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Copyright © Alexandre Varela e Viviane Varela, 2016 Copyright © Editora Planeta do Brasil, 2016 Todos os direitos reservados. Preparação de textos: Elisa Nogueira Diagramação: Abreu’s System Revisão: Maria Aiko Nishijima e Lizete M. Machado Capa: Sérgio Campante Imagem de capa: dade72 / Shutterstock Ilustrações de miolo: Ricardo Almeida Adaptação para eBook: Hondana Todas as citações bíblicas foram extraídas da Bíblia de Jerusalém, 5a edição revisada e ampliada, publicada pela Editora Paulus em 2008. CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ V419g Varela, Alexandre As grandes mentiras sobre a igreja católica: desvende os mitos sobre o catolicismo / Alexandre Varela, Viviane Varela. – 1. ed. – São Paulo : Planeta, 2016. ISBN 978-85-422-0841-2 1. Catolicismo. 2. Igreja Católica. I. Varela, Viviane. II. Título. 16-36225 CDD: 282.09 CDU: 282 2016 Todos os direitos desta edição reservados à EDITORA PLANETA DO BRASIL LTDA. Rua Padre João Manuel, 100, 21o andar http://www.hondana.com.br Edifício Horsa II – Cerqueira César 01411-000 – São Paulo – SP www.planetadelivros.com.br atendimento@editoraplaneta.com.br http://www.planetadelivros.com.br mailto:atendimento@editoraplaneta.com.br Talvez não haja nos Estados Unidos uma centena de pessoas que odeiem a Igreja Católica; mas há milhões de pessoas que odeiam aquilo que erroneamente supõem ser a Igreja Católica. Venerável Fulton Sheen Agradecimentos Agradecemos e dedicamos este livro a Deus e à Virgem Maria, que conduziram nosso trabalho no site O Catequista ao patamar em que se encontra hoje. Às nossas famílias, que nos apoiaram neste caminho e compreenderam as horas e horas investidas em estudar e escrever sobre a beleza da Igreja Católica. Aos nossos colaboradores, padre Álvaro Inácio e padre Anderson Alves, que trabalharam na revisão dos textos, e ao nosso compadre e designer Ricardo Almeida, que gentilmente ilustrou este livro e que colabora conosco desde o primeiro dia do site. Agradecemos também a todos os bispos e padres que nos dão apoio nesta caminhada e aos nossos leitores que ajudaram na missão de O Catequista de se espalhar pelo Brasil e mostrar de um jeito diferente a nossa Igreja de sempre! Sumário Apresentação Prefácio Que livro é esse? Sobre Deus O mundo seria melhor sem as religiões? Religião é invenção de Deus ou dos homens? Por que existe o sofrimento? Por que nascem pessoas deficientes? Por que Deus era tão duro no Antigo Testamento? Por que o Deus do Antigo Testamento é tão diferente de Cristo? Sobre Jesus Jesus é Deus ou só mais um guru? Jesus era mesmo o Messias? Jesus é só paz e amor? Jesus casou com Maria Madalena? Sobre a Bíblia A Bíblia é confiável? Como a Bíblia foi compilada? Por que a Bíblia protestante é diferente? O livro do Gênesis copia mitos antigos? Por que não seguimos as leis dos judeus? A Igreja medieval impedia a leitura da Bíblia? Sobre a Tradição Por que os católicos não seguem apenas a Bíblia? Como era a Igreja primitiva? A Igreja sempre foi chamada de Igreja Católica? As igrejas cristãs não defendem a mesma fé? Sobre o magistério da Igreja O papa não é como qualquer outro homem? Por que chamamos o líder da Igreja de “papa”? Por que os católicos se ajoelham diante do papa? Qual é o fundamento da autoridade dos bispos católicos? Por que os católicos obedecem ao clero? O que é dogma? Sobre Maria O que é Imaculada Conceição e Assunção? Maria era pura mesmo? Jesus tinha irmãos? Os católicos adoram Maria? Sobre a devoção aos santos O que são os santos? Como é o processo de reconhecimento dos santos? Se Jesus é o único mediador, por que se reza aos santos? Santos falecidos podem interceder? Como os santos ouvem nossas orações? Para que servem as relíquias dos santos? Os católicos adoram imagens? Orar aos santos é o mesmo que invocar espíritos? Sobre o Céu, o Inferno e o Purgatório Só os católicos vão para o céu? Por que a Igreja não crê em reencarnação? O Inferno realmente existe? Sobre a Inquisição A Inquisição matou milhares de pessoas? A Igreja promoveu uma caça às bruxas? A Igreja é culpada pela morte de Joana d’Arc? Sobre a ciência A fé é inimiga da razão? A Igreja é inimiga da ciência? A Igreja medieval escondia o conhecimento? A Igreja atrasou o avanço da medicina? A Igreja negava que a Terra é esférica? A Igreja nega a Teoria do Big Bang? Darwin provou que Deus não existe? A Igreja é contra a pesquisa com células-tronco? O que aconteceu com Galileu Galilei? O que aconteceu com Giordano Bruno? Sobre nazismo e racismo A Igreja apoiou o nazismo? A Igreja apoiou a escravidão? A Igreja destruiu a cultura indígena? Sobre machismo Por que a Igreja diz que as mulheres devem ser submissas? São Paulo era machista? A Igreja não valoriza as mulheres? Como as mulheres são vistas nos países não cristãos? Por que mulheres não podem ser padres? E agora? O que fazer com tudo isso? Referências bibliográficas Apresentação DOM FILIPPO SANTORO (Arcebispo Metropolitano de Taranto, Itália) Treta. Os jovens são pródigos em inventar nomes novos e engraçados para questões antigas e fundamentais. Quem sabe não seria uma coisa boa se, com seus amigos sacerdotes ou com as pessoas maduras, mais adultas, vocês se empenhassem em esclarecer as palavras e as frases que são ditas, usadas por Deus? Por exemplo, vocês farão muito barulho, uma barulheira cada vez que tentarem inventar respostas para suas exigências; na verdade, descobrirão que essas respostas vêm exclusivamente quando a pessoa repousa a cabeça nos ombros de Cristo. (Dom Luigi Giussani) Essas são palavras ditas por Dom Luigi Giussani, fundador do Movimento Comunhão e Libertação, a jovens colegiais em 2003. [1] Os termos podem ter mudado, mas o barulho é o mesmo. No fundo, há um grande desejo de conhecer a Verdade, de entender qual é o caminho que dá sentido a toda a vida. Mas, ao mesmo tempo, são tantas informações, tantas distrações, tantas ideologias, que é muito fácil se perder e acabar agarrado à última grande “revelação” espalhada pelas redes sociais. Conheci Alexandre e Viviane quando eles ainda estavam na casa dos vinte anos. Eles já haviam começado a se dedicar à catequese de jovens e adultos como gesto de caridade proposto pelo Movimento Comunhão e Libertação e deparavam com pessoas que não precisavam ser simplesmente catequizadas, mas sim reapresentadas à Igreja e ao que ela realmente é. Era necessário despojá-las das “verdades” trazidas da televisão, do professor marxista, dos jornais e dos livros sensacionalistas. Era preciso desfazer a confusão, “desarmar as tretas”, para que aquelas pessoas se dispusessem a ouvir a Boa Nova, o anúncio que mudaria sua vida. “A fé é um problema de conhecimento”, disse também Dom Giussani; assim, era preciso enfrentar e diluir os preconceitos que turvavam a visão e impediam que se reconhecesse a beleza da presença de Cristo e da Sua Igreja. O trabalho cresceu e — assim quis o Senhor — saiu do ambiente paroquial para alcançar centenas de milhares de pessoas por meio da internet e do rádio. Agora essa dupla de catequistas traz neste livro parte da experiência vivida nesses mais de quinze anos de catequese, que fizeram do site O Catequista uma leitura obrigatória para os católicos que desejam entender a verdade por trás de todo o barulho, de toda a confusão, de todas as tretas! Prefácio CARDEAL DOM ORANI JOÃO TEMPESTA, ORDEM DE CISTER (Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro) A importância de conhecer a doutrina sempre foi uma das preocupações da Igreja, desde os seus primórdios. O próprio Jesus Cristo nos deixou o mandato de ensinar a todas as nações (Mt 28, 19).Começando pelo primeiro anúncio do querigma até a sistematização dos artigos da fé, muitos se empenharam em nos legar a reta doutrina, esclarecendo seus contemporâneos e até entregando a vida em defesa das verdades que professamos. Esse conhecimento tornou-se essencial para um verdadeiro encontro com Cristo. É necessário entender o que a doutrina fala para a nossa vida, sabendo também refutar os erros, as falsas interpretações e até as calúnias que foram sendo forjadas ao longo da história e que, em nosso tempo, aparecem frequentemente como uma sutil, porém não menos grave, perseguição. É essa a missão que Alexandre e Viviane abraçaram no site O Catequista e neste livro: fazer o leitor entender de maneira rápida e simples qual é a verdade por trás da confusão e da desinformação que se propaga sobre o Catolicismo desde muito tempo e que hoje se renova e chega a nós através da internet, da imprensa, de professores mal informados e de livros tendenciosos. Os leitores acostumados à internet e a um novo jeito de falar encontrarão, nos textos a seguir, a mesma doutrina que é comunicada há dois mil anos, porém em um formato totalmente renovado, capaz de levar jovens e adultos a entenderem mais sobre a Igreja e sua história. Além dos esclarecimentos que este livro oferece, o testemunho dos seus autores no diálogo com o mundo atual os insere na tradição apologética, ao mesmo tempo que vivem a autêntica experiência de Igreja “em saída”[1] do nosso tempo. Que livro é esse? Oi, povo católico! Nossos leitores pediram, a Editora Planeta acreditou e toma aí o primeiro livro do site O Catequista! Uhuuuul!!! Se você ainda não nos conhece, dê uma passadinha em ocatequista.com.br. Somos um site católico que tem o desejo de