o processo legal que consiste no ato de se incluir 
espontaneamente como seu filho uma criança disponibilizada para esse tipo de 
inserção familiar, desde que respeitadas as condições jurídicas para tal, passando a 
existir laços de parentalidade e filiação sem qualquer tipo de diferenciação quanto à 
parentalidade natural de filho das próprias entranhas. Essa parentalidade constitui-se 
por sentença, sendo um meio possível de propiciar filiação às crianças que não 
podem, por motivos diversos, conviver com seus genitores ou família extensa. 
Considero que a partir do ECA, transformações ocorreram no que se refere à 
possibilidade de se adotar filhas e filhos no Brasil. Quanto à adoção por casais LGBT+, 
há que se considerar – agora mais que nunca – o terreno instável que permeia tal 
possibilidade, posto que a interpretação do texto constitucional sobre a necessidade 
de haver a diferença de sexo para se considerar a formação de uma união estável 
constitui-se em premissa para magistrados e promotores públicos Brasil afora41, não 
obstante a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, em 2011, sobre a 
constitucionalidade das uniões estáveis homoconjugais. 
Faz-se necessário considerar que o reconhecimento da constitucionalidade das 
uniões estáveis homoafetivas pelo Supremo Tribunal Federal é, ainda, recente, e não 
 
40BRASIL. CNJ. SNA. op. cit. jun. 2021. 
41 DIAS. op. cit. 2009. 
33 
 
 
se consubstancia em Lei, por mais que exista projeto de Lei denominado Estatuto das 
Famílias, proposto pelo IBDFAM, PLS 470/201342 da ex-senadora Lídice da Mata, e 
que não se confunde com o nefasto Estatuto da Família, de autoria do Deputado 
Federal Anderson Ferreira. Deste modo, há que se colocar em análise, não apenas 
do ponto de vista do Direito, mas em uma dimensão ético-política-social-psicológica, 
como se situam as famílias homoafetivas no momento atual. 
Os mesmos dilemas ético-políticos-social-psicológicos precisam ser 
enfrentados também nos processos de adoção, guarda e tutela, uma vez que apenas 
divergem acerca da natureza jurídica dos vínculos, não dos afetos que circulam entre 
crianças e adultos que se relacionam. 
O tema da pesquisa realizada surgiu a partir do REsp do STJ Superior Tribunal 
de Justiça (STJ – REsp n. 889.852/RS – 4ª Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – 
DJ: 27 abr. 2010) que traz em seu bojo estudos da Universidade de Virgínia, da 
Universidade de Valência e da Academia Americana de Pediatria, que assim 
indicam43: 
•“ser pai ou ser mãe não está tanto no fato de gerar, quanto na circunstância 
de amar e servir”; 
•“nem sempre, na definição dos papéis maternos e paternos, há coincidência 
do sexo biológico com o sexo social”; 
•“o papel de pai nem sempre é exercido por um indivíduo do sexo masculino”; 
•os comportamentos de crianças criadas em lares homossexuais “não variam 
fundamentalmente daqueles da população em geral”; 
•“as crianças que crescem em uma família de lésbicas não apresentam 
necessariamente problemas ligados a isso na idade adulta”; 
•“não há dados que permitam afirmar que as lésbicas e os gays não são pais 
adequados ou mesmo que o desenvolvimento psicossocial dos filhos de gays 
e lésbicas seja comprometido sob qualquer aspecto em relação aos filhos de 
pais heterossexuais”; 
•“educar e criar os filhos de forma saudável o realizam semelhantemente os 
pais homossexuais e os heterossexuais”; 
•“a criança que cresce com 1 ou 2 pais gays ou lésbicas se desenvolve tão 
bem sob os aspectos emocional, cognitivo, social e do funcionamento sexual 
quanto a criança cujos pais são heterossexuais”. 
Assim, as noções de família, de possibilidades e competências para o cuidado 
de crianças, a colocação no lugar de filho, o exercício pleno da parentalidade é tão 
 
42 BRASIL. Senado Federal. PLS n. 470, de 2013. Dispõe sobre o Estatuto das Famílias e dá outras 
providências. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-
getter/documento?dm=4590857&ts=1594021233924&disposition=inline. Acesso em: 15 jun. 2021. 
43BRASIL. STJ. op. cit. RE n. 889.852 RS 2006/0209137-4. R 
34 
 
