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Hiponatremi� Conceitos Iniciais Distúrbio eletrolítico mais encontrado em pacientes hospitalizados (20% de prevalência) Definido como sódio abaixo de 135 mEq/L Natremia normal = 135-145 mEq/L (principal determinante da osmolaridade) Osmolaridade normal = 275-290 mEq/L Osmolaridade plasmática = 2(sódio) + (glicose)/18 + (uréia)/6 Osmolaridade efetiva (tonicidade) = 2(sódio) + (glicose)/18 (Considera apenas os solutos que exercem efeito osmótico entre os compartimentos extra e intracelular, ou seja, aqueles que não passam livremente pela membrana) Mecanismos de regulação da osmolaridade ● ADH (vasopressina) - Hormônio produzido no hipotálamo e liberado pela neuro-hipófise em resposta a variações da osmolaridade(também pode ser liberado em resposta a redução do volume sanguíneo por um mecanismo mediado por barorreceptores). Age no túbulo coletor, estimulando a incorporação de aquaporinas na célula tubular, permitindo a reabsorção de água livre e concentração da urina. ● Sede - Valores de osmolaridade aumentada estimulam o comportamento de sede. Os distúrbios da concentração do sódio (hiponatremia e hipernatremia), na verdade, representam distúrbios no manejo da água corporal. Hiponatremia hipovolêmica Resulta do aumento da secreção de ADH por mecanismo não osmótico (barorreceptor dependente) em resposta a perda primária de volume sanguíneo Pode ser subdividida em: ● Hiponatremia hipovolêmica com sódio urinário baixo (Na<20 mEq/L) - Perda extrarrenal de volemia (vômitos, diarreia e hemorragia) provoca reabsorção tubular de sódio. Ou seja, temos uma hiponatremia secundária à insuficiência renal pré-renal. ● Hiponatremia hipovolêmica com sódio urinário alto (Na>40 mEq/L) - Ocorre nas síndromes perdedoras de sal por via renal ○ Diuréticos tiazídicos ○ Hipoaldosteronismo ○ Síndrome cerebral perdedora de sal - Ocorre na primeira semana após uma lesão cerebral grave, sendo decorrente de hiperativação simpática (Natriurese pressórica) e secreção anormal de peptídeo natriurético cerebral Hiponatremia hipervolemica Resultam do aumento da água corporal, como ocorre no edema e no acúmulo de líquidos em serosas (ascite, derrame pleural e pericárdico) ● ICC e cirrose hepática - Nessas doenças ocorre uma redução do volume arterial efetivo, já que o sangue fica aprisionado no sistema venoso e interstício, isso induz o aumento do ADH. ● Insuficiência renal - Compromete a capacidade de eliminar água livre Hiponatremia Normovolêmica com Diurese Hipertônica Resulta da perda da capacidade renal de excretar água livre, devido hipersecreção de ADH O acúmulo de água livre não provoca aumento da volemia (na verdade provoca aumento, mas é momentâneo), pois este é prontamente compensado pela liberação de peptídeo natriurético atrial, aumentando a excreção de sódio (>40 mEq/L) e uréia. ● Insuficiência suprarrenal secundária - O cortisol exerce feedback negativo sobre a produção de ADH, dessa forma, o hipocortisolismo provoca aumento no ADH (OBS: na insuficiência adrenal primária também ocorre hiponatremia, mas na forma hipovolêmica, já que há hipoaldosteronismo associado) ● Hipotireoidismo - Mecanismo pouco compreendido ● Síndrome da antidiurese inapropriada (SIAD) ○ Produção ectópica de ADH (CA de pulmão) ○ Secreção induzida por drogas (clorpropamida, carbamazepina, neurolépticos, ocitocina, antineoplásicos e ecstasy) ○ Ajuste do osmostato hipotalâmico (pacientes desnutridos) ○ Doenças neurológicas - TCE, HSA, meningite, abscesso, tumor hipotalâmico ○ Secção incompleta do pedículo hipofisário (ADH fica “vazando” a partir dos axônios da neurohipófise) ○ Doenças pulmonares - Sobretudo Legionelose ○ Presença de outro fator antidiurético não identificado ○ Pós-cirúrgico ● Hiponatremia induzida pelo exercício - O exercício prolongado provoca aumento do ADH ao mesmo tempo em que provoca vasoconstrição na circulação esplâncnica. Ao término da atividade, a circulação esplâncnica é reperfundida, provocando absorção maciça de água ingerida pelo indivíduo durante a atividade, nesse momento, o ADH ainda permanece aumentado, provocando retenção dessa água e consequente hiponatremia. Hiponatremia normovolêmica com diurese hipotônica Cursa com osmolaridade urinária apropriadamente baixa (<100 mOsm/L), em vista que a osmolaridade plasmática também está baixa. ● Polidipsia primária - Pacientes psiquiátricos com potomania (ingestão de água superior a 16L excede a capacidade renal de eliminar água livre) ● Cirurgia de ressecção transuretral de próstata - Cirurgia que exige a instilação de grande quantidade de líquidos isotônicos (manitol) ou hipotônicos (glicina, sorbitol) a fim de lavar a bexiga. ● Alcoolismo e desnutrição proteico-calórica Hiponatremia não Hipotônica Todas as hiponatremias citadas anteriormente são hipotônicas, as hiponatremias não hipotônicas são tidas como exceção. Hiponatremia causada pelas sindromes hiperglicemicas do diabético (cetose e estado