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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL MONALISA PEREIRA DE ARAÚJO MEDEIROS A CONDIÇÃO DE VIDA E SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA DA CIDADE DE NATAL/RN E SEUS DETERMINANTES SÓCIO HISTÓRICOS: uma análise da realidade e dos serviços prestados na atenção básica à saúde NATAL/RN 2022 MONALISA PEREIRA DE ARAÚJO MEDEIROS A CONDIÇÃO DE VIDA E SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA DA CIDADE DE NATAL/RN E SEUS DETERMINANTES SÓCIO HISTÓRICOS: uma análise da realidade e dos serviços prestados na atenção básica à saúde Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Serviço Social. Orientadora: Profª Draª Maria Célia Correia Nicolau NATAL/RN 2022 Medeiros, Monalisa Pereira de Araújo. A condição de vida e saúde da população em situação de rua da Cidade de Natal/RN e seus determinantes sócio históricos: uma análise da realidade e dos serviços prestados na atenção básica à saúde / Monalisa Pereira de Araújo Medeiros. - 2022. 43f.: il. Monografia (Graduação em Serviço Social) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento de Serviço Social. Natal, RN, 2022. Orientadora: Profª. Draª. Maria Célia Correia Nicolau. 1. População em situação de rua - Monografia. 2. Saúde - Monografia. 3. Capitalismo - Monografia. 4. Políticas Públicas - Monografia. I. Nicolau, Maria Célia Correia. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/Biblioteca CCSA CDU 364.682.42:61 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355 MONALISA PEREIRA DE ARAÚJO MEDEIROS A CONDIÇÃO DE VIDA E SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA DA CIDADE DE NATAL/RN E SEUS DETERMINANTES SÓCIO HISTÓRICOS: uma análise da realidade e dos serviços prestados na atenção básica à saúde Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Serviço Social. Orientadora: Profª Draª Maria Célia Correia Nicolau Aprovado em: _____/______/2022 BANCA EXAMINADORA Profa. Dra. Maria Célia Correia Nicolau (UFRN) Orientadora Profa. Dra. Ilena Felipe Barros (UFRN) Membro Interno Beatriz Suellen Pereira da Silva – CRESS 6401 Membro Externo AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus, por diante de tantos desafios e dificuldades, ter me capacitado para a construção deste trabalho. A minha mãe, por todo esforço, dedicação, apoio, força, paciência, compreensão, para que eu pudesse chegar até aqui e estar encerrando mais um ciclo na minha vida acadêmica. A minha família e amigos/as, por todo apoio e incentivo. A minha orientadora, Maria Célia Correia Nicolau, por todas as orientações e apoio para a realização deste trabalho e a todos os professores e profissionais que contribuíram para o meu desenvolvimento acadêmico/profissional. Enfim, gratidão a todos/as que torceram por mim e estiveram ao meu lado durante esse processo. RESUMO Este Trabalho de Conclusão de Curso, resultante de uma pesquisa bibliográfica e revisão integrativa, apresenta uma análise acerca da condição de vida e saúde da população em situação de rua e seus determinantes sócio-históricos, tratando mais especificamente desse fenômeno na cidade de Natal/RN. Tem por objetivo identificar os motivos que levam e determinam a população em situação de rua a permanecer nas ruas, analisando a condição de vida e saúde desse contingente populacional no município de Natal/RN. Analisar seus determinantes sócio- históricos, sob a lógica capitalista e o ideário neoliberal, ao mesmo tempo em que identifica e analisa os serviços na área da atenção à saúde voltada para essa população. O sistema capitalista tem em sua lógica a ideia de gerar cada vez mais lucro, e, concomitante a isso, promove de forma acelerada a pobreza, estando essa intrínseca ao seu funcionamento. Inserida na “superpopulação relativa”, vivendo em condição de pauperismo, a população em situação de rua vivencia as contradições básicas do sistema de produção vigente. Destituídas dos direitos mais básicos, que contraditoriamente no Brasil são garantidos em termo constitucionais, essas pessoas vivem em um estado subumano, e, consequentemente, apresentando um quadro de saúde fragilizado. As reflexões teórico-metodológicas das informações obtidas através das pesquisas bibliográfica e documental, e sistematizadas neste trabalho, possibilitaram um entendimento de como vive esse contingente populacional, a sua condição de saúde e como o Estado responde, por meio das políticas públicas, mais especificamente da saúde e assistência, a essa situação da população de rua, que diante de ideologia neoliberal, é naturalizada e perpetuada como uma escolha do indivíduo. Palavras chaves: População em situação de rua; Saúde; Capitalismo; Políticas Públicas. ABSTRACT This Work and Course Conclusion, resulting from a bibliographic research and integrative review, presents an analysis about the life and health condition of the homeless population and its socio-historical determinants, dealing more specifically with this phenomenon in the city of Natal/RN. It aims to identify the reasons that lead and determine the homeless population to remain on the streets, analyzing the living and health condition of this population contingent in the city of Natal/RN. It identifies and analyzes its socio-historical determinants, under the capitalist logic and neoliberal ideology, at the same time that it identifies and analyzes the services in the area of health care aimed at this population. The capitalist system has in its logic the idea of generating more and more profit, and, concomitantly, generates poverty in an accelerated way, which is intrinsic to its functioning. Inserted in the relative overpopulation (MARX, 1980), living in a condition of pauperism, the homeless population experiences the basic contradictions of the current production system. Deprived of the most basic rights, which contradictorily in Brazil are guaranteed in constitutional terms, these people live in subhuman conditions, and consequently, have a fragile health condition. The theoretical-methodological reflections of the information obtained through the bibliographical and documentary research, and systematized in this work, allowed an understanding of how this population contingent lives, their health condition and how the State responds, through public policies, more specifically health and assistance, to this situation of the homeless population, which in the face of neoliberal ideology, is naturalized and perpetuated as an individual's choice. Keywords: Homeless population; Health; Capitalism; Public policy. LISTA DE SIGLAS BIRD - Banco Mundial; CADÚNICO - Cadastro único; CENTRO POP - Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua; CNAR - Consultório na Rua; CRDH - Centro de Referência em Direitos Humanos; IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; MDS - Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; MNPR - Movimento Nacional da População em Situação de Rua; MPC - Modo de Produção Capitalista;OMS - Organização Mundial da Saúde; ONU - Organização das Nações Unidas; PNAB - Política Nacional de Atenção Básica; PNPSR - Política Nacional para a população em situação de Rua; PSR - População em Situação de Rua; RDH - Relatório de Desenvolvimento Humano; SETHAS - Secretaria de Estado do Trabalho, da Habitação e da Assistência Social; SNAS - Secretaria Nacional de Assistência Social; SUAS - Sistema Único de Assistência Social; SUS - Sistema Único de Saúde; UBS - Unidades Básicas de Saúde; UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte; UPAs - Unidades de Pronto Atendimento. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 9 2. A PROBLEMÁTICA DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA E A LÓGICA DO SISTEMA CAPITALISTA E DO IDEÁRIO NEOLIBERAL .......................................... 14 2.1 A CONDIÇÃO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA E SEUS DETERMINANTES SOB A LÓGICA CAPITALISTA ................................................. 14 2.2 A RESPOSTA DO ESTADO FACE A CONDIÇÃO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA SOB O IDEÁRIO NEOLIBERAL NA PARTICULARIDADE DA ATENÇÃO À SAÚDE ................................................................................................ 20 3. OS DETERMINANTES SÓCIO HISTÓRICOS DAS CONDIÇÕES DE VIDA E SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA DE NATAL .............................. 27 3.1 A CONDIÇÃO DE VIDA E SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA DE NATAL/RN ........................................................................................................... 27 3.2 A POLÍTICA DE SAÚDE NA ATENÇÃO BÁSICA PARA A POPULAÇÃO SITUAÇÃO DE RUA NA CIDADE DE NATAL ........................................................... 