 
bem realizado por casais héteros como por casais homotransafetivos. A ideia é, então, 
apreender o que os filhos e as filhas dessas famílias têm a dizer sobre o assunto. 
Bailey et al. em pesquisa realizada no Departamento de Psicologia da 
Universidade Americana Northwestern verificaram que mais de 90% dos filhos de pais 
homossexuais são heterossexuais44. Já, Zambrano ressalta que, na conjuntura da 
adoção, os pontos mais importantes encontram-se nas relações socioafetivas 45 . 
“Entre esses aspectos, sobressaem a capacidade de cuidar e a qualidade dos 
relacionamentos, que funcionam como protagonistas da boa parentalidade”46. 
O ECA afirma o direito à convivência familiar de crianças, o que implica em 
enfrentar as questões que acabam por infringir a milhares de crianças a condição de 
acolhidas. 
Não há que se falar em novos arranjos familiares, pois famílias constituídas por 
modos de se ser família que rompem com a tríade mãe-pai-filho existem no curso da 
história. Todavia, os arranjos familiares considerados desviantes não reivindicavam 
ao Estado a chancela de família. Não apenas existiam famílias homoconjugais, mas, 
muitas delas tinham filhos, naturais ou adotivos. Desta feita, a novidade estaria na 
busca pelo reconhecimento do estatuto de família dos arranjos que não se 
enquadravam no padrão heteronormativo47. 
1.2 Consecução do Afeto 
Passadas as questões médicas e psicológicas, em um breve histórico, 
seguimos para a consecução do afeto, que, segundo Maria Berenice Dias, dá base às 
famílias homoafetivas por terem “mútua assistência afetiva”48. O afeto, pois, é o fio 
condutor dos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo, sendo o alicerce para 
a constituição da família. 
É também de Dias, inclusive, a autoria do termo homoafetivo, em sua visão de 
ativista pela causa LGBT+, além de doutrinadora das áreas dos direitos das famílias, 
 
44 BAILEY, J. M. et al. Sexual orientation of adult son of gays father. Developmental Psychology, 
Leicester, v. 35, n. 1, p. 124-129, 1995. 
45 ZAMBRANO. op. cit. 2006. 
46 ARAÚJO, L. F. A.; OLIVEIRA, J. S. C. A adoção de crianças no contexto da homoparentalidade. 
Arquivos Brasileiros de Psicologia, v. 60, n. 3, 2008. Disponível em: 
https://www.redalyc.org/pdf/2290/229017563006.pdf. Acesso em: 01 jun. 2021. 
47DÁROS. op. cit. 2021. 
48 DIAS, 2009, loc.cit. 
35 
 
 
da mulher e da criança. Para ela o fundamento do relacionamento entre duas pessoas 
não é mais a “função procriacional”, mas sim a vivência autêntica desse afeto mútuo49. 
Darós50, por sua vez, critica o termo ao entender que: 
(...) o neologismo referido é uma tentativa de dessexualizar homossexuais, 
no intuito de lhes garantir direitos. Direitos esses que deveriam ser garantidos 
a quaisquer pessoas, independentemente de orientação sexual e identidade 
de gênero. 
Atrelado a essas questões, pontuamos o papel da sexualidade nos âmbitos 
público e político. A homoafetividade questiona a formulação de direitos que têm como 
base o exercício da sexualidade dos indivíduos, e que, ao mesmo tempo, contribui 
para excluir esses mesmos sujeitos do direito fundamental à liberdade e, portanto, do 
direito de exercer sua forma de expressão do corpo e do afeto. Como sujeitos sociais 
que são, os sujeitos homoafetivos reivindicam para si o direito de constituírem família, 
o direito à cidadania e o direito ao exercício da educação e da socialização de seus 
filhos, quer biológicos, quer adotivos51. 
Os mitos de que as crianças/adolescentes adotados por casais homoafetivos, 
ainda designados na grande maioria da literatura pátria como “pares homoafetivos”, 
não teriam as necessárias “referências” comportamentais e seriam, também, 
incentivados a exercerem a sexualidade nos moldes familiares, como se ocorresse 
uma forma de estímulo a também serem homoafetivos, não possuem fundamentos 
reais. Uma vez que sujeitos homoafetivos são filhos de relacionamentos 
heterossexuais, não existe uma relação direta entre tais aspectos52. 
Em meio a todas essas questões de natureza, inclusive, dogmáticas, observa-
se o constante aumento do número de crianças e adolescentes inseridas no SNA – 
Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, no aguardo de uma família. As crianças 
acolhidas não são as de perfil padrão dos habilitados brasileiros, pois a criança real 
não guarda similaridade com a criança idealizada. Em 01 de junho de 2021, o número 
total de crianças acolhidas, no Brasil, é de 30.272, sendo que apenas 4.956 estão 
disponíveis à doção, ou seja, apenas 16,37% estão disponíveis, enquanto o restante 
 
49 IDEM, Ibidem. 
50 DARÓS, L. E. S. Adoção judicial de filh@s por casais homossexuais: a heteronormatividade 
em questão. 2016. Tese (Doutorado em Políticas Públicas e Formação Humana) -Universidade do 
Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016. Disponível em: http://ppfh.com.br/wp-
content/uploads/2018/05/Tese-NORMALIZADA-1.pdf. Acesso em: 20 dez. 2020. 
51 MELLO, L. Outras famílias: A construção social da conjugalidade homossexual no Brasil. Cadernos 
Pagu, v. 24, n. 1, p. 197-225, 2005. 
52 DIAS, op. cit., 2009. 
36 
 