mostrar a beleza da Igreja Católica com a leveza de uma conversa informal entre amigos. Não é à toa que nosso estilo é chamado de Catequese de Boteco. E como em qualquer boteco, o papo é informal e, sempre que possível, cheio de boas risadas. Mas não se engane! Podemos usar um método diferente, mas, por trás de toda a informalidade, você encontrará uma catequese absolutamente fiel ao papa e à doutrina da Igreja. Agora que você nos conhece um pouquinho, junte-se àqueles que já fazem parte dessa grande onda católica e descubra, com muito humor, como refutar as acusações mais comuns à Igreja Católica. Neste livro, você encontrará mais de sessenta artigos que explicam de forma simples, didática e direta questões que muitas vezes nos pegam desprevenidos, as famosas tretas anticatólicas! http://ocatequista.com.br Quantas vezes não ficamos calados ou fomos obrigados a concordar a contragosto que a Igreja agiu de modo terrível na Idade Média, que atrapalhou enormemente a ciência, que matou milhares de inocentes durante a Inquisição, que é machista ou tantas outras coisas? Pois esses questionamentos têm explicação, e muitas vezes a realidade se revela completamente diferente das histórias que ouvimos nas escolas e na mídia. Ao longo deste livro, vamos caçar e desarmar todas essas tretas, sempre com o jeitinho que caracteriza O Catequista. E, pra não deixar dúvidas, sempre matamos a cobra e mostramos o sabre de luz (ou espada Jedi, se você não for nerd), então você encontrará aqui muitas referências e sugestões de leitura para poder se aprofundar mais em cada um dos assuntos apresentados. Agora chega de blá-blá-blá e vamos ao trabalho. Esperamos que você curta esse jeito novo de mostrar a Igreja de sempre. Embarque na aventura dos Caçadores de Treta! Sobre Deus O MUNDO SERIA MELHOR SEM AS RELIGIÕES? Muita gente mata, humilha, oprime e segrega outros por causa da religião que professa. Logo, pode-se concluir que as religiões são uma coisa ruim, certo? Se concordarmos com essa afirmação, teremos de dizer, seguindo a mesma linha de raciocínio, que se apaixonar é ruim, afinal tantas pessoas brigam por causa de uma mulher ou de um homem (lembremos da Guerra de Troia, motivada pelo rapto da bela Helena). Quantas amizades desfeitas, quantos crimes passionais! Tenhamos cuidado com os raciocínios fáceis. A verdade é simples, mas chegar a ela não é moleza: requer prudência, humildade, curiosidade, honestidade intelectual e, acima de tudo, a graça do Espírito Santo. Muitas pessoas desejam viver no mundo imaginado por John Lennon em sua canção “Imagine”, especialmente no que diz respeito a estes versos: Imagine there’s no countries It isn’t hard to do Nothing to kill or die for And no religion too[1] Na letra dessa música, John Lennon acusa as religiões de promoverem uma divisão entre os povos e sugere que o mundo seria mais pacífico e unido com a extinção das religiões. O grande desejo é que não haja diferenças nem, logo, motivos para desavenças e guerras. É claro que o desejo de paz universal é muito bonito, porém Lennon errou feio ao imaginar que poderíamos caminhar rumo à perfeita paz (ou ao bem absoluto) confiando simplesmente em nós mesmos e em nossas boas intenções. A Bíblia relata que assim surgiu o pecado original: os homens acharam que poderiam ser autossuficientes, ou seja, que poderiam se virar muito bem sem Deus. E temos aí o resultado… Somos incapazes de alcançarmos por nós mesmos a felicidade, por mais que nos empenhemos. Veja, Lennon lutou pela paz com suas belas canções e protestos, os famosos bed-ins ao lado da Yoko Ono, mas, cá pra nós, o resultado prático foi nulo! Acaso alguém vai deixar de promover a guerra porque dois cabeludos estão cantando baladinhas numa cama de um hotel de luxo?! É muito fácil discursar e sonhar com o bem (“It’s easy if you try”[2]), mas realizar o bem dia após dia não é moleza! É uma tremenda falta de realismo crer que, contando só com a nossa força de vontade, podemos nos aperfeiçoar a ponto de alcançar a ausência de falhas. São Paulo é uma grande referência para nós nesse ponto, pois tinha autocrítica suficiente para saber que não era capaz de ser bom sem o auxílio divino: […] Pois o querer o bem está ao meu alcance, não porém o praticá-lo. Com efeito, não faço o bem que quero, mas pratico o mal que não quero. […] Verifico, pois, esta lei: quando quero fazer o bem, é o mal que se me apresenta. […] Infeliz de mim! Quem me libertará deste corpo de morte? Graças sejam dadas a Deus, por Jesus Cristo Senhor nosso! (Rom 7, 18-19; 21; 24-25) E assim, com o tempo, São Paulo chegou a um nível heroico de caridade e santidade. Não sonhando, mas crendo em Deus e trabalhando. Algumas religiões são mesmo um atraso de vida, em especial aquelas cuja doutrina incita a violência, porém é injusto e infame enfiar a Igreja Católica nesse balaio. Basta comparar as nações influenciadas pelo cristianismo com as demais para notar a imensa diferença na evolução dos direitos humanos, da ciência e da moral. RELIGIÃO É INVENÇÃO DE DEUS OU DOS HOMENS? Existem algumas frases feitas para atacar a validade das religiões e a necessidade de sua existência. Vamos dar uma olhada nas mais comuns: “Deus não criou a igreja nem a religião. São criações humanas…” De que Deus estamos falando? Nós, cristãos, cremos que Deus se fez Homem na pessoa de Jesus Cristo. Os profetas que anunciaram a Sua vinda e Ele mesmo disseram que se edificaria uma igreja (Mt 16, 18) por meio da qual Ele levaria a ação salvadora às pessoas de todos os tempos. Em parte, é correto afirmar que algumas religiões e igrejas são criações humanas, porém essa afirmação não cabe no cristianismo. As religiões, em geral, são fruto da meditação e da imaginação presentes em todas as culturas, revelando o anseio do homem de religar-se ao Absoluto,a Deus, mas o fato de que Jesus, Deus que se fez Homem, veio habitar entre nós não brotou da imaginação humana: é um acontecimento histórico. Portanto, o cristianismo é uma verdade revelada pelo próprio Deus. “Deus apenas criou o bem e o caminho correto…” Perfeito! Mas o que é o bem? Qual é o caminho certo? Muitas vezes, as pessoas se sentem perdidas e fazem o mal convictas de estarem praticando o bem. E uma multidão segue pela via do erro, crente que está indo pelo lado certo. Mas qual é o caminho correto? Tenho uma amiga, por exemplo, que optou pelo aborto. Ela achava que esse era o caminho correto. Antes de realizar o “serviço”, porém, o aborteiro solicitou uma ultrassonografia. Foi então que minha amiga viu aquelas perninhas e aqueles bracinhos se mexendo… Caramba, era mesmo um bebê! E ela desistiu de matar sua filha. Mas havia estado a um triz de cometer essa atrocidade. Infelizmente, nem todas voltam atrás. Muitas mulheres optam pela via do erro, acreditando que estão fazendo o melhor. Todos nós sabemos que não é fácil reconhecer e seguir o bem. Muitas vezes confundimos o mal com o bem e não sabemos qual é o caminho correto, a não ser que Deus o aponte de maneira clara e inequívoca. Para nos ajudar nisso, Deus se fez nosso companheiro, um homem de carne e osso. Jesus disse: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14, 6). E assim tudo ficou mais simples! Basta olhar para esse homem, ouvir Suas palavras, permanecer com Ele. E essa companhia de Deus permaneceu ao longo da história na forma da Igreja. O Senhor escolheu alguns homens, os apóstolos, e deu-lhes a missão de anunciar a Sua mensagem a todos os povos. A Igreja Católica Apostólica Romana que existe hoje é a continuidade da missão dos apóstolos, de modo que o Evangelho ilumine todas as gerações. Por meio dela, o amor de Jesus nos alcança hoje da mesma forma como alcançou os discípulos há dois mil anos. Sem uma religião, estamos seguindo e adorando a nós mesmos. Essa é a corrente de pensamento que está em voga no momento. Idolatramos a nossa tosca capacidade de decidir o que é melhor para a nossa vida, sem precisar de profetas, revelações ou ensinamentos. “Somos muito espertos! Podemos chegar à verdade sozinhos e não precisamos ser doutrinados!” “Deus nos deu o livre-arbítrio para decidirmos sobre o rumo de nossa vida.” Sim, é claro. E Ele também nos enviou o Seu Filho para nos ensinar a usar bem o nosso livre-arbítrio e a decidir pelo bem e rejeitar o mal. Afinal, quem insiste em abusar da sua liberdade jamais alcançará a paz interior. E muito menos poderá contribuir para a paz no mundo. Temos liberdade para escolher, e Deus nos convida a optar pelo caminho certo: seguir a Jesus por meio da Sua Igreja! POR QUE EXISTE O SOFRIMENTO? “Muitas crianças foram abandonadas por seus pais. Muitas foram vítimas de coisas terríveis, como drogas e prostituição. Por que Deus permite que essas coisas aconteçam?” Essa foi a pergunta que Glyzelle Palomar, uma menina de doze anos, fez ao Papa Francisco durante um encontro do pontífice com jovens filipinos em Manila. Comovido, o papa observou: “Ela fez a única pergunta que não tem resposta”.