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JoseAvelinoDaHoraNeto-DISSERT

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
CENTRO DE CIENCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES 
Programa de Pós-Graduação em Estudos Urbanos e Regionais 
 
 
 
 
 
 
JOSÉ AVELINO DA HORA NETO 
 
 
 
 
 
 
DINÂMICA DE EXPANSÃO URBANA DE CEARÁ-MIRIM/RN: ASPECTOS LOCAIS 
E METROPOLITANOS? 
 
 
 
 
Dissertação N.º 30/PPEUR. 
 
 
 
 
NATAL – RN 
AGOSTO/2015 
 
 
JOSÉ AVELINO DA HORA NETO 
 
 
 
 
 
 
DINÂMICA DE EXPANSÃO URBANA DE CEARÁ-MIRIM/RN: ASPECTOS LOCAIS 
E METROPOLITANOS? 
 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa 
de Pós-Graduação em Estudos Urbanos e 
Regionais, do Centro de Ciências Humanas, Letras 
e Artes da Universidade Federal do Rio Grande do 
Norte, como parte dos requisitos para obtenção do 
título de Mestre em Estudos Urbanos e Regionais. 
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria do Livramento 
Miranda Clementino 
 
 
 
 
NATAL – RN 
AGOSTO/2015 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ficha catalográfica 
 
 
 
 
 
 
Ata 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
À minha querida vovó Biu, Severina Galdino da 
Hora (in memorian), por ter me dedicado seu amor 
incondicional. 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Meus agradecimentos mais sinceros para todos que durante esse longo 
percurso não permitiram que estivesse sozinho nos momentos de desânimo e 
incertezas. A todos que mencionaram palavras de conforto, estenderam a mão, 
compartilharam risadas e respeitaram, vez por outra, meu silêncio. 
Obrigado aos meus pais, André e Josenilda, que não mediram esforços para 
que esse trabalho se realizasse, seja no incentivo por meio de palavras, na ajuda 
financeira, no ombro amigo, no colo confortante, na confiança empreendida nas 
minhas ações e principalmente na certeza de que somos verdadeiramente uma 
família unida, meus sinceros agradecimentos. 
Aos meus irmãos, André Luís e Andressa, que nos mais diversos momentos 
por meio de pequenos gestos, me agraciaram com suas companhias nesse longo 
processo de amadurecimento entre irmãos. Sou grato pelo respeito e admiração que 
me depositam, sendo recíprocos meus sentimentos por vocês. 
Agradeço a atenção e ternura da minha avó materna Maria Luísa (Vovó 
Mariquinha), que nos olhares experientes, me ensinou a confiar em Deus 
acreditando sempre no poder de suas realizações: obrigado. 
Aos tios e tias que se fizeram presentes nessa caminhada, entre eles 
agradeço, especialmente, à minha tia, madrinha e amiga Josivânia Marisa, pelo 
exemplo que se tornou em minha vida, pelos conselhos, pela ajuda na revisão do 
texto, pelo papel que conquistou na minha vida. Muito obrigado. 
Pelo companheirismo, paciência e amor dedicados, a partir de meados dessa 
aventura acadêmica, agradeço a Rodrigo Oliveira. 
É raro encontrar pessoas que acrescentam à palavra amizade o significado 
de doação. Desse modo, agradeço àqueles que desde a graduação em geografia 
acompanham minha vida; Lídia Gabriela, Deickson Lennon, Emanuell Cavalcanti, 
Nádia, Monick, Priscila e Eloísa. 
Aos meus talentosos e afetuosos amigos que ajudaram na confecção da capa 
e revisão ortográfica, agradeço à Anaxágoras e Mônica Cavalcante. 
 
 
Aos meus amigos do PPEUR pelos quais os desafios, as angústias e 
superações foram compartilhados de maneira intensa, agradeço profundamente à 
Jenair, Rafael João, André, Haline, Paula, Valéria, Gabi, Raquel, Wagner, Pedro, 
Lucas e Gilka. 
Por fim, a todos os professores, funcionários e bolsistas do PPEUR, em 
especial à minha orientadora, professora Maria do Livramento, agradeço pela 
confiança construída ao longo dessa produção acadêmica, pelas conversas das 
quais surgiram os primeiros esboços para o presente estudo, pelos direcionamentos 
textuais e pela generosidade em me ceder espaço no grupo do Observatório das 
Metrópoles (Núcleo Natal) para a realização deste trabalho: meus sinceros 
agradecimentos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Vivo no quase, no nunca e no sempre. 
Quase, quase – e por um triz escapo.” 
(A cidade sitiada – Clarice Lispector) 
 
 
RESUMO 
 
Este trabalho tem por objetivo compreender a dinâmica de crescimento da cidade de 
Ceará-Mirim considerando os aspectos que definem sua atual expansão urbana, ou 
seja, seu crescimento. Escolheu-se utilizar como aporte metodológico o conceito de 
espaço como produto e produtor das relações sociais, sendo o mesmo constituído 
por objetos e ações que se relacionam num processo dialético ao longo do tempo. 
Como instrumento de pesquisa, realizou-se estudo bibliográfico que caracterizasse 
os aspectos históricos de uso e ocupação do solo da região a fim de evidenciar os 
agentes que explicam sua configuração urbana atual. Em seguida, realizou-se o 
levantamento de dados secundários para uma análise das atividades econômicas do 
município e seus respectivos impactos na estrutura social local. Entre esses 
aspectos, a economia açucareira, mesmo em decadência, aparece como definidora 
dos limites de crescimento urbano. Na escala regional, outros fatores são discutidos 
abordando a influência dos processos urbanos formadores da Região Metropolitana 
de Natal (RMNatal), na qual Ceará-Mirim aparece integrada no nível muito baixo 
segundo estudo do Observatório das Metrópoles (2012). Contudo, destacamos que 
nos últimos anos principalmente no vetor de crescimento da BR 406, instalaram-se 
equipamentos de abrangência metropolitana. Esses objetos estão associados a um 
discurso imobiliário em que a possível “metropolização” aparece como 
impulsionadora de investimentos na área de expansão da cidade. 
Palavras-chave: Espaço, Dinâmica urbana, Metropolização. 
. 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
This study aims to understand the growth dynamics of Ceará-Mirim city considering 
the aspects that define its current urban sprawl. We chose to use as methodological 
approach the concept of space as a product and producer of social relations and the 
same constitutes by objects and actions that relate in a dialectical process over time. 
As a research tool, it took place bibliographical study that features the historical 
aspects of use and occupation, in order to evidence the regional ground agents that 
explain its current urban setting. Then, it was collected a secondary data of economic 
analysis activities from municipality and their impact on local social structure. 
Between these aspects, the sugar economy, even in decline, had appeared as 
defining the boundaries of urban growth. At the regional scale, other factors were 
discussed in a way of urban influence processes forming the Greater Natal 
(RMNatal), and Ceará-Mirim appears integrating into this scale in a very low level 
according to Metropolis Observatory (2012). However, we have pointed out that in 
recent years, especially in growth vector of BR 406, settled metropolitan scope 
equipment. These objects have been associating in a real estate sector's reasoning 
while the possible "metropolization" have been promoting as investments in the city's 
expansion area. 
 
Keywords: Space, Urban dynamics, Metropolis. 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
Figura 1 – Localização de Ceará-Mirim 2015. ............................................................................... 20 
Figura 2 – Macro zonas de Ceará-Mirim segundo o plano diretor. ............................................ 24 
Figura 3 – Distribuição e características das propriedades agrícolas no médio vale do Ceará-
Mirim. ............................................................................................................................... 27 
Figura 4 – Foto do engenho Carnaubal na década de 50 do século XX. ................................. 28 
Figura 5 – Réplica do cruzeiro erguido na fundação do povoado Boca da Mata. ................... 30 
Figura 6 – Localizaçãodas demarcações do povoamento Boca da Mata. ............................... 31 
Figura 7 – Largo da Matriz destacando à esquerda a imponente casa do Dr. José Inácio. .. 35 
Figura 8 – Prédio da Intendência municipal no início do século XX. ......................................... 36 
Figura 9 – Mercado Municipal. ......................................................................................................... 37 
Figura 10 – Distribuição dos núcleos de ocupação em Ceará-Mirim. ....................................... 39 
Figura 11 – Vetores de crescimento urbano de Ceará-Mirim por décadas. ............................. 40 
Figura 12 – Macro zona Urbana de Ceará-Mirim. ......................................................................... 41 
Figura 13 – Expansão urbana de Ceará- Mirim: Vetores de crescimento por décadas. ........ 42 
Figura 14 – Abrangência de equipamentos de comércio............................................................. 44 
Figura 15 – Abrangência de escolas de ensino fundamental. .................................................... 44 
Figura 16 – Abrangência de escolas de ensino Médio. ............................................................... 45 
Figura 17 – Abrangência de linhas de transporte ......................................................................... 45 
Figura 18 – Abrangência de postos de saúde ............................................................................... 46 
Figura 19 – Organograma: Hierarquia Dos Centros Urbanos. .................................................... 49 
Figura 20 – Gráfico de Composição do PIB de Ceará-Mirim por Setores da Economia – 
2008, 2010 e 2012 (em Mil Reais). ............................................................................. 54 
Figura 21 – Gráfico de Evolução Agropecuária, Industrial e de Serviços em Ceará-Mirim – 
2000, 2002, 2004, 2006, 2008, 2010 e 2012 (em Mil Reais). ................................. 55 
Figura 22 – Feira livre de Ceará-Mirim. .......................................................................................... 56 
Figura 23 – Prédio da Justiça Federal. ........................................................................................... 57 
Figura 24 – Prédio do Ministério Público Estadual. ...................................................................... 58 
Figura 25 – Atual formação da Região Metropolitana de Natal .................................................. 70 
Figura 26 – Eixos de Integração Metropolitana ............................................................................. 79 
Figura 27 – Vista do embarque/desembarque de passageiros. ................................................. 81 
Figura 28 – Lagoa de Extremoz. ...................................................................................................... 82 
Figura 29 – Hotel às margens da lagoa de Extremoz. ................................................................. 82 
 