33 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 38 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 40 9 1. INTRODUÇÃO De acordo com a Política Nacional para a população em situação de Rua (PNPSR), instituída pelo decreto n° 7.053 de 23 dezembro de 2009, a população em situação de rua (PSR) é um Grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória (BRASIL, 2021). Não é preciso andar muito pelas ruas da cidade para notar a presença de pessoas que vivem nas ruas, uma população incluída marginalmente (MARTINS, 1997) na sociabilidade capitalista e invisível para muitos, mas que está bem à nossa frente diariamente, cujas marcas se tornam visíveis: pelo não trabalho que o tira da produção; no alimento que falta e chega pela solidariedade humana; na saúde que se deteriora, tendo seu cuidado dificultado pelo difícil acesso a atenção básica; na educação que ignora tal cenário; no vestuário andrajoso e na moradia temporária e/ou permanente forrada de papelão em baixo das marquises das grandes lojas, quando a noite chega. A população em situação de rua é uma das mais gritantes expressões da questão social1 na sociedade contemporânea. Pensar essa categoria também é pensar a sociabilidade capitalista, a sua lógica de funcionamento primada pela desigualdade social. Vivemos em uma sociedade onde a riqueza é produzida coletivamente, mas o lucro é privado, sendo sua distribuição desproporcional e estando o consumo de bens básicos e indispensáveis cada vez mais condicionados ao poder aquisitivo que o indivíduo possui, aumentando a desigualdade social cada vez mais, uma vez que a riqueza se encontra nas mãos de poucos. O Brasil continua sendo o nono país mais desigual do mundo, quando se trata de distribuição de renda dos cidadãos, e, ao longo do tempo, a situação vem piorando. É o que aponta a Síntese de Indicadores Sociais, divulgada pelo Instituto 1A Questão Social é apreendida como o conjunto de expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade. (IAMAMOTO, 1998, P. 27) 10 Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e com base nos parâmetros do Banco Mundial (Bird). Em 2019, a extrema pobreza se agravou em relação a 2012: nos últimos sete anos, a quantidade de pessoas que estão na miséria passou de 6,5% da população para 13,5%. Isso significa que o total dos extremamente pobres eram 13,6 milhões de pessoas. Os pretos e pardos, principalmente as mulheres, são os mais afetados. O estudo do IBGE revelou que 56,8% das pessoas abaixo da linha da extrema pobreza viviam no Nordeste (27,2% da população total do país) (VERA BATISTA, 2020). A população em situação de rua vive em condições precárias, não tendo acesso aos seus direitos básicos e fundamentais enquanto ser humano, como alimentação, higiene, moradia e saúde; e esse contingente populacional que vive das e nas ruas vêm aumentando consideravelmente nos últimos anos. Como essas pessoas chegam à rua e nela permanecem exige uma leitura e análise dos determinantes sócio-históricos inerentes a uma sociedade regida por uma política neoliberal, que, segundo Casara (2017) é regida por diversas estratégias, as quais formatam e controlam essas pessoas transformadas em mercadorias. São indivíduos que não tem valor de uso no mercado, portanto integram a lógica da sociabilidade capitalista, a qual cria enormes contingentes de homens e mulheres sem trabalho ou vivenciando formatos de trabalhos precarizadas, compelindo “essa população à situação de absoluta pobreza, vulnerabilidade e degradação humana” (SILVA, 2006, p. 75). A existência dessas pessoas em situação de rua, portanto, é produzida pelo capitalismo, essencial ao mesmo, uma vez que elas se encontram na superpopulação relativa, população supérflua2 ou o chamado exército industrial de reserva, que, segundo Marx (1989) assume nas fases cíclicas do capital as formas que se materializam nas superpopulações: flutuante, latente e estagnada. O conjunto da superpopulação relativa ou exército industrial de reserva encontra-se submetido ao pauperismo. 2Segundo Marx (2014) a acumulação capitalista sempre produz na mesma proporção de sua expansão, uma população supérflua, a qual extrapola as necessidades do capital, significa que “[...] a população trabalhadora, ao produzir a acumulação do capital, produz, em proporções crescentes, os meios que fazem dela, relativamente, uma população supérflua” (MARX, 2014, p. 742). 11 Neste raciocínio, a situação de rua vivida pela população não é uma condição escolhida pelas pessoas que nela se encontram, muito pelo contrário, elas foram impelidas a essa condição. O modo de produção em que vivemos exige a existência de pessoas que não conseguirão inserção no mercado formal de trabalho. E quanto mais o capitalismo se desenvolve, mais contradições e atrocidades ele carrega. O movimento de transformação de trabalhadores ocupados em desempregados ou semiempregados é constante, quanto maior for a acumulação e o desenvolvimento do capitalismo, maior será a exploração e menor o número de trabalhadores necessários (MARX, 2013 Apud TIENGO,2018, p139-140). Diante deste cenário, o Brasil possui em termos constitucionais um sistema de Seguridade Social, cuja letra da lei diz que toda a população deve ter acesso à Saúde, sendo essauniversal; a Assistência Social, oferecida para quem dela necessitar; e a Previdência Social, acessada por meio da contribuição, mas que na realidade não alcança toda a população! E, qual o porquê dessa contradição? É importante ressaltar a questão do processo saúde-doença dessa população, pois a saúde vai além do bem estar físico, uma vez que ela está atrelada a diversos fatores da vida social. A condição de vida e trabalho de um indivíduo está diretamente relacionada com sua situação de saúde. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), os determinantes sociais da saúde são as condições sociais em que as pessoas vivem e trabalham. (BUSS e FILHO, 2007, p. 78). Portanto, pensando nesse conceito e nas condições de acesso aos direitos constitucionais em contradição com o agravamento das expressões da questão social, usando como pressuposto a situação de pobreza extrema na qual a população em situação de rua vive, e ainda diante a um contexto pandêmico, que para o seu enfrentamento são primordiais o isolamento, a constante higiene e o uso de itens de proteção individual, suscita imaginar como está a saúde desses indivíduos, fragilizada. Frente a essa problemática, o trabalho em questão tem como proposta identificar e analisar as condições de vida e saúde da população em situação de rua e seus determinantes sócio históricos na particularidade da cidade de Natal. O tema em questão sempre me chamou a atenção, justamente por querer entender como esse contingente populacional chega às ruas e ali permanecem. Após entrar na Universidade, espaço que proporcionou fazer uma leitura crítica da nossa sociedade e compreender as contradições existentes diante o contexto da sociabilidade 12 capitalista e o quanto está intrínseco a essa situação, impulsionou a vontade de entender mais profundamente esse fenômeno que vem aumentando. Com a inserção no campo de estágio3, em um serviço de saúde de urgência e emergência, observei que sempre chegava demandas de usuários em situação de rua para o Serviço Social, o que me despertou a reflexão acerca da saúde da população em situação de rua e a importância do seu acesso a atenção básica de saúde e aos serviços da política de assistência. Sendo a saúde da população em situação de rua uma das expressões da questão social, que tem como agravante as contradições do sistema de produção capitalista, é uma importante discussão para o Serviço Social. Além de atuar em diversos espaços e com as políticas sociais, o/a Assistente Social age diretamente nas expressões da Questão Social, desse modo atendendo demandas da população em situação de rua. Assim, evidencia-se a importância da abordagem desse tema para a profissão, auxiliando a produção de conhecimento, o aprimoramento intelectual e no atendimento as demandas. Para a realização do estudo em questão foi delimitado como objetivos: analisar as condições de vida e saúde da população em situação de rua no município de Natal/RN, identificando seus determinantes sócio históricos sob a lógica capitalista, orquestrados pelo neoliberalismo4; constatar e analisar serviços na área da atenção à saúde voltadas para a população em situação de rua; e identificar os motivos que levam/determinam a população em situação de rua a permanecer nas ruas, em situação de vulnerabilidade social. A metodologia escolhida para direcionar a pesquisa pautou-se na materialista histórico-dialético, por permitir uma análise do tema, possibilitando um olhar para além do imediatismo posto no problema e considerando o contexto sócio-histórico. Além disso, o método está vinculado ao modo de analisar, agir e transformar a sociedade, enxergando as contradições do sistema capitalista e objetivando superá- lo. Dessa forma, relacionando a problemática com o método marxista, permitiu uma 3 Estágio realizado no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel / Pronto Socorro Clóvis Sarinho, hospital referência em trauma do Rio Grande do Norte, no período de junho/2021 a fevereiro/2022. 4 A despeito do neoliberalismo segundo a concepção de Harvey (2008): “é uma teoria das práticas político-econômicas que propõe que o bem-estar humano pode ser melhor promovido liberando-se as liberdades e capacidades empreendedoras individuais no âmbito de uma estrutura institucional caracterizada por sólidos direitos a propriedade privada, livres mercados e livre comércio” (HARVEY, 2008, p.12). 