[3] E não lhe vieram as palavras. Teve de responder com lágrimas. A origem do mal foi revelada nas Escrituras: o primeiro casal, abusando da sua liberdade, cometeu o pecado original e abriu as portas do mundo para o mal, para o sofrimento e para a morte. Porém, a razão de um sofrimento específico é sempre um mistério (e a doutrina do carma é ilógica, como você poderá ver mais para a frente). Por isso, o papa disse à menina: “[…] o núcleo da tua pergunta quase não tem resposta. Somente quando formos capazes de chorar sobre as coisas que vós vivestes é que poderemos compreender qualquer coisa e dar alguma resposta”. Sim, Papa Francisco! Quando temos piedade do próximo, damos o primeiro passo para nos colocarmos adequadamente diante do problema do sofrimento. É a compaixão, ou seja, a capacidade de se colocar no lugar do outro e se condoer do seu sofrimento. E Cristo compreendeu tão bem os dramas humanos que, muitas vezes, comoveu-se até a alma e chorou diante deles. Portanto, o segundo passo é contemplar o fato de que Deus chora conosco. Um Deus que se compadece de nossos sofrimentos! Um Deus que se aflige e chora por nós! O Catecismo da Igreja[4] diz que a razão pela qual Deus permite que Satanás continue a agir no mundo, tema central do livro de Jó, é um mistério. Mas nós sabemos o essencial: Deus nos ama e trabalha para o nosso bem. O terceiro passo diante do sofrimento é deixar-se amar por Deus. Não é fácil, porque muitas vezes insistimos em nos concentrar no sofrimento. Revoltadas e blasfemando contra Deus, chamando-o de injusto e tirano, as pessoas deixam de fazer o mais importante: olhar para a cruz. Nela está a beleza e a null “loucura” de um Deus que compartilhou o sofrimento humano até o extremo da humilhação e da dor. Quando Cristo diz “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”,[5] ele se identifica profundamente com os questionamentos aflitos de todo inocente que sofre, mas, ao mesmo tempo que pergunta, Cristo responde da forma mais satisfatória possível, com Sua entrega de amor. E esse amor é mais forte do que o sofrimento.[6] Também o Salmo 21, que se inicia com o grito de um homem aflito, termina com uma mensagem de sólida esperança no Deus que socorre o Seu povo. Jesus, Deus feito homem, tendo entregado o espírito nas mãos do Pai, levantou-se do túmulo no terceiro dia. Ele venceu o mal e a morte! Com Seu corpo, Ele nos comunica a Sua doutrina, ensinando-nos que já não sofremos sozinhos nem sofremos em vão. Sim, estamos em meio à guerra contra o mal e penamos por isso, mas a vitória é certa, pois Cristo está vivo e impera. No fim dos tempos, Cristo virá não mais como um humilde servidor, mas sim como imperador e juiz. E então veremos que já não haverá lugar para a maldade na Terra e “Ele enxugará toda lágrima dos seus olhos” (Apo 21, 4). Há um episódio da série de super-heróis X-Men em que um monge mutante dialoga com Wolverine, um típico ateu, que, revoltado com injustiças e maldades, renega a possibilidade da existência de um Deus bondoso. Porém, o testemunho de um religioso cristão o leva a ver as coisas com outros olhos. “Nossa habilidade de entender os propósitos de Deus é limitada, mas nos consolamos com o fato de que Seu amor é infinito”, diz o monge mutante.[7] A conversão de Wolverine lembra um episódio que o padre Luigi Giussani narrou em seu livro O senso religioso, contando que um jovem, na confissão, disse-lhe que para ele o ideal humano era representado por Capâneo, personagem citado por Dante em A divina comédia. Capâneo é acorrentado pelos deuses, mas eles não podem impedi-lo de blasfemar. Giussani, então, lhe perguntou: “Mas não é ainda maior amar o infinito?”[8] A pergunta da jovem Glyzelle também foi feita por Bento XVI em sua visita ao campo de concentração de Auschwitz, em 2006, onde mais de um milhão de judeus foram exterminados pelos nazistas. “Num lugar como esse faltam palavras. No fundo, pode permanecer apenas urn silêncio aterrorizado, urn silêncio que é urn grito interior a Deus: Senhor, por que silenciaste? Por que toleraste tudo isso?” Bento XVI Em sua genial reflexão, o papa disse que os homens que pretendem agir como juízes de Deus apenas contribuem ainda mais para a destruição do humano. A postura mais justa é aquela do homem que eleva um grito humilde e insistente para que Deus quebre o silêncio e se manifeste, “Pois todo o quepede, recebe; o que busca, acha; e ao que bate, se abrirá” (Lc 11, 10). Em seu discurso, o papa disse: Quantas perguntas surgem neste lugar! Sobressaem sempre as perguntas “Onde estava Deus naqueles dias?”, “Por que Ele silenciou?”, “Como pôde tolerar este excesso de destruição, este triunfo do mal?” […] Nós não podemos perscrutar o segredo de Deus. Vemos apenas fragmentos e enganamo-nos se pretendemos eleger-nos juízes de Deus e da história. Não defenderemos, nesse caso, o homem, mas contribuiremos apenas para a sua destruição. Não, em definitivo: devemos elevar um grito humilde, mas insistente a Deus: Desperta! Não te esqueças da tua criatura, o homem! E o nosso grito a Deus deve ao mesmo tempo ser um grito que penetre o nosso próprio coração, para que desperte em nós a presença escondida de Deus […] (Bento XVI)[9] Mais tarde, enquanto Bento XVI rezava diante do memorial das vítimas de Auschwitz, de forma suave, poética e gentil, o Pai de Bondade quebrou Seu silêncio e enviou um sinal: em meio a tanta feiura, por trás daquele cenário todo cinza e tão triste, surgiu um belíssimo arco-íris.[10] Sim, Deus se manifesta de forma poderosa na vida de quem O invoca. Não é à toa que a esperança, mesmo em meio ao caos, é um dos traços mais fascinantes da humanidade. POR QUE NASCEM PESSOAS DEFICIENTES? Stevie Wonder ficou cego quando ainda era bebê. Você acha que ele é mais “sofrido” ou tem menos possibilidade de ser feliz do que uma pessoa que enxerga? • • • Ao ver uma pessoa deficiente, muitos se perguntam por que alguns nascem deficientes e outros nascem “perfeitos”. Ainda que a maioria das pessoas não tenha coragem de assumir isso, no fundo dessa pergunta está a crença de que uma pessoa deficiente tem menos potencial para se realizar, para ser feliz, do que uma pessoa “normal”. Será? Para compreendermos essa questão, é necessário, primeiramente, nos darmos conta de um problema anterior: por causa do pecado original, nossa alma e nosso corpo não estão de acordo com o plano de Deus ao criar os homens. Tudo tende a se corromper, tudo está fora do lugar, tudo decai. Feridos por essa mancha, todos nós nascemos com deficiências e limitações, sejam elas de ordem física, psicológica, emocional, econômica ou outra. Se entendermos isso, veremos que o leque de perguntas deve ser ampliado: Por que alguns filhos são gerados por pais que se amam e se respeitam enquanto outros são recebidos neste mundo por um casal em crise e amargurado? Por que alguns filhos nascem em um lar onde há fartura enquanto outros nascem em uma família miserável? Por que alguns filhos nascem amados pelo pai e pela mãe enquanto outros nascem rejeitados por um deles ou por ambos? Uma deficiência física ou intelectual de um recém-nascido nos abala de modo especial porque torna evidente aos nossos olhos algumas das dificuldades que aquela criança terá na vida, mas uma criança “normal” também nasce com uma série de deficiências que não chama tanto a nossa atenção por não ser tão explícita. São limitações internas ou relativas ao ambiente social e familiar, porém não menos dramáticas. Vamos partir de um exemplo concreto: Marilyn Monroe, ícone pop e uma das maiores estrelas do cinema, tinha beleza, sensualidade, talento, glamour e sucesso, mas o que pouca gente sabe é que ela sofria as consequências de suas graves deficiências familiares. Ela jamais conheceu o pai e sua mãe foi internada em um hospício quando ela ainda era muito pequena. Apesar de ter pais vivos, a menina era, na prática, uma órfã, e passou boa parte da infância em casas de parentes e em orfanatos. Foi abusada sexualmente por vários anos de sua infância. Então, apesar de ser fisicamente “perfeita”, ela nasceu emocionalmente mutilada, sem o amor e a presença do pai e, logo depois, sem os cuidados da mãe. Quem poderá dizer que o “fardo” do seu desamparo — que a expôs a sabe-se lá quantas dores e humilhações ao longo de toda a sua vida — é menor do que o de uma criança que nasce com alguma deficiência física ou intelectual? Quem poderá vislumbrar e medir a grandeza dos obstáculos que se apresentam diante de cada pessoa assim que ela nasce? Os deficientes físicos ou intelectuais precisam que a sociedade olhe para suas limitações de forma objetiva e sem pieguice: eles têm necessidade de atendimento médico especializado, cultura, educação, lazer e acessibilidade nas ruas, nos meios de transporte, no comércio etc. Mas… ter pena? Como diziam meus sábios amiguinhos do jardim de infância, quem tem pena é galinha! Assim, não é realista ver o deficiente físico ou intelectual como um coitado que sofre mais do que os outros. Filhos de Adão e Eva, coitados somos todos nós, que já nascemos destinados a morrer. Cada indivíduo carrega as suas mazelas, as suas frustrações, os seus traumas… e cada um sabe onde o seu calo aperta. A ideia de que deficientes físicos ou intelectuais são pessoas potencialmente infelizes resulta, muitas vezes, no preconceito e na segregação dessas pessoas dentro da sociedade. Em um nível mais crítico de rejeição, muitos chegam até mesmo a pensar que seria melhor que pessoas deficientes nem chegassem a nascer. E isso explica por que mais de noventa por cento dos fetos com diagnóstico de síndrome de Down são abortados na Europa e nos Estados Unidos. Assim como todos nós somos “coitados”, do ponto de vista das nossas chagas de diversas naturezas, também todos nós somos imensamente abençoados. Temos motivos de