 
Figura 30 – Estação em construção entre Extremoz e o distrito de Massangana (Ceará-
Mirim). .............................................................................................................................. 83 
Figura 31 – Diferenças entre a locomotiva e o VLT...................................................................... 84 
Figura 32 – Estação Ferroviária de Ceará-Mirim. ......................................................................... 85 
Figura 33 – Saída do VLT Na plataforma Ribeira (Natal/RN) em direção à Ceará-Mirim. ..... 85 
Figura 34 – Localização da BR 101 no RN. ................................................................................... 86 
Figura 35 – Distrito Industrial de Extremoz às margens da BR 101. ......................................... 87 
Figura 36 – Macrozoneamento Ceará-Mirim-RN .......................................................................... 89 
Figura 37 – Placa sinalizadora das obras de acesso ao aeroporto internacional Aluízio Alves.
 .......................................................................................................................................... 90 
Figura 38 – Loteamento Rota Norte. Massaranduba BR 406/Ceará-Mirim-RN ...................... 91 
Figura 39 – Mapa ilustrativo de anúncio do loteamento Rota Norte .......................................... 92 
Figura 40 – Anúncio do loteamento Rota Norte ............................................................................ 92 
Figura 41 – Equipamentos de Abrangência Metropolitana na BR 406/Ceará-Mirim-RN ........ 93 
Figura 42 – Entrada do Aterro Sanitário Metropolitano, BR 406/Ceará-Mirim-RN. ................. 94 
Figura 43 – Entrada do IFRN campus Ceará-Mirim, BR 406/Ceará-Mirim-RN. ....................... 95 
Figura 44 – Planta do loteamento “Maninho Barreto”, BR 406/Ceará-Mirim-RN. .................... 96 
Figura 45 – Casas populares do complexo Barretão, BR 406/Ceará-Mirim-RN. ..................... 97 
Figura 46 – Vista do campo de treinamento e do estádio “Barretão” ao fundo, BR 406/Ceará-
Mirim-RN. ........................................................................................................................ 97 
 
 
 
LISTA DE TABELAS 
 
Tabela 1 – Área Colhida / Quantidade Produzida (Cana-de-Açúcar) em Ceará-Mirim .......... 53 
Tabela 2 – Evolução de Unidade de Empresas em Ceará-Mirim – 2007 2010 e 2013. ......... 55 
Tabela 3 – Destaque dos 10 Municípios Potiguares com maior concentração de indústrias 
empregados no segmento formal – 2012 (em %). ................................................... 59 
Tabela 4 – Ceará-Mirim e Rio Grande do Norte: IDH (1991 2000 e 2010)............................... 61 
Tabela 5 – Nível de integração na dinâmica da aglomeração da Região Metropolitana de 
Natal ................................................................................................................................. 72 
Tabela 6 – Região Metropolitana de Natal: População, Área e Taxa de Crescimento 
populacional por Municípios. ........................................................................................ 74 
Tabela 7 – Produto Interno Bruto A Preços Correntes E Produto Interno Bruto Per Capita - 
Região Metropolitana De Natal – RN. ........................................................................ 75 
Tabela 8 – Índices de Desenvolvimento Humano na Região Metropolitana de Natal - 2010 76 
Tabela 9 – Taxa de Alfabetização da Região Metropolitana de Natal – RN ............................. 77 
Tabela 10 – Municípios da Região Metropolitana de Natal: crescimento da participação de 
entrada de pessoas por municípios segundo dimensões do movimento pendular.
 .......................................................................................................................................... 78 
 
 
 
LISTA DE SIGLAS 
 
CBTU Companhia Brasileira de Trens Urbanos 
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 
IDH Índice de Desenvolvimento Humano 
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada 
MCMV Minha Casa Minha Vida 
MST Movimento dos Sem Terra 
ONU Organização das Nações Unidas 
PIB Produto Interno Bruto 
PROALCOOL Programa Nacional do Álcool 
PRODETUR Programa de Desenvolvimento do Turismo 
REGIC Regiões de Influências das Cidades 
RMNatal Região Metropolitana de Natal 
VLT Veículo Leve Sobre Trilhos 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................... 14 
2 O ESPAÇO URBANO DE CEARÁ-MIRIM .............................................. 20 
2.1 A construção histórica .......................................................................... 26 
2.2 O espaço urbano atual: as novas áreas de expansão ........................ 38 
3 DINÂMICA NO CONTEXTO SOCIOECONOMICO: ASPECTOS LOCAIS48 
3.1 O setor sucroalcooleiro e a agropecuária ........................................... 50 
3.2Comércio e serviços .............................................................................. 55 
3.3 A pequena indústria .............................................................................. 58 
3.4 Indicadores de qualidade de vida ......................................................... 60 
4 VETORES DE CRESCIMENTO URBANO: ASPECTOS 
METROPOLITANOS? ..................................................................................... 62 
4.1 A cidade como locus das desigualdades ............................................ 63 
4.2 Metropolização à brasileira ................................................................... 66 
4.3 Um breve histórico da institucionalização da RMNatal ...................... 69 
4.4 Ceará-Mirim na RMNatal ........................................................................ 73 
4.5 Os eixos viários de integração metropolitana ..................................... 78 
4.6 O vetor de crescimento da BR 406: equipamentos e usos ................ 90 
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................... 99 
 REFERÊNCIAS ..................................................................................... 103 
 
 
 
 
 
14 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
 As transformações socioespaciais provocadas pelo acelerado crescimento 
urbano brasileiro nas últimas décadas possibilitou uma configuração complexa nas 
atuais dinâmicas e atividades que compõem as cidades. Observa-se que o processo 
de industrialização e ampliação dos serviços da malha urbana foi consolidada pela 
implementação de equipamentos e infraestruturas que garantissem a expansão e 
fluidez do mercado. As cidades então se tornaram locus dessas transformações 
devido a concentração demográfica que catalisa e polariza os processos da ordem 
urbana. 
No Brasil, a partir da década de 1960, percebe-se a intensidade do processo 
de urbanização por meio da concentração demográfica nas regiões industriais, 
diminuição da população rural devido ao êxodo, queda nas taxas de natalidade, 
entre outros. Esse período marca a expansão das corporações capitalistas que 
difundiu e introduziu novas relações envolvendo a industrialização e a consequente 
urbanização, afetando tanto a organização social quanto as formas espaciais criadas 
pelo homem. 
Essa intensa urbanização se desenvolveu em meio a diversidades dos perfis 
citadinos. Santos (2013) descreve que alguns desses perfis são resultados da 
aceleração das macrocefalias metropolitanas, caracterizando um novo e complexo 
arcabouço de sistemas urbanos atualmente dinamizados por meio de múltiplos 
fluxos de informações e dos fluxos de matéria. 
Em meio a isso, cidades de menor porte como centros de zona e centros 
locais (IBGE, 2007) desenvolveram-se integradas a um crescimento espraiado, na 
lógica centro-periferia, estruturando-se um espaço intra-urbano, pelo qual Vilaça 
(2001) fundamenta sua organização pelas condições de deslocamento do ser 
humano, “seja como portador da mercadoria força de trabalho; como no 
deslocamento casa/trabalho; deslocamento casa/compras; casa/lazer/ escola, etc.” 
(VILAÇA, 2001, p.20). 
Considerando este nível de influência na hierarquia urbana, as cidades 
compõem redes cujos fluxos das atividades hegemônicas desenham um esqueleto 
de interações. Essa característica revela uma forma urbana marcada por usos e 
15 
 
funções diversas do espaço “à luz dos subprocessos econômicos, políticos e 
socioculturais” (SANTOS, 2012, p.11) nos diferentes momentos históricos. 
Localizada na Zona da Mata Nordestina, Ceará-Mirim é a expressão urbana 
da inter-relação entre o campo e a cidade desde o século XIX quando, no vale do rio 
que origina o nome da cidade, foi introduzida a cultura da cana-de-açúcar. 
Entretanto, o contexto de reestruturação produtiva da agroindústria canavieira, a 
cidade que até então tinha esta atividade como base da economia local, começou a 
sofrer transformações dessa ordem a partir da década de 1960. 
Essa estrutura socioeconômica foi fundamental na atração de fluxos 
migratórios e de serviços que consolidaram a sede do município como importante 
centro regional, sendo classificado pelo REGIC (Regiões de Influências das 
Cidades), no fim da década de 1970, como centro de zona e posicionando-se entre 
as cinco maiores aglomerações urbanas do estado do Rio Grande do Norte naquele 
período (CLEMENTINO, 1995). 
No entanto, com o desmonte da agroindústria canavieira nos últimos anos, 
observa-se uma gradativa mudança no papel da cidade de Ceará-Mirim como centro 
urbano regional. Essa mudança é confirmada por indicadores e índices que validam 
o surgimento de arranjos econômicos ligados ao setor de serviços, desencadeando 
uma nova dinâmica socioeconômica na cidade e, consequentemente, influenciando 
sua configuração urbana. 
Essas mudanças são acompanhadas de uma perda de centralidade, no que 
se refere a influência da cidade na rede urbana regional, como comprovado pelo 
REGIC (IBGE, 2007) quando classifica Ceará-Mirim como centro local, 
hierarquicamente abaixo de centro de zona descrito nos estudos da década de 1970 
(CLEMENTINO, 1995). 
Além dos fatores locais de transformação econômica que provocaram uma 
mudança na hierarquia urbana, Ceará-Mirim vem gradualmente inserindo-se na 
dinâmica da Região Metropolitana de Natal (RMNatal). 
As regiões metropolitanas são expressões contemporâneas do processo de 
urbanização, que se aproximam da definição de aglomerações urbanas por 
concentrar atividades, serviços e pessoas como sugere Ribeiro (2010, p. 3), 
16 
 
mancha contínua de ocupação, constituída por mais de uma unidade 
municipal, envolvendo intensos fluxos intermunicipais com comutação 
diária, complementaridade funcional, agregados por integração 
socioeconômica decorrente de especialização, complementação e/ou 
suplementação funcional. 
 
