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REVISÃO: SÍNTESE DE CONTEÚDOS E CONCEITOS FUNDAMENTAIS HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NA INFÂNCIA No período medieval a criança era valorizada apenas sob o ponto de vista de que ela existia para a conservação dos bens e continuidade do agregado familiar, tendo que trabalhar desde cedo, aprender os afazeres domésticos e valores humanos mediante a aquisição de conhecimento e experiências práticas. O mundo das crianças concentrava-se em torno das mulheres no ambiente doméstico. Não havia distinção entre crianças e adultos, usavam os mesmos tipos de trajes e de linguagem, não existia um sentimento em especial aos mais novos, sendo esses a todo momento forçados a ingressar o mais rápido possível na lógica de vida adulta. As pessoas eram instruídas da mesma forma, independentemente da faixa etária, frequentavam a mesma sala de aula e recebiam o mesmo ensinamento. O conceito de criança passa a se modificar com a Revolução Industrial, com o Iluminismo e a constituição de Estados Laicos, porém somente as crianças da elite passaram a receber cuidados e atenção em função da idade. Entre os séculos XV e XVI surgiram modelos educacionais para superar os desafios estabelecidos pela sociedade europeia – sociedade essa cujo foco incidia sobre o desenvolvimento industrial. Tais modelos, relacionados aos progressos científicos, comerciais e artísticos impulsionados pelo Renascimento, reforçavam concepções acerca da criança e de como ela deveria ser educada. Nesse contexto a relação com a infância começa a mudar, evocando preocupações sobre formas de educar as crianças. Ao longo do século XIX, a criança passou a receber mais atenção dos adultos em relação a procedimentos educativos, sendo entendida como sujeito de necessidades, objeto de expectativas e cuidados de preparação para o ingresso e sucesso no mundo dos adultos, o que tornou a escola instrumento para tal. No entanto a escola não era uma instituição acessível a muitos, pois o Estado priorizava a formação da elite. A criança pobre, nesse contexto, era merecedora de piedade e, no Brasil, o atendimento às crianças de 0 a 6 anos se deu no final do século XIX. Na zona rural, onde vivia a maior parte da população, as famílias de fazendeiros assumiam o cuidado das crianças abandonadas, geralmente fruto da exploração sexual da mulher negra e índia pelo senhor branco. Na área urbana, bebês abandonados, por vezes filhos de moças pertencentes a famílias de prestígio social, eram recolhidos na roda dos expostos. Essa situação modifica-se com a migração para a zona urbana; as cidades crescem, observam-se iniciativas isoladas de proteção à infância a fim de combater as altas taxas de mortalidade infantil, criando entidades de amparo. Nesse contexto, a abolição da escravatura trouxe problemas, pois qual seria o destino dos filhos de escravos que, na maioria das vezes, eram abandonados? Isso implicaria a criação de creches, asilos e internatos destinados a cuidar das crianças pobres. Nesse sentido, a Educação Infantil evidencia em seu histórico a necessidade como propulsora de seu surgimento, a saber, atender crianças que muitas vezes eram exploradas ou abandonadas, e não o direito universal à educação. No século XX, a educação na infância começa a evocar debates em torno do cuidado, preservação e preparação da infância. Naquele período começou a ser pensada uma nova forma de educar a criança pequena, pois até então predominavam modelos europeus. A partir dos princípios da Escola Nova, na qual a criança era tida como o centro do processo e o foco no aprender fazendo, foram debatidas as ideias de instituições de atendimento à infância. Os debates sobre as instituições de Educação Infantil foram polêmicos, pois existiam intelectuais da época que não concordavam com a implantação dessas instituições, relacionando-as diretamente aos asilos franceses e demais instituições assistencialistas. As mudanças sociais e familiares, principalmente a partir da segunda metade do século XX, modificaram e transformaram a relação entre pais e filhos, o que, em consequência, causou impacto na educação das crianças pequenas. Houve uma transformação significativa quanto à criação e educação dos filhos entre os anos 1930 e 