sobra para ter esperanças e sorrir! Há dois mil anos, Deus se encarnou no ventre de uma Virgem e se fez menino. Ele se dignou a descer de Sua glória nos Céus, vir até nós, olhar nos nossos olhos e ensinar-nos o caminho para a verdadeira vida. Ele nos amou a ponto de se entregar por nós. Então, seja como cadeirantes ou “andantes”, pobres ou ricos, tendo sido crianças amadas ou negligenciadas, podemos caminhar com Jesus e nos tornar pessoas melhores com o null tempo, buscando amar como Ele amou, gozar do “cêntuplo” ainda nesta vida e, no fim, partilhar de sua eterna vitória. Somos muito mais do que infelizes filhos de Eva: somos filhos da doce e poderosa Virgem Maria! POR QUE DEUS ERA TÃO DURO NO ANTIGO TESTAMENTO? O Deus do Antigo Testamento gostava de castigar? Dilúvio, grandes pragas, anjos exterminadores, cidades inteiras destruídas, apedrejamentos… Ao considerar certas passagens sangrentas do Antigo Testamento, muita gente tem a impressão de estar vendo um filme do Tarantino. E o que não falta é cristão achando que o Deus do Antigo Testamento era cruel e rígido demais e que somente mostrou a Sua face de amor e de bondade no Novo Testamento. Entretanto, essa impressão pode ser desfeita se observarmos o Antigo Testamento na sua globalidade. Basta um pouco de atenção para perceber a afeição e a doçura de Deus em toda a null Bíblia e a sua profunda dor diante da maldade dos homens. Deus não sente nenhum prazer em punir seus filhos, e, quando envia sofrimentos, seu objetivo é a conversão ou a necessidade urgente de cessar o mal. Podemos ver isso em Ezequiel, que diz “Porventura tenho eu prazer na morte do ímpio? — oráculo do Senhor Iahweh. — Por-ventura não alcançará ele a vida se se converter de seus maus caminhos?” (Ez 18, 23) e em Oseias, quando diz “Meu povo está obstinado em sua apostasia. Chamam-no do alto, mas ninguém se levanta! […] Meu coração se contorce dentro de mim, minhas entranhas comovem-se. Não executarei o ardor de minha ira, não tornarei a destruir Efraim, porque eu sou Deus e não um homem, eu sou santo no meio de ti, não retornarei com furor” (Os 11, 7-9). E quando o povo, ao passarpor um mau momento, murmurou contra Deus, Ele rebateu que a desgraça dos maus, antes de ser fruto da ira divina, é a consequência natural de suas más ações (Ez 18, 25-26). O Deus do Antigo Testamento não tinha misericórdia? É uma enorme calúnia dizer que o Deus do Antigo Testamento era implacável. Dar mais colher de chá do que Ele dava, impossível! Por diver-sas vezes, Ele perdoou pessoas e populações inteiras que estavam destinadas à destruição por causa de seus pecados. Quando Moisés ainda estava no alto do Monte Sinai, recebendo as tábuas da Lei, por exemplo, o Senhor viu que o null povo estava adorando o bezerro de ouro. Então, resolveu destruir a todos e poupar somente a Moisés e sua tribo. Moisés, porém, convenceu-O a perdoá-los, “Iahweh, então, desistiu do castigo com o qual havia ameaçado o povo” (Ex 32, 14). Em outro exemplo, o profeta Jonas profetizou que a cidade de Nínive seria em pouco tempo aniquilada, mas, vendo como os ninivitas “se converteram de seu caminho perverso, e Deus arrependeu-se do mal que ameaçara fazer-lhes e não fez” (Jn 3, 10). Outra ocasião, em que Deus decide passar o rodo nas cidades de Sodoma e Gomorra, é bastante interessante. Ao saber dos planos do Senhor, Abraão, respeitosamente, questionou a razoabilidade daquela ação: “Talvez haja cinquenta justos na cidade. Destruirás e não perdoarás à cidade pelos cinquenta justos que estão em seu seio? Longe de ti fazeres tal coisa: fazer morrer o justo com o pecador, de modo que o justo seja tratado como o pecador! Longe de ti! Não fará justiça o juiz de toda a terra?” Iahweh respondeu: “Se eu encontrar em Sodoma cinquenta justos na cidade, perdoarei toda a cidade por causa deles”. (Gn 18, 24- 26) E o diálogo prosseguiu. Abraão foi diminuindo cada vez mais o número de possíveis justos (“Talvez só existam quarenta?” “Talvez se encontrem vinte?”). Por fim, Abraão replicou: “‘Que meu Senhor não se irrite e falarei uma última vez: talvez se encontrem dez. E ele respondeu: ‘Não destruirei, por causa dos dez’” (Gn 18, 32). O problema é que o total de gente que prestava em Sodoma e Gomorra não chegava à soma dos dedos das mãos. E aí não teve jeito… Deus mandou fogo na cidade. O que muitos não conseguem ver é que este foi, efetivamente, um ato de misericórdia, pois numerosos viajantes incautos passavam por aquela cidade e eram simplesmente estuprados, sem dó. Fazia parte da “cultura local”. Destruindo aquela cidade, Deus impediu que mais crianças crescessem naquele meio abominável, aprendendo a repetir os mesmos erros, e que outros estrangeiros fossem violentados. Outra coisa importante é que Deus nunca entrega uma pessoa ou um povo à desgraça sem antes ter avisado — e avisado muuuuito —, na esperança de que se arrependa e se emende: Iahweh, Deus de seus pais, enviou-lhes sem cessar mensageiros, pois queria poupar seu povo e sua Habitação. Mas eles zombavam dos enviados de Deus, desprezavam suas palavras, caçoavam dos profetas, até que a ira de Iahweh contra o seu povo chegou a tal ponto que já não havia mais remédio. (II Cr 36, 15-16) Os apedrejamentos previstos na Lei Mosaica Tá, e o festival de apedrejamentos ordenados por Moisés? Bem, tente se transportar para aquela época. O povo recém-saído do Egito tinha alguns hábitos nada legais, como sacrificar crianças para agradar aos deuses, fazer suruba como ritual de culto, matar por qualquer motivo pessoas de sua própria tribo, torturar escravos, transar com as próprias filhas ou irmãs… Tem mais coisa, mas acho que já deu pra sentir o drama, não deu? Era esse pessoal que Moisés precisava colocar na linha. A coisa estava tão feia que era preciso um “choque de ordem”. O povo estava no meio do deserto, não havia como estabelecer prisões para deter os infratores (só havia tendas) e a autoridade de Moisés era vez por outra contestada. A moral se resumia a “cada um por si e deuses por todos”. Nesse cenário punk, a punição por apedrejamento foi a solução encontrada para consolidar o respeito às normas mais básicas da dignidade humana. Era isso ou o caos. Na ocasião da vinda de Jesus, o povo já estava devidamente “catequizado” em relação à Lei de Deus e não havia mais razão para aplicar o apedrejamento dos infratores. O povo já não era mais criança e Deus agora o tratava como adulto. A pedagogia divina estava numa nova etapa, em que o desafio era outro. Com as leis consolidadas na cultura do povo, faltava agora fazê-las vibrar nos corações por meio de uma adesão livre e amorosa. Podemos notar que, diante da mulher adúltera que seria apedrejada, Jesus em nenhum momento criticou Moisés. Ele simplesmente superou a sua lei, levando-a à perfeição: “Quem dentre vós estiver sem pecado, seja o primeiro a lhe atirar uma pedra” (Jo 8, 7). Um Deus capaz de amar assim… Por falar em adultério, era isso que o povo de Israel fazia toda vez que cultuava outros deuses. Deus se comparava a um marido traído que continuamente perdoa a sua esposa prostituída. Eu a castigarei pelos dias do baais, aos quais queimava incenso. Enfeitava-se com seu anel e seu colar e corria atrás de seus amantes, mas de mim ela se esquecia! Oráculo de Iahweh. Por isso, eis que, eu mesmo, a seduzirei, conduzi-la- ei ao deserto e falar-lhe-ei ao coração. […] Acontecerá, naquele dia — oráculo de Iahweh — que me chamarás “Meu marido”, e não mais me chamarás “Meu Baal”.[11] […] Eu te desposarei a mim para sempre, eu te desposarei a mim na justiça e no direito, no amor e na ternura. (Os 2, 15-21) Depois de conhecer essas palavras, como ainda podemos pensar que o coração do Deus de Israel era duro? POR QUE O DEUS DO ANTIGO TESTAMENTO É TÃO DIFERENTE DE CRISTO? Embora saibamos que Deus sempre amou muito os homens, é fato que ele parecia mais duro no Antigo Testamento. Então, é comum nos perguntarmos como se deu essa mudança dos castigos dos tempos de Abraão e Moisés para o amor dos tempos de Cristo e da Igreja. A verdade é que essa mudança, embora pareça abrupta, faz parte de um processo pedagógico absolutamente genial. Pra começar, o amor sempre esteve lá, o que mudou foi a forma. Isso tem a ver com o amadurecimento da nossa capacidade de compreender e aceitar as sucessivas revelações. Em outras palavras, Deus nos ama tanto que se revelou aos poucos, de forma que pudéssemos aceitar e compreender mais facilmente. Imagine-se dentro da mentalidade e do conhecimento do povo hebreu na época da escravidão no Egito, quando os judeus viviam em uma barbárie quase completa. Imagine agora como seria receber o Espírito Santo e fundar a Igreja nesse contexto. Impossível, não é? Claro… Nosso povo precisava passar pelas mesmas etapas que qualquer pessoa vivencia no seu caminho de amadurecimento. Infância espiritual O Antigo Testamento mostra a infância do povo de Deus, sua fase da imaturidade. Repare que o Senhor sempre se comunicava concretamente, isto é, por meio de encontros humanos. Nessa fase, os encontros eram intermediados pelos profetas, que não tinham lá muito tino pra guiar um povo como aquele e que só conseguiam fazer isso porque eram diretamente inspirados por Deus para transmitir a verdade aos homens. Eles não ficavam adivinhando o futuro como normalmente se diz — até faziam isso, mas esse não era o objetivo da sua missão. Sua função era