 A classificação dessas aglomerações é associada ao caráter metropolitano ou 
não metropolitano, cujo o grau de integração funcional dos municípios que fazem 
parte do aglomerado é utilizado como critério de avaliação dos processos de 
metropolização. O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) diferencia as 
aglomerações urbanas das regiões metropolitanas a partir dos processos urbanos 
de metropolização: 
O conceito aglomerações urbanas, que embora semelhante ao de região 
metropolitana, serve para designar outros espaços urbanos, situados em 
nível sub-metropolitano, que congregam mais de uma cidade, notadamente 
cidades que começariam a experimentar o processo de conurbação. 
(MATOS, 2000, p.2) 
A relação evolutiva do desenvolvimento das aglomerações urbanas em 
regiões metropolitanas revela uma análise da região como espaço de concentração 
das atividades urbanas estabelecidas no polo de importante ordem econômica, 
capaz de influenciar outras áreas que a circundam. 
Segundo estudo do Observatório das Metrópoles (2012) a RMNatal está 
classificada como aglomeração urbana não metropolitana por apresentar em sua 
área de influência municípios com alto, médio, baixo e muito baixo grau de 
integração ao polo, com predominância dos dois últimos níveis. As variáveis que são 
utilizadas na definição dessa classificação estão relacionadas ao crescimento 
populacional; produção e distribuição da riqueza; ocupação do território; mobilidade 
populacional e grau de urbanização. 
Ceará-Mirim é um dos municípios que se inserem na RMNatal desde sua 
institucionalização em 1997. Contudo, o município ainda apresenta nível muito baixo 
de integração metropolitana conforme as variáveis consideradas para a 
determinação desse nível. A natureza dessa configuração permite uma relação 
complexa dos fenômenos urbanos que implicam na dinâmica de crescimento da 
cidade, sendo necessária uma análise sócioespacial que compreenda não apenas a 
escala local, mas também macrolocal, ou regional. 
Partindo dessa contextualização,objetiva-se com este estudo compreender a 
dinâmica de crescimento da cidade de Ceará-Mirim considerando os fatores que 
17 
 
definem sua atual expansão urbana. E, a partir dessa atividade, transcrever a 
caracterização dos objetos que contemplam os novos arranjos urbanos de Ceará-
Mirim, revisar sua relação com os aspectos da dinâmica local e apontar sua inserção 
na RMNatal. 
Para desenvolver este trabalho foi empregado como aporte metodológico o 
conceito de espaço como produto e produtor das relações sociais, sendo o mesmo 
transformado e transformador dos objetos e ações constituintes desse processo 
dialético ao longo do tempo. Nessa condição, será compreendido no conceito de 
espaço geográfico definido por Milton Santos como conjunto de fixos e fluxos que 
permitem modificações e novos significados a partir de ações (SANTOS, 2012). 
Agregados a essa noção, os objetos constituintes do espaço “assumem novas 
funções adquirindo novos valores em períodos históricos da estrutura social” 
(CASTRO, 1992, p.13). Baseados nesse conceito, podemos identificar a dinâmica 
entre os objetos e as ações do espaço urbano atual de Ceará-Mirim a partir das 
funções já exercidas como centro de importância regional, de forma a compreender 
as novas funções desses objetos frente aos processos de produção espacial. 
Como ponto de partida duas perguntas são lançadas: 
i. A estrutura histórica baseada na agroindústria canavieira ainda delimita e 
influencia a configuração urbana de Ceará-Mirim? 
ii. A metropolização de Natal interfere na definição dos novos arranjos urbanos? 
Para responder essas perguntas e atingir os objetivos destacados foram 
utilizados como procedimentos de pesquisa dados secundários, pesquisa 
documental, pesquisa bibliográfica, visita in loco e confecção de mapas visando 
caracterizar a realidade do objeto de estudo discutido nos três capítulos em que se 
divide este trabalho. 
O primeiro capítulo, intitulado “O espaço urbano de Ceará-Mirim”, é a 
compilação de dados que resultaram na descrição do município quanto a sua forma 
e características territoriais considerando o aporte teórico em Santos, 2012. A 
seguir, o primeiro subcapítulo, A construção histórica da cidade, é categorizado com 
o objetivo de debater a atual dinâmica urbana por meio do entendimento dos 
processos que definiram a atual conformação. O trabalho de levantamento histórico 
18 
 
foi realizado mediante pesquisa bibliográfica sobre o processo histórico de ocupação 
da cidade, estudo de documentos históricos e pesquisa em acervo fotográfico. No 
segundo subcapítulo; O espaço urbano atual: as novas áreas de expansão, é 
destacado a relação entre o uso e ocupação do solo e sua influência quanto à forma 
e configuração do espaço. Para isso, foram consideradas como referências 
analíticas o plano diretor da cidade e Siqueira Neto (2011) com estudos relacionados 
às novas áreas urbanizadas. 
 No segundo capítulo, a “Dinâmica no Contexto Socioeconômico: 
Aspectos Locais” são discutidos as atividades econômicas do município e seus 
respectivos impactos na estrutura social. Consideramos a análise de dados 
secundários atualizados de institutos de pesquisa como IBGE (Instituto Brasileiro de 
Geografia e Estatística) e IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). 
Também foi organizada pesquisa in loco para apresentar um panorama dos 
aspectos discutidos nos respectivos subcapítulos; O setor sucroalcooleiro e a 
agropecuária; A pequena indústria; Indicadores de qualidade de vida. 
No terceiro e último capítulo, que tem por título “Vetores de crescimento 
urbano: Aspectos metropolitanos?”, os aspectos relacionados à escala 
macrolocal da dinâmica urbana ceará-mirinense são destacadas. Inicialmente no 
primeiro subcapítulo, As cidades como locus das desigualdades, os fenômenos 
urbanos que consolidam a cidade capitalista como locus do desenvolvimento e da 
segregação são discutidos embasados no referencial teórico da área. 
 No segundo subcapítulo, Metropolização à brasileira, uma discussão sobre os 
fenômenos relacionados à metropolização é destacada como resultado dessa 
configuração urbana complexa, sugerindo que há um “problema metropolitano” 
(LEFEVRE, 2009) a partir de uma inadequação entre território funcional da 
metrópole e sua organização institucional. 
No terceiro subcapítulo; Um breve histórico da institucionalização da RMNatal, 
é descrita a formalização da região metropolitana especificando os níveis de 
integração entre os municípios de acordo com metodologia adotada pelo 
Observatório das Metrópoles (2012). No quarto subcapítulo; Ceará-Mirim na 
RMNatal, os aspectos da cidade em âmbito macrolocal são analisados por meio da 
19 
 
comparação de dados secundários dos últimos levantamentos feitos pelo IBGE, 
PNUD e Observatório das Metrópoles. 
No quinto subcapítulo, Os eixos viários de integração metropolitana, os fluxos 
relacionados a integração da cidade de Ceará-Mirim ao polo metropolitano são 
destacados considerando três vias de acesso: a ferrovia, a BR101 e a BR 406. A 
pesquisa in loco foi realizada nos três eixos de integração viária de Ceará-Mirim com 
a RMNatal a fim de identificar as funções atuais dessas vias e caracterizar os 
possíveis objetos artificiais metropolitanos materializados em território ceará-
mirinense. Somente na BR 406 são identificados equipamentos de abrangência 
metropolitana nas áreas de expansão urbana da cidade, que logo foram mapeados e 
caracterizados no último subcapítulo; O vetor de crescimento da BR 406: 
Equipamentos e usos. 
Nas Considerações Finais são relacionadas as transformações produtivas da 
cidade de Ceará-Mirim nas últimas décadas e sua inserção gradual no processo de 
metropolização de Natal como agentes que explicam os atuais vetores de expansão 
urbana da cidade. Além disso, uma reflexão sobre o objeto de estudo é apresentada 
a título de análise para composição de um quadro futuro. 
 
20 
 
2 O ESPAÇO URBANO DE CEARÁ-MIRIM 
 
O município de Ceará-Mirim está localizado na faixa litorânea do Estado do 
Rio Grande do Norte, com área territorial de 724, 377 km² e a uma distância de 31 
km da capital do estado, Natal. 
Seus limites geográficos são os municípios de Maxaranguape (ao Norte e a 
Leste), Taipu (a Oeste), Ielmo Marinho, São Gonçalo do Amarante (ao Sul) e 
Extremoz (ao Sul e a Leste). 
 
Figura 1 – Localização de Ceará-Mirim 2015. 
Fonte: Produzido por ALMAPAS, 2015. 
 
