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AVALIAÇÃO AMBIENTAL DE ETA´S DO ALTO E BAIXO COTIA: 
 O CUSTO DA NÃO PRESERVAÇÃO DOS MANANCIAIS 
 
Pedro José Gabriel Ferreira* 
Silvia H. Bonilla* 
Cecília M. V. B. Almeida* 
Biagio F. Giannetti* 
*Universidade Paulista - UNIP 
 
Abstract: Two Brazilian water treatment plants, located at São Paulo state, are examined from a 
biophysical perspective using the emergy environmental accounting. One of them, the Baixo Cotia plant 
treats polluted water whereas the other one, the Alto Cotia plant is located in a preserved area. The 
environmental and financial costs associated to the non-preserved water sources are evidenced by means 
of the applied methodology. Thus, the treatment derived from most polluted water reservoir showed the 
lower global efficiency as well as it was unsustainable. Results derived from the preserved water 
reservoir are comparable of literature data. The necessity of proper public polices and environmental 
education is briefly discussed from the concluding results. 
Keywords: Water treatment; emergy; preservation. 
 
1. Introdução 
 
A água é vital para os seres humanos, porém, é um recurso finito. A degradação dos mananciais 
seja pela ocupação desordenada ou pelo despejo de resíduos industriais e domésticos prejudica o 
tratamento de água na região metropolitana de São Paulo. Segundo Katsuhiko Haga (2008), 
representante chefe da JICA, a água é um recurso indispensável para a vida na terra e ele está se 
tornando cada vez mais escasso, mesmo no Brasil que detém 12% da água doce do mundo. Segundo 
Brown et al. (2010), a terra, com sua abundância de formas de vida, incluindo seis bilhões de humanos, 
está enfrentando uma séria crise de água. 
O tratamento é fundamental para que na distribuição ao consumidor final a água esteja dentro dos 
padrões de potabilidade. Existem diversos tipos de tratamento de água, porém, o utilizado na RMSP é o 
convencional, com etapas de pré-cloração, pré-alcalinização, coagulação, floculação, decantação, 
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filtração, pós-alcalinização, desinfecção e fluoretação. Após o processo de tratamento, o resíduo gerado 
é o lodo. Quanto maior a intensidade do tratamento necessário, maior a quantidade de lodo gerado. Este 
resíduo deve ser destinado de forma apropriada, pois o seu lançamento de volta aos mananciais altera a 
turbidez da água, restringe a penetração de raios solares, afetando os organismos que dependem daquele 
ambiente. A destinação incorreta também pode provocar o assoreamento e mudança das correntes, 
atingindo toda a vida aquática daquele ecossistema. 
Uma política apropriada de ocupação, desenvolvimento industrial e educação ambiental torna-se 
necessária para manter os mananciais em condições adequadas, reduzindo o custo ambiental e financeiro 
do tratamento de água, demandando menos trabalho do homem e menor quantidade de produtos 
químicos. Segundo Brown et al. (2010), nos países desenvolvidos os governos tem iniciado uma 
legislação mais cuidadosa para as questões envolvendo a água, inclusive associando diferentes custos 
para usos diferentes deste recurso. 
Para avaliar os valores da água dentro de diferentes contextos e escalas, Buenfil (2001) utilizou a 
contabilidade em emergia, onde converteu todas as entradas do sistema em uma única métrica, a 
emergia. A água é encontrada em todos os estágios dos processos biogeoquímicos, tendo diversos 
valores de emergia. Também foram avaliados por ele oito fornecedores de serviço de tratamento de água 
na Flórida. Buenfil verificou quantitativamente que a hierarquia da água na escala da biosfera é 
equivalente a da gasolina e eletricidade, portanto, seu uso deve ser realizado de acordo com o alto valor 
agregado que possui e mediante políticas adequadas. 
No presente estudo será utilizada a contabilidade em emergia para avaliar a sustentabilidade de 
dois sistemas de tratamento de água localizados no Brasil. Os dois sistemas serão comparados entre si e 
com resultados obtidos a partir de sistemas de tratamento semelhantes na Flórida (EUA), Buenfil 2001. 
Os dois sistemas em estudo, localizados em São Paulo, captam água em dois mananciais com 
condições distintas de preservação. Um deles preservado, em meio a uma reserva de mata atlântica 
(Reserva do Morro Grande – Alto Cotia) e o outro em meio a ocupação do solo desordenada, 
lançamento de esgoto clandestino e utilização inadequada dos solos (Baixo Cotia). O estudo pretende 
com isso evidenciar o custo da não preservação, a necessidade de políticas adequadas para a ocupação 
das regiões próximas aos mananciais, o desenvolvimento sustentável e a educação ambiental. 
 