13 análise das relações sociais a partir das raízes do sistema capitalista, enxergando a questão numa perspectiva de totalidade. Procurando trabalhar os objetivos explicitados, utilizou-se a abordagem qualitativa, que para Minayo (2001), trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. Também foi utilizado a abordagem quantitativa, na medida em que foi apresentado dados estatísticos acerca da população em situação de rua. Para o desenvolvimento do estudo, foi utilizada a pesquisa bibliográfica e revisão integrativa, pois o trabalho foi realizado a partir da leitura de um conjunto de textos acadêmicos e livros que dialogam com o tema, e partindo de estudos já realizados. Fundamentando a parte teórico-metodológica deste trabalho, utilizou-se alguns autores que tratam do objeto deste estudo, entre eles: Tolentino e Bastos (2017); Tiengo (2018); Costa (2005); Paiva, Lira, Justino, Miranda e Saraiva (2016); Netto e Braz (2012); Siqueira (2013), Silva, Natalino e Pinheiro (2020), Iamamoto (1998). Diante de todas essas questões para construção deste trabalho, apesar do curto tempo para a realização e ainda diante de um contexto pandêmico, que está sendo vivenciado a mais de dois anos, foi possível contemplar os objetivos colocados. De forma a compreender os rebatimentos do Modo de Produção Capitalista, somado a lógica neoliberal, para toda a população, principalmente a que se encontra nas ruas. E que apesar do país ter em termos constitucionais a garantia do sistema de Seguridade Social, as políticas que o compõe não chegam de fato a população. O Trabalho de Conclusão de Curso está estruturado da seguinte forma: no item 2 (dois), que representa o primeiro capítulo, é discutido a problemática da população em situação de rua diante da lógica do sistema capitalista, de modo a situar a questão na nossa sociabilidade e também a resposta do Estado para a problemática em questão. O item 3 (três) traz a discussão da condição de vida e saúde da população em situação de rua do município de Nata/RN e a política de saúde para a PSR na cidade de Natal. Por fim, a última seção versa acerca das considerações finais. 14 2. A PROBLEMÁTICA DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA E A LÓGICA DO SISTEMA CAPITALISTA E DO IDEÁRIO NEOLIBERAL A seção que se inicia é composta por dois itens, nos quais abordam como se configura a população em situação de rua no Brasil, fazendo uma análise da dinâmica do Modo de Produção Capitalista e mostrando como este é contraditório e determinante na produção de pobreza e a desigualdade social. Discute ainda, como o Estado se comporta frente a problemática da PSR, um fenômeno que vem tendo um crescimento acelerado nos últimos anos, que exige urgência de políticas sociais efetivas para o seu enfrentamento. Diante de um cenário de aprofundamento da política neoliberal, que defende a redução das políticas sociais e prima pela naturalização da pobreza, culpabiliza as pessoas pela condição de pobreza que se encontra, o que se torna ainda mais desafiante. 2.1 A CONDIÇÃO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA E SEUS DETERMINANTES SOB A LÓGICA CAPITALISTA Apesar de parecer um fenômeno recente, o contingente populacional que habita as ruas existe desde o surgimentodas sociedades pré-industriais da Europa5, quando o capitalismo começou a se expandir de forma mais rápida e suas contradições afloraram, entre elas, as que para se sustentar, o sistema não absorve parte da população, pois ao mesmo tempo em que se produz um alto nível de riqueza, também se produz de pobreza. (PAIVA, LIRA, JUSTINO, MIRANDA e SARAIVA, 2016, p. 2596) Falando mais especificamente do Brasil, sob a lógica do sistema capitalista, o modelo de colonização, pelo qual o país foi refém, também foi determinante para a exclusão de um grande grupo populacional, que foi expropriado de suas terras, sendo obrigados a migrarem em busca de sobrevivência, e assim aumentando 5 Conforme “contextualização histórica feita por Silva (2009) o qual nos leva a observar o processo histórico onde a revolução industrial encerrou a transição entre o feudalismo e capitalismo, a fase de acumulação primitiva de capitais e de preponderância do capital mercantil sobre a produção. Em meio esta transição o camponês de forma súbita e repentina perde sua propriedade e passa a vender sua força de trabalho nas indústrias na cidade. Porém, nem todos conseguem se adaptar a esta mudança brusca, ficando descartado da produção capitalista e, por conseguinte, passa a sobreviver nas ruas. Descartados estes que acabam se tornado parte do “exército industrial de reserva”, nas palavras de Marx, qual fica à mercê de toda injustiça, em meio a falta de posto de trabalho.” (KLAUMANN, 2015, p 3 e 4) 15 expressivamente a quantidade de pessoas vivendo às margens das grandes cidades. (OLIVEIRA, 2018, p.39-40) De acordo com a primeira e única Pesquisa em nível nacional sobre a População em Situação de Rua, realizada em 2008, são mulheres, homens, crianças, idosos que vivem em situação de pobreza e extrema pobreza nas ruas. De acordo com levantamentos municipais e uma pesquisa nacional, as pessoas que vivem na rua são, em sua maioria, homens (82%), negros (67%), jovens (43,21 dos homens e 52,23% das mulheres até 35 anos) e com baixa escolaridade (17,1% é alfabetizado). O estudo mostrou também que entre os principais problemas que os fizeram chegar à rua, está o álcool e/ou outras drogas (35,5%), o desemprego (29,8%) e desavenças familiares (29,1%) e ainda que 30% tem algum problema de saúde. (SILVA, NATALINO E PINHEIRO, 2020, P. 8) “Desse modo, a ida para as ruas está ligada a diversos determinantes, entretanto não se pode perder de vista o processo social que empurra milhares de pessoas para essa condição.” (PAIVA, LIRA, JUSTINO, MIRANDA E SARAIVA, 2016, P. 2600) O estado em que a população em situação de rua se encontra é totalmente precário. São pessoas destituídas dos direitos sociais mais básicos, como saúde, moradia, alimentação, acesso a higiene básica, a educação, lazer, vivendo da mendicância e das ações filantrópicas. Essas pessoas são vistas, muitas vezes, como perigosas, vagabundas, preguiçosas e são olhadas com um olhar culpabilizador, mas, que na verdade, estão ali por terem sido atingidas por uma lógica completamente desigual, que a estigmatiza. A propósito, vejam, [...] a população em situação de rua é assim estigmatizada, pois escancara as contradições básicas do modo capitalista de produção: a falácia de que todos possuem iguais oportunidades e a evidência de que, embora a produção seja social, a apropriação dos ganhos é sempre individual, sendo as pessoas em situação de rua testemunhas vivas de que a exploração e a desigualdade estão no cerne deste modo de produção (DI FLORA, 1987 Apud MATTOS E FERREIRA, 2004, p. 49). O sistema capitalista tem em sua natureza a ideia de gerar cada vez mais lucro, e isso acontece a partir da exploração da classe trabalhadora, que a única coisa que possui é sua força de trabalho. Enquanto é produzido cada vez mais riqueza pelos trabalhadores, cresce junto a pobreza, essa é a lei geral da acumulação capitalista, onde se desenvolveu o capitalismo, mesmo com suas 16 particularidades, com o crescimento da riqueza, aumentou aceleradamente a pobreza. (NETTO e BRAZ, 2012) A pobreza na sociedade em que vivemos vai além de ser uma contradição do sistema, essa condição é intrínseca ao modo de produção capitalista, isto porque a [...] pobreza não é um aspecto residual, transitório do capitalismo, é estrutural e resultado do seu próprio desenvolvimento. O capitalismo gera acumulação, por um lado, e pobreza por outro; jamais eliminaria nem um nem outro (SIQUEIRA, 2013, P. 164). Pode-se dizer que a condição de pobreza está presente na vida de uma grande parcela da população brasileira. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais, divulgada pelo IBGE em 2021, cerca de 12 milhões de pessoas viviam em extrema pobreza no Brasil, isso significa que elas viviam com menos de R$ 155,00 (cento e cinquenta e cinco reais) por mês, e mais de 50 milhões, ou seja, de 1 a 4 brasileiros, viviam em situação de pobreza, o que significa que viviam com menos de R$450 (quatrocentos e cinquenta reais) por mês. (SÍNTESE DE INDICADORES SOCIAIS, 2021) Além da condição de pobreza, a desigualdade no nosso país é marcante, enquanto uma minoria detém fortunas, a maioria vive em uma situação degradante. O Brasil é o segundo país com maior concentração de renda do mundo, de acordo com o Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado em 2019, o 1% mais rico no país concentra 28,3% da renda total e os 10% mais ricos concentram 41,9% da renda total do país. (G1, 2019) Já o Estado do Rio Grande do Norte, de acordo com Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Anual, de 2012 a 2021, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é o segundo estado brasileiro com maior desigualdade de renda (PAZ, 2022). Dessa forma, se visualiza o quão discrepante é a distribuição de renda no Brasil. A lógica em que funciona o sistema capitalista gera cada vez mais o empobrecimento de grande parcela da população. Karl Marx (1980) trata essa questão em seus estudos como um processo de pauperização, expresso, segundo Tiengo (2018), na miséria, na fome, no desemprego, no baixo nível instrucional, na violência, na ausência de moradia, no trabalho informal, na rualização, na ocupação irregular, na pobreza, na migração, no uso de substâncias psicoativas licitas e ilícitas. 