1980. Como eixos principais dessa transformação, poderíamos apontar o fato de a educação da criança passar de um sentido “moral”, em que a “preocupação central eram os bons comportamentos”, para um “psicológico”, centrando-se na “saúde emocional”; do apoio à sabedoria e à tradição chegou-se à valorização exclusiva do conhecimento técnico-científico; de um conjunto de prescrições claras e definidas a priori em função do comportamento desejado para a criança, de padronização de atitudes paternais. As teorias psicanalíticas e do desenvolvimento infantil começam a surgir e a influenciar a educação escolar da infância. A Psicanálise fortalecia as intensas discussões existentes em torno da maior ou menor permissividade que deveria existir na educação das crianças, trazendo o debate de temas como frustração, agressão e ansiedade. A atenção de professores se voltava às necessidades afetivas da criança e ao papel que o professor deveria assumir do ponto de vista clínico e educacional. Concomitantemente, houve a descoberta, durante os anos 1950, dos trabalhos teóricos de Montessori, Piaget e Vygotsky, sendo difícil determinar se tais achados foram causa ou consequência do ressurgimento da educação pré-escolar. Crescia também o interesse de estudiosos da aprendizagem pelo conhecimento dos aspectos cognitivos do desenvolvimento, pela evolução da linguagem e pela interferência dos primeiros anos de vida da criança no seu desempenho acadêmico posterior – a preocupação com os métodos de ensino reaparecia. Nessa época, as mudanças nas relações de trabalho vinham em função das transformações sociais e da produção capitalista. Os operários exigiam condições menos precárias no trabalho, jornada de oito horas diárias, salário, entre outros. Em razão das pressões desses e dos sindicatos, alguns empresários começaram a dar benefícios aos seus empregados, sendo um deles a creche no interior da fábrica. A recomendação da criação de creches junto às indústrias ocorria com frequência nos congressos que abordavam a assistência à infância. No aspecto historiográfico, a literatura apresenta diferentes fases no atendimento à criança pequena. A fase da filantropia aconteceu durante o período colonial e caracterizou-se por atender crianças órfãs e abandonadas. A fase higienista, que ocorreu entre o século XIX e início do século XX, caracterizou-se pela ampliação do atendimento, surgindo os jardins de infância para a classe mais abastada e instituições beneficentes, ou seja, creches para as mães trabalhadoras. Na tentativa de evitar que o critério socioeconômico determinasse diferentes objetivos para as duas instituições, alguns educadores, especialmente na década de 1920, sugeriram a idade como critério para agrupar as crianças no maternal e no jardim, colaborando com algumas alterações na denominação das instituições de Educação Infantil. As primeiras preocupações dessas instituições concerniam à alimentação, aos cuidados de higiene e à segurança física, sendo pouco valorizado o trabalho de desenvolvimento intelectual e afetivo com as crianças, o que evidencia, mais uma vez, a secundarização do aspecto pedagógico. A diferença entre creche e pré-escola, nos anos 1950, encontrava-se em suas origens e desenvolvimento. Enquanto as crianças pobres eram atendidas em creches com propostas que partiam de uma ideia de carência e deficiência, as crianças mais ricas eram colocadas em ambientes estimuladores e consideradas como tendo um processo dinâmico de viver e desenvolver-se. Orientação de estudo: leiam os textos-base atentamente, observando marcos de datas e acontecimentos que se destacam. Assistam também aos vídeos e dediquem-se àleitura e ao estudo dos materiais complementares, como a seção “aprofundando o tema”. EDUCAÇÃO INFANTIL BRASILEIRA: ORDENAMENTOS LEGAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS Conforme as leituras realizadas, é possível perceber que o surgimento da creche está associado ao trabalho feminino fora do âmbito doméstico, sendo visto pejorativamente em alguns momentos como promovedor da ausência materna, principalmente quando o foco recai sobre o papel da mulher no cuidado da criança. No entanto, o direito da criança de atendimento em creches passou a ser garantido a partir de 1988, com a promulgação da