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DIAGNÓSTICO E DESISTÊNCIA NA PSICOTERAPIA PSICANALÍTICA (4)

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UNIVERSIDADE JOSÉ DO ROSÁRIO VELLANO – UNIFENAS BRENO DAMASCENO DA SILVA1
DIAGNÓSTICO E DESISTÊNCIA NA PSICOTERAPIA PSICANALÍTICA: EXPERIÊNCIAÇÕES EM UMA CLÍNICA ESCOLA
VARGINHA-MG 2022
BRENO DAMASCENO DA SILVA2
DIAGNÓSTICO E DESISTÊNCIA NA PSICOTERAPIA PSICANALÍTICA: EXPERIÊNCIAÇÕES EM UMA CLÍNICA ESCOLA
Trabalho apresentado ao Curso de Formação em Psicologia, da Universidade José do Rosário Vellano, como requisito à aprovação no estágio Clínica Psicanalítica.
Orientador: Prof. Ms. Silvio Memento
VARGINHA - MG 2022
1. INTRODUÇÃO
A partir da experiência desde do sétimo semestre, enquanto estagiário da Clínica Escola de Psicologia, da Universidade José do Rosário Vellano, pode-se perceber uma frustração em comum entre os demais estagiários que compõe o serviço-escola de Psicologia da mesma instituição: desistência do processo psicoterapêutico (lê-se analítico), e consequentemente, o não fechamento do diagnóstico diferencial.
Esse último, por sua vez, é considerado imprescindível quando inferida na perspectiva psicanalítica, dado que Freud fez fortes recomendações a antes de começar o trabalho analítico propriamente dito, estabelecer um diagnóstico. Na realidade experimental de uma clínica escola, essa pré- condição tende a ser abalada, quiçá excêntrica, em especial pelo fator mencionado acima, de desistência e/ou não continuidade dos atendimentos.
No artigo “Momentos distintos no abandono da psicoterapia psicanalítica” de Simone Isabel et. al. (2013), a mesma enfatiza que em cada cinco pacientes que iniciam tratamento, um interrompe antes de seu término. Ainda, destaca uma estatística nacional, que mostra os índices de interrupção, apresentando uma variação entre 38,21% e 49,5%. Desse modo, a autora conclui “que o abandono da psicoterapia é um fenômeno que ocorre em diferentes abordagens de tratamento, idades e grupo diagnósticos, sua compreensão é um problema e desafio para clínicos e pesquisadores (JUNG et. al., 2013, p. 134).
Não somente, Simone Isabel juntamente de demais organizadores (2015), completou os seus estudos com o artigo “Desistência e Conclusão em Psicoterapia Psicanalítica, um estudo qualitativo de pacientes de Porto Alegre, Brasil”, o qual estrutura hipóteses para os complexos fenômenos de desistência e conclusão da psicoterapia psicanalítica em um curso de pós- graduação.
Partindo desse exposto, apresentarei sucintamente a seguir algumas reflexões em torno do diagnóstico em psicanálise, especificamente no que diz
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respeito à realidade do abandono do processo psicanalítico vivenciado em uma clínica escola de Psicologia.
2. DIAGNÓSTICO EM PSICANÁLISE
Ao mencionar a terminologia “diagnóstico”, automaticamente associa-se com o diagnóstico psiquiátrico, o qual é comumente construído nas clínicas médicas, por meio de uma classificação, uma lista de sintomas e critérios apresentados por órgãos oficiais. Porém, diferente deste, a clínica psicanalítica apresenta outra concepção em torno do diagnóstico, não sendo realizada objetivamente e diretamente, baseada em um conjunto de sinais previamente estabelecidos ou relacionados a alguma doença e/ou distúrbio.
Nesse viés, destaca-se que a psicanálise concebe o diagnóstico enquanto orientação para a continuidade do tratamento. Essa afirmativa corrobora com que Freud (FREUD, 1895/1974, p. 312) afirma na passagem referenciada:
é muito difícil formar uma opinião exata de um caso antes de submetê-lo a uma análise aprofundada. Entretanto, é antes mesmo de conhecer o caso detalhadamente que nos vemos obrigados a estabelecer um diagnóstico e determinar o tratamento. (FREUD, 1895/1974, p. 312)
Para isso, faz-se necessário que o sujeito diga, expresse, manifeste os seus conteúdos inconscientes e subjetivos. Somente assim, a causa será o sujeito e o diagnóstico não estará atrelado a objetividade, mas sim, na constituição e “objetividade” do sujeito. Em suma, entende-se que o sintoma freudiano acontece na medida em que é trazido e falado. Um segundo passo, na tangente do diagnóstico, dentro da clínica psicanalítica, é a verificação da posição que o sujeito possui em relação ao sintoma e localizar o seu dizer dentro dessa dimensão. Trata-se, conquanto, de localizar o sujeito para surgir às variações da sua posição subjetiva.