17 O processo de pauperização é o empobrecimento da população gerado e indispensável ao modo de produção capitalista (MPC). Com o desenvolvimento do sistema, os trabalhadores são cada vez mais expulsos do mercado de trabalho e a partir do momento em que são excluídos desse processo, não possuem mais uma fonte de renda, e dessa forma não conseguem suprir suas necessidades básicas, entrando em um estado de pobreza/pauperismo absoluto. (SIQUEIRA, 2013, P. 172- 3-4). Assim, [...] nas palavras de Marx, “o pauperismo constitui o asilo dos inválidos do exército ativo dos trabalhadores e o peso morto do exército industrial de reserva”, sendo, no entanto “condição de existência da produção capitalista”, pois “quanto maiores essa camada de lázaros da classe trabalhadora e o exército industrial de reserva, tanto maior (...) o pauperismo” (1980, I, p. 747) (SIQUEIRA, 2013, P. 173). Por mais que se produza riqueza de forma excedente, indo além do necessário, essa se concentra nas mãos de poucos, como visto anteriormente. Porém, para que se continue produzindo cada vez mais, necessita de uma força de trabalho que esteja sempre à disposição, que ofereça esse trabalho a qualquer custo. Dessa forma, tem-se o “exército industrial de reserva” ou “superpopulação relativa”, como Marx denomina em seus estudos que resultaram em seu livro O Capital (1980); a mão de obra que o sistema tem sempre a sua disposição e que é fundamental para o seu funcionamento. Esse exército é constituídopela classe trabalhadora, população que dispõe somente da venda da sua força de trabalho para sobreviver, vivendo assim de acordo com as necessidades do capital, sendo ora expulsa, ora atraída para o mercado de trabalho. (SIQUEIRA, 2013) Se uma população trabalhadora excedente é produto necessário de acumulação ou do desenvolvimento da riqueza com base no capitalismo, essa superpopulação torna-se, por sua vez, a alavanca da acumulação capitalista, até uma condição de existência do modo de produção capitalista [...] (MARX, 1980, I, p.733-4, APUD SIQUEIRA, 2013, p. 166). Na particularidade da população em situação de rua, essa se encontra em um estado que não consegue mais adentrar ao mercado de trabalho formal, tendo sido totalmente expulsa desse espaço. Marx (1980) traz ainda diferentes formas da existência da superpopulação relativa: a superpopulação flutuante que constitui o conjunto de trabalhadores absorvidos no mercado de trabalho nos momentos de 18 expansão do capital, ao mesmo tempo em que podem ser afastados do círculo da produção, ou seja, ora são repelidos, ora atraídos para o trabalho, seguindo a demanda; a superpopulação latente que integra os trabalhadores rurais, considerando sua inserção no modo capitalista de produção no campo, os quais se veem compelidos e/ou pressionados a migrar para as cidades, aumentando o proletariado urbano; a superpopulação estagnada formada pelos trabalhadores mais pauperizados, que segundo Marx (2014 p. 754) “[...] constitui parte do exército de trabalhadores em ação, mas com ocupação totalmente irregular”, sem vínculos empregatícios, levando-os a essa ocupação na tentativa de garantir sua sobrevivência. Vejam, [...] a população em situação de rua compõe essa superpopulação relativa, como afirma Silva (2009, p. 97): “A reprodução do fenômeno população em situação de rua vincula-se ao processo de acumulação do capital, no contexto da produção contínua de uma superpopulação relativa, excedente à capacidade de absorção pelo capitalismo (SILVA, 2009, p. 97 Apud TIENGO, 2018, p.141). Sem acesso ao mercado formal de trabalho, ao se constituir parte da população sobrante, vivenciando um processo de exclusão social, a população em situação de rua não dispõe de renda mínima para adquirir espaços apropriados para sua habitação, portanto, sem opção tem as ruas da cidade como possibilidade de moradia. Tenhamos presente que a ocupação do solo urbano ou rural está fundamentada sob a “lógica capitalista de apropriação privada dos espaços”, portanto é exigido o “pagamento do valor da terra” ou o teto, do qual a população de rua não dispõe. (WAGNER, DE CERQUEIRA; FRANCISCO, 2022) A população em situação de rua faz parte da superpopulação relativa sendo encontrada principalmente na posição de estagnada. Esses indivíduos estão inseridos em atividades informais em condições precárias e irregulares, tentando conseguir o mínimo para sobrevivência, ou seja, a PSR vive em uma condição de pauperismo, de miséria. De acordo com Marx (1980) existe ainda outro grupo que as características mostram que se encontra abaixo das formas da superpopulação relativa, é o lumpemproletariado. Formado por indivíduos aptos ao trabalho, órfãos e filhos de indigentes e degradados, maltrapilhos e incapacitados para a esfera da produção. Analisando as características da configuração da superpopulação relativa, do lumpemproletariado e da condição de pauperismo, associados a realidade da 19 população e situação de rua - um fenômeno complexo formado por um grupo de indivíduos heterogêneos marcados: pela fome; pela solidão vivenciada nas ruas; violência vivida e sofrida; olhar das pessoas que vivem em condições subumanas; em situação de precariedade -, vemos que esse contingente populacional transita na superpopulação relativa, estando presente de maneira marcante na forma estagnada, e também no lumpemproletariado, vivenciando em todas as formas uma condição de pauperismo, de pobreza, de miséria e destituição de direitos. A partir dessa reflexão visualizamos o quanto a classe trabalhadora está subalternizada a essa lógica imposta na sociedade capitalista. De acordo com a Carmelita Yazbek (2001), a pobreza, a exclusão e a subalternidade são indicadores de uma forma de inserção da vida social e que expressam as relações vigentes na sociedade. São diversos os fatores, que se somam a uma lógica que tem a desigualdade em suas raízes, que levam as pessoas a chegar às ruas. Podemos citar a falta de trabalho, que leva a impossibilidade de garantir uma moradia e uma alimentação adequada, o uso abusivo de psicoativos ilícitos e os vínculos familiares interrompidos e/ou fragilizados. Diante da sociabilidade em que vivemos, essas situações acabam levando as pessoas a sobreviver nas margens das grandes cidades, de forma indigna e dependendo da ajuda das pessoas ao redor e cada vez mais das políticas públicas. o fenômeno “situação de rua” é consequência de diversos condicionantes, como: fatores estruturais – ausência de moradia, trabalho e renda; fatores biográficos relacionados à vida particular do indivíduo – por exemplo, a quebra de vínculos familiares, doenças mentais e uso abusivo de álcool ou drogas; e fatos da natureza – como terremotos ou inundações (LOPES, 2006) (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). De acordo com estimativa realizada pelo IPEA, a população em situação de rua teve um aumento de 140% entre 2012 e março de 2020, subindo para 222 mil pessoas. (IPEA, 2020). Apesar desse grande contingente que forma a PSR, esta população é vista e tratada pela sociedade com compaixão mediante a caridade de alguns, reprimida com atitudes de preconceitos, de violência e/ou indiferenças por outros. Porém, aos olhos de muitos, parece ser uma população invisível e excluída do cenário da sociedade, sobretudo diante da condição em que vive, onde seus direitos não são reconhecidos, e sim negados. 20 A sociedade capitalista é extremamente desigual, exclui parte da população de forma a incluir em seus padrões. Quando falamos que a população em situação de rua é excluída da sociedade não podemos levar “ao pé da letra”, pois como vimos ela é necessária para a lógica do sistema, incluída em seus moldes. De acordo com Martins (1997, p. 32), “a sociedade capitalista desenraiza, exclui, para incluir, de outro modo, segundo suas próprias regras, segundo sua própria lógica.” 2.2 A RESPOSTA DO ESTADO FACE A CONDIÇÃO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA SOB O IDEÁRIO NEOLIBERAL NA PARTICULARIDADE DA ATENÇÃO À SAÚDE Em meio à crise do Capital de 19706, quando o capitalismo apresentou sinais de esgotamento, momento em que a expansão não se dava nas mesmas condições favoráveis, apresentando uma estagnação e a economia mostra novos contornos mediante reestruturação produtiva, sob um novo padrão de acumulação capitalista: a acumulação flexível, surge o neoliberalismo com o intuito de que o sistema recuperasse sua força e que para isso adotou medidas que possibilitaram a continuidade do capitalismo. (GOIS, 2017) O neoliberalismo, como nova estratégia hegemônica, implica necessariamente em redução de políticas sociais, aumento da desigualdade social, novas formas de flexibilização do trabalho, entre outras medidas que permitem a superexploração do trabalho como um todo (GOIS, 2017, P. 7). A crise iniciada nos países cêntricos, em 1970, atinge com suas estratégias de enfretamento a realidade brasileira na década de 1990 e o Brasil passa por um aprofundamento da ideologia neoliberal, apresentando avanços das práticas que essa lógica defende, entre elas: a subalternização da classe trabalhadora, a ânsia pela privatização do espaço público, a naturalização da pobreza e do desemprego e a não valorização do social. 