Constituição Federal brasileira, não restringindo o direito à assistência unicamente à mulher, como observado em suas origens, quando as instituições de Educação Infantil estavam mais próximas às mães do que aos filhos. Afinal, não é apenas a inserção da mulher no mercado de trabalho que explica a busca por creches e pré-escolas, mas também uma movimentação em torno da infância, revelando a preocupação quanto às suas necessidades educativas e de socialização, portanto, vendo-a sob uma nova ótica. A educação e o cuidado da criança pequena, principalmente no período pós-Segunda Guerra Mundial, passam a ocorrer também fora de casa, ou seja, em equipamentos coletivos como creches, escolas maternais ou jardins de infância. Essa mudança no padrão de criação das crianças pequenas é decorrente das alterações observadas na concepção de “criança pequena”, da configuração de família e dos papéis de gênero na sociedade, além das transformações ocorridas no mundo produtivo e das modificações nas relações de gênero. É nessa ótica que se dá a constituição do cuidado e da educação das crianças dentro das políticas públicas, ou seja, a família e o Estado passam a dividir a responsabilidade quanto ao bem-estar infantil, desempenhando ações complementares. O movimento de luta por creches cresceu e se desenvolveu durante os anos 1970 e ao longo da década de 1980, iniciado em São Paulo e, progressivamente, em outros estados brasileiros. Surgiram também movimentos em torno da defesa dos direitos da criança na Constituinte de 1988, tal como abordaremos a seguir. Esses movimentos são resultado da crescente pressão das mulheres trabalhadoras e das orientações feministas, muitas vezes ligadas às organizações partidárias de esquerda, questionando os papéis dos homens e das mulheres na sociedade e, também, o lugar da infância. Desde a Constituição de 1988, definiu-se legalmente que os pais, a sociedade e o poder público devem respeitar e garantir os direitos das crianças. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-las a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência e opressão. Dessas definições decorre que creches e pré-escolas são direitos tanto das crianças quanto de seus pais, sendo instituições de caráter educacional, e não simplesmente assistencial. O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), de 1998, reúne objetivos, conteúdos e orientações didáticas, reforçando o caráter educacional e institucional da Educação Infantil. Além de citar nominalmente o cuidar e o educar como funções da Educação Infantil, também explicita os dois conceitos: educar significa propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento de capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, sendo que o acesso, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplia a realidade social e cultural. O cuidar, por sua vez, significa valorizar e ajudar a desenvolver capacidades. O cuidado é um ato em relação ao outro e a si próprio que possui dimensão expressiva e implica procedimentos (RCNEI, 1998, p. 23). A Lei de Diretrizes e Bases (LDB), de 1996, reconhece a Educação Infantil como uma etapa da educação básica, institucionalizando seu caráter educacional em oposição a um caráter assistencialista, declarando-a como primeira etapa e constituída por dois níveis, quais sejam, creche e pré‐escola, tendo como única finalidade o desenvolvimento integral da criança de 0 a 6 anos, com o objetivo de eliminar a dicotomia “a creche cuida” e a “pré‐escola educa”. A Política Nacional para a Educação Infantil (PNEI), de 2006, assegura o direito das crianças brasileiras à Educação Infantil, ou seja, creche e pré‐escola, contemplando a sua formação como indivíduos integrais e plenos. O documento sustenta que a mudança nas concepções de criança contribuiu para a delimitação da função dessa etapa educacional, isto é, cuidar e educar. Destaca que uma das dificuldades dessa etapa educacional para o cumprimento de sua função diz respeito ao fato de a creche estar por muito tempo vinculada ao assistencialismo e, portanto, destinada às crianças de classes econômicas menos favorecidas, as quais deveriam ser designados cuidados relacionados à alimentação e higiene. Para a pré‐escola, por sua vez, a função era educar, entretanto, o foco