Tais pontos supracitados podem ser formulados na realização das entrevistas preliminares, as quais Freud postulou como essencial dada o
intervalo temporal das sessões prévias para o início da análise propriamente dita. Desse modo, as entrevistas preliminares visam, conforme Freud (1912/1996) afirma no texto “Sobre o inicio do tratamento”, modificar a queixa em sintoma, estruturar o diagnóstico diferencial, especialmente entre neurose e psicose, fornecer ao analista conhecimento de causa do paciente, analisar se é viável, ou não, o início da análise, e, finalmente, estabelecer a transferência, que é um instrumento impar na condução do tratamento.
O diagnóstico diferencial sustenta-se no registro do simbólico, com a composição dos três modos de negação do Édipo, e referente a três estruturas clínicas: neurose, psicose e perversão. Na obra "Neurose, psicose e perversão" (FREUD, 1924/2016) a definição dessas terminologias da psicopatologia psicanalítica aparece como respectivamente "definidas pela prevalência, ou mesmo pela exclusividade, em cada uma delas, do recalque [Verdrängung], da rejeição ou forclusão [Verwerfung], ou da recusa ou desmentido [Verleugnung]." (p. 6).
Posto isso, conclui-se que o diagnóstico diferencial, na clínica psicanalítica, não pretende rotular, mas sim, constatar uma expressão psíquica do sujeito analisado. E, para que ocorra o diagnóstico é necessária a fala, consequentemente, a escuta do paciente. Sendo então, um momento de parceria entre analisado e analista. Quando não ocorre a associação livre, dificilmente é possível chegar à hipótese diagnóstica psicanalítica. Realidade esta vivenciada por muitos estagiários de Psicologia da Clínica Escola, conforme mostrará a seguir.
3. DESISTÊNCIA NA PSICOTERAPIA PSICANALÍTICA
Um aspecto continuamente identificado como rotineiro nas experiências de estágio na Clínica Escola de Psicologia é o abandono psicoterapêutico. O abandono implica a situação de interrupção do tratamento sem dada a alta por parte do terapeuta. Ao buscar arcabouço teórico sobre o tema, encontra- se um estudo sobre a incidência da psicoterapia psicanalítica com uma
amostra de 34 pacientes de uma clínica escola e a constatação de que apenas cinco pacientes concluíram o tratamento. (JUNG et. al., 2013, p. 134).
Em virtude disso, percebe-se uma correlação do presente relato de experiência em uma Clínica Escola de Psicologia com o levantamento estatístico de Jung, Nunes e Eizirik, também realizado em uma Clínica Escola (2013, p. 134). Por intermédio da investigação realizada por esses autores, pode-se identificar uma variável comum entre os participantes da pesquisa e os fatores associados à desistência, destacando “a aliança terapêutica, capacidade de atingir insights, status socioeconômico, o nível educacional, expectativas dos pacientes, diagnóstico psiquiátrico, motivação, entre outros.” (JUNG et. al., 2015, p. 28).
Quando enlaçada essa perspectiva com a reflexão proposta por Freud, adentramos naquilo que ele elenca como o problema do fim da análise, trabalhado no seu texto intitulado “Análise terminável e interminável”, de 1937. Aqui, Freud revela não apenas uma preocupação com as saídas antecipadas, como também, com as análises intermináveis. No mesmo texto fez questão de alinhar as especificidades do término do tratamento psicanalítico, conforme referenciado a posteriori:
Durante os primeiros anos de minha prática analítica, eu tinha extrema dificuldade em persuadir os doentes a prosseguirem em sua análise. Esta dificuldade deixou de existir há muito tempo e, agora, esforço-me ansiosamente por obrigá-los a parar o tratamento. (FREUD, 1937, p. 15)
Freud clarificou que tanto o paciente saindo cedo oudemasiadamente tarde do processo analítico, o paciente evidencia uma defasagem entre a sua própria percepção subjetiva e o ideal fim de análise de acordo com a lógica do tratamento.