educar o povo por meio de instruções claras, sem muitas explicações, com ameaças de punições para os rebeldes, exatamente como fazemos com crianças. Quando uma criança teima em enfiar o dedo na tomada, os pais não perdem tempo explicando a ela sobreo funcionamento de uma corrente elétrica. Eles apenas proíbem esse comportamento e impõem um castigo em caso de desobediência. Isso acontece porque é necessário livrar a criança do perigo imediato, mesmo que ela ainda não tenha a capacidade de compreender o motivo. Da mesma forma, Deus queria o melhor para o seu povo e cuidava inclusive de sua saúde física. Eles não tinham conhecimento suficiente, por exemplo, para entender sobre o perigo de vírus, bactérias e micróbios em geral. Por isso praticar princípios básicos de higiene, como lavar as mãos antes das refeições, era impossível! Então, ou era na base da imposição ou não era… Adolescência espiritual E chegamos à adolescência. Por que somos tão chatos nessa fase da vida? O padre Luigi Giussani diz que levamos uma mochila nas costas desde que nascemos, e que nossos pais colocam várias coisas dentro dela, acreditando que serão úteis para a nossa vida. Mas, na adolescência, não queremos mais carregar tanto peso sem entender por quê. Então, tiramos tudo e testamos cada coisa pra saber se queremos mesmo continuar a carregá-las. E fazemos isso com a experiência![12] O que um jovem mais diz é “Eu quero fazer sozinho!”, “Prefiro quebrar a cara por mim mesmo!” ou “Me deixa viver a minha vida!”, mas diz isso porque precisa experimentar e seguir adiante. Precisa entender com sua própria razão e emoção. Vendo o avanço do povo hebreu, que se torna mais disciplinado e esperançoso, preparado pelos profetas para a vinda do Messias, fica evidente a nova estratégia de Deus para educar a humanidade. Quando João e André abordaram Jesus, querendo saber quem Ele era, a resposta de Cristo não foi nenhuma descrição de si mesmo… Não houve nem mesmo uma breve explicação. Ele disse simplesmente: “Vinde e vede” (Jo 1, 39). Com Jesus, o povo de Deus pôde aprender por meio da própria experiência, mas, a exemplo dos profetas, Cristo também preparou o povo para a fase seguinte. Ele anunciou que iria embora, mas enviaria o Espírito Santo. É o início da fase adulta do povo de Deus. Maturidade espiritual Os adultos sabem o que fazer, mas não esquecem a sua origem e retornam a ela à procura de apoio sempre que necessário. Cristo, antes de subir aos Céus ressuscitado, funda a sua Igreja sobre Pedro e estabelece com o grupo dos apóstolos a forma definitiva do encontro com Ele. Agora nós andamos com as nossas próprias pernas, mas com ajuda do Alto e guiados pelos legítimos sucessores dos apóstolos. Novamente, chegamos a Deus por meio de encontros humanos, mas, desta vez, a ligação não é por intermédio de um profeta ou de Jesus Cristo em pessoa: agora Deus se faz presente por meio de Seu próprio povo! Mesmo com todas as nossas fragilidades, somos o rosto de Cristo no mundo, e isso só é possível porque somos investidos pela força da última revelação da Santíssima Trindade, o Espírito Santo. Essa é a Igreja Católica! E chegamos até aqui. Fomos capazes de alcançar a compreensão que temos hoje graças ao genial caminho pedagógico montado por Deus para nos trazer até este ponto. Depois da fase adulta, vem a morte e a passagem para a vida eterna. Se você pensar bem, a profecia sobre a segunda vinda de Cristo é a preparação para essa próxima etapa. Sobre Jesus JESUS É DEUS OU SÓ MAIS UM GURU? Boa parte das pessoas ao nosso redor não reconhece o Nazareno como aquilo que Ele revelou ser: Filho de Deus e Deus Ele mesmo. Há uma multidão de pessoas que admiram Jesus, que simpatizam com seus ensinamentos, que o consideram um fofo, enfim, mas que não o aceitam como Deus. Essas pessoas não se dão conta de que é simplesmente impossível considerarmos que Jesus foi um homem respeitável, digno de ser ouvido, se não crermos que Ele é Deus. Não, não estamos exagerando, e vamos mostrar por quê. Muitos dizem que não veem Jesus como Deus, mas que o admiram como um exemplo de humildade. Sim, é verdade, Jesus era extremamente humilde. Porém, se tiver um mínimo de coerência intelectual, uma pessoa que não o reconhece como Deus é obrigada a tê-lo como um louco ou como um homem arrogante. Afinal, não dá pra levar a sério um cara que, não sendo Deus, diz este tipo de coisa: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vem ao Pai a não ser por mim” (Jo 14, 6), “Filipe lhe diz: ‘Senhor, mostra-nos o Pai e isso nos basta!’ Diz- lhe Jesus: ‘Há tanto tempo estou convosco e tu não me conheces, Filipe? Quem me vê, vê o Pai. Como podes dizer Mostra-nos o Pai?’” (Jo 14, 8-9), “Vós me chamais Mestre e Senhor e dizeis bem, porque eu o sou” (Jo 13, 13) e “Eu sou a videira e vós os ramos. Aquele que permanece em mim e eu nele produz muito fruto; porque, sem mim, nada podeis fazer” (Jo 15, 5). Imagine encontrar na rua um homem que, não sendo Deus em pessoa — ou ao menos o Chuck Norris —, lhe diga essas coisas. Aposto que você teria de fazer um grande esforço para segurar o riso (é o efeito Inri Cristo, saca? Nem ele mais se leva a sério!). Agora, repare que Jesus aceitava na boa que seus discípulos o cultuassem como Deus. Isso fica claro diante de Tomé: “Respondeu-lhe Tomé: Meu Senhor e meu Deus! Jesus lhe disse: Porque viste, creste. Felizes os que não viram e creram!” (Jo 20, 28-29). Quando ainda era bebê, Jesus recebeu a adoração dos três reis magos: “Ao entrar na casa, viram o menino com Maria, sua mãe, e, prostrando-se, o homenagearam” (Mt 2, 11). E veja como era grande a Sua pretensão: Ele afirmava ser capaz de fazer coisas que só um Deus poderia fazer, como purificar as pessoas de seus pecados e dar-lhes a vida eterna. Vemos isso no Evangelho de Lucas — “Por essa razão, eu lhe digo, seus numerosos pecados lhe serão perdoados, porque ela demonstrou muito amor. […] Em seguida, disse à mulher: ‘Teus pecados são perdoados’. Logo os convivas começaram a refletir: ‘Quem é este que até perdoa os pecados?’” (Lc 7, 47-49) — e no Evangelho de João — “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6, 54) e “As minhas ovelhas escutam a minha voz, eu as conheço e elas me seguem; eu lhes dou a vida eterna” (Jo 10, 27-28). Ora, se um homem que fala e age dessa forma não é mesmo Deus, então não passa de uma figura patética. E, por mais que tenha falado “coisas bonitas” e tenha “pregado o amor”, seria uma mera caricatura de guru. Repito: Jesus se considerava digno de ser adorado como Deus. A-DO-RA-DO! E fazia questão de ser amado acima de todas as coisas; menos do que isso, Ele não aceitava: “Aquele que ama pai ou mãe mais do que a mim não é digno de mim. E aquele que ama filho ou filha mais do que a mim não é digno de mim” (Mt 10, 37). Sobre esse assunto, C. S. Lewis (autor de As crônicas de Nárnia) escreveu: Estou tentando impedir que alguém repita a rematada tolice dita por muitos a seu respeito: “Estou disposto a aceitar Jesus como um grande mestre da moral, mas não aceito a sua afirmação de ser Deus”. Essa é a única coisa que não devemos dizer. Um homem que fosse somente um homem e dissesse as coisas que Jesus disse não seria um grande mestre da moral. Seria um lunático — no mesmo grau de alguém que pretendesse ser um ovo cozido — ou então o diabo em pessoa. Faça a sua escolha. Ou esse homem era, e é, o Filho de Deus, ou não passa de um louco ou coisa pior. […] Mas que ninguém venha, com paternal condescendência, dizer que ele não passava de um grande mestre humano. Ele não nos deixou essa opção, e não quis deixá-la.[1] Diante de tudo o que disse e fez, Jesus não deixa a opção de acharmos que Ele é simplesmente um sujeitobacana, um “espírito iluminado” ou algo assim. Ou Deus ou nada. A quem é dada a graça imensa de reconhecer a Sua divindade não é mais possível relativizar a Sua Palavra: “Isso aqui que Jesus falou me agrada, eu sigo, ok. Ah, não, nessa outra passagem Ele foi muito radical, isso eu não vou levar em conta…” Deus falou, tá falado, mano! JESUS ERA MESMO O MESSIAS? No século I, muitos judeus reconheceram Jesus como o Messias prometido nas Escrituras. Tanto é que São Paulo era o apóstolo dos gentios (cristãos não judeus) enquanto São Pedro pastoreava os cristãos judeus. Mas também é verdade que uma grande parcela dos israelitas rejeitou Jesus, dizendo que Ele não cumpriu as profecias messiânicas. Mas será que Jesus não se encaixa mesmo no perfil do Messias traçado pelos profetas da Torá? Certamente que se encaixa! Nós sabemos que os hebreus deixaram a vida de escravidão no Egito, atravessaram o deserto e, décadas depois, por meio de campanhas militares, conseguiram conquistar os territórios da Terra Prometida. A libertação do povo não foi somente física, mas sobretudo espiritual, porém a libertação perfeita e definitiva só viria com o Messias. O problema é que o povo imaginava muito mais uma libertação política do que espiritual. Os judeus sabiam que o Messias seria descendente de Davi, que foi um rei guerreiro. Então, era natural que o imaginassem como um Rambo com sangue nos zoio. Tal expectativa cresceu especialmente na época que antecedeu a vinda de Jesus, quando o território de Israel era dominado pelo Império Romano. Nesse momento, os judeus esperavam que o Messias viesse e liderasse uma revolta, chutando os lacaios de César pra bem longe. Inicialmente, uma multidão