Segundo dados do IBGE (2010) a população alcançava o número de 68.141 
habitantes. 
Ainda segundo o mesmo Censo, 52,1% da população residiam na zona 
urbana da sede municipal e 49,4%, na zona rural, esse dado revela a relevância da 
área rural na grande extensão territorial do município. 
21 
 
 Desde 1997, o município pertence à Região Metropolitana de Natal 
(RMNatal). Apresenta a posição a mais distante do polo, mas corresponde a 27,2% 
da área total da RMN (IBGE, 2010). 
O espaço urbano atual de Ceará-Mirim possui em sua gênese características 
que evidenciam o domínio de agentes políticos e econômicos que denotam uma 
riqueza de informações quanto ao seu uso e forma. A partir da noção de espaço 
como “conjunto indissociável de sistemas de objetos e ações” (SANTOS, 2012, p. 
22) podemos reconhecer o espaço urbano da cidade por meio de categorias 
analíticas como a configuração territorial, rugosidades, função e forma. 
Ao utilizar o espaço como recurso metodológico de análise, Santos (2013) 
afirma que ele é formado a partir de sistemas de objetos e sistemas de ações 
indissociáveis, solidários e também contraditórios. O primeiro elemento, os objetos, 
são hoje cada vez mais artificiais devido a técnica e as intencionalidades sociais que 
transformam, criam e substituem os objetos naturais em artificiais. 
Essa lógica ressalta que esses objetos são criados e reproduzidos a partir de 
um dado momento histórico com as condições sociais e técnicaspresentes. Sendo 
assim, 
Através da presença desses objetos técnicos: hidroelétricas, fábricas, 
fazendas modernas, portos, estradas de rodagem, estradas de ferro, 
cidades, o espaço é marcado por esses acréscimos, que lhe dão um 
conteúdo extremamente técnico. (SANTOS, 2012, p. 63) 
Portanto, os sistemas de objetos interagem com os sistemas de ações. Esse 
último é resultante de necessidades naturais e criadas que apontam uma função, 
“essas funções de uma forma ou de outra desembocam nos objetos” (SANTOS, 
2012, p.82). Trata-se então da ação humana sobre os objetos, seu valor, sua função 
e seus significados fazendo com que, 
De um lado, os sistemas de objetos condicionam a forma como se dão as 
ações e, de outro, o sistema de ações leva à criação de objetos novos ou se 
realiza sobre objetos preexistentes. É assim que o espaço encontra a sua 
dinâmica e se transforma. (SANTOS, 2012, p.63) 
Como citado acima, o espaço é produzido a partir das relações entre os 
objetos criados e as intencionalidades das ações sobre eles. Essa dinâmica é 
estabelecida historicamente pela sociedade ali instalada, o que demonstra o 
surgimento de territorialidades que Sack (1986) define como expressões geográficas 
22 
 
de poder, sendo um meio pelo qual o espaço e a sociedade são inter-relacionados. 
Constata-se então que as características do espaço são construídas socialmente por 
intermédio de estruturas e processos que delimitarão sua forma e função. 
Portanto, o espaço não é interpretado como algo que contenha uma natureza 
cristalizada, impregnado de uma natureza prévia. Seus significados derivam dos 
investimentos feitos sobre ele, por meio de técnicas onde não há espaços sem as 
práticas que lhe conferem sentido. 
Em tempo, estudar o espaço da cidade é consequentemente pensar no 
urbano como a materialização da divisão espacial do trabalho e do processo de 
reprodução do capital, onde o mesmo se estabelece mediante a ação humana, 
modificando e o transformando no sistema de objetos e ações. 
No caso de Ceará-Mirim, a origem do seu espaço urbano é relatada por 
Castro (1992) como “sítio primitivo” localizado às margens do rio de mesmo nome, 
onde a cidade fundamentou-se por uma dinâmica econômica proporcionada pelo 
comércio, que, por sua vez, era aquecido pelo vigor da atividade canavieira na 
região, implantada desde o século XIX. 
A região do médio vale do rio Ceará-Mirim classificou-se como um objeto 
natural importante para a construção e desenvolvimento da atividade açucareira em 
meados do século XIX. Essa atividade econômica incentivou a criação de objetos 
artificiais que desencadearam no surgimento do núcleo urbano de Ceará-Mirim. 
A consolidação da cidade no município marca o processo de expansão 
urbana que não foi restrito apenas a um conjunto denso e definido de edificações, 
mas para Rolnik (2012, p.12) “demonstra a predominância da cidade sobre o campo 
[...] Periferias, subúrbios, distritos industriais, estradas e vias expressas recobrem e 
absorvem zonas agrícolas num movimento incessante de urbanização”. 
Segundo o Plano Diretor de Ceará-Mirim (CEARÁ-MIRIM, 2006) são 
consideradas urbanas aquelas áreas que atendem simultaneamente aos seguintes 
critérios: 
I – Definição legal pelo Poder Público; 
23 
 
II – Existência de, no mínimo, quatro dentre os seguintes 
equipamentos de infraestrutura urbana: 
a) malha viária com canalização de águas pluviais; 
b) rede de abastecimento de água; 
c) rede de esgoto; 
d) distribuição de energia elétrica e iluminação pública; 
e) recolhimento de resíduos sólidos urbanos; 
f) tratamento de resíduos sólidos urbanos; 
Desse modo, até a década de 1970, o espaço urbano do município de Ceará-
Mirim que concentrava apenas o núcleo considerado sede do poder municipal, onde 
a atividade açucareira juntamente aos serviços proporcionaram a urbanização da 
local. 
Contudo, uma dinâmica urbana independente daquela expressa na sede 
municipal surge na zona litorânea, ocasionando a segmentação do município em 
duas áreas urbanas, uma vez que ocorreram processos de urbanização 
diferenciados. A figura a seguir destaca em vermelho as zonas urbanas segundo o 
plano diretor da cidade; 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
24 
 
Figura 2 – Macro zonas de Ceará-Mirim segundo o plano diretor. 
 
Fonte: Cedido pelo IDEMA (Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente) 
 
A mancha urbana de ocupação nos distritos litorâneos de Ceará-Mirim aponta 
para um crescimento independente das dinâmicas de crescimento percebidas na 
sede. 
Tal fato pode ser explicado como reflexo das dinâmicas metropolitanas 
ligadas à atividade turística, que enfatiza o sol e as praias dos municípios costeiros 
da Região Metropolitana de Natal, colocando o turismo como uma importante 
atividade econômica para o município atualmente. 
A atividade turística é considerada eixo estratégico, sendo objeto de ações 
prioritárias do poder público municipal. No plano diretor de Ceará-Mirim (2006) é 
destacada a região dos distritos litorâneos como potencial zona de interesse turístico 
e lazer, “onde é possível o desenvolvimento de planos e programas de interesse 
turístico, bem como a uso econômico da área para dar suporte ao desenvolvimento 
da atividade” (CEARÁ-MIRIM, p.26, 2006). 
25 
 
Segundo Lopes (2008), a porção urbana que abrange grande parte da faixa 
litorânea do município, ou seja, os núcleos de praia Jacumã, Muriú e Porto Mirim, 
tem sido alvo de investimentos imobiliários de grande porte voltados para o turismo, 
como infraestruturas de condomínios e resorts. 
 Esse litoral tem sido, conforme Fonseca (2005), núcleo de segundas 
residências e local de veraneio o que constitui em uma das modalidades de turismo. 
Em Ceará-Mirim, a principal tendência do mercado são as praias de Jacumã e 
Muriú. 
Nessa lógica, Clementino (2009) observa que essa configuração evidencia 
novas territorialidades, emergentes do crescimento populacional, incremento do 
setor de serviços e, principalmente, o turismo como alavancador de novos processos 
e espaços econômicos. A autora ainda complementa; 
O turismo, cujo crescimento pelo litoral, via binômio sol e mar, evidenciam e 
ampliam a tendência do processo de conurbação entre polo e as 
localidades costeiras urbanizadas, propiciando o distanciamento das 
relações existentes entre tais localidades e a sede do seu próprio município. 
(CLEMENTINO, 2009, p.5) 
Diante disso, é evidente o surgimento de novos arranjos urbanos decorrentes 
não só da atividade turística, mas também da própria dinâmica de expansão urbana 
do município, sendo essa proporcionada por fatores que podem se relacionar pelas 
dinâmicas local e regional. 
Como anteriormente fundamentado em Santos (2008) revisamos sobre o 
espaço enquanto um produto social, que está em permanente processo de 
transformação. Logo, para estudá-lo devemos considerar sua totalidade, uma vez 
que, os elementos que atuam dialeticamente na produção do espaço, não são 
compostos apenas de fatos passados, mas também de presente, resultando aí sua 
dinâmica. 
Com vistas a observar os fatores que hoje definem os novos arranjos faz-se 
necessário, inicialmente, inventariar o espaço por sua configuração territorial desde 
a origem da cidade de Ceará-Mirim, sendo essa a proposta do próximo tópico. 
 
26 
 
2.1 A construção histórica 
 
A ocupação do território ceará-mirinense denota ter iniciado nas relações do 
intenso comércio ilegal do pau-brasil (abundante na região) entre franceses, 
holandeses e os índios Janduís que habitavam às margens do rio Ceará-Mirim no 
início do século XVI. O projeto colonizador português caminhava a passos lentos no 
início deste século, na província do Rio Grande, principalmente na várzea do rio 
Ceará-Mirim, cujo nome deriva do vocábulo indígena “Ce-ará-mirim”, que significa 
“canto do papagaio pequeno” (CASTRO, 1992, p.15). 
As relações amistosas entrefranceses, holandeses e indígenas agregada à 
uma resistência no processo de aculturação e desapropriação das terras provocou 
uma situação de risco quanto à perda do território por parte dos portugueses. Assim, 
a partir da vinda de expedições colonizadoras chefiadas por Manoel Mascarenhas 
Homem no fim do século XVI “com a ideia fixa de usar a força contra os índios” 
(SENNA, 1974, P. 361) o território foi pontualmente reconquistado em duras lutas 
entre portugueses e nativos. 
Essas expedições deflagraram no massacre da população indígena que se 
opunha à ocupação portuguesa, população essa relatada por Senna (1974, p.355): 
No início da ocupação portuguesa (1599-1600) a zona polarizada CEARÁ- 
MIRIM – GUAJIRU continha umas 16 aldeias mais ou menos afastadas, 
abrigando uma população nativa de 11.200 pessoas, na proporcionalidade 
de 700 por unidade geográfica. [...] Isto depois dos massacres, 
degolamentos, incêndios e emigrações para a região tapuia ou cariri. Essa 
era a situação do homem no começo do século XVI na zona apreciada. 
Logo após o estabelecimento dos portugueses (1597) foram implantadas por 
concessão do 2º Capitão–Mor Jerônimo de Albuquerque (Donatário1 da capitania do 
Rio Grande) 23 sesmarias2 na ribeira do Ceará-Mirim e arredores. Andrade (2004, 
p.56) descreve que dentre as inúmeras atribuições que competiam aos donatários 
estavam as de “doar terras em sesmarias a pessoas cristãs e a de escravizar os 
índios a fim de usá-los no trabalho”. 
 As sesmarias, estrutura fundiária característica do Brasil colonial, tinham por 
fundamento fixar o domínio territorial português na colônia por meio da doação de 
 
1
 Donatário: Indivíduo que recebeu uma doação de alguma sesmaria. Senhor de capitania hereditária 
2
 Sesmaria: Lote de terra concedida pelo Rei de Portugal a fim da apropriação e cultivo. 
27 
 
grandes latifúndios a pessoas de confiança da coroa. Essa estrutura concentradora 
e excludente seria base para as futuras atividades agrícolas implantadas na região 
do Ceará-Mirim. Segundo Cascudo (2002, p. 258) 
[...] desde março de 1602 houve ocupação na várzea ou ao longo do Rio 
Seara, terras aproveitadas para lavoura e pequena criação de gado. Por 
todo século XVII incontável foi o número de sesmarias dividindo toda região 
com maior ou menor utilidade agrícola, notadamente de proprietários de 
Extremoz. 
O autor citado descreve que nos primeiros anos de ocupação, o vale do rio 
Ceará-Mirim3 teve como atividades econômicas dominantes a criação de gado e a 
agricultura de subsistência. Desse modo, podemos inferir que a ocupação inicial do 
território ceará-mirinense esteve sempre relacionada a atividades agropastoris 
devido às condições naturais favoráveis encontradas na região do médio vale do rio 
(Figura 3). 
 