6 Agora estamos falando de crise estrutural do sistema que se estende portoda parte e viola nossa relação com a natureza minando as condições fundamentais de sobrevivência humana” […] A crise atual é profunda […] essa não é apenas a maior crise de história humana, mas a maior crise em todos os sentidos (MÉSZÁROS, 2009, p. 130-133). Netto e Braz (2006, p. 162) afirmam que “as crises são funcionais ao modo de produção capitalista, constituindo se constitui nuns mecanismos que determina a restauração das condições de acumulação, sempre em níveis mais complexos e instáveis, assegurando assim a sua continuidade” 21 No contexto das sucessivas crises do capital, o Brasil, enquanto inserido na mundialização do capital, entre os anos 2014/2015, mergulha em uma onda recessiva profunda expressa na combinação de tensões políticas e econômicas. Em decorrência surgem consequências, como afirmam Tolentino e Bastos (2017): desemprego e inflação em níveis alarmantes, aumento da pobreza, ataque às políticas sociais, bem como aos direitos sociais em geral, como a Emenda Constitucional 95/2016, já aprovada no Congresso Nacional, que prevê o congelamento dos gastos públicos durante 20 anos, atingindo em cheio as políticas sociais e a classe trabalhadora, sobretudo as populações mais pobres (TOLENTINO; BASTOS, 2017, P. 303). Este direcionamento da Emenda Constitucional implica na diminuição do repasse das verbas destinadas às políticas públicas essenciais e acaba por ocasionando o seu desmonte, na medida em que essas perdem seu caráter universal (no caso da saúde), ou para quem dela precisar (assistência social), atingindo diretamente o acesso dos que mais necessitam delas: as populações mais pobres e subalternizadas, sem acesso a produção, ao consumo e a cidadania. Este congelamento do repasse de verbas destinadas as políticas públicas relacionadas com a aprovação da Emenda constitucional 95, em 2016, no governo de Michel Temer (2016 – 2018) vem sacrificando as despesas e investimentos sobre políticas públicas essenciais, que integram um plano maior de sucateamento e desmonte dessas políticas no Brasil, em benefício do setor financeiro7. Tal emenda passa a fazer parte da agenda do atual presidente da república, Jair Messias Bolsonaro, que iniciou seu governo em 2019, cuja imposição do nefasto “teto de gastos públicos” nas áreas sociais vem sendo penalizada, sobretudo a população em situação de pauperismo, da qual a população em situação de rua se situa. A lógica neoliberal contribui diretamente com a formação da População em Situação de Rua e com o difícil acesso desses indivíduos as políticas públicas, de forma que governos adeptos do ideário neoliberal, como é o caso do atual Governo Federal brasileiro, diminui o direito da classe trabalhadora e naturaliza o estado em que vivem os indivíduos em condição de extrema pobreza, impulsionando apenas o 7 “As ações e omissões governamentais sobre políticas públicas essenciais integram um plano maior de sucateamento e desmonte, que tentamos abordar ao longo das últimas semanas. Conforme as informações que trouxemos na série de reportagens sobre a destruição do Estado Brasileiro, o conjunto de reformas, privatizações e abandono de políticas públicas constitui um caminho que leva o país a retrocessos brutais em diversas áreas e ao retorno à condição de dependência e subserviência, com estagnação da economia e aumento das disparidades.” (JULIANA CAMPANI, 2021) 22 sistema capitalista, garantindo a eficiência econômica, a concentração de renda e aprofundando da desigualdade e a pobreza no país. Historicamente, as necessidades da população em situação de rua são atendidas por meio da caridade e ações filantrópicas, sendo na maioria das vezes advinda diretamente das instituições religiosas, em seus segmentos vinculados as igrejas católicas, igrejas evangélicas e centros espiritas ou membros dessas instituições. Constata-se que as primeiras ações voltadas para esse contingente populacional foram na década de 1950, em São Paulo, por meio das irmãs “Oblatas de São Bento”, sob o nome de Organização do Auxílio Fraterno, já em 1970 foi criada a Pastoral do Povo da Rua, sendo as duas iniciativas da igreja. Até os anos 2000 as ações voltadas para população em situação de rua foram, majoritariamente, realizadas por entidades religiosas, existindo algumas iniciativas pontuais do governo. (MEDEIROS; ALMEIDA; OLIVEIRA, 2019, p. 64 - 65) A população em situação de rua não é um fenômeno recente e vem crescendo consideravelmente, dessa forma, exigindo cada vez mais políticas que atendam, de fato, as suas necessidades de saúde, moradia, alimentação; os direitos mais básicos que todos devem ter acesso. Em 1988, foi instituída a atual Constituição brasileira, esse foi um momento de grandes conquistas para o povo brasileiro, pois foi a partir dela que vários direitos passaram a ser reconhecidos, a exemplo o sistema de Seguridade Social, reconhecendo a Saúde como um direito universal, a Assistência Social como uma política pública para quem dela necessitar e a previdência como contributiva. Foi a partir desse momento que o Estado brasileiro começou a dar mais atenção à problemática da população em situação de rua. (COSTA, 2005) De acordo com a nova legislação, portanto, o poder público passou a ter a tarefa de manter serviços e programas de atenção à população de rua, garantindo padrões éticos de dignidade e não-violência na concretização de “mínimos sociais” e de direitos de cidadania a esse segmento social (COSTA, 2005, P. 6). Porém, grandes ações, como o planejamento e implementação de uma política específica para a população em situação de rua, ocorreu apenas após o ano de 2004, depois de ter ocorrido uma chacina na praça da sé, na cidade de São Paulo, onde 07 (sete) pessoas em situação de rua vieram a óbito e 08 (oito) ficaram gravemente feridas, sendo esse um marco para o surgimento do Movimento 23 Nacional da População em Situação de Rua (MNPR). (MEDEIROS; ALMEIDA; OLIVEIRA, 2019, P. 65) Para esses autores Na conjuntura brasileira, o aumento da barbárie, o acirramento da violência, o avanço do conservadorismo, e as violações de direitos conquistados ao longo da história têm sido cada vez mais presentes. Assim, tais fatores vêm desafiando os trabalhadores que atuam na execução das políticas públicas, que, de modo geral, visam acolher, acompanhar e atuar junto a indivíduos e famílias para garantir o acesso dessas pessoas às políticas públicas (MEDEIROS; ALMEIDA; OLIVEIRA, 2019, P. 66). Destaca-se a importância do movimento da PSR, da organização popular no geral, na reivindicação de seus direitos, sendo essa uma organização política que gera a possibilidade de respostas do Estado de forma a pressionar este para responder minimamente as requisições da população. Dessa forma, começa a se ter mais ações voltadas para a população em situação de rua. No ano de 2005, ocorre o I Encontro Nacional sobre População em Situação de Rua, organizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), por meio da Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), com o objetivo de debater uma política voltada para esse contingente populacional. Já entre agosto de 2007 e março de 2008 foi realizada pelo MDS a Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua, que caracterizou o segmento em questão. Essas ações viabilizaram a construção da Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPSR), instituída pelo Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009. (ARAÚJO, 2012, P. 26) A PNPSR tem como objetivos, entre outros, assegurar a esses indivíduos o acesso a serviços e programas que integram as políticas públicas de saúde, educação, previdência, assistência social, moradia, segurança, cultura, esporte, lazer, trabalho e renda; instituir a contagem oficial da população em situação de rua; proporcionar o acessodas pessoas em situação de rua aos benefícios previdenciários e assistenciais e aos programas de transferência de renda, na forma da legislação específica; criar meios de articulação entre o Sistema Único de Assistência Social e o Sistema Único de Saúde para qualificar a oferta de serviços; adotar padrão básico de qualidade, segurança e conforto na estruturação e reestruturação dos serviços de acolhimento temporários; implementar ações de segurança alimentar e nutricional suficientes para proporcionar acesso permanente pela população em situação de rua à alimentação, com qualidade e disponibilizar 24 programas de qualificação profissional para as pessoas em situação de rua, com o objetivo de propiciar o seu acesso ao mercado de trabalho. (BRASIL, 2009) Fazendo uma análise desses objetivos elencados acima, vemos que na realidade é bem diferente. A PSR compõe a superpopulação relativa, estando inserida em ocupações totalmente precarizadas sem vínculo empregatício formal, vivenciando, portanto, uma condição de pauperismo, estando longe de uma inserção na política de previdência, que funciona mediante contribuição. No que diz respeito à contagem desse contingente populacional, por mais que seja uma ação de suma importância para apreender as particularidades desse grupo e executar políticas que alcance as suas necessidades, esta não acontece em nível nacional (NATALINO, 2020). A contagem vem sendo feita a partir do censo SUAS, o sistema de monitoramento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), com base nos inscritos no Cadastro Único (CadÚnico). Contudo, realizada apenas dessa forma a contagem é imprecisa, visto que nem todos aderiram ao cadastro. Segundo Costa (2005), [...] nos últimos anos, concretizaram-se poucas iniciativas públicas destinadas a essa população. Merecem destaque os municípios, com experiências criativas e inovadoras, porém restritas diante da crescente demanda. As áreas de Saúde e Segurança atuaram de maneira indireta, restando apenas à Assistência Social equipamentos urbanos e projetos sociais (p. 6). A política de Assistência Social é oferecida para quem dela necessitar e tem por objetivo garantir a proteção social dos indivíduos. É da Assistência Social que parte a maioria dos programas voltados para a população em situação de rua, entre eles estão os serviços oferecidos pelo Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), que tem por objetivo promover o acesso a espaços de guarda de pertences, de higiene pessoal, de alimentação e provisão de documentação, podendo ser ainda o