vinculava‐se à antecipação do Ensino Fundamental. A PNEI ressalta que a mudança de perspectiva acontece com a promulgação da Lei nº 9.394/96, que passa a considerar a função de educar intrínseca ao cuidado e estabelece parâmetros para a formação do profissional que atuará com as crianças pequenas (isto é, aquelas de 0 a 6 anos). Os Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil, de 2006, englobam o cuidar/educar como função precípua da primeira etapa da educação básica e, de forma mais específica, como papel do professor. A garantia do cuidado e educação de forma indissociável passa a ser um indicador de qualidade para a Educação Infantil. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI), de 2009, orientam a organização e o desenvolvimento curricular das instituições, propondo a organização por eixos de interações e brincadeira. Traz como marco conceitual a indissociabilidade entre o cuidar e o educar. Sobre a identidade da Educação Infantil, o documento concebe a creche e a pré‐escola como instituições educacionais destinadas ao atendimento de crianças de 0 a 5 anos e 11 meses de idade, com profissionais formados, conforme prevê a LBD nº 9.394/94, tendo por unção o cuidar e o educar de modo integrado. A Constituição Federal, no que estabelece acerca do cuidado e da educação de crianças pequenas, é ratificada por leis posteriores como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a LDB da Educação Nacional (LDB/Lei nº 9.394/96), o RCNEI, o PNEI, os Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil, as DCNEI e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A BNCC[1], de 2017, consolida na Educação Infantil a concepção que vincula educar e cuidar, entendendo o cuidado como algo indissociável do processo educativo. A BNCC valida e reforça esse conceito de que as ações de cuidado estão plenamente integradas com as ações de educar, já presentes nas DCNEI. https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1031134/estatuto-da-crian%C3%83%C2%A7a-e-do-adolescente-lei-8069-90 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1031134/estatuto-da-crian%C3%83%C2%A7a-e-do-adolescente-lei-8069-90 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1031134/estatuto-da-crian%C3%83%C2%A7a-e-do-adolescente-lei-8069-90 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1035083/lei-de-diretrizes-e-bases-lei-9394-96 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1035083/lei-de-diretrizes-e-bases-lei-9394-96 https://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/rcnei_vol1.pdf https://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/rcnei_vol1.pdf https://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Educinf/eduinfparqualvol1.pdfhttps://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Educinf/eduinfparqualvol1.pdf https://ndi.ufsc.br/files/2012/02/Diretrizes-Curriculares-para-a-E-I.pdf https://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/ https://ava.univesp.br/bbcswebdav/courses/fundamentos-da-educacao-infantil-i-sfi001-/wiki_content/texto-base-revisao.html#_ftn1 Orientação de estudo: atentem-se aos nomes corretos das legislações e às datas em que foram promulgadas ou consolidadas. Prestem atenção aos conceitos-chave de cada uma. O CUIDAR E O EDUCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL O ato de cuidar e educar crianças pequenas, além de ser direito constitucional, tem sido reconhecido como binômio fundamental ao bom desenvolvimento da estrutura neurológica humana, uma vez que uma rede de conexões neuronais (mais de 90% das sinapses) se forma nos primeiros anos de vida. De acordo com os autores estudados por vocês na Semana 3, quanto mais a criança for estimulada em processos que envolvam cuidados e educação, mais ligações entre os neurônios ela terá e, consequentemente, maiores serão as chances relacionadas a potencialidades e condições de desenvolvimento e aprendizagem. Nesse sentido, as políticas para Educação Infantil no Brasil definem como funções da creche e da pré-escola cuidar e educar. No entanto, a efetivação dessas funções depende de várias condições, dentre elas, as concepções que orientam as práticas dos trabalhadores no dia a dia das instituições. É preciso ter claro o que é colocado por diretrizes curriculares e