Figura 3 – Distribuição e características das propriedades agrícolas no médio vale do Ceará-
Mirim. 
 
Fonte: (ANDRADE, 1956, Apud CASTRO, 1992) editado pelo autor. 
 
 
É somente no século XIX que o vale do rio Ceará-Mirim receberá o cultivo da 
cana-de-açúcar, cultura largamente introduzida desde o início da colonização 
 
3
 Vale do Rio Ceará-Mirim: A denominação vale do rio Ceará-Mirim é uma construção humana. O rio 
Ceará-Mirim nasce no município de Lages e tem sua foz no município de Extremoz, percorrendo 120 
km. Mas a área em que foram instalados os engenhos de açúcar, localizada no seu baixo curso, 
ocupa apenas 25 quilômetros do seu curso e 2 quilômetros de largura. Será essa área de 50km² que 
receberá, na linguagem da região, a denominação “vale do Ceará- Mirim. 
28 
 
portuguesa. Destaca-se assim a implantação do primeiro engenho em 1840 por 
Antônio Bento Viana, o engenho Carnaubal (Figura 4). 
Figura 4 – Foto do engenho Carnaubal na década de 50 do século XX. 
 
Fonte: Acervo de Gibson Machado. 
 
 
Nesse momento histórico, o espaço econômico do Rio Grande do Norte antes 
dedicado principalmente ao cultivo do algodão e à pecuária extensiva no interior da 
província sofrera modificações ocasionadas tanto por fatores naturais quanto 
econômicos. 
Monteiro (2002, p.166) explica que “a seca ocorrida entre os anos de 1844 e 
1846 dizimou o rebanho bovino, desarticulando esta atividade, diminuindo os lucros 
gerados pela exportação do algodão, levando os proprietários rurais a buscarem 
uma atividade mais sólida para investir”. 
Motivados por esses fatores, os proprietários rurais voltaram os olhares para 
a Zona da Mata e passaram a investir no cultivo da cana-de-açúcar no médio vale 
do rio Ceará-Mirim. Essa atividade redimensionara a configuração desse território e 
acarretara o surgimento de uma sociedade baseada nas relações engenho/casa-
grande, considerando o engenho como “unidade de produção mais importante, em 
torno do qual outros espaços se estruturavam, refletindo a configuração desse 
território” (GOMES, 1997, p. 25). 
29 
 
Foi nesse cenário de prosperidade econômica que o presidente da província, 
João Capistrano Bandeira de Mello, ressaltou na sua Fala à assembleia legislativa 
provincial em 13 de julho de 1874 (FALAS, 2001 p.44-45) a importância do vale do 
Ceará-Mirim em relação às outras áreas da província onde a cana era cultivada: 
A terra, o primeiro elemento de produção, temol-a de sobejo, e da melhor 
qualidade. É sobretudo notável nesta província o rico Valle do Ceará Mirim, 
onde a canna, uma vez plantada, torna-se quase perpetua, mediante um 
pequeno trabalho, a sua grandeza e quantidade despertão com razão o 
enthusiasmo no viajante, extasiado ante a uberdade de um solo abençoado, 
e que compensa em demasia os serviços do agricultor laborioso. 
Logo, as terras férteis do vale utilizadas inicialmente para a prática da 
agricultura e pecuária foram ocupadas e direcionadas para o cultivo da cana-de-
açúcar. Esse fato dinamizou as relações sociais e econômicas do território e 
provocou o surgimento de uma sociedade urbana, que no caso, desde os 
primórdios, esteve relacionada à atividade agrícola. 
Como podemos observar no decorrer dessa descrição historiográfica sobre o 
município as relações econômicas, a produção do espaço está concentrada nas 
mãos de agentes dominantes, latifundiários, senhores, ou seja, dos grupos 
hegemônicos, que transformam e moldam os espaços de acordo com seus 
interesses e valores específicos. Esses agentes se relacionam a uma construção 
histórica comum da zona da mata nordestina onde as relações sócio-históricas 
estiveram circunscritas pelo sistema patriarcal, de estrutura colonial, com base no 
catolicismo. 
Nesse contexto, Haesbaert (2006, p.121) sintetiza a ideia de território 
afirmando que o mesmo “é o produto da relação desigual de forças, envolvendo o 
domínio ou controle político-econômico do espaço [...].” Assim, o estabelecimento e 
ascensão de uma classe social, cujo poder se estendia além dos engenhos e casa 
grande, possibilitara ritmo e dinamismo necessário para a construção do território 
urbano de Ceará-Mirim, inicialmente denominado como povoado, o Boca da Mata. 
Como destacado, a partir da ocupação territorial advinda da introdução de 
economias agropastoris como forma de dominação do território e por último com a 
implantação da monocultura da cana-de-açúcar (em meados do século XIX) as 
complexidades das relações sociais permitiram o estabelecimento de um povoado 
30 
 
denominado Boca da Mata, onde existiam roçados de algodão, cereais e algumas 
matas, de onde se extraia madeira para construção (SENNA, 1974, p.454). 
Castro (1992, p. 19) relata o surgimento desse povoado destacando que no 
século XIX “foi construída uma pequena casa comercial, erguido um cruzeiro, 
marcando o nascimento do povoado, e organizada uma feira”. Ainda sobre a origem 
desse povoado, Senna (1974, p. 454) corrobora dizendo que, 
O povoamento originou-se no ponto de cruzamentodas estradas que 
seguiam para o sertão, provenientes de Natal e Extremoz, e das que 
partiam do povoado de jacoca e praias do Norte, rumo aos engenhos, que 
já se haviam estabelecido, às margens do rio. Ao poente desse cruzamento 
Francisco de Bernardo de Gouveia construiu também, uma pequena casa 
comercial. Nesse ponto, foi organizada uma feira e erguido um cruzeiro, 
marco do nascente povoado. 
 Um ponto relevante na descrição do autor é a incorporação de uma 
apropriação simbólica do território com erguimento de um cruzeiro (Figura 5), o que 
demonstra um significado maior, para Corrêa (1996) um significado de 
pertencimento – a terra pertence a alguém – não necessariamente como 
propriedade, mas com o caráter de apropriação. 
 
Figura 5 – Réplica do cruzeiro erguido na fundação do povoado Boca da Mata. 
 
Fonte: foto de autoria própria, 2012. 
 
31 
 
 Abaixo, na Figura 6 uma tabela de localização das demarcações iniciais do 
povoado é apresentada. Nela, são destacados quatro cruzeiros (ao Nascente, ao 
Poente, ao Sul e ao Norte) e seus respectivos pontos de referência. 
 
 
Figura 6 – Localização das demarcações do povoamento Boca da Mata. 
Fonte: SENNA, 1974, editada pelo autor. 
 
É importante observar na figura acima que os pontos de cruzamento de 
estradas referem-se respectivamente, ao que hoje corresponde à Linha Férrea 
(Natal- Extremoz- Ceará-Mirim), às estradas litorâneas (Trairi – Potengi – Jacoca – 
Carnaubal – Quiri – Maxaranguape – Oceano) e aos cruzamentos centrais do 
povoado. 
Essa descrição demonstra o grau de importância que os eixos de integração 
viária já exerciam mesmo antes do estabelecimento da cidade. Esses mesmos 
pontos de cruzamento atualmente são representados pela linha férrea que 
interligava Ceará-Mirim aos municípios do litoral sul e agreste e a RN 160 que liga a 
cidade aos municípios de Maxaranguape e Rio do Fogo. Percebe-se então que 
Ceará-Mirim possuía uma ligação viária mais acentuada com o chamado Sertão do 
que com a Capital do Estado. Isso é consequência de uma maior relevância 
econômica que outros centros urbanos possuíam em relação à Natal. 
32 
 
Vale ressaltar que no período em questão (anterior a 1855) o povoado Boca 
da Mata era uma localidade pertencente à Freguesia de São Miguel do Guajiru4 com 
sede na Vila Nova de Extremoz do Norte5. 
Portanto, a importância do erguimento dos cruzeiros (ver figura 6) como 
símbolo demarcatório nos remete a um período sublinhado pela presença da igreja 
como principal agente na gestão territorial. Teixeira (2009, p. 281) afirma que ainda 
no século XIX mesmo após a implantação das políticas pombalinas a igreja na 
província do Rio Grande Norte apresentava um papel fortemente administrativo já 
que, 
A sede da paróquia se situava na aglomeração mais importante localizada 
em sua jurisdição territorial, fosse ela uma povoação, uma vila ou uma 
cidade. Numa época em que os cartórios inexistiam, era a paróquia que 
possuía, através de seus registros de batismos, de casamentos e de óbitos, 
informações fundamentais para a população local, inclusive de caráter 
etnográfico. (TEIXEIRA, 2009, p. 281) 
 Destacamos assim que o início da organização da configuração territorial do 
espaço, nesse caso, passa pelo domínio do sagrado, precedendo a gestão laica do 
território, de forma que “a bênção de Deus acompanhava de muito perto as 
primeiras ações com vistas ao estabelecimento definitivo dos homens.” (TEIXEIRA, 
2009, p. 167). É por meio dessa estrutura de dominação político-econômica 
associada à apropriação simbólica que se constituem os primórdios do núcleo 
urbano primitivo ceará-mirinense. 
 De acordo com Castro (1992) esse núcleo urbano primitivo está assentado 
em terrenos que anteriormente pertenciam aos engenhos Espinheiro, na porção 
oriental, e Diamante, no lado ocidental da cidade, o que evidencia a relação 
existente entre disponibilidade de terras dos engenhos e crescimento urbano. 
 