 
 
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2. Objetivos 
 
São objetivos deste estudo a utilização da Síntese em Emergia para avaliar as operações de 
tratamento de água em diferentes contextos, em mananciais com características distintas de preservação, 
comparar a avaliação realizada ao trabalho de Buenfil (2001), avaliar com o auxílio de indicadores o 
custo da não preservação e operação destes sistemas e fornecer de forma científica mais uma evidência 
da necessidade de políticas adequadas para a utilização da água, preservação dos mananciais e educação 
ambiental. 
 
3. Metodologia 
 
3.1 Ferramenta analítica 
 
Ao longo do tempo o homem tem evoluído e juntamente com ele as indústrias. A partir da 
Revolução Industrial houve um aumento considerável dos impactos sobre o meio ambiente, modificando 
a relação do homem com este. O rejeito industrial atua em todos os meios da biosfera, na água doce, nos 
mares, 
na atmosfera e no solo, causando algum tipo de impacto indesejado. 
Diversas metodologias foram desenvolvidas de forma a apoiar o homem em sua tomada de 
decisão, com o objetivo de minimizar os impactos ao meio ambiente. Odum (1996) desenvolveu a 
contabilidade em Emergia, que contabiliza toda a energia necessária para a produção de um bem ou 
serviço em uma única métrica, a chamada energia incorporada ou memória energética. Esta metodologia 
converte todas as contribuições (moeda, massa, metabolismo, informação etc.) em uma única métrica, a 
Emergia, expressada em Joules de energia solar (sej). 
Para que seja possível a conversão de todos os fluxos empregados na produção de um bem ou 
serviço em emergia, a metodologia utiliza a chamada transformidade, que é a quantidade de energia 
solar empregada, direta ou indiretamente, para a obtenção de um joule deste bem ou serviço (sej/J). São 
encontradas diversas transformidades na literatura, para os mais variados tipos de insumos e produtos. 
Muitas vezes encontramos uma grande variedade de transformidades para o mesmo produto, isso pode 
demonstrar a energia mínima para obtenção de um produto ou a máxima energia necessária a partir da 
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qual não compensaria produzi-lo. No caso da transformidade da água bruta, o valor foi calculado no 
presente trabalho com base no estudo de Chen et al. (2009). 
Odum (1996) desenvolveu também os diagramas de energia de sistemas, que utilizam a 
simbologia adequada e que possibilitam a análise da entrada de todos os recursos e a saída de bens ou 
serviços. Os recursos são classificados como R (renováveis), N (não renováveis) e F (provenientes da 
economia). Determinado o fluxo de energia e selecionadas as transformidades, torna-se possível calcular 
a energia (direta e indireta) necessária para a produção de um bem ou serviço. 
Brown e Ulgiati (2002) afirmam que a sustentabilidade tem se tornado uma questão global, 
aparentemente por dois fatores: (1) consciência crescente de que os recursos renováveis têm limites; e 
(2) consciência crescente de que existem limites para a capacidade da biosfera assimilar resíduos. Ainda 
segundo Brown e Ulgiati (2002), um recente método para a avaliação, chamado contabilidade em 
emergia, utiliza a base termodinâmica de todas as formas de energia e materiais, convertendo em uma 
única forma de energia. 
A partir dos valores obtidos com a síntese em emergia,podem ser calculados indicadores: 
EYR: Rendimento em emergia indica se um processo é competitivo como fonte de energia 
primária para a economia, sendo possível compará-lo a outro, com idêntico produto. 
EYR = Y/F = (R+N+F)/F (1) 
ELR: Índice de carga ambiental identifica se no processo existe um grande estresse ambiental. 
ELR = (N+F)/R (2) 
SI: Índice de sustentabilidade é dado pela relação entre o rendimento em emergia e a carga 
ambiental. 
SI = EYR/ELR (3) 
EIR: Investimento Emergético demonstra o quanto é investido financeiramente para explorar os 
recursos naturais. 
EIR = F / (N+R) (4) 
Para a comparação entre os tratamentos distintos será utilizada uma ferramenta gráfica, o diagrama 
emergético ternário. Esta ferramenta permite comparar os processos de tratamento de água e avaliar 
melhorias, mostrando sua dependência dos recursos. Segundo Giannetti et al., 2005, a ferramenta produz 
um diagrama triangular equilátero com três variáveis associadas a porcentagens. Desta forma, a soma de 
R, N e F será sempre 100%. Pode-se representar três variáveis em duas dimensões. Cada vértice deste 
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triângulo está associado a um fluxo (R, N e F) e os lados representam combinações binárias. 
Combinações de três fluxos são representadas no interior do triângulo (Figura 1). 
 
 
Figura 1 - Diagrama emergético ternário. 
 