combater preconceitos em relação ao cuidar na Educação Infantil, que é tido muitas vezes como inferior ao educar, como sendo função de quem não possui formação para exercer a docência e metodologias de antecipação da escolaridade. A Educação Infantil decididamente não pode ser encarada pela ótica do assistencialismo, isto é, a ideia de um local para que crianças permaneçam quando suas famílias não podem estar com elas, tampouco pelo anseio de prepará-las para o Ensino Fundamental. Ao se compreender o educar indissociável do cuidar há centralidade na importância do vínculo de crianças entre si, bem como entre a criança e o adulto. A dinâmica que se estabelece na rotina diária das instituições de Educação Infantil requer, mediante o cuidado, que a interação e a brincadeira favoreçam o estabelecimento de vínculos afetivos significativos e essenciais ao bem-estar infantil, promovendo aprendizagens orientadas e de forma integrada. O cuidar, como expressão do educar, implica todas as ações e situações na instituição de Educação Infantil, tais como banho, sono, alimentação, troca de fraldas, brincadeiras, atividades orais, textuais, plásticas, expressão corporal etc. Na prática, trata-se de aproveitar cada oportunidade para proporcionar às crianças seu desenvolvimento integral. Outro ponto relevante no material estudado na disciplina é o respeito à diferença, evocando a reflexão acerca do quanto o cuidar e o educar devem assumir a diferença como algo a ser celebrado, reafirmando a ideia de que a desigualdade deve ser eliminada. É preciso atentar-se ao discurso de “aceitação” e tolerância da diversidade que, muitas vezes, sob o pretexto da necessidade de cada criança construir sua percepção da diferença existente entre uma e outra, em um processo que busca a formação da “identidade” da criança, mantém intacto o que forja as relações desiguais e hierárquicas entre crianças brancas e negras, por exemplo. Orientação de estudo: leiam, estudem e observem que, em todos os textos, as ações de cuidar e educar são discutidas. Sendo assim, tenham em mente as bases teóricas que sustentam essas discussões. O BRINQUEDO E A BRINCADEIRA O brinquedo e a brincadeira são contemplados e defendidos no material da Semana 4 como elementos inerentes e característicos das culturas próprias da infância. As crianças, assim como os brinquedos e brincadeiras, sempre estiveram presentes na sociedade, mas aquelas nem sempre foram consideradas sujeitos particulares e com características próprias. A infância, como representada hoje, ficou velada ou invisível por muitos séculos de nossa história. As crianças encontravam-se fisicamente presentes, mas ausentes no que diz respeito à ideia de uma categoria social particular, com especificidades e direitos próprios. Até o Renascimento não existia um sentimento de infância, as crianças eram consideradas como apêndices do universo feminino. Adultos e crianças compartilhavam os mesmos espaços e atividades. Não havia uma concepção específica além das diferenças biológicas. A institucionalização da infância ocorreu com o início da modernidade e foi realizada, como afirma Manuel Jacinto Sarmento, por meio da conjugação de vários fatores. Um desses, a ser destacado, refere-se à criação de instâncias públicas de socialização, seguido pela transformação do modelo de família para um formato nuclear, da formação de um conjunto de saberes normativos e, completando, a administração simbólica da infância por meio de regras e instituições. Todos esses fatores se desenvolveram e passaram por grandes transformações. A escola, que não nascera inicialmente para as crianças, tornou-se espaço privilegiado de sociabilidade infantil e de preparação para o novo mundo que surgia. A família foi perpassada por mudanças profundas que alteraram o lugar da criança, retirando-a da periferia e levando-a para o centro de suas preocupações e daquelas concernentes à Sociologia da Infância, com o advento dos estudos sobre as culturas próprias das crianças. A questão fundamental trazida por Sarmento no estudo das culturas da infância é a interpretação da sua autonomia em relação aos adultos. As crianças realizam processos de significação e estabelecem modos de monitorização da ação que são específicos e genuínos. O “mundo da fantasia” das