4
 Freguesia de São Miguel do Guajiru: A Aldeia de Guajiru, situada a margem esquerda da lagoa de 
mesmo nome, era um centro de resistência que contava com o auxílio de incursões francesas e 
holandesas, interessadas no comércio de pau-brasil. As constantes penetrações estrangeiras pelos 
vales e tabuleiros Potiguares e Janduís, assanhavam o gentio que o colonizador tinha em mira 
exterminar, coisa que só conseguiu pelo processo bárbaro da degradação e da intriga. O aldeamento, 
porém, não produziu os frutos ambicionados. Os índios trazidos pelos portugueses ali alojados não 
suportaram os limites de sua ação e começaram a conspirar. A Companhia de Jesus, então no Brasil, 
procurou parlamentar pacificamente com os elementos locais estabelecidos na Aldeia de Guajiru, 
resultando no estabelecimento da Freguesia de São Miguel do Guajiru. 
5
 Vila Nova de Extremoz do Norte: A Vila Nova de Extremoz do Norte, a primeira do Estado, foi 
fundada em 1758, por Bernardo Coelho Gama Casco. Fora sempre povoada, com terrenos e plantios 
desde o início do Séc. XVII. 
33 
 
Outro fator limitante para o crescimento urbano de tal povoado é o rio Ceará-
Mirim, que se encontra ao norte do sítio primitivo. Todas as construções erguidas 
nesse sítio se estabeleceram na margem esquerda do rio, distanciando-se alguns 
metros dos terrenos alagadiços de várzea, possuindo uma altitude de treze metros 
em sua menor elevação. 
 Sucessivamente, foi no sítio primitivo que pequenos comerciantes 
estabeleceram suas moradias e seus respectivos comércios, de sorte que 
abasteciam os engenhos da região do vale e serviam como entreposto comercial 
para os viajantes que seguiam rumo a Extremoz e Natal. O dinamismo comercial 
atrelado ao enriquecimento dos donos de engenho desencadeou uma mudança 
profunda na organização territorial do antigo povoado como destaca Castro (1992, 
p.15): 
Em 1855 a sede do município de Vila Nova de Extremoz do Norte passa a 
ser a povoação de Boca da Mata, com o nome de Vila de Ceará Mirim. Essa 
transferência foi motivada pelas facilidades apresentadas por aquele local, 
em relação às atividades comerciais que se realizavam com os engenhos 
instalados no Vale do Ceará Mirim. Mais tarde, em 1858, Vila Nova de 
Extremoz do Norte se transformou no município de Ceará Mirim. 
 No que concerne às mudanças no âmbito da gestão territorial, a lei provincial 
321 de 18 de agosto de 1855, que marca a elevação do povoado à vila e 
consequentemente a transferência da sede do município de Vila Nova de Extremoz 
para a Vila de Ceará-Mirim, foi suspensa pela resolução 345 de 4 de setembro de 
1856. 
A suspensão da lei de elevação e transferência de sede foi condicionada à 
construção da cadeia e da intendência municipal (casa de câmara). Por isso, 
somente dois anos depois, em 30 de julho de 1858 a povoação de Boca da Mata foi 
finalmente elevada à categoria de vila, com o título de vila do Ceará-Mirim. 
 A partir de 1858, como descrito acima, o povoado de Boca da Mata toma 
foros de vila. O processo de transformação dos aldeamentos e povoados em vilas 
está intimamente ligado ao desenvolvimento urbano, ou pelo menos ao pensamento 
urbanístico “modernizador” do período em questão. Para Maia (2005) esse 
pensamento no século XIX é a anunciação de “uma vida nova, vida esta muitas 
vezes promulgada pelas ‘novas’ ideias que vão repensar o espaço, em especial o 
das cidades, que se tornam cada vez mais o locus da modernidade”. 
34 
 
Esse pensamento urbanístico, que teve início no Iluminismo do século XVIII, 
influenciou a política administrativa da coroa portuguesa desde a Era Pombal e se 
estendeu até o século XIX na forma de movimentos modernistas. Muito embora a 
vila de Ceará-Mirim seja estabelecida apenas na segunda metade do século XIX, já 
no Brasil império, ela demonstra um ato administrativo expressivo, marcante na 
reorganização do território da primitiva aglomeraçãourbana, de modo que, 
[...] tal mudança revela igualmente interesses relacionados à organização 
do território, sendo, às vezes, motivada por contendas políticas no interior 
das próprias localidades. Em todo caso, o papel administrativo das 
aglomerações urbanas, que se afirma ao longo do tempo, se relaciona 
profundamente à questão do desenvolvimento dos municípios, forma de 
organização do território. (TEIXEIRA, 2009, p.446) 
 Com isso, o autor revela o papel de ruptura que a vila representa quanto ao 
uso, forma e função dos antigos aldeamentos e povoados. Desse modo, é 
importante considerar que o título de vila transcende a questão econômica da 
localidade, pois a titulação também fazia parte de uma política deliberada da coroa 
portuguesa para a urbanização da colônia. Tal ideia política perpassa e chega ao 
Brasil Império. A expressão dessa ruptura se expressou na forma arquitetônica da 
vila, nos edifícios públicos, no traçado das ruas, nas praças e nas casas de 
particulares. 
 Ao que consta, a vila do Ceará-Mirim situava-se em “terreno geralmente 
desigual” próximo ao leito do rio, onde se estabeleceu o antigo povoado Boca da 
Mata (NOBRE, 1971, p.189). Ainda sobre sua forma, o autor comenta que “seria 
uma vila bem edificada e elegante, se os fundadores tivessem aproveitado o terreno 
elevado e plano, onde já existem alguns prédios”. 
No próprio relato do autor existe uma perspectiva diferenciada quanto ao 
traçado urbano português6 tão difundido no Brasil colonial e que nesse momento 
histórico abre espaço para outras concepções urbanísticas, entretanto, todas 
 
6
 Urbanismo português: O urbanismo português possui características marcantes quanto à sua 
morfologia urbana, entre elas se destacam: a seleção de locais topograficamente dominantes como 
núcleos iniciais dos aglomerados urbanos; a íntima articulação dos traçados das cidades com as 
particularidades topográficas locais; a estruturação das cidades em núcleos distintos, com malhas 
urbanas diferenciadas, correspondendo cada uma delas a diferentes unidades de crescimento; a 
localização de edifícios singulares em sintonia com a topografia e o importante papel desses edifícios 
na estruturação dos traçados urbanos; a lenta estruturação formal das praças urbanas, associadas a 
diferentes núcleos geradores e a funções distintas. 
35 
 
europeias, que eram consideradas as mais desenvolvidas na época. Nessa 
discussão, Santos (1985, p.40) comenta que, 
As propostas de desenvolvimento a partir do fim do século XIX apontam 
para uma trajetória retilínea, cheia de determinação e que passa pela 
cidade [...] sem se importar muito com os efeitos não desejados que causa. 
Não há novidade; é um tempo em que tradições antigas estão sendo 
superadas, enquanto são propostos novos modelos de articulação da 
sociedade. 
 
 Castro (1992, p.19) caracteriza as casas mais imponentes da vila destacando 
que são “geminadas dos dois lados, sem recuo lateral ou frontal, possui amplos 
aposentos e grandes quintais, e paredes, em geral, de tijolos duplos”. 
Entre os prédios particulares construídos no período, destaca-se o do Dr. 
José Inácio Fernandes Barros, Juiz de Direito (lado esquerdo da Figura 7). Nobre 
(1971, p.190) no ano de 1877 relata a construção desse edifício, antecipando que 
“será por tal forma completo, que não deixará coisa alguma a desejar e nada a 
imaginar”. 
Figura 7 – Largo da Matriz destacando à esquerda a imponente casa do Dr. José Inácio. 
 
Fonte: Acervo de Gibson Machado. 
Sobre a arquitetura dos prédios públicos da vila, o autor ainda acrescenta que 
além do paço municipal, onde se localizava a intendência do município (Figura 8), 
destacava-se o cemitério público, a pequena casa que serve para açougue, e um 
excelente prédio em que funcionam as escolas públicas da vila, fundado e oferecido 
ao governo pelo Coronel Manoel Varela do Nascimento, Barão do Ceará-Mirim. 
 
36 
 
Figura 8 – Prédio da Intendência municipal no início do século XX. 
 
Fonte: Acervo de Gibson Machado. 
 