endereço usado como como referência para o usuário. A conceituação e os objetivos da política e os serviços do Centro POP em questão são muito pertinentes, porém na realidade existe um déficit na implementação, uma vez que os serviços não suportam a demanda, faltando financiamento e uma gestão adequada. Isto ocorre porque O formato e a composição dos serviços são constantemente elogiados pelos profissionais, a despeito das críticas sobre sua restrita implementação e atual configuração. Tomando-se apenas o exemplo dos Centros POP, segundo dados do Censo Suas 2019, o 25 país contava com apenas 228 desses equipamentos no país, presentes em duzentos municípios e concentrados na região Sudeste (46,5% das unidades). Em 2017, análise feita pelo Ministério da Cidadania mostrou que, dos municípios com mais de 100 mil habitantes e de regiões metropolitanas com 50 mil ou mais, 31,3% deles não contavam com algum tipo de serviço voltado para a população em situação de rua. Os CREAS, que também atuam no atendimento da população em situação de rua e cuja existência é condição para que os municípios sejam elegíveis ao cofinanciamento federal para os Centros POPs, apresentam um déficit de 242 unidades em todo o país, principalmente no Sudeste, onde ainda faltariam 131 unidades para garantir a oferta adequada segundo as orientações técnicas emitidas pelo então Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (Brasil, 2011) (SILVA; NATALINO; PINHEIRO, 2020, P. 11). Outro serviço voltado para a população em situação de rua que se destaca é o Consultório na Rua (CnaR). Constitui um serviço que oferece a essa população o acesso à atenção básica de saúde, sendo para eles a principal porta de entrada para o SUS. No ano de 2011 foi feita uma revisão na Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), inserindo o Consultório na Rua, tornando-o uma estratégia voltada diretamente para a população em situação de rua, oferecendo serviços de saúde e assistência. (OLIVEIRA, 2018, p.45) O Consultório na Rua veio como uma proposta para ampliar e qualificar o acesso da população em situação de rua à assistência à saúde, através de equipes multiprofissionais para atender às diversas necessidades de saúde das pessoas que vivem na rua, mediante um atendimento primário. Ademais, abrange em sua estrutura a Atenção Básica da Rede de Atenção Psicossocial que desenvolve ações de Atenção Básica em Saúde, partindo dos fundamentos e diretrizes instituídos na Política Nacional de Atenção Básica. (HINO, SANTOS E ROSA, 2018, p. 733) O CnaR, assim como o Centro POP, também tem limites na sua expansão. (SILVA; NATALINO; PINHEIRO, 2020, P. 11 APUD. BARBOSA, 2018; MEDEIROS e CAVALCANTE, 2018) Não se pode negar o que foi conquistado pela população de rua, porém o que vemos na realidade é o aumento desse fenômeno e políticas que não agem na causa do problema no intuito de mudar essa realidade, apenas tratam o problema de forma paliativa, mediante prestação de serviços pontuais e distribuição de alimentos e outros objetos, que não garantem a dignidade dessa população, uma vez que estas pessoas precisam de emprego e renda, moradia, segurança alimentar, acesso 26 a saúde, a educação. As políticas públicas essenciais, sob a lógica capitalista não combatem a pobreza, apenas tratam problemas pontuais e nesse propósito [...] a doutrina neoliberal não implica na defesa da ausência total do Estado no controle da vida social, mas sim uma ação “seletiva e focalizada em esferas vitais para o pleno funcionamento da ordem capitalista, como a defesa dos múltiplos regimes de propriedade privada” (CASTELO, 2011, p. 226 Apud GOIS, 2017, P. 5). De forma efetiva, a perspectiva neoliberal conquista sua hegemonia no contexto do cenário mundial e, em sua particularidade na sociedade brasileira, implicando na desregulação dos direitos do trabalho, na privatização do Estado, na retirada do Estado na garantia do bem estar social a partir do desmonte das políticas sociais, na mercantilização dos serviços sociais, atingindo todas as dimensões da vida humana (SANTOS, 2018). Nesse contexto, além da Emenda Constitucional 95/2016 que prevê o congelamento dos gastos públicos durante 20 anos, temos a Reforma da Previdência (PEC 287/2016) já aprovada, a Reforma Trabalhista (Lei 13.467 de 13/07/2017) em vigor desde 11 de novembro de 2017 e já alterada por Medida Provisória 808 de 2017 (MEDIDA...,2017), conforme Tolentino e Bastos (2017, p. 303). Para esses autores, essas são medidas estão em discordância com a democracia, implicando um total assalto ao poder, uma vez que os “instrumentos de direitos mantêm o poder e o capital para decisão de poucos, enquanto a massa explode em todos os cantos e é tratada com violência e descrédito moral” (TOLENTINO E BASTOS, 2017, P. 303). Ou seja, são propostas e encaminhamentos que afetam diretamente as políticas sociais e as classes que vivem do trabalho, principalmente as populações mais pobres. Historicamente, são medidas que instituem condições para a ampliação da pobreza e miséria de milhões de brasileiros, os quais terão difícil ou não acesso às políticas públicas essenciais como: educação, saúde, assistência social, habitação, saneamento básico, emprego e renda, previdência social, habitação, segurançaalimentar entre outras. Neste contexto, a população em situação de rua, enquanto parte da superpopulação relativa estagnada (Marx, 1980), vem sofrendo a refração de direitos sociais atendidos pelo Estado, no âmbito das políticas sociais, em decorrência dos intensos ataques através das reformas em curso pelo atual governo ultraliberal. 27 3. OS DETERMINANTES SÓCIO HISTÓRICOS DAS CONDIÇÕES DE VIDA E SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA DE NATAL A seguinte seção, também composta por dois itens, analisa as condições de vida e saúde da população em situação do município de Natal/RN, abordando como se configura esse contingente populacional na cidade, pontos de maior aglomeração, principais atividades exercidas, os serviços ofertados e como funcionam. Além de analisar a política de saúde voltada para a PSR através da Atenção Básica de Saúde. 3.1 A CONDIÇÃO DE VIDA E SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA DE NATAL/RN A população em situação de rua se encontra em uma condição degradante, daí torna-se essencial situar historicamente a discussão de grupos populacionais que estão em vulnerabilidade social, numa perspectiva de totalidade. Veja o que falam esses autores A dupla vivência de laços e relações familiares/sociais fragilizados e a precarização do trabalho intensificaram a vulnerabilidade que leva os sujeitos a viverem nas ruas (ROSA, 2005; NEVES, 2010), num processo em que o rompimento com os vínculos de trabalho e com as redes sociais de suporte, em conjunto, levam à desfiliação social (CASTEL, 2013), o que coloca esses sujeitos num ciclo vicioso de fragilidade, rompimento e dificuldade em resgatar seus vínculos familiares e de trabalho (PINHO, PEREIRA; LUSSIA ,2019, p. 481). Ao andar nas ruas da cidade de Natal/RN sempre nos deparamos com a população em situação de rua, sendo visível seu crescimento nas principais ruas da cidade nos últimos anos. O município ainda não tem uma contagem oficial desse contingente populacional, uma vez que esse dado está sendo construído pela Secretaria de Estado do Trabalho, da Habitação e da Assistência Social (SETHAS), tendo o primeiro Censo da População em Situação de Rua no Rio Grande do Norte iniciado em junho de 2021 e devendo ser finalizado em julho de 2022. A importância desse estudo reside no fato que seus resultados podem contribuir na proposição de políticas públicas que, de fato, possam contemplar e responder às reais necessidades dessa população. 28 De acordo com Vanilson Torres, Coordenador Geral do Movimento Nacional Para População de Rua para o estado do Rio Grande do Norte (MNPR-RN), em junho de 2021 foram contabilizadas 2.500 (duas mil e quinhentas) pessoas em situação de rua no município de Natal. (SANTOS, 2022, P. 67) Nos resultados preliminares divulgados pela secretaria foi constatado que as pessoas que vivem em situação de rua em nosso Estado são em sua maioria homens, com faixa etária de 18 a 59 anos, com baixa escolaridade e que se auto identificam como pretos e pardos. Foi revelado, ainda, que entre os principais motivos pelos quais se encontram em situação de rua, estão conflitos e fragilidades dos vínculos familiares, separação conjugal, morte de parentes e uso abusivo de substâncias psicoativas ilícitas. (ASSECOM/RN, 2022) Ainda de acordo com Vanilson, menos de 60% das pessoas em situação de rua estão cadastradas no Cadastro Único (CADúnico), o que mostra mais uma vez a importância da realização da contagem oficial da PSR para que políticas públicas os alcancem. (SANTOS, 2022, P. 67) Uma pesquisa, intitulada “Direitos Humanos da População em Situação de Rua na cidade de Natal: investigando limites e possibilidades de vida” (ARRAES AMORIM, 2015), realizada pelo Centro de Referência em Direitos Humanos (CRDH), vinculado à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), realizou entrevistas com 159 (cento e cinquenta e nove) pessoas em situação de rua em Natal, entre os anos de 2013 e 2015. O resultado mostrou que no Estado do Rio Grande do Norte existiam apenas duas unidades de acolhimento para população em situação de rua, que ficam localizadas nos municípios de Natal e Parnamirim. “A unidade de Natal acolhe até 58 (cinquenta e oito) pessoas, sendo 50 (cinquenta) homens e 08 (oito) mulheres. Já o abrigo de Parnamirim, situado na região metropolitana, tem capacidade máxima de atendimento de 25 (vinte e cinco) pessoas” (MEDEIROS, ALMEIDA E OLIVEIRA, 2019, P. 70 - 80). Ou seja, em todo o Estado tinha-se apenas 83 (oitenta e três) vagas em unidades de acolhimento. (MEDEIROS, ALMEIDA E OLIVEIRA, 2019, P. 70 - 80) Atualmente, o Albergue Municipal de Natal tem capacidade para atender cerca de 50 (cinquenta) usuários, assim como a Unidade de Acolhimento para Adultos e Famílias em Situação de Rua da prefeitura de Natal. Somando-se ao Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centros 29 Pop), a cidade possui 03 (três) unidades com capacidade de acolhimento para 220 (duzentos e vinte) adultos. Esses serviços oferecem albergagem noturna, pernoite, alimentação, abrigamento, kits de higiene, roupas de cama e como também jantar e café da manhã, porém o número de pessoas que comporta esses serviços está muito abaixo da quantidade de pessoas que vivem em situação de rua no Estado. (NATAL, 2022) Dessa forma, conseguimos visualizar o quão precarizados estão os serviços voltados para as pessoas em situação de rua. Esses homens, mulheres, crianças, idosos vivem em uma condição indigna. Ainda na entrevista realizada por Santos (2022) para uma manografia8, Vanilson conta que muitas das pessoas que estão nas ruas de Natal, se encontram sobrevivendo nessa condição desde o momento em que nasceram e outras há pelo menos 30 anos, o que mostra o quão é difícil sair dessa condição, a qual são jogados pela lógica do sistema capitalista orquestrado pelos ideais neoliberal. Entre as principais ocupações da PSR do município estão as atividades informais, entre elas destacam-se: limpar para-brisas, fazer malabarismos em sinais de trânsito, “cuidar” de carros em grandes pontos de estacionamento, camelôs com vendas de doces e balas no transporte público (SANTOS, 2022, P. 68). Atividades que enunciam a precarização das relações de trabalho desse contingente populacional submetido ao pauperismo, enquanto parte da superpopulação relativa, em decorrência da conjuntura política, econômica e social, própria da sociabilidade capitalista. Nota-se que as condições do trabalho na informalidade e precarizado, parece atuar duplamente no fenômeno da situação de rua: tanto como motivo para ida à rua e, principalmente, como favorecedora da manutenção nessa condição, uma vez que dificilmente os trabalhos realizados por essa população são viabilizadores de autonomia financeira, por serem quase sempre transitórios, temporários, variados e irregulares, muitas vezes desenvolvidos sob condições insalubres e de risco e que mal permitem a sobrevivência (PINHO, PEREIRA; LUSSIA, 2019, p.482). São atividades ocupacionais desenvolvidas na invisibilidade, não qualificadas, não recompensadas monetariamente, portanto não lhes garantem o direito ao trabalho, nem tão pouco os direitos dos trabalhadores que atuam no mercado formal. São quase 3.000 (três) mil pessoas na cidade de Natal em situação de 8 Monografia intitulada “ESPAÇOS PÚBLICOS E POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA EM NATAL- RN: UMA ANÁLISE DA DINÂMICA DE ESPACIALIZAÇÃO NA CAPITAL POTIGUAR” 30 rualização, submetidas a condições de extrema vulnerabilidade, expostas a violências diversas, bem como à violação de seus direitos sociais básicos no seu cotidiano, dentre eles emprego e renda, habitação, alimentação, e, por seu turno, a saúde. Pensando que a saúde vai além do bem estar físico e da ausência de doença, a população em situação de rua temsua saúde afetada, em razão do seu modo de vida. Isto porque, são indivíduos que se encontram sobrevivendo no seu cotidiano, dormindo em calçadas, sem acesso a espaços para realizar sua higiene básica, sem acesso a uma alimentação que ofereça um mínimo de nutrição, sem acesso a água potável e dependendo de outras pessoas para o acesso mínimo dessas necessidades, carecendo de um serviço de atenção básica, que venha promover a proteção da sua saúde. Na cidade de Natal, o Consultório na Rua chegou em 2011, porém com uma lógica diferente da qual exerce atualmente, uma vez que funcionava em um ponto fixo da cidade e era voltado para atender a questão da saúde mental dos indivíduos. Porém, em 2014 ocorre uma mudança e o CnaR deixa de ser somente voltado para a saúde mental e passa a ser um serviço de atenção básica, oferecendo o atendimento primário em saúde para a população em situação de rua. Segundo Matos et al (2019) Se o enfoque do CR (Consultório de Rua) na saúde mental era pautado fortemente na questão do uso e abuso de substâncias psicoativas – inclusive, geralmente, numa lógica de combate às “drogas” –, agora na Atenção Primária em Saúde percebe-se uma ampliação na concepção de assistência em saúde e se busca mais fortemente uma aproximação com as necessidades em saúde da População em Situação de Rua (MATOS, 2016) (MATOS et al., 2019, P. 306 - 307). No momento presente, o Consultório na Rua em Natal funciona de forma que as equipes são itinerantes, formada por 3 (três) equipes, sendo estas vinculadas às Unidades Básicas de Saúde (UBS) de distintos bairros da cidade e cada uma possui trajetos e rotas diferentes que se cumprem diariamente. Segundo nos afirma MATOS et al (2019) A prática da rota, no entanto, se não for bem estruturada, pode levar a dificuldades no manejo da assistência em saúde, tal como a chamada “rota vazia”, que nada mais é senão uma rota instituída com percurso fixo, que não implica necessariamente na produção de cuidado, ou seja: a rota perde o seu sentido de ser uma ferramenta 31 de promover o cuidado sistemático e longitudinal para ser um fim em si mesma, independente de proporcionar o encontro com os usuários. (p. 310) Segundo os profissionais que atuam no CnaR em Natal, as principais demandas que chegam da população em situação de rua são a realização do Cartão do SUS, solicitação de exames e consultas, especialmente com clínico geral; questões clínicas advindas das suas condições de sobrevivência na rua, como doenças gastrointestinais e cardiovasculares já em estado avançado; problemas na pele, visto que essas pessoas não têm acesso a cuidados de higiene pessoal. Trazem também o que chamam de “Demandas Sociais” que são relacionadas à habitação, à violência contra a mulher e aos abrigos. (MATOS et al., 2019, p. 308) A partir desses dados é possível observar o quanto a vivência nas ruas rebate na condição de saúde da população em situação de rua. A maior área de concentração da Pop Rua em Natal é a zona Leste da cidade, onde são localizados o Centro Pop e o Albergue Municipal e estão localizados os pontos comerciais, o que favorece as atividades informais, que é de onde essas pessoas conseguem um mínimo para se manter. (MATOS et al., 2019, p. 309) Um ponto da Zona Leste da cidade onde ocorre uma grande concentração de pessoas em situação de rua é o viaduto do baldo, por ser uma grande estrutura, as pessoas usam aquele espaço como abrigo, dia e noite. (SANTOS, 2022, p. 71), Veja o que nos informa Mariana Ceci em reportagem realizada para o jornal Tribuna do Norte O aumento do desemprego e da informalidade vem impactando não apenas no número, mas também no perfil da população em situação de rua na capital potiguar. Embaixo do viaduto do Baldo, há um verdadeiro contingente de pessoas capacitadas que, sem emprego ou possibilidade de solicitar ajuda a familiares, passaram a viver na rua (MARIANA CECI, 2019). O viaduto do Baldo é um dos locais mais conhecidos onde se tem uma grande quantidade de pessoas em situação de rua na cidade potiguar, e um local onde já ocorreram diversas ações higienistas promovidas pela prefeitura da cidade. Sem aviso prévio, sem comunicado aos representantes da PSR e sem oferecer uma opção de abrigo temporário, a prefeitura manda força policial e realiza o desalojamento dessas pessoas; da última vez que ocorreu, no mês de abril de 2022, foi construído um muro que impediu o acesso ao espaço embaixo do viaduto. Um 32 tratamento desumano fornecido a uma população que já tem tantos direitos infringidos. Os cidadãos que se encontram em situação de rua estão vulneráveis e expostos a violências, doenças e não têm como se protegerem, se não for por meio das políticas públicas ou por atos de caridade e filantropia. A condição da população em situação de rua é tratada por muitos como um problema individual, e essa ideia é perpetuada de forma tão natural pela ideologia neoliberal, que não é nem questionada, apenas reproduzida. Olhamos para a realidade da população em situação de rua sempre que vamos aos grandes centros urbanos, e, para muitos, esta situação passa despercebida, é invisível. Mas sua invisibilidade maior é principalmente para o Estado, instituição que tem o dever de criar e efetivar políticas públicas, uma vez que dispõe de recursos (pagos pelos cidadãos mediante impostos) disponíveis para reverter a situação. Contudo as ações têm sido através de medidas pontuais e instrumentais, tratando a situação dessa população de forma paliativa, sob a lógica capitalista, para não interferir nos interesses não negociáveis das classes detentoras do poder. É dever do Estado assegurar os direitos básicos para toda a população em situação de rua, através de ações coletivas e intersetoriais que reconheçam o acesso ao trabalho como direito, alinhado aos desejos, necessidades e singularidades das pessoas em situação de rua, na qual a inclusão produtiva, por meio da articulação entre diferentes políticas e serviços, possa contribuir para a diminuição da vulnerabilidade e criação de autonomia (PINHO, PEREIRA E LUSSIA, 2019, p.480). Ademais, a garantia do acesso dessa população aos direitos sociais pela via da inclusão produtiva deve estar articulado ao direito à saúde. Os estudiosos da problemática defendem que a formulação de políticas públicas de saúde deve considerar os determinantes sociais e ambientais que interferem no processo de adoecimento e pensar nos cuidados da saúde, através de ações individuais e coletivas no enfrentamento do processo de saúde e doença, nela incluindo a assistência social, a educação, a segurança pública, a segurança alimentar, entre outras, para uma atenção integral (GAMEIRO, 2021). 