crianças constitui o modo de construção de significado pelas crianças. Essas formas culturais nascem e se desenvolvem em modos específicos de comunicação intrageracional e intergeracional. Sem prejuízo da análise dos fatores psicológicos e das dimensões cognitivas e desenvolvimentais que presidem a formação do pensamento das crianças, as culturas da infância possuem, primeiramente, dimensões relacionais, constituem-se nas interações de pares e das crianças com os adultos, estruturando-se nessas relações formas e conteúdos representacionais distintos. As culturas da infância exprimem a cultura social em que se inserem, mas fazem-no de modo distinto das culturas adultas, ao mesmo tempo em que veiculam formas especificamente infantis de inteligibilidade, representação e simbolização do mundo. Há uma “universalidade” das culturas infantis que ultrapassa consideravelmente os limites da inserção cultural local de cada criança. Orientações de estudo: leiam os textos atentamente, observando suas bases teóricas e os estudiosos mobilizados e citados pelos autores dos artigos. Por exemplo, no texto “A brincadeira e suas implicações nos processos de aprendizagem e de desenvolvimento” os autores citam inúmeros pesquisadores para fundamentar seus argumentos. Prestem atenção a esses autores. As bases da Teoria Histórico-Cultural estão presentes em mais de um texto, estudem-nas. A EDUCAÇÃO INFANTIL E A RELAÇÃO COM A FAMÍLIA E A COMUNIDADE A relação entre a instituição de Educação Infantil e a família precisa ser construída e aprimorada com estratégias de aproximação em prol dos direitos e do bem-estar das crianças. Tais estratégias devem considerar as transformações que esses entes sociais sofreram ao longo do tempo. Ocorridas nas sociedades industrializadas, principalmente a partir de meados do século XX, essas transformações provocaram alterações na estrutura e na dinâmica das relações familiares, o que nos leva a tentar compreender a família como um sistema complexo, influenciado por múltiplos fatores e eventos internos e externos,que sofre variações em função de contextos sócio-histórico-culturais. Vários fatores na atualidade contribuíram para influir na organização e configuração das famílias brasileiras atuais, a exemplo de eventos científicos no século XX, como a produção da pílula anticoncepcional, o desenvolvimento da fertilização in vitro, os exames de DNA para a paternidade duvidosa; marcos legais como a dissolução do casamento pelo divórcio e a união entre pessoas do mesmo sexo; discussões impulsionadas pelos movimentos sociais, como o feminista e o LGBTQ+; a entrada da mulher no mercado de trabalho – todos esses fatores, que constituem a realidade de muitas crianças, devem ser considerados ao se pensar em propostas pedagógicas para que ninguém se sinta constrangido, segregado, discriminado ou humilhado. Nesse cenário, cabe ao professor ser sensível a uma configuração de família em rede que proponha outro olhar sobre a mesma, contrariando a ideia de organização em núcleo. O conceito de família em rede perpassa o ideário de família como existência da possibilidade de buscar outras definições que, não se antecipando à sua própria realidade, permitam pensar como a família se constrói, como constrói a noção de si mesma; sendo uma construção, como se dá na cultura e, consequentemente, pelos sujeitos envolvidos em trama de relações. Nesse sentido, algo que não deve ser desconsiderado são as discussões sobre gênero dentro de uma cultura que celebra a diversidade como direito humano. Afinal, a inscrição do gênero nos corpos é um processo decorrente do contexto de determinada cultura, sendo elemento constitutivo de relações sociais com base nas diferenças que podem ser ressignificadas e implicar certa subordinação de um gênero a outro porque nascemos biologicamente macho ou fêmea, mas nos tornamos masculinos ou femininos nas relações sociais que ocorrem no interior de redes de poder. A família é considerada a primeira agência educacional do ser humano e é responsável, principalmente, pela forma com que o sujeito se relaciona com o mundo, a partir de sua localização na estrutura social. Existem muitas formas de entender o conceito de família, sendo que suas definições tradicionais se baseiam em diferentes