As ruas da vila, em descrição feita por Nobre (1971), eram, algumas delas, 
arborizadas e iluminadas por iniciativa particular. Isso demonstra o poderio 
econômico de alguns residentes desse centro urbano, poder que se expande ao 
âmbito simbólico e espacial, visto que começam a demarcar nos espaços da cidade 
valores que são específicos de uma classe. 
Todos esses traços arquitetônicos revelam o dinamismo político-econômico 
no qual era organizada a vila de Ceará-Mirim, onde o crescimento urbano esteve 
vinculado a uma classe social enriquecida pela agroindústria açucareira do tipo 
plantation, escravocrata e detentora de capital suficiente para “edificar” uma cidade 
no médio vale do rio Ceará-Mirim. Contudo, Senna (1974, p.460) acrescenta que 
[...] não se desenvolveram apenas os engenhos, com sua aristocracia 
escravocrata e canavieira, mas, sobretudo o comércio, momento em que o 
cel. Onofre José Soares construiu o Mercado Municipal, inaugurado a 27-
12-1881 e para onde foi transferida a feira, que até então era efetuada na 
Rua Grande, e em torno do qual cresceram pequenos estabelecimentos 
comerciais. [...] assim, também, uma sociedade de comerciantes 
enriquecidos, proprietários urbanos e rurais. 
O Mercado Municipal (Figura 9) agregara uma feira que logo fora destacada 
como uma das mais importantes da província. 
 
 
 
 
37 
 
Figura 9 – Mercado Municipal. 
 
Fonte: SENNA, 1939. 
 
Dessa maneira, em 9 de julho de 1882 a vila de Ceará-Mirim fora elevada à 
categoria de cidade, por projeto apresentado a 25 de maio de 1882 pelos deputados 
Augusto Leopoldo Raposo da Câmara, Pedro Soares de Araújo, Antônio Carlos 
Fernandes Pimenta e Galdino Procópio Rêgo. 
Ceará-Mirim, então, revelou-se como locus de um desenvolvimento urbano 
atrelado a uma economia rural, e, as quase três décadas (1855- 1882) foram 
determinantes para as formas pelas quais se estabeleceram os elementos 
urbanísticos, e, conjuntamente ao uso desses espaços que constituíram a cidade. 
Todos esses objetos implantados e construídos no espaço sob determinado 
período e dentro de um processo de ações que modificam e redefinem suas funções 
são chamados de rugosidades do espaço. Santos (2012, p. 140) descreve que 
Chamemos e acumulam em todos os lugares, o que resta do processo de 
supressão, acumulação, superposição, com que as coisas substituem, 
paisagem de rugosidade ao que fica do passado como forma, espaço 
construído. 
 Em cada momento do processo social de reprodução do espaço são deixadas 
heranças visíveis por meio de suas formas ou arranjos. As rugosidades perceptíveis 
no espaço urbano atual da cidade de Ceará-Mirim representam produtos de divisões 
do trabalho, técnicas e tipos de capitais já passados, mas ainda cristalizados em 
suas formas. Afirmações que são importantes para destacarmos, visto que essas 
38 
 
formas carregam em si ideologias, valores e heranças que estão definindo e 
demarcando o espaço. 
Para que possamos entender como a dinâmica urbana de Ceará-Mirim se 
configura na atualidade é necessária uma caracterização de sua forma perante as 
transformações de suas funções ao longo do tempo. No próximo subcapítulo serão 
destacadas as delimitações do espaço urbano ceará-mirinense juntamente com as 
demandas de suas novas áreas de expansão. 
 
2.2 O espaço urbano atual: as novas áreas de expansão 
 
No tópico anterior enfatizou-se a construção da configuração territorial da 
cidade de Ceará-Mirim considerando os objetos artificiais implantados desde o 
período de sua fundação. Hoje, partes desses objetos se configuram como 
rugosidades no espaço-tempo na cidade. Nesse contexto, apesar do declínio da 
produção canavieira no município a concentração fundiária ainda se apresenta como 
definidores no uso e ocupação do solo na região. 
Os núcleos populacionais, além dos limites dasede municipal, se 
desenvolveram sob diversos processos e morfologias. Segundo Lopes (2008) 
algumas localidades foram ocupadas de maneira espontânea, outras apresentam 
traçado regular e outras, ainda, seguem o traçado de rodovias e da ferrovia (Figura 
10). Muitos desses distritos resultam de ocupações aos redores de engenhos, 
enquanto outras se desenvolveram próximas a terras favoráveis ao cultivo de 
lavouras, algumas mantendo-se ainda hoje suas bases produtivas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
39 
 
Figura 10 – Distribuição dos núcleos de ocupação em Ceará-Mirim. 
 
Fonte: IDEMA, 2006, editado por Lopes (2008). 
 
 A concentração fundiária, característica da economia açucareira implantada 
no vale do rio Ceará-mirim, implicou no limite da expansão urbana da sede do 
município no sentido norte, já que nessa região há terras pertencentes a Companhia 
Açucareira Vale do Ceará-Mirim. Segundo Araújo e Clementino (2006), diante do 
estoque de terras desocupadas, Ceará-Mirim apresenta uma grande concentração 
fundiária, a maior da Região Metropolitana de Natal, além de ser o município que 
detém o maior número de assentamentos rurais da região. 
Diante disso, com o desmonte da agroindústria, os vetores de crescimento da 
mancha urbana do município mostram que nas últimas décadas os sentidos sul, 
leste e oeste de crescimento da sede municipal apresentam eclosão considerável, 
justamente nos setores não ocupados pela indústria canavieira, demonstrados na 
figura a seguir: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
40 
 
Figura 11 – Vetores de crescimento urbano de Ceará-Mirim por décadas. 
 
Fonte: ARAÚJO; CLEMENTINO, 2006, editada pelo autor. 
 
A partir da figura acima é possível observar que os vetores de crescimento da 
sede municipal a partir da década de 1980 direcionam para o sentido sul, o que 
denota uma expansão ao longo da principal avenida da cidade, onde atualmente 
estão concentrados os principais estabelecimentos de comércio e de serviços, como 
resultado do desenvolvimento comercial (LOPES, 2008, p.34). Já na década de 
1990 com a implantação de conjuntos e loteamentos habitacionais, os setores leste 
e oeste surgem com principais áreas de expansão. 
Em 2001, a cidade continua crescendo nos sentidos leste e oeste, sendo que 
a mancha urbana já apresenta concentração considerável nas margens da BR-406. 
Em 2004, segue o ritmo de crescimento Leste-Oeste e agora com crescimento sul, 
no sentido da BR 406. 
Para que possamos entender como se configura atualmente o crescimento 
urbano da sede municipal, consideramos o plano diretor de Ceará-Mirim (2006) 
como marco na definição das macrozonas do município. Segundo o mesmo, o 
41 
 
município se divide entre as macrozonas urbana, rural e de expansão urbana. Neste 
trabalho nos deteremos àquelas que compreendem a cidade, no caso, a macro zona 
urbana e a macro zona de expansão urbana. 
A macro zona urbana é caracterizada pela 
área do território municipal ocupada, decorrente do processo de 
urbanização, com características propícias a diversos usos, com 
infraestrutura básica já instalada e sistema viário definido, que permite a 
intensificação controlada do uso do solo. (CEARÁ MIRIM, 2006, p. 20). 
Essa área descrita corresponde a área da sede do município ocupada desde 
o século XIX até o início dos anos 2000. Essa região apresenta uma infraestrutura 
consolidada com equipamentos e serviços urbanos organizados em setores 
administrativos, subdivididos em sete bairros como mostra a Figura a seguir. 
 
Figura 12 – Macro zona Urbana de Ceará-Mirim. 
 
Fonte: CEARÁ-MIRIM, 2006. 
 
Os bairros de Santa Águeda, Novos tempos, Centro, São Geraldo, Passa e 
Fica, Luís Lopes Varela e Planalto representam no plano diretor a delimitação da 
sede municipal de Ceará-Mirim. Todas as novas áreas urbanas são consideradas 
extensão dos bairros já estabelecidos, porém regulamentadas por outra macrozona 
segundo o plano diretor; a macro zona de expansão urbana. 
42 
 
A macro zona de expansão urbana é representada pelos novos arranjos 
urbanos da sede municipal, encontrados fora dos bairros delimitados pela 
macrozona urbana. A região de expansão é caracterizada como “não submetida a 
processo de urbanização”, com baixa densidade e com sistema viário projetado 
onde se permite a instalação de infraestrutura por programas e projetos voltados a 
essa finalidade. 
Desde os anos 2000 loteamentos e projetos habitacionais estão se instalando 
nessa região, a maioria desses se encontra às margens da BR 406. O mapa a 
seguir destaca a região citada como área de expansão dos anos 2000 até os dias 
atuais. 
Figura 13 – Expansão urbana de Ceará- Mirim: Vetores de crescimento por décadas. 
 
Fonte: LOPES, 2008. 
 
 
 Como o crescimento urbano das novas áreas de expansão junto a sede 
municipal são consequência do avanço imobiliário, nem sempre o poder público 
acompanha a demanda que exige serviços básicos e equipamentos urbanos 
destinados a população residente nesses locais. 
É imprescindível a noção de espaço e de seus elementos no planejamento 
urbano, principalmente no que diz respeito à oferta de equipamentos que favoreçam 
43 
 
um crescimento urbano com desenvolvimento local e qualidade de vida para a 
população. Em estudos recentes sobre a integração espacial das novas áreas aos 
serviços urbanos básicos constata-se a falta de abrangência dos principais 
equipamentos relacionados à saúde, educação, comércio e transporte. 
O descompasso entre o planejamento urbano e o processo de urbanização 
também é visível nas áreas de crescimento e expansão em Ceará-Mirim. Ao 
elaborar estudos referentes a abrangência dos serviços urbanos na cidade Siqueira 
Neto (2011) considerou tamanho, capacidade do equipamento urbano, faixa etária 
do usuário e densidade populacional para gerar buffers a partir de ferramentas de 
Sistema de Informação Geográfica que mostrem a distância desses equipamentos 
urbanos em relação as novas áreas. 
Considerando serviços básicos como comércio, escolas de ensino 
Fundamental e Médio postos de saúde e transporte, percebeu-se que apesar do 
surgimento de novos loteamentos e projetos de habitação, os serviços ainda se 
concentram na sede da cidade como observado nos produtos do estudo de Siqueira 
Neto (2011). 
Os loteamentos analisados compreendem essa nova área de expansão 
urbana ceará-mirinense às margens da BR 406. Identificou-se até então oito 
empreendimentos relacionados ao programa habitacional Minha Casa Minha Vida 
do Governo Federal, são eles: Novo Horizonte, São José, Condomínio Residencial 
Adriano, Natureza 1, Natureza 2, Maninho Barreto, Aloysio Franco e Guararapes, 
destacados na figura a seguir: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
44 
 
Figura 14 – Abrangência de equipamentos de comércio 
 
Fonte: SIQUEIRA NETO, 2011. 
 