hiperosmolar não cetótico) - O aumento da glicemia eleva a osmolaridade plasmática, diluindo o sódio, sendo necessário calcular o valor do sódio corrigido) Outras causas são infusão de manitol hipertônico (tratamento do edema cerebral) Cálculo do sódio corrigido - Cada 100 pontos de aumento de glicemia representa um aumento de 1,6 na glicemia Exemplo: ● Paciente com sódio de 132 mEq/L e glicemia de 600 (500 pontos acima de 100 mg/dL ● Sódio corrigido = 132 + (5 x 1,6) = 140 ● Com o sódio corrigido verificamos que o paciente não possui hiponatremia hipotônica, não precisando repor sódio. Pseudo-hiponatremia Artefato técnico decorrente do método espectrofotométrico de medição do sódio, no qual a hiperlipidemia e a hiperproteinemia (mieloma múltiplo) podem enganar o aparelho. Diagnóstico Etiológico das Hiponatremias Bioquímica Urinária Manifestações Clínicas Hiponatremia Aguda ● Começa a se manifestar em casos de queda aguda para um valor inferior a 125 mEq/L (em indivíduos sem lesões neurológicas) e 130 mEq/L (em indivíduos idosos ou portadores de lesões neurológicas preestabelecidas) ● O estado hipo-osmolar provoca edema celular, sendo mais proeminente nos neurônios (edema cerebral citotóxico) levando a sinais e sintomas que constituem a encefalopatia hipo-osmolar: ○ Cefaleia ○ Náuseas/vômitos ○ Cãibras musculares ○ Sonolência ○ letargia ○ Fasciculações ○ Hiporreflexia ○ Rigidez ○ Nistagmo ○ Ataxia ○ Distonias ○ Sinais piramidais focais ○ Na hiponatremia aguda grave (110-115 mEq/L) - Crise convulsiva, estupor, coma, hipertensão intracraniana, herniação cerebral, apneia. Hiponatremia crônica (>48 horas): ● Podem se apresentar completamente assintomáticos, até mesmo com níveis séricos de sódio muito baixos (110 mEq/L). ● Isso ocorre por que os neurônios sofrem adaptação osmótica, nesses casos a correção deve ser cuidadosa ● O aumento abrupto do sódio pode precipitar a desidratação neuronal. Além disso, pode causar disfunção da barreira hematoencefálica, permitindo a entrada de componentes do sistema imune, os quais atacam os oligodendrócitos, provocando desmielinização (mielinólise pontina) Imagem de RNM mostrando a mielinólise pontina. Tratamento Hiponatremia Hipovolêmica ● Reposição volêmica - Soro fisiológico 0,9% ● Síndrome cerebral perdedora de sal - Após a normalização volêmica pode-se aumentar o aporte de sal na dieta ou usar fludrocortisona (análogo da aldosterona) Hiponatremia Crônica Assintomática Normovolemica ou Hipervolemica ● Remover fatores causais - Medicamentos (inibidores da recaptação da serotonina, anticonvulsivantes, carbamazepina e diuréticos tiazídicos), insuficiência supra renal e hipotireoidismo ● Restrição hídrica - A intensidade da restrição é calculada com base na razão entre eletrólitos na urina e eletrólitos no plasma (sódio urinário + potássio urinário/sódio plasmático) ○ Razão > 1 (urina muito concentrada, ou seja, pouca capacidade de eliminar água livre, demandando restrição mais agressiva) - < 500 ml/dia ○ Razão = 1 - 500 a 700 ml/dia ○ Razão < 1 - < 1 L/dia ● Furosemida - Pode ser utilizado noscasos em que a restrição hídrica não foi resolutiva ● Pacientes com SIAD ○ Restrição hídrica + ingestão de sódio, já que na SIAD induz a perda renal de sódio (restrição hídrica isolada pode causar hipovolemia nesses pacientes) ○ Nos casos refratários pode-se utilizar a ureia 30g/dia na dieta ○ Se mesmo com a ureia, o paciente não melhorar, pode-se usar os bloqueadores do receptor de vasopressina (vaptanos) ○ Alternativa aos vaptanos (são muito caros) - Demeclociclina e carbonato de lítio, essas medicações dessensibilizam o túbulo coletor a ação do ADH. ● Portadores de quadros edematosos (ICC, cirrose hepática e insuficiência renal) - Restrição hídrica + furosemida Hiponatremia Aguda Sintomática Nesses pacientes realiza-se a reposição de sódio: ● Solução de escolha - NaCl a 3% ● Aumentar a natremia em 3-6 mEq/L (geralmente 3 mEq/L) nas primeiras 3 horas ● Após isso, elevar a natremia em 8 -12 mEq/L até completar 24 horas (elevação máxima de 12 mEq/L em 24 horas) ● Cálculo da reposição - Deve ser feito meticulosamente, visando evitar possíveis complicações (mielinólise pontina) ○ Volume de solução (Na a 3%) = Déficit de sódio ÷ 17 (cada grama de sódio representa 17 mEq) x 100 ÷ 3 ○ Déficit de sódio = Água corporal (0,6 x peso para homens / 0,5 x peso para mulheres) x variação desejada de sódio ● Em pacientes portadores de SIAD, ICC ou cirrose hepática deve-se iniciar furosemida 20 mg EV antes de repor o sódio (visando uma osmolaridade urinária <300 mOsm/L, para tornar a reposição mais eficaz) ● Realizar monitorização seriada (a cada 2-4 horas) ● Caso a natremia aumente acima dos níveis de segurança pode-se usar solução hipotônica (Soro glicosado 5% 6 mL/kg em 2 horas) e desmopressina (2 UI IV ou SC a cada 6 horas, podendo aumentar para 4 UI em pacientes refratários) Algoritmo de Tratamento das Hiponatremias Referência Medcurso 2022 - Nefrologia - Volume 3