3.2 Apresentação dos processos em estudo 
 
O objeto deste estudo são dois processos de tratamento de água na rede metropolitana de São 
Paulo, pertencentes a estações de tratamento de água da SABESP. O sistema Cotia está inserido na bacia 
hidrográfica do Rio Cotia, com dois subsistemas produtores de água, Alto Cotia e Baixo Cotia. 
O sistema Baixo Cotia está localizado na parte inferior da bacia, tendo entrado em funcionamento 
em 1963, a partir das barragens da Isolina Superior e Inferior. A partir de 1970, com a operação da 
Rodovia Raposo Tavares, da Rodovia Régis Bittencourt e da adoção de isenções fiscais para atrair 
indústrias, a região dos mananciais foi sendo ocupada de forma desordenada. Essa ocupação, combinada 
com a falta de políticas específicas de ocupação e lançamento de esgotos, resultou na degradação deste 
manancial. A região que predominantemente vivia da cultura hortifrutigranjeira, passou a desenvolver 
outras atividades que, na falta de uma regulamentação, ocasionaram o problema citado. A Figura 2 
ilustra a ocupação atual deste manancial. 
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Figura 2 - Mapa Ocupação Cotia (Fonte: Caminhos do Rio Cotia). 
 
A Isolina Superior foi projetada para regularizar vazões e a Inferior para sobrelevar o nível da 
captação. A produção deste sistema é de 900 litros por segundo, abastecendo 460 mil moradores de 
áreas da zona Oeste de São Paulo. 
O sistema Alto Cotia foi construído entre 1916 e 1933, com operação de duas represas, Pedro 
Beitch, responsável por regularizar as vazões, e a represa da Graça, responsável por sobrelevar o nível 
da captação. O sistema aquático é totalmente preservado por uma reserva de Mata Atlântica, a água é 
transportada até a ETA Morro Grande, onde são produzidos 1000 l de água por segundo, abastecendo 
400 mil habitantes dos municípios de Cotia, Embu, Itapecerica da Serra, Embu-Guaçu e Vargem 
Grande. A localização dos dois sistemas é demonstrada na Figura 3. 
 
 
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Figura 3 - Mapa de localização dos sistemas Alto e Baixo Cotia (Fonte: Caminhos do Rio Cotia). 
 
4. Resultados e discussão 
 
Os diagramas de energia, para os dois sistemas de tratamento de água, são representados nas 
Figuras 4 e 5. 
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Figura 4 - Diagrama de Energia – Baixo Cotia. 
 
 
Figura 5 - Diagrama de Energia – Alto Cotia 
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Cada fluxo que atravessa o sistema é considerado um recurso e deve ser contabilizado. Os recursos 
localizados no lado esquerdo do diagrama são considerados renováveis (vento, insolação e chuva). Os 
recursos localizados no lado direito do diagrama são considerados pagos (produtos químicos, energia 
elétrica e mão de obra). 
A emergia total que suporta os sistemas é calculada como a soma dos recursos renováveis, não 
renováveis e pagos. A Tabela 1 mostra a emergia correspondente ao tratamento de água do Baixo Cotia. 
A Tabela 2 mostra a emergia correspondente ao tratamento de água do Alto Cotia. Elas foram 
organizadas de acordo com os três tipos de recursos, pagos (F), renováveis (R) e não renováveis (N). 
 
Tabela 1 - Avaliação em emergia correspondente ao tratamento de água Baixo Cotia. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Tabela 2 - Avaliação em emergia correspondente ao tratamento de água Alto Cotia. 
 
 
A partir das tabelas observa-se uma contribuição elevada dos recursos renováveis, representado 
pela água de superfície (7,59E+12 e 4,16E+11 sej/m³, respectivamente). O esgoto representa uma 
contribuição comparável a da água de superfície. Para o sistema Baixo Cotia, a eletricidade é a 
contribuição mais elevada dentre os recursos pagos, seguida da contribuição de produtos químicos. Para 
o Alto Cotia, a eletricidade representa o maior valor para os recursos pagos, seguido da manutenção. 
Neste caso, os produtos químicos ocupam a terceira maior contribuição. A emergia por volume 
calculada para o Baixo Cotia é aproximadamente 30 vezes maior que a emergia para o Alto Cotia, fato 
que demonstra a maior eficiência global do sistema que apresenta o manancial preservado. 
 