 
Figura 15 – Abrangência de escolas de ensino fundamental. 
 
Fonte: SIQUEIRA NETO, 2011. 
45 
 
Figura 16 – Abrangência de escolas de ensino Médio. 
 
Fonte: SIQUEIRA NETO, 2011. 
 
 
 
Figura 17 – Abrangência de linhas de transporte 
 
Fonte SIQUEIRA NETO, 2011. 
 
 
46 
 
Figura 18 – Abrangência de postos de saúde 
 
Fonte: SIQUEIRA NETO, 2011. 
 
O estudo de Siqueira Neto (2011) mostra que o crescimento urbano 
ocasionado pela especulação imobiliária apresenta também contradições dialéticas 
de produção desigual em todas as suas esferas de reprodução do espaço. Foi 
considerado no estudo acima equipamentos de serviços urbanos básicos e seus 
respectivos raios de abrangência que são 
referidos como buffer de abrangência, serve como um indicador, uma 
referência à distância máxima que o usuário deveria trilhar para obter 
determinado serviço urbano, levando em consideração um tempo de 
deslocamento satisfatório (SIQUEIRA NETO, 2011, p. 48). 
 Percebe-se então que principalmente os equipamentos relacionados à Saúde, 
comércio (supermercados e lojas especializadas) e transportenão abrangem de 
maneira satisfatória os novos loteamentos localizados na macrozona de expansão 
urbana da cidade. Considerou-se também nessa avaliação a inexistência de um de 
transporte público interbairros regulamentados na cidade, o que resulta na 
concentração de serviços nas áreas com infraestrutura consolidada. 
Destaca-se então a importância do planejamento urbano como uma 
ferramenta para intervenção na localização de equipamentos de serviços urbanos, 
47 
 
visto que estes mantêm relação com aspectos físico-espaciais e sociais. Nesse 
ponto, a disponibilidades e acesso aos equipamentos urbanos torna-se essencial 
para a diminuição de fenômenos como a segregação residencial. 
No que se refere a segregação residencial, segundo Sabatine (2006) o 
mercado imobiliário e as racionalidades que nele se produzem são o centro de 
gravidade principal da evolução da segregação residencial nas cidades e no nosso 
continente. Diante disso, Castells (1981, p. 203-204) afirma que a distribuição das 
residências no espaço “produz sua diferenciação espacial e há uma estratificação 
urbana correspondente a uma expressão espacial, ocorre a segregação urbana. ” 
Essas novas áreas urbanas seguem o modelo centro-periferia de 
urbanização, característico dos países subdesenvolvidos, onde a concentração dos 
serviços urbanos é estruturada no centro da cidade, enquanto que a periferia se 
urbaniza desprovida de planejamento e subequipada. 
Portanto, a forma e o uso do espaço se configuram como elementos 
fundamentais para o entendimento da dinâmica urbana. No próximo capítulo 
analisaremos os principais usos do espaço urbano ceará-mirinense e suas 
implicações sociais. 
 
 
48 
 
3 DINÂMICA NO CONTEXTO SOCIOECONOMICO: ASPECTOS LOCAIS 
 
O espaço da cidade é concebido entre as relações políticas, econômicas, 
sociais e culturais. E nesse espaço percebemos a reprodução das relações de 
trabalho, de aplicação e utilização da técnica e do sistema de relações sociais, que 
por sua vez, requer uma infraestrutura necessária ao atendimento das demandas 
locais e de sua área de influência. 
O IBGE a partir do estudo Regiões de Influencias das Cidades (IBGE, 2007) 
define a hierarquia dos centros urbanos e suas regiões de influência associadas aos 
aspectos de gestão e da dotação de equipamentos e serviços. De acordo com esse 
estudo, Ceará-Mirim é inserido na rede urbana brasileira como centro local 
apresentando-se como cidade que possui uma centralidade e atuação que não 
extrapolam os limites do seu município, servindo apenas aos seus habitantes. 
Todavia, o papel desempenhado por Ceará-Mirim na rede urbana se 
transformou ao longo das décadas. Observa-se que em estudo do IBGE sobre 
Regiões de Influências das Cidades (CLEMENTINO, 1995), na década de 1970, a 
cidade estava classificada como centro de zona, cuja atuação também é restrita à 
sua área imediata, contudo, exercia funções de gestão elementares. 
Isso demonstra uma perda de poder de influência na hierarquia urbana 
regional, já que a posição nessa rede identifica o grau de importância exercido pela 
cidade na tomada de decisões e comando em áreas de influência. A seguir o 
organograma (Figura 19) mostra a relação hierárquica entre as categorias da rede 
urbana. 
 
 
 
 
 
 
 
49 
 
Figura 19 – Organograma: Hierarquia Dos Centros Urbanos. 
 
Fonte: elaborado pelo autor, por meio de dados do IBGE, 2007. 
 
Tendo em vista a mudança de posição frente a rede urbana brasileira nas 
últimas décadas, para entender a dinâmica no contexto urbano de Ceará-Mirim é 
necessário observar os meios reprodutores do capital que definem força de trabalho 
local e suas consequências sociais. 
Esses meios são representados principalmente pelos setores de serviços 
(sejam eles públicos ou privados), pelo comércio, indústria e agropecuária, enquanto 
os indicadores de qualidade de vida e desenvolvimento humano são considerados 
como análise da realidade social. 
Para iniciar essa análise consideramos primeiramente os fatores que 
influenciaram na caracterização desse perfil atual em Ceará-Mirim, no caso, a crise 
do setor sucroalcooleiro, que de modo contundente influenciou na estrutura 
socioeconômica da cidade, fazendo com que ela assumisse novas funções frente ao 
desenvolvimento do capital. 
 
 
Metrópole 
Capital 
Regional 
 
Centro Sub-
Regional 
 
Centro de 
Zona 
Centro 
Local 
 
50 
 
3.1 O setor sucroalcooleiro e a agropecuária 
 
O setor sucroalcooleiro sempre se destacou na economia da região, no 
entanto, o mesmo enfrentou diversas crises ao longo do século XX e atualmente 
vive o desmonte de sua estrutura fomentada por fatores conjunturais que se 
agravam ao longo do tempo. 
Como a cana-de-açúcar é uma cultura agrícola temporária, o impacto social 
da crise no setor aumenta, uma vez que, boa parte dos empregos também 
dependem dos períodos de safra. Para que possamos entender os impactos sociais 
e econômicos desse setor na cidade devemos compreender o declínio desde seus 
primeiros sinais ainda no século passado. 
No início do século XX a baixa do preço do açúcar fez retrair a vida 
econômica da cidade de Ceará-Mirim, que depende do comércio açucareiro. Essa 
pequena retração caracterizou o início do declínio da produção dos engenhos 
fomentada ainda por questões que impediam o desenvolvimento desta atividade no 
Vale, entre elas, o regime de cheias do rio Ceará-Mirim. 
Outro fator decisivo para o declínio dos engenhos foi a utilização de técnicas 
rudimentares no cultivo e na produção de açúcar nos engenhos. De acordo com 
Bertrand (2010, p.89): 
A cultura do solo entre nós, infelizmente, ainda obedece a processos 
rudimentares obsoletos, que se remontam aos tempos primitivos. Com que 
tristeza, ouvimos nós, não há muito, dizer um especialista estrangeiro que 
os trabalhos da agricultura nesta terra eram ainda feitas como nos tempos 
do pai Adão! 
Nesse contexto, os grandes proprietários de engenho passaram a se 
apropriar de maiores parcelas de terra, em razão da crise do semiárido estimular a 
ocorrência do êxodo rural. Diante das dificuldades, os pequenos proprietários de 
terra iniciaram um processo migratório para o setor urbano, como resultado, muitos 
se transferiram para Natal, dedicando-se a diversas atividades como comenta 
Castro (1992, p. 30): 
A maior parte dos senhores de engenho, que se mantiveram como tal, 
faleceu ou não encontrou em seus descendentes quem se motivasse para 
prosseguir na atividade, pois alguns desses também já se haviam 
estabelecido como profissionais liberais na capital do Estado. 
 
 
51 
 
Segundo Morais (2005), não dispondo de recursos para modernizarem seus 
equipamentos, os senhores de engenho passaram a meros fornecedores de cana-
de-açúcar e a agroindústria foi se consolidando no mercado local. A reestruturação 
produtiva possibilitou o advento dessas usinas, substituindo o engenho e projetando-
as como principal unidade econômica da zona canavieira. 
O sistema de produção das usinas é semelhante ao dos engenhos apenas no 
fato da usina reunir os setores agrícola e industrial numa só empresa, mantendo, 
assim, o controle do cultivo da cana e da produção e comercialização do açúcar. 
Essa fusão, segundo Castro (1992) viabilizou a consolidação do capital industrial e 
financeiro no campo. 
A usina mudou as relações sociais e econômicas vigentes no período de 
apogeu dos engenhos, Melo (1975) explica que a realidade econômico-social 
representada pelas usinas, espelha uma nova maneira da relação capital-trabalho 
ou entre produtores e subordinados. O desaparecimento das áreas de aproximação 
entre esses (compadrio, o convívio entre os filhos dos senhores de engenho, 
catolicismo patriarcal) fizessem com que fossem acentuadas as distâncias e a 
estratificação social se tornasse mais rígida e opressiva. Nesse sentido, (MELO, 
1975, p.48) complementa que: 
Sem ligação com

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