 
continua no limbo. Do total acolhido, 18.382 têm a partir dos 9 anos de idade; 9.716 
têm irmãos; 21% são pardos; 6,5% são pretos; 13,9% são brancos; 58,1%, têm etnia 
não informada e 50,1% são do sexo masculino53. 
Segundo Lidia Weber, tais crianças têm dificuldades de inserção social e no 
estabelecimento e na manutenção de vínculos afetivos, além de terem a formação de 
uma autoimagem negativa, ocasionando problemas nas esferas do desenvolvimento 
humano e psicossocial de suas vidas54. 
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)55 determina em seu artigo 4º 
que toda criança e todo adolescente possuem o direito à “convivência familiar e 
comunitária”. Tal inserção é advinda de princípios constitucionais insertos no artigo 
227 da Constituição Federal, norteando, dessa forma, a necessidade humana de 
vínculos afetivos e sociais, além dos direitos à saúde, educação, cultura, lazer, dentre 
outros. Portanto, a convivência familiar deve ser estabelecida a todas as crianças, 
independentemente da orientação sexual da família adotante, vez que a modalidade 
de família adotiva é a única e derradeira possibilidade dessas crianças serem parte 
de uma família e ocuparem o lugar de filho ou filha que lhes é de direito. 
Os critérios para a seleção do que venha a ser uma família ideal e apta para 
adotar são grandes e perpassam por uma análise acurada dos pretendentes e 
independe de sexo, gênero ou estado civil. Os pretendes à parentalidade responsável 
passam por preparação que, a depender da comarca, vão de 3 a 10 encontros em 
Grupos de Apoio à Adoção – GAA; juntam todos os documentos pessoais, atestados 
de sanidade física e mental, certidões cíveis e criminais; são submetidos a estudos 
psicológicos e sociais; passam pelo crivo do Ministério Público, para, ao final, serem 
inseridos, quando da prolação da sentença, no já citado Sistema Nacional de Adoção 
e Acolhimento. 
Para Weber, torna-se necessário ampliar e superar os debates concernentes à 
adoção, à família e à orientação sexual56. A adoção é um ato jurídico, um processo 
judicial com todas as suas intercorrências, guiadas pelo ECA, pelo Código Civil e pelo 
 
53 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Sistema Nacional de Adoção. 2021. Disponível em: 
https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/adocao/. Acesso em: 01 jun. 2021. 
54 WEBER, L. N. Aspectos psicológicos da adoção. Curitiba: Juruá, 2007. 
55 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do 
Adolescente. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 20 jan. 
2021. 
56 WEBER, op. cit. 2007. 
37 
 
 
Código de Processo Civil, mas ainda alicerça o parentesco com base no fator 
biológico, em detrimento da dimensão afetiva manifestada pelas partes envolvidas57. 
Maria Berenice Dias assevera – o que é uma realidade escancarada, que 
muitos não querem enxergar – que famílias homoafetivas existem desde sempre, que 
casais formados por pessoas do mesmo sexo têm filhos58. Contudo, o preconceito 
ainda existe e, pelo que se verifica, aumenta nos tempos atuais. 
O preconceito foi entendido ora como disposição da personalidade59, ora como 
“estilo cognitivo” 60 . A questão, contudo, deve ser analisada sob os aspectos 
psicossociais, já que envolve questões de ordem política e ideológica 61 . Como 
sublinham Camino, Silva e Machado62, a partir desse enfoque psicossocial, verifica-
se que o preconceito parte de grupos majoritários (proprietários do poder político), 
mediante comportamentos de discriminação em relação aos grupos minoritários. 
Numa interpretação livre e pessoal verifico que o preconceito parte dos que 
entendem ter poder – e alguns efetivamente o tem –, em face daqueles em situação 
de vulnerabilidade. Traduzindo para uma linguagem clara e coloquial, o preconceito é 
utilizado para extirpar seus próprios demônios, sendo uma atitude covarde dos que 
detém a força física ou o poderio socioeconômico-político. Essa é uma rápida 
pontuação pelo momento de conservadorismo que passa o mundo globalizado em 
pleno século XXI. 
1.3 Avanços e Preconceitos 
Como bacharela em Letras, verifico que a sociedade acompanha a arte ou a 
arte acompanha a sociedade, numa montanha russa de luzes e trevas, que, ao 
pontuarmos nos estilos literários, tornam-se claras as diferenças que marcam os 
estilos. Por exemplo, o Barroco, movimento que tem início na Europa, nos séculos 
XVII e XVIII (primeira metade) e no Brasil tem o seu início em 1601, com a publicação 
 
57 DIAS, op. cit. 2009. 
58 DIAS, M. B. Filhos do afeto. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. 
59 ADORNO, T. W. et al. The authoritarian personality. New York: Harper and Row, 1950. 
60 GAERTNER, S. L.; MCLAUGHLIN, J. P. Racial stereotypes: associations and ascriptions of positive 
and negative characteristics. Social Psychology Quarterly, v. 46, n. 1, p. 23–30, 
1983. doi.org/10.2307/3033657. 
61BILLIG, M. Racismo, prejuicios y discriminacion. In: MOSCOVICI, S. (ed.). Psicologia social II: 
pensamiento y vida social. Barcelona: Paidós, 1984. p. 575-600. 
62 CAMINO, L., SILVA, P., MACHADO, A. As novas formas de expressão do preconceito racial

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