Tabela 3 - Indicadores de Emergia 
 
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O indicador EYR em todos os casos apresenta valores maiores que 1 (um), o que indica que todos 
os sistemas contribuem para a economia global. 
O maior valor para carga ambiental (ELR) corresponde ao sistema Hillsborough, seguido do 
sistema Baixo Cotia, o que segundo Brown e Ulgiati (1997), representa um impacto ambiental 
moderado. Nos casos do Alto Cotia e West Palm Beach, os valores menores que 2 (dois) indicam baixo 
impacto. 
O índice de sustentabilidade (SI) demonstra que os sistemas Baixo Cotia e Hillsborough são 
insustentáveis, enquanto os dois restantes apresentam sustentabilidade em curto prazo, segundo critérios 
de Brown e Ulgiati (2002). 
O índice EIR oscila entre 0,79 e 3,11, mostrando diferentes aproveitamentos do investimento 
realizado em cada um dos sistemas. 
O diagrama ternário da Figura 6 ilustra os pontos que representam cada sistema. O diagrama 
permite visualizar algumas das observações apresentadas e discutidas nos indicadores. 
 
Figura 6 - Diagrama Emergético ternário representando os sistemas: (1) Alto Cotia; (2) Baixo Cotia; (3) 
West Palm Beach; (4) Hillsborough. 
 
5. Conclusões 
 
Foi observado que o sistema Baixo Cotia, que capta água de um manancial não preservado, 
apresenta impacto ambiental elevado em comparação ao sistema Alto Cotia. O sistema de tratamento 
Baixo Cotia apresenta uma eficiência global muito inferior, se comparado ao sistema que capta água de 
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um manancial preservado. Esta é mais uma evidência, porém científica, do custo da não preservação e 
da necessidade de políticas adequadas de preservação e educação ambiental. Embora alguns sistemas 
captem água de melhor qualidade, isso não representa um excelente desempenho do ponto de vista da 
sustentabilidade ambiental, o que pode sugerir a necessidade de um estudo a respeito da troca de 
tecnologia de purificação. 
 
6. Agradecimentos 
 
Agradecemos ao gerente de Departamento de Tratamento de Água Metropolitana da SABESP, 
Marcio Savoia Coelho, pela cordialidade e viabilização na obtençãodos dados das ETA´s, à Sheila 
Gozzo Câmera Rodrigues, da Divisão das ETA´S Baixo Cotia e Alto Cotia, pelo encaminhamento dos 
dados, e à Cristina Oka, coordenadora SELVA, pela disponibilização da cartilha Caminhos do Rio 
Cotia. 
 
Referências bibliográficas 
 
BEU, S. E. Caminhos do Rio Cotia, 2008. 
BUENFIL, A. A. Emergy Evaluation of Water. 2001. Tese – Universidade da Flórida, EUA. 
BROWN, M. T.; MARTINEZ, A.; UCHE, J. Emergy analysis applied to the estimation of the recovery 
of costs for water services under the European Water Framework Directive. Ecological Modelling, v. 
221, p.2123-2132, 2010. 
BROWN, M. T.; ULGIATI, S. Emergy-based índices and ratios to evaluate sustainability: monitoring 
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BROWN, M. T.; ULGIATI, S. Emergy evaluations and environmental loading of production systems. 
Journal of Cleaner Production, v. 10, p. 321-334, 2002. 
CHEN, D.; CHEN, J.; LUO, Z.; LV, Z. Emergy evaluation of the natural value of water resources in 
Chinese Rivers. Environmental Management, v. 44, p. 288-297, 2009. 
GIANNETTI, B. F.; BARRELLA, F. A.; BONILLA, S. H.; ALMEIDA, C. M. V. B. Aplicações do 
diagrama emergético triangular na tomada de decisão ecoeficiente. Produção, v. 17, n. 2, p. 246-262, 
2007. 
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ODUM, H. T. Environmental Accounting – Emergy and Environmental Decision Making. ED. John 
Wiley and Sons Ltd, 370, 1996. 
 
 
 
 
Tipo de Produção: Anais em CD 
 
 
Título do Texto: Avaliação Ambiental de ETA’s do Alto e Baixo Cotia: O Custo da Não 
Preservação dos Mananciais 
Autores: P. J. G. Ferreira, S. H. Bonilla, C. M. V. B. Almeida, B. F. Giannetti 
 
 
Título do Meio de Publicação: III Simpósio Intercâmbio Brasil-Japão em Sustentabilidade: 
Um Desafio da Humanidade 
 
 
Local da Publicação: Campo Grande-MS - Brasil 
Mês e Ano da Publicação: 8 a 12 outubro de 2010 
 
 
Página inicial e página final: 1-8 
 
 
Apresentação: Houve 
 
 
Área de Concentração: Gestão de Sistemas de Operação 
Linha de Pesquisa: Produção Mais Limpa e Ecologia Industrial 
Projeto de Pesquisa: Produção Mais Limpa e Ecologia Industrial: Avaliação Multicritério de 
Sistemas 
 
 
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