critérios, como restrições jurídicas e legais, aproximações genealógicas, perspectiva biológica de laços sanguíneos e compartilhamento de uma casa com crianças (PETZOLD apud OLIVEIRA; MARINHO ARAUJO, 2010). A escola, por sua vez, é a instituição responsável pela socialização do saber sistematizado, ou seja, do conhecimento elaborado e da cultura erudita. De acordo com Saviani (2005), a escola se relaciona com a ciência, não com o senso comum, e existe para proporcionar a aquisição de instrumentos que possibilitam o acesso ao saber elaborado (ciência) e aos rudimentos (bases) desse saber. A contribuição da escola para o desenvolvimento do sujeito é específica à aquisição do saber culturalmente organizado e às áreas distintas de conhecimento. No que diz respeito à família, “um dos seus papéis principais é a socialização da criança, isto é, sua inclusão no mundo cultural mediante o ensino da língua materna, dos símbolos e regras de convivência em grupo, englobando a educação geral e parte da formal, em colaboração com a escola” (POLONIA; DESSEN, 2005, p. 304 apud OLIVEIRA; MARINHO ARAUJO, 2010). Escola e família têm suas especificidades e complementariedades. Embora não se possa supô- las como instituições completamente independentes, não se pode perder de vista suas fronteiras institucionais, ou seja, o domínio do objeto que as sustenta como instituições. Esses dois sistemas têm objetivos distintos, mas que se interpenetram, uma vez que “compartilham a tarefa de preparar as crianças e os jovens para a inserção crítica, participativa e produtiva na sociedade” (REALI; TANCREDI, 2005, p. 240 apud OLIVEIRA; MARINHO ARAUJO, 2010). A divergência entre escola e família está na tarefa de ensinar, sendo que a primeira tem a função de favorecer a aprendizagem dos conhecimentos construídos socialmente em determinado momento histórico, de ampliar as possibilidades de convivência social e, ainda, legitimar uma ordem social, enquanto a segunda tem a tarefa de promover a socialização das crianças, incluindo o aprendizado de padrões comportamentais, atitudes e valores aceitos pela sociedade. Orientações de estudo: prestem atenção ao conceito de criança trazido pelos textos, à questão da Pedagogia da Infância, às competências das famílias e à relação escola-pais-sociedade. A ARTICULAÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL COM O ENSINO FUNDAMENTAL A importância da articulação entre cuidar e educar no cotidiano da Educação Infantil é tratada no Parecer nº 022/1998 sobre as DCNEI. De acordo com o Parecer, as propostas pedagógicas destinadas às instituições de Educação Infantil devem promover, em suas práticas de educação e cuidados, a integração entre os aspectos físicos, emocionais, afetivos, cognitivo/linguísticos e sociais da criança, entendendo-a como um ser total, completo e indivisível (BRASIL, 1998, p. 12). Tal proposição é reiterada na Resolução nº 01/1999, que propõe as DCNEI. Já os Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil definem, como finalidade da Educação Infantil, o “desenvolvimento integral da criança até 6 anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade” (BRASIL, 2006, p. 32), o que evidencia a necessidade de se tomar a criança como um todo para promover seu desenvolvimento e implica o compartilhamento da responsabilidade familiar, comunitária e do poder público. Nas DCNEI (2010) e no Parecer nº 7/2010, que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, o cuidado e a educação são destacados como fundamentais para a formação humana, pois “educar exige cuidar” e o cuidado refere-se ao “acolhimento das crianças, jovens e adultos”. De acordo com essas diretrizes, é importante assegurar “a educação em sua integralidade, entendendo o cuidado como algo indissociável ao processo educativo” (BRASIL, 2010, p. 19). A indicação é de que “cuidar e educar inicia-se na Educação Infantil; são ações destinadas a crianças a partir de zero ano, que devem ser estendidas ao Ensino Fundamental, Médio e posteriores” (PARECER, 2010, p. 12). Com o entendimento da importância da articulação entre as duas primeiras etapas da educação básica, ainda mais com a inserção das crianças de 6 anos de idade no Ensino Fundamental, podemos afirmar, com o respaldo de Campos et al. (2011), que as secretarias