33 3.2 A POLÍTICA DE SAÚDE NA ATENÇÃO BÁSICA PARA A POPULAÇÃO SITUAÇÃO DE RUA NA CIDADE DE NATAL A saúde pública no Brasil tem uma longa história, marcada por muitas lutas populares e descaso por parte do Estado. As ações filantrópicas, historicamente, gerenciadas pelas igrejas marcaram a história da saúde no Brasil, pois eram a essas práticas que a classe trabalhadora recorria, e que a população em situação de rua recorre até os dias de hoje. Com a promulgação da Constituição de 1988 houve conquistas significativas em relação à ampliação de direitos da população brasileira. Entre elas está a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), colocando a saúde como um direito de todos e dever do Estado. A partir de então, a política de saúde passa a ter um caráter universal devendo ser garantida a todos os cidadãos brasileiros, baseado em três princípios: a universalidade9, a integralidade10 e a equidade11. O SUS passa a oferecer serviços de saúde, em todos os níveis, de forma gratuita, conforme o enunciado abaixo O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos maiores e mais complexos sistemas de saúde pública do mundo, abrangendo desde osimples atendimento para avaliação da pressão arterial, por meio da Atenção Primária, até o transplante de órgãos, garantindo acesso integral, universal e gratuito para toda a população do país. Com a sua criação, o SUS proporcionou o acesso universal ao sistema público de saúde, sem discriminação. A atenção integral à saúde, e não somente aos cuidados assistenciais, passou a ser um direito de todos os brasileiros, desde a gestação e por toda a vida, com foco na saúde com qualidade de vida, visando a prevenção e a promoção da saúde (GOVERNO FEDERAL, 2020). Pensando no conceito e nos princípios que norteiam o SUS, vemos que é uma grande política, com a capacidade oferecer a toda a população um serviço de saúde de qualidade e atendendo todas as suas necessidades. Porém, quando olhamos para a realidade, encontramos a superlotação nos serviços, a falta 9 A saúde é um direito de cidadania de todas as pessoas e cabe ao Estado assegurar este direito, sendo que o acesso às ações e serviços deve ser garantido a todas as pessoas, independentemente de sexo, raça, ocupação ou outras características sociais ou pessoais. (GOVERNO FEDERAL, 2020) 10 O objetivo desse princípio é diminuir desigualdades. Apesar de todas as pessoas possuírem direito aos serviços, as pessoas não são iguais e, por isso, têm necessidades distintas. Em outras palavras, equidade significa tratar desigualmente os desiguais, investindo mais onde a carência é maior. (GOVERNO FEDERAL, 2020) 11 Este princípio considera as pessoas como um todo, atendendo a todas as suas necessidades. Para isso, é importante a integração de ações, incluindo a promoção da saúde, a prevenção de doenças, o tratamento e a reabilitação. (GOVERNO FEDERAL, 2020) 34 equipamentos, medicações e até profissionais. Para se materializar de forma eficaz, essa política, assim como todas as outras, depende diretamente do apoio do Estado, através de recursos e uma boa gestão. Tenhamos presente que o apoio estatal não acontece de forma efetiva, tendo em vista o avanço de políticas neoliberais, que vem provocando o desmonte das políticas sociais, e, por seu turno, levando a precarização do sistema de saúde como um fato vivenciado por toda a população que depende da saúde pública. Quando se trata da população em situação de rua, o acesso ao atendimento à saúde se torna ainda mais complicado. Além do desmonte da política em questão por parte do Estado, a população em situação de rua necessita de uma abordagem diferenciada, voltada para sua realidade e suas necessidades, justamente o que diz a equidade. Reiteramos este princípio do SUS por “considerar as pessoas como um todo, atendendo a todas as suas necessidades(...)” daí ser “importante a integração de ações, incluindo a promoção da saúde, a prevenção de doenças, o tratamento e a reabilitação” (SUS,2020), contudo este princípio na realidade é contrariado. Esse contingente populacional sofre inúmeros preconceitos, julgamentos, sendo uma população socialmente estigmatizada, e essa questão adentra os serviços da saúde. É comumente que o morador de rua chegue à unidade de saúde sem tomar banho, com roupas sujas e rasgadas, o que causa olhares, gestos e falas preconceituosas, sendo mal acolhido no ambiente, o que influencia, inclusive, nas atitudes e comportamentos dos profissionais de saúde, o que acaba por dificultar ainda mais o processo. E, neste sentido [...] se constroem imagens sociais negativas dos sujeitos, interferindo diretamente nas atitudes e comportamentos dos profissionais que, por sua vez, prejudicam as relações inerentes à atenção e ao cuidado. Assim, a negação dos direitos produz um círculo vicioso que engloba os profissionais dos serviços públicos como atores envolvidos na produção de mais marginalização, estigma e preconceitos (ABREU E OLIVEIRA, 2017, p. 2). São recorrentes os relatos das pessoas em situação de rua que se recusaram a ir em unidades de saúde devido ao mau atendimento. A Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua “revela que 18,4% das pessoas em situação de rua já passaram por experiências de impedimento de receber atendimento na rede de saúde”. (BRASIL, 2014, P. 27) 35 A condição de saúde da população em situação de rua vai além das questões patológicas, é necessário que se pense a política de saúde para essas pessoas de forma que ultrapasse essa dimensão e contemple todos os aspectos que englobam o processo saúde-doença. Dessa forma, conhecer a realidade dessas pessoas e suas necessidades é imprescindível para que elas sejam contempladas por todas as políticas, não só a de saúde. A propósito, os autores trazem No entanto, o que se tem observado na realidade dos serviços de saúde é que um modelo multicausal tem inspirado o planejamento das ações de promoção da saúde nos variados níveis de atenção. Há, também, um reforço do modelo biomédico, medicalizador da sociedade. Essa forma de pensar e produzir serviços de saúde não tem conseguido resolver os problemas relativos ao processo saúde doença da maioria da população brasileira, em especial, a PSR (PAIVA LIRA, JUSTINO, MIRANDA E SARAIVA, 2016, P.2601). De acordo com o Manual Sobre o Cuidado à Saúde da População em Situação de Rua, material do Ministério da Saúde lançado em 2012, que tem por objetivo ampliar o acesso e a qualidade da atenção integral à saúde dessa população, entre as principais patologias que atingem a PSR estão os problemas nos pés, infestações, tuberculose, DSTs, HIV, AIDS, álcool e uso abusivo de substâncias psicoativas ilícitas e a saúde bucal. Diante desse contexto, visualizamos a importância dessas pessoas acessarem os serviços de atenção básica à saúde, pois é por meio da atenção básica que alcançamos a prevenção e proteção à saúde. (BRASIL, 2012). Vejam, A Política Nacional de Atenção Básica – PNAB/Portaria nº 2.488, de 21 de outubro de 2011, caracteriza a atenção básica como um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos e a manutenção da saúde, com o objetivo de desenvolver uma atenção integral que impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de saúde das coletividades (BRASIL, 2012, P.12). No âmbito do acesso primário a saúde, tem-se o Consultório na Rua, como citado anteriormente, que é um serviço de atenção básica voltado para a população em situação de rua e busca atender as necessidades de saúde desse contingente, indo além da questão da saúde mental. Na cidade de Natal/RN, existem 03 (três) equipes de CnaR: a de Mãe Luíza, São João e Ponta Negra, que fazem referência 36 aos bairros das cidades e estão vinculadas as UBS destes. (Matos, et al., 2019) As equipes de consultório na rua devem funcionar da seguinte forma: realizar suas atividades de forma itinerante, desenvolvendo ações na rua, em instalações específicas, na unidade móvel e também nas instalações das Unidades Básicas de Saúde do território onde está atuando, sempre articuladas e desenvolvendo ações em parceria com as demais equipes de atenção básica do território (UBS e NASF), e dos Centros de Atenção Psicossocial, da Rede de Urgência e dos serviços e instituições componentes do Sistema Único de Assistência Social, entre outras instituições públicas e da sociedade civil (BRASIL, 2012a, p. 62 Apud MATOS et al, 2019, p. 304). As equipes Mãe Luiza e São João realizam suas atividades na zona Leste da cidade, onde possui a maior concentração de pessoas em situação de rua e a Ponta Negra atende na Zona Sul da cidade. (MATOS et al., 2019) Além de funcionar de forma itinerante, o consultório na rua promove ações de promoção a saúde nas Unidades Básicas de Saúde, e as ações contam com atendimento médico, de enfermagem, odontologia,