O que se quer dizer pela expressão ambígua “término de uma análise”? De um ponto de vista prático, é fácil responder. Uma análise termina quando analista e paciente deixam de encontrar-se para a sessão analítica. Isso acontece quando duas condições foram aproximadamente preenchidas: em primeiro lugar, que o paciente não mais esteja sofrendo de seus sintomas e tenha superado suas ansiedades e inibições; em segundo, que o analista julgue que foi tornado consciente
tanto material reprimido, que foi explicada tanta coisa ininteligível, que foram vencidas tantas resistências internas, que não há necessidade de temer uma repetição do processo patológico. Todo analista já terá tratado de alguns casos que apresentaram esse gratificante desfecho. (FREUD, 1937, p. 250-1)
No que concernem os fatores que podem dificultar a continuidade do tratamento, Freud propõe a seguinte reflexão: “Em vez de se indagar como se dá uma cura, deveria se perguntar quais são os obstáculos que se colocam no caminho de tal cura” (FREUD, 1937, p. 252). Para ele, os obstáculos podem girar em torno de fatores de ordem constitucional e acidental, alteração do ego, a precocidade das fixações, o fator quantitativo.
Há, portanto, correlação com os apontamos estatísticos levantado por Jung, Nunes e Eizirik (2013). O obstáculo subjetivo, mediante a resistência, infere na continuidade das etapas da proposta freudiana, impossibilitado a associação livre, o diagnóstico diferencial e a transferência. Não somente, a resistência em aprofundar na análise demonstra uma dificuldade do funcionamento simbólico e confrontam o analista, nesse caso, o estagiário em experiência, com uma inércia desafiadora de romper. Segundo Jung, Nunes e Eizirik (2015, p. 35) “diminuir essa lacuna é ainda um desafio”.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar das limitações de trabalhos e pesquisas referentes ao tema de abandono na clínica psicanalítica, os estudos supracitados foram essenciais para a formulação do presente trabalho. Cabe também mencionar que este trabalho é fruto de uma experiência naturalística e representa o que ocorre efetivamente no dia a dia das Clínicas Escolas de Psicologia, sobretudo, pelo viés da abordagem psicanalítica.
Considera-se relevante ressaltar que os obstáculos no tratamento analítico são vários, como por exemplo no atendimeto de Ester, solicitou atendimento e se fez presente na fila de espera, quando chegado sua vez consegui atende_la somente duas vezes, apos esses encontros abandonou a psicoterapia ,fazendo com que nao se valesse para possivel diagnostico. Nao diferente com Eduardo , que frequentou os atendimentos , mas apos alguns encontros nao rertornou, recebendo apenas um recado de sua esposa dizendo que nao iria mais, esposa essa que se fez presente em todos os relatos e queixa principal. 
formação do aluno de Psicologia e com uma gama significativa de resistência por parte dos analisados a continuar em um processo psicoterapêutico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREUD, Sigmund. (1893-1895). Estudos sobre a histeria. In: Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. v. II. Rio de Janeiro: Imago, 1974.
 	. (1912). Sobre o Início do tratamento. Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996. v. XII
 	. (1924-2016). Neurose, Psicose e Perversão. Obras Incompletas de Sigmund Freud, vol. X. Autêntica, 2016.
 . (1937). Análise terminável e interminável. In: Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. v. XXIII. Rio de Janeiro: Imago, 1975. p. 239-87.
JUNG, S. et. al. Desistência e Conclusão em Psicoterapia Psicanalítica, um estudo qualitativo de pacientes de Porto Alegre, Brasil. Revista Brasileira de Psicoterapia: Volume 17, número 1, 2015. Disponível em:
<https://lume.ufrgs.br/handle/10183/201831>. Acesso em 23 junho 2022.
JUNG, S. et. al. Momentos distintos no abandono da psicoterapia psicanalítica. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 2014. Disponível em: < https://www.scielo.br/j/jbpsiq/a/QDNdrXC38pF5NhxR33xVKbB/abstract/?lang= pt>. Acesso em 23 junho 2022.

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