de educação, as escolas e os cursos de formação de professores precisam estar voltados à Pedagogia da Infância, centrada na criança dessa faixa etária, propiciando a continuidade entre um currículo e outro, considerando as especificidades das experiências vividas pelas crianças, com atenção nas diversas formas de organização que possam ser assumidas durante a infância. Orientações de estudo: leiam todos os textos atentamente, observando os conceitos, definições, leis e decretos por eles trazidos. Considerem os textos-base “Contribuições da Pedagogia da Infância par a articulação entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental” e “BNCC: um currículo integrador da infância brasileira”. Pensem sobre a importância da articulação entre Educação Infantil e Ensino Fundamental, considerem o que diz a BNCC e estejam atentos às contribuições e problemas contidos nela, em especial, nas seções que dizem respeito à BNCC. PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO INFANTIL Neste módulo, aprendemos sobre os profissionais da Educação Infantil. Conforme estudamos ao longo de toda a disciplina, após intensas lutas sociais e debates entre educadores, pesquisadores e políticos, a Educação Infantil foi reconhecida como integrante da área da Educação. A luta pela profissionalizaçãodocente, no entanto, ainda segue como pauta de qualidade necessária às instituições de Educação Infantil, que demandam profissionais capazes de oferecer às crianças um atendimento que efetivamente integre os aspectos físicos, cognitivos, afetivos, sociais e linguísticos, compreendendo, assim, a criança como um sujeito de direito. Para ser professor, afirma Sonia Kramer (2005, p. 129), “mais do que ensinar é preciso gostar de aprender, o que implica compreender que formação científica, cultural e política não para, mas continua”. Dessa forma, dediquem-se à leitura dos textos-base. O texto 1, “Professoras de educação infantil e saber docente”, tem por finalidade relacionar os estudos sobre saber docente com o campo da Educação Infantil. Primeiramente identifica os profissionais que atuam em creches e pré-escolas e as exigências legais estabelecidas recentemente, que indicam um novo perfil profissional. Além disso, discute o saber docente como uma categoria de análise da prática e de conhecimentos dos professores de crianças de 0 a 6 anos, buscando contextualizar a perspectiva docente na Educação Infantil. Por fim, afirma a importância de se investigar o saber prático das professoras desse segmento educacional, bem como de se repensar as propostas de formação continuada para as professoras, a fim de que proporcionem espaços para reflexão sobre a própria prática. No texto 2, por sua vez, “Desenvolvimento profissional docente”, os autores discutem o desenvolvimento profissional docente em face da política pública do Plano Nacional de Educação. Examinam conceitos construídos por pesquisadores ibéricos e nacionais sobre o desenvolvimento profissional docente e empreendem esforços analíticos em torno das metas do Plano Nacional de Educação (2014-2024). As análises apresentadas envolvem os resultados de entrevistas semiestruturadas realizadas com 90 professores supervisores do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência da rede municipal e estadual de ensino de Minas Gerais, São Paulo e Ceará. Os autores concluem apontando as lacunas deixadas para o cumprimento das metas, a falta de articulação entre os entes federados responsáveis pela implementação do plano e a necessidade de a comunidade acadêmica e a profissional de professores aprofundarem os estudos e a compreensão acerca de programas e políticas de desenvolvimento profissional docente. Orientações de estudo: assista aos vídeos e leia as seções aprofundando o tema, pois esses materiais completam e complementam os conteúdos dos textos-base, enriquecendo os seus saberes e conhecimentos. [1]A BNCC atual não invalida os documentos e leis que já estão postos, portanto, as diretrizes educacionais anteriores a Base continuam valendo. Assim, a BNCC propõe um conjunto de orientações às equipes pedagógicas para a elaboração dos currículos. https://ava.univesp.br/bbcswebdav/courses/fundamentos-da-educacao-infantil-i-sfi001-/wiki_content/texto-base-revisao.html#_ftnref1