de judeus achou que Jesus era O cara. Depois que O viram multiplicar os pães e os peixes, quiseram aclamá-lo como rei, mas, em vez de ficar lisonjeado, Ele deu o toco em geral: “Em verdade, em verdade vos digo: vós me procurais, não porque vistes sinais, mas porque comestes dos pães e vos saciastes. Trabalhai, não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna, alimento que o Filho do Homem vos dará, pois Deus, o Pai, o marcou com seu selo” (Jo 6, 26-27). Para completar, Jesus veio com a estranha história de que teriam de comer da Sua carne e beber do Seu sangue. Depois dessa, quem dois minutos antes estava gritando “É o rei! É o rei!” passou a fazer cara de nojinho e a considerá-lo tantã. Sim, Jesus é rei. Mas Seu reino não é deste mundo: “Se meu reino fosse deste mundo, meus súditos teriam combatido para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas meu reino não é daqui” (Jo 18, 36). Em Jerusalém, Cristo entrou pelos portões da cidade em meio a uma multidão em delírio, que O louvava como o Enviado de Deus. Porém, Ele bem sabia que quase todos aqueles, quando o vissem preso e espancado, perderiam a fé. A decepção do povo foi grande. Jesus não era o líder triunfante que eles almejavam, era só um pobre crucificado. E rapidamente Seus milagres e Suas palavras, que haviam rasgado o coração de todos e dado sentido à vida, foram esquecidos. Assim aconteceu para que se cumprisse a profecia de Isaías: Ele desprezado e abandonado pelos homens, homem sujeito à dor, familiarizado com o sofrimento, como pessoa de quem todos escondem o rosto; desprezado, não fazíamos nenhum caso dele. E, no entanto, eram nossos sofrimentos que ele levava sobre si, nossas dores que ele carregava. Mas nós o tínhamos como vítima do castigo, ferido por Deus e humilhado. Mas ele foi trespassado por causa das nossas transgressões, esmagado por causa das nossas iniquidades. O castigo que havia de trazer-nos a paz, caiu sobre ele, sim, por suas feridas fomos curados. […] Eis por que lhe darei um quinhão entre as multidões; com os fortes repartirá os despojos, visto que entregou a si mesmo à morte e foi contado entre os criminosos, mas na verdade levou sobre si o pecado de muitos e pelos criminosos fez intercessão. (Is 53, 3-5; 12) Alguns judeus alegam que esse capítulo do livro do profeta Isaías não se refere a Jesus, mas sim ao povo de Israel. Mas está claro que não se trata do povo, mas sim de alguém que morreu para salvar este povo. Está aqui a prova: “Após detenção e julgamento, foi preso. Dentre os contemporâneos, quem se preocupou com o fato de ter sido cortado da terra dos vivos, de ter sido ferido pela transgressão do seu povo” (Is 53, 8). É interessante notar que Jesus não foi o único profeta desprezado e morto em Israel. Isaías, por exemplo, foi serrado ao meio enquanto Jeremias foi hostilizado pelo povo e perseguido até pelos seus parentes[2] e o profeta Zacarias, filho de Joiada, morreu apedrejado no pátio do templo. Vamos analisar agora, uma a uma, as principais contestações de alguns judeus à crença de que Jesus é o Messias e veremos que nenhuma delas se sustenta. “O Messias construirá o terceiro templo sagrado” Muitos judeus alegam que o verdadeiro Messias construirá novamente o templo de Jerusalém. Enquanto isso não acontece, eles seguem rezando diante das ruínas do Muro das Lamentações. Sobre isso, vejamos o que diz o livro do profeta Ezequiel: “Estabelecê-los-ei e os multiplicarei, e porei o meu santuário no meio deles para sempre. A minha Habitação estará no meio deles: eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo” (Ez 37, 26-27). O povo, naturalmente, tende a imaginar um novo templo feito com paredes de tijolo. Entretanto, o Senhor veio habitar entre nós. Ele é o Emanuel (Deus conosco). O santuário da profecia é Ele mesmo, o ungido, Aquele que carrega em si o Espírito Santo em plenitude. Veja que Jesus se referiu a si mesmo como um templo: “‘Destruí este santuário, e em três dias eu o levantarei.’ Disseram-lhe, então, os judeus: ‘Quarenta e seis anos foram precisos para se construir este santuário, e tu o levantarás em três dias?’ Ele, porém, falava do santuário de seu corpo” (Jo 2, 19-21). Portanto, Jesus cumpriu a profecia de Ezequiel, porque Ele mesmo é o santuário de Deus que permanecerá entre o povo para sempre. “O Messias levará todos os judeus de volta a Israel” Aqui, ocorre outra interpretação materialista das Escrituras. A fé judaica é algo muito mais espiritual do que material, mas nem todos conseguem enxergar isso. Quando Deus diz que reunirá todos os filhos de Israel, fazendo-os vir de todas as partes do mundo (Is 43, 5-6 e Is 11, 12), está falando de algo muito mais especial e profundo do que a mera reunião de pessoas em um território físico nacionalista. Estar junto de Deus é algo que ultrapassa qualquer fronteira. Jesus, de fato, cumpre essa profecia ao reconciliar com o Pai todos os que Nele creem. Ele reúne todos os filhos dispersos de Deus na comunhão da Igreja. “O Messias introduzirá uma era de paz mundial” “Uma nação não levantará a espada contra a outra, nem se aprenderá mais a fazer guerra”, disse Isaías (Is 2, 4). Miqueias também fez uma profecia de paz: “Ele julgará entre povos numerosos e será o árbitro de nações poderosas. Eles forjarão de suas espadas arados, e de suas lanças, podadeiras. Uma nação não levantará a espada contra outra nação e não se prepararão mais para a guerra” (Miq 4, 3). Ora, essas são profecias sobre o fim dos tempos, e não sobre a vinda do Messias. A paz virá após a grande batalha contra o mal descrita no Apocalipse. É só ler esses capítulos de Isaías e de Miqueias desde o início, nos quais fica claro que as profecias falam dos últimos dias. “O Messias curará todosos cegos e surdos” No livro do profeta Isaías (Is 42), o Senhor diz que o Messias abrirá os olhos dos cegos e libertará os presos e os que vivem nas trevas. Mais uma vez, a Escritura fala de questões espirituais, e não meramente materiais, pois a cegueira que será curada é a da alma, e não somente a dos olhos. Deus diz claramente que o cego e o surdo aos quais se refere não são outros que não o povo de Israel, seu servo, que mesmo vendo muitas coisas, nada percebeu, e mesmo abrindo os ouvidos, nada escutou (Is 42, 19-20). Além da cegueira espiritual de muitos, Jesus também curou pessoas que não enxergavam e não ouviam e apresentou essas obras como sinais aos discípulos de João Batista que estavam à espera do Messias (Lc 7, 19-22). “Com a vinda do Messias, todos crerão no Deus de Israel” Essa afirmação dos judeus se baseia em Zacarias (Zc 14, 9). Segundo eles, se Jesus fosse mesmo o Messias, a Terra inteira creria Nele, e não foi isso que aconteceu. Ok… Só que dizer que essa profecia de Zacarias se refere especificamente à vinda do Messias é forçar a barra. Como podem dizer que a vinda do Messias acabará com as guerras (Is 2, 4) e, ao mesmo tempo, levará a uma grande guerra de Javé contra todas as nações que perseguiram Israel? Não tá meio furado, isso? Veja que o citado capítulo de Zacarias promete bomba pra todo lado: Reunirei todas as nações contra Jerusalém para o combate; a cidade será tomada, as casas serão saqueadas, as mulheres violentadas; a metade da cidade sairá para o exílio, mas o resto do povo não será eliminado da cidade. Então Iahweh sairá e combaterá essas nações, como quando combate no dia da batalha. (Zac 14, 2-3) Então… se a vinda do Messias trará a paz mundial, como explicam esse pega pra capar descrito em Zacarias? “Deus não pode assumir uma forma física” Nós, católicos, cremos que Jesus Cristo é verdadeiramente Deus e verdadeiramente Homem. Porém, os judeus dizem que Deus é incorpóreo e, sendo assim, não pode nascer nem pode morrer. Como assim? Agora nós, reles seres humanos, é que diremos o que o Deus Onipotente pode ou não fazer? Tem lógica isso? Certamente Deus é puro espírito, mas se Ele decidisse se fazer homem — como de fato se fez em Jesus —, o que O impediria? Lembremos que Ele assumiu a forma de um homem e lutou contra Jacó, que afirmou ter visto Deus “face a face” (Gn 32, 31). Detalhe: não há qualquer linha nas Escrituras que fundamente a teoria de que o Messias jamais seria Deus e não teria poderes sobrenaturais. Na verdade, a Torá afirma o contrário! Em uma de suas visões, o profeta Daniel descreve o Messias com atributos divinos e humanos: Eu continuava contemplando, nas minhas visões noturnas, quando notei, vindo sobre as nuvens do céu, um como Filho de Homem. Ele adiantou-se até o Ancião e foi introduzido à sua presença. A ele foi outorgado o poder, a honra e o reino, e todos os povos, nações e línguas o serviram. Seu império é império eterno que jamais passará, e seu reino jamais será destruído. (Dn 7, 13-14) Atributos divinos: “sobre as nuvens do céu”, “adiantou-se até o Ancião”, “poder, a honra e o reino” e “todos os povos, nações e línguas o serviram”, lembrando-nos de que devemos servir, no sentido de adorar, só a Deus. Atributos humanos: apesar de ser de natureza divina, Ele tem forma humana e é como “um Filho de Homem”. Além do mais, Isaías também profetizou que o Messias seria humano — “um menino” — e divino — “porque um menino nos nasceu, um filho nos foi dado; ele recebeu o poder sobre seus ombros, e lhe foi dado este nome: Conselheiro- maravilhoso, Deus-forte, Pai-para-sempre, Príncipe-da-paz” (Is 9, 5). “A Santíssima Trindade contradiz a teologia judaica” Muitos judeus argumentam que a Santíssima Trindade “quebra Deus em três”. Nada a ver! Os católicos também creem firmemente que Deus é um só e afirmam que “as pessoas divinas não dividem entre Si a divindade única: cada uma delas é Deus por inteiro”.[3] Em Gn 18, está dito que o Senhor (um) apareceu a Abraão junto ao carvalho de Mambré. E, ao levantar os olhos, Abraão viu três homens. Taí: são três pessoas e um só Senhor. “Jesus contradiz a Torá” De todas as acusações que fazem a Jesus, essa é a mais injusta. Ele, sendo Filho de Deus, jamais poderia contradizer as palavras de Seu Pai. Ele veio para levar a lei à plenitude: “Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas. Não vim revogá-los, mas dar-lhes pleno cumprimento” (Mt 5, 17). Os acusadores buscam apoio nas curas que Jesus realizou em um sábado, o que seria pecado. Sinceramente… Ele deveria deixar de fazer o bem ao cego e ao homem com a mão atrofiada? Será mesmo que é isso que Deus quis dizer quando mandou guardar o sábado? O próprio Jesus se defende da acusação de violar o sábado, como aparece no Evangelho de Mateus 12, 1-13. “Jesus não pertencia à Tribo de Judá” O Deus de Israel prometeu que o Messias pertenceria à linhagem da tribo de Judá e seria descendente dos reis Davi e Salomão. Certos judeus dizem que Jesus, não tendo pai humano, jamais poderia ser dessa tribo. De fato, a linhagem dos hebreus se estabelecia conforme a tribo de seu pai, e não da mãe (Nm 1, 2). Porém, apesar de Jesus não ser filho de sangue de São José, Ele o era pela lei. Assim, pertencia legitimamente à tribo de Judá e era da linhagem real de Salomão, cumprindo as Escrituras. Porém, Jesus não teria, por meio de São José, direito ao trono de Davi. Afinal, São José era descendente de Salomão por meio do rei Conias, sob o qual recaiu uma maldição, pois o Senhor determinou que seus descendentes jamais reinariam em Israel (Jr 22, 30). O Messias, então, jamais poderia ter o sangue de Conias. E aqui se resolve o problema: de fato, Jesus herdou a linhagem real de Salomão somente pela lei, e não pelo sangue. Ao mesmo tempo, herdou a linhagem sanguínea de Davi por meio de sua mãe, Maria. Eis que estão cumpridas as Escrituras! Jesus é membro da tribo de Judá e descendente de Salomão pela lei e é filho de Davi pelo sangue. É, amigos… Tem jeito não: JESUS É O MESSIAS. JESUS É SÓ PAZ E AMOR? Não tem nada mais irritante do que ouvir que não temos o direito de nos irritar em hipótese alguma pelo simples fato de sermos cristãos. Eis alguns dos pontos básicos do manual de etiqueta da Madame Lili Carola: nunca levantar a voz, proferir apenas palavras doces e jamais demonstrar revolta em relação às atitudes alheias. Cá pra nós, isso tá mais pra ideologia paz e amor de hippie-maconheiro do que pra cristianismo. Muitas pessoas, é verdade, têm um temperamento irascível, são com frequência arrogantes no trato com os demais ou vivem de mau humor. Certamente, isso não é nada bom. Mas nem sempre a irritação é uma coisa censurável: se o motivo for justo, esse sentimento pode ser uma expressão de virtude. Basta olhar para o exemplo de Jesus, que, em diversas passagens do Evangelho, parece estar cuspindo marimbondos. Sente só o jeito meigo com o qual Ele se dirigia aos fariseus e aos escribas: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, que percorreis o mar e a terra para fazer um prosélito, mas, quando conseguis conquistá-lo, vós o tornais duas vezes mais digno da geena do que vós” (Mt 23, 15), “Sois semelhantes a sepulcros caiados, que por fora parecem belos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e de toda podridão” (Mt 23, 27) e “Serpentes! Raça de víboras! Como haveis de escapar ao julgamento da geena?” (Mt 23, 33). Pegou pesado, hein, Mestre… Há também o famoso episódioda expulsão dos vendilhões do templo. Em vez de tentar convencer o pessoal a respeitar o lugar sagrado, usando para isso diálogo e gentileza, Jesus simplesmente varreu todo mundo dali na base da chibatada (Jo 2, 14-16). Outra passagem muito ilustrativa é aquela em que os discípulos não conseguem curar um menino que sofria de uma grave enfermidade, provavelmente epilepsia. O pai, então, recorre a Jesus, que se mostra frustrado com a falta de fé de seus discípulos e os censura duramente diante de todos: “Ó geração incrédula! Até quando estarei convosco? Até quando vos suportarei? Trazei-o a mim!” (Mc 9, 17-19). Por que Jesus não os corrigiu de forma mais cortês? Bem, delicadeza era uma coisa bastante secundária diante do sofrimento de uma criança. O Senhor tinha uma preocupação muito urgente de libertar e aliviar a dor daquelas pessoas. Sua irritação traduzia o grande zelo que Ele nutria pela felicidade de cada ser humano, e ele cobrava energicamente que Seus discípulos (aqueles que dariam continuidade ao Seu apostolado) tivessem a mesma postura. Além do mais, depois de tudo o que eles tinham visto e ouvido, o Mestre esperava uma fé mais sólida. Porém, não podemos ser levianos e imaginar que Jesus tratava todos os pecadores na base da chicotada. Na maior parte do tempo, Ele era muito manso e amável: sentava-se à mesa para comer com prostitutas e todo tipo de gente de má fama, frequentava a casa de publicanos e, na cruz, prometeu levar um ladrão para o Paraíso. Assim, transformou o coração e a vida de muitos com a Sua doçura. O Senhor parecia ter, entretanto, pouca tolerância com a hipocrisia, com o desrespeito às coisas sagradas e com a falta de fé por parte daqueles que deveriam ser os primeiros a crer (os discípulos). Por isso, em primeiro lugar, devemos detestar essas coisas em nós e pedir que Ele nos converta a cada dia, mas não precisamos ser frescos a ponto de nos cobrarmos serenidade e simpatia em tempo integral. Ninguém tem sangue de barata. Com todo o respeito ao Profeta Gentileza (figuraça que andou pelas ruas do Rio de Janeiro entre as décadas de 1970 e 1990), gentileza gera gentileza, sim, mas às vezes uma chicotada cai muito bem. JESUS CASOU COM MARIA MADALENA? Aposto que você tem algum amigo maria vai com a mídia que já lhe alfinetou com a notícia de que teriam descoberto um manuscrito de 1.500 anos e que esta era a comprovação de que Jesus foi casado com Maria Madalena. O amigo maria vai com a mídia é assim: acredita automaticamente em tudo o que lê em sites de notícias, especialmente quando se trata de conteúdos que atacam o cristianismo. Agora, essas criaturas estão batendo pino? Primeiro juram que Jesus nunca existiu (porque um escritor americano disse isso), e, depois, de um dia pro outro, mudam de ideia e dizem que Jesus existiu, sim, e casou com Maria Madalena, e fazem isso só porque ouviram falar sobre um tal manuscrito apócrifo. Essa gente precisa se decidir! Ou bem dizem que Jesus não existiu ou bem dizem que Ele existiu e casou. Porque ficar pulando entre duas teses contraditórias não dá! Em primeiro lugar, essa polêmica é pra lá de requentada. O manuscrito em questão, chamado Ecclesiastical History of Zacharias Rheto, é conhecido há mais de duzentos anos e foi analisado por vários estudiosos que o descartaram como insignificante. A “novidade” é que dois estudiosos lançaram, em 2015, um livro intitulado The Lost Gospel [O evangelho perdido], com uma nova interpretação do manuscrito, dizendo — na verdade, inventando — que o texto traz revelações bombásticas sobre a vida privada de Jesus. Em segundo lugar, poucas pessoas se dão conta de que se trata de um “evangelho pirata” produzido quinhentos anos — quinhentos anos!!! — após a morte de Jesus! Isso me lembra tipo… uma revista de fofocas do século IV! Em terceiro lugar, note o desespero da dupla de autores desse livro: o tal manuscrito fala que um cara chamado JOSÉ casou com uma mulher chamada ASENETH e que eles tiveram filhos. Tá, e onde entram Jesus e Madalena? EM LUGAR NENHUM! Os autores simplesmente inventaram uma teoria de que os nomes José e Aseneth são códigos para se referir de modo velado a Jesus e Madalena. Em quarto lugar, um dos autores do livro, Jacobovici, é famoso por suas pesquisas pagadoras de mico! Ele também produziu um documentário sobre a tumba de Talpiot, tentando provar que Jesus não ressuscitou e teve filhos, esposa, irmãos… O vexame foi tremendo! Dezessete arqueólogos renomados desceram a lenha no documentário, entre eles Joe Zias, que classificou o filme como “cientificamente desonesto”. O arqueólogo americano William Dever disse que se tratava de um “golpe de publicidade”.[4] Em seguida, Jacobovici produziu outro documentário, para o History Channel, em que garantia ter encontrado os pregos usados na crucificação de Jesus. E levou mais um toco da comunidade arqueológica! A Autoridade de Antiguidades de Israel disse que a coisa mais comum é encontrar pregos naquela região e que as afirmações de Jacobovici não possuem embasamento em pesquisa.[5] E que ninguém venha citar o livro O código Da Vinci pra falar sobre esse assunto! É muito mico usar uma obra de ficção como fonte para estudo histórico![6] Sobre a Bíblia A BÍBLIA É CONFIÁVEL Todos nós já ouvimos alguém dizer que a Bíblia não é confiável, pois teria sido adulterada ao longo dos séculos. À primeira vista, apresenta-se diante de nós um cenário altamente desfavorável à confiabilidade dos textos bíblicos, pois os manuscritos originais foram perdidos e é provável que nem existam mais. Os livros do Antigo Testamento começaram a ser escritos há cerca de 3.400 anos, e os livros do Novo Testamento foram escritos há quase dois mil anos. Ao longo de todos esses séculos, os livros que compõem a Bíblia foram repetidamente copiados, e nem sempre os copistas fizeram um bom trabalho. Diante disso, você pode estar pensando que não dá pra pedir que um cristão confie na Bíblia… mas acalme-se e não seja apressado em seu julgamento! O texto bíblico é altamente confiável. Saindo um pouco do campo das discussões-clichê e estudando a questão mais a fundo, qualquer ateu de mente aberta verá que as evidências arqueológicas e históricas e críticas textuais tendem a confirmar a autenticidade dos textos bíblicos. Vamos analisar primeiro o Antigo Testamento e, depois, o Novo Testamento. Evidências sobre a autenticidade do Antigo Testamento Em 1947, um grupo de pastores de cabras encontrou por acaso, em uma caverna em Qumram, na Cisjordânia, às margens do Mar Morto, centenas de manuscritos. Foi uma descoberta bombástica! Esse conjunto é simplesmente a versão mais antiga que conhecemos do Antigo Testamento, escrito entre os séculos III a.C. e 70 d.C. Entre os manuscritos, havia pergaminhos e fragmentos de textos de diversos livros do Antigo Testamento, porém a peça mais impressionante foi o rolo do profeta Isaías, que contém o livro completo em aramaico. Quando os especialistas compararam os manuscritos do Mar Morto com os textos atuais da Bíblia, puderam verificar que, por mais de mil anos (!!!), os copistas reproduziram esses textos fielmente, sem qualquer alteração de sentido. O texto do Antigo Testamento que temos em mãos atualmente é, portanto, praticamente igual ao conteúdo desses pergaminhos. É claro que a descoberta, considerada por muitos como a mais importante do século XX, deixou muitos críticos ferrenhos da Bíblia — que diziam que seu texto estava bastante corrompido — com cara de pastel. Fué-fué-fué-fué-fuéeeeeee… Evidências sobre a autenticidadedo Novo Testamento Os milhares de variantes entre os manuscritos Há mais de cinco mil cópias antigas do Novo Testamento, escritas em grego, em museus e monastérios na Europa e na América do Norte. Detalhe: nenhuma delas é idêntica a outra, pois sempre muda uma palavrinha aqui, outra ali. Por cerca de 1.500 anos, a Bíblia foi reproduzida manualmente, em especial por meio do trabalho de monges copistas. Eram necessários muitos anos para se produzir um exemplar e quase sempre havia alterações (variantes), intencionais ou não, realizadas pelo copista. Alguns estudiosos do Novo Testamento afirmam que, comparando essas cópias manuscritas, podem-se encontrar entre 200 e 400 mil variantes (uooooou!). O número impressiona, mas a sua interpretação pode ser enganosa. O fato é que quase todas as variantes entre uma cópia do Novo Testamento e outra são irrelevantes. Em sua grande maioria, são ligeiras falhas de ortografia ou palavras dispostas em ordem diferente em uma frase. Tais variantes não afetam em nada a doutrina cristã, mas isso os detratores da Bíblia não dizem, é claro! Imagine o número enorme de variantes gerado pelas simples trocas de “Jesus Cristo” para “Cristo Jesus” ou para “Senhor” no Novo Testamento… Acaso isso produz qualquer impacto no sentido do texto? O parecer dos estudiosos Neste livro, a gente mata a cobra e mostra a espada Jedi! Quando dizemos que as variantes encontradas em cópias antigas da Bíblia não têm qualquer impacto na doutrina, nós nos baseamos no parecer de especialistas em crítica textual mundialmente reconhecidos. Uma explicação rápida: crítica textual é o estudo e a comparação entre antigos manuscritos com a finalidade de resgatar a versão original de um texto. Daniel B. Wallace, estudioso do Novo Testamento, observou que, embora existam cerca de 300 mil variações de texto entre essas cópias do Novo Testamento, a grande maioria das diferenças é completamente sem importância, como erros de ortografia, frases invertidas ou coisas similares.[1] A opinião desse sujeito tem peso: ele é diretor-executivo do Centro para o Estudo de Manuscritos do Novo Testamento, organização que está digitalizando todos os manuscritos conhecidos da Bíblia com a finalidade de garantir a preservação de seu conteúdo. Vejamos agora o que disse Frederic G. Kenyon, ex-diretor do Museu Britânico e ex-presidente da Academia Britânica e da Escola Britânica de Arqueologia (em Jerusalém). Tendo pesquisado papiros antigos por muitos anos, ele garantiu que “… em nenhum outro caso o intervalo de tempo entre a composição do livro e a data dos manuscritos mais antigos é tão próximo como no caso do Novo Testamento”.[2] Ainda segundo ele, “não resta nenhuma dúvida de que as Escrituras chegaram até nós praticamente com o mesmo conteúdo dos escritos originais”.[3] Bruce M. Metzger é um dos estudiosos mais influentes do Novo Testamento. Foi a ele que Bart D. Ehrman dedicou o seu best-seller O que Jesus disse? O que Jesus não disse? (falaremos sobre esse livro mais adiante), chamando-o de “meu mentor e Pai-Doutor”. Em uma entrevista, perguntaram a Metzger quantas doutrinas da Igreja estão em risco por causa das variações entre os manuscritos do Novo Testamento. Eis a sua resposta: Não sei de nenhuma doutrina que esteja em risco. […] As variações mais significativas não solapam nenhuma doutrina da Igreja. Qualquer Bíblia que se preza vem com notas que indicam as variações de texto mais importantes. Mas, como eu já disse, esses casos são raros.[4] Outra grande autoridade nesse assunto é F. F. Bruce, teólogo formado pelas universidades de Aberdeen, Cambridge e Viena. Foi professor de grego nas universidades de Edimburgo e de Leeds e depois assumiu o Departamento de História e Literatura Bíblica na Universidade de Sheffield. Aposentou-se em 1978 como professor de crítica e exegese bíblica na Universidade de Manchester. Ele, que é autor do clássico Merece confiança o Novo Testamento?, afirmou que “no mundo não há qualquer corpo de literatura antiga que, à semelhança do Novo Testamento, desfrute uma tão grande riqueza de confirmação textual”.[5] É importante notar que os pesquisadores da Bíblia têm à sua disposição fontes muito privilegiadas. Afinal, eles podem comparar os textos atuais com papiros produzidos em datas muito próximas às dos manuscritos originais. Muitos desses papiros são, provavelmente, cópias diretas dos originais, ou estão distantes, no máximo, duas gerações. Além disso, os milhares de cópias do Novo Testamento, em diversas línguas, tornam muito fácil identificar qualquer alteração relevante feita por um copista descuidado ou mal-intencionado. Porém, não é preciso ser nenhum especialista para notar a autenticidade do texto do Novo Testamento, pois há muitas evidências que podem ser verificadas por qualquer cristão por meio de um simples estudo bíblico. Os católicos adulteraram o conteúdo do Novo Testamento? Com impacto comparável ao de O código Da Vinci, o livro O que Jesus disse? O que Jesus não disse? Quem mudou a Bíblia e por quê? causou alvoroço e virou best-seller nos Estados Unidos. O autor, Bart D. Ehrman, alcançou o status de celebridade no mercado editorial americano. No livro, ele defende que os escribas fizeram alterações graves na Bíblia ao longo dos séculos, especialmente com a intenção de dar suporte aos dogmas católicos. Por isso, o acesso às palavras originais do Novo Testamento seria impossível ao homem contemporâneo. Ehrman foi apresentado no Brasil como “a maior autoridade em Bíblia em todo o mundo”. É mesmo? Quem disse? A editora e a equipe de marketing dele, ora bolas! Bem, um currículo de peso o cara tem: é PhD em teologia pela Universidade de Princeton e diretor do Departamento de Estudos Religiosos da Universidade da Carolina do Norte. Mas está bem longe de ser “o maioral”. Enfim… Vamos analisar algumas das afirmações equivocadas desse livro. Ehrman disse que a Bíblia não é infalível, pois contém muitos erros e contradições. Como exemplo, cita a passagem em que Jesus diz que Davi comeu os pães da proposição (Mar 2, 25-26) no tempo do sumo sacerdote Abiatar. Porém, em I Sam 21, 1-6 está escrito que o sumo sacerdote naquela ocasião era Aquimelec, pai de Abiatar. Essa diferença oferece algum problema para os cristãos? Não! Por duas razões: 1) Um fato narrado de forma diferente em dois livros da Bíblia não está necessariamente errado. A maioria esmagadora dessas aparentes contradições já foi exaustivamente esclarecida pelos estudiosos, mas se — ainda — não se alcançou uma solução satisfatória para uma ou outra, isso não significa que a questão é inexplicável. Durante séculos, os cientistas não compreenderam certos fenômenos facilmente explicáveis nos dias de hoje, mas nem por isso desistiram de pesquisar e alcançar a verdade. Sobre isso, Santo Agostinho explica: Se estamos perplexos por causa de qualquer aparente contradição nas Escrituras, não nos é permitido dizer que o autor desse livro tenha errado; mas ou o manuscrito utilizado tinha falhas, ou a tradução está errada, ou nós não entendemos o que está escrito.[6] 2) Quase cem por cento das discrepâncias detectadas na Bíblia não envolvem nenhum ponto da doutrina, como é o caso dessa mudança do nome do sumo sacerdote. Em geral, são contradições relativas a nomes de cidades, datas de acontecimentos etc. Enfim, detalhes sem importância. Nenhum ensinamento necessário à salvação é afetado por esses pontos de dificuldade.