Prévia do material em texto
A TEORIA DA DEPENDÊNCIA E SUA VERSÃO MARXISTA Wendell da Costa Magalhães Bacharel e Mestre em Economia pela Universidade Federal do Pará – UFPA Vânia Bambirra Ruy Mauro Marini Theotonio Dos Santos Com a Teoria da Dependência, segundo DOS SANTOS (2015, p. 26): Abria-se o caminho para compreender o desenvolvimento e o subdesenvolvimento como resultado histórico do desenvolvimento do capitalismo como um sistema mundial que produzia ao mesmo tempo desenvolvimento e subdesenvolvimento. Segundo Magnus Blomstrom e Bjorn Hettne (1984), existiam dois antecedentes imediatos para o enfoque da dependência: • A crítica ao eurocentrismo implícito na teoria do desenvolvimento; • O debate latino-americano sobre o subdesenvolvimento. PARADIGMA MODERNIZANTE VS. ENFOQUE DA DEPENDÊNCIA 4 (QUATRO) IDEIAS CENTRAIS DA ESCOLA DA DEPENDÊNCIA: 1) O subdesenvolvimento está conectado de maneira estreita com a expansão dos países industrializados; 2) O desenvolvimento e o subdesenvolvimento são aspectos diferentes do mesmo processo universal; 3) O subdesenvolvimento não pode ser considerado como a condição primeira para um processo evolucionista; 4) A dependência não é só um fenômeno externo, mas ela se manifesta tamabém sob diferentes formas na estrutura interna (social, ideológica e política). Segundo Martins (2011), o diferencial e a superioridade das Teorias da Dependência estava em conceber o desenvolvimento e o subdesenvolvimento como conjugados no espaço e no tempo de expansão de uma mesma economia-mundo. Por esse prisma, o desenvolvimento do capitalismo estabelecia uma divisão internacional do trabalho hierarquizada, composta por classes e grupos sociais articulados em seu interior, mas podendo pertencer a estruturas jurídico político distintas. A circulação de capitais e mercadorias engendradas por essa divisão do trabalho, por sua vez, era comandada pelos monopólios tecnológicos pertencentes aos países industrializados que, com isso, subordinavam os países dependentes, impondo que adaptassem seu aparato comercial, produtivo e financeiro à melhor dinâmica daquela circulação. Aquilo que antes fora considerado subdesenvolvimento, portanto, no sentido de ausência de desenvolvimento, de atraso ou etapa para alcançar um patamar e status de desenvolvido, passa a ser visto como o desenvolvimento de uma trajetória subordinada, portanto dependente, dentro da economia mundial. TEORIA MARXISTA DA DEPENDÊNCIA (TMD) O acúmulo de contradições dentro do projeto nacional-democrático burguês, o qual, no Brasil, tem como desfecho o golpe de Estado civil-militar de 1964, consolida este país na rota do desenvolvimento dependente, apoiado no capital internacional e num ajuste estratégico com o sistema de poder mundial. É nesse cenário e envolta nele, na tentativa de explicá-lo, que nasce e se estabelece a Teoria Marxista da Dependência (TMD). PRECEDENTES TEÓRICOS DA TMD • Obras de Marx e Engels; e a (s) Teoria (s) do Imperialismo desenvolvida (s) por Lenin, Rosa de Luxemburgo, Bukhárin, Hilferding entre outros; • Crítica à (s) Teoria (s) do Desenvolvimento. Vânia Bambirra (2013) diz que a TMD surge para substituir a Teoria do Desenvolvimento, por razões que dizem respeito ao fracasso da concepção tradicional de desenvolvimento em dar conta dos novos fatos que despontavam na realidade naquele momento. Novos fatos estes que encontravam sua razão de ser, sobretudo, na penetração do capital estrangeiro na região latino-americana, a qual era produto do fenômeno a que a autora chama de integração monopólica mundial. Segundo Marini ([1990] 2011b, p. 63-64), no entanto: [...] a teoria da dependência tem suas raízes nas concepções que a ‘nova esquerda’ [filiada ao Marxismo-Leninismo] elaborou, para fazer frente à ideologia dos partidos comunistas. A Cepal só se converteu também em alvo na medida em que os comunistas [se apoiaram] nas teses cepalinas da deterioração das relações de troca, do dualismo estrutural e da viabilidade do desenvolvimento capitalista autônomo, para sustentar o princípio da revolução democrático- burguesa, antiimperialista e antifeudal, que eles haviam herdado da Terceira Internacional. Independentemente da TMD surgir para substituir a Teoria do Desenvolvimento, como fala Bambirra (2013), ou para fazer frente à ideologia dos partidos comunistas, como é a posição de Marini ([1990] 2011), Dos Santos (2015) aponta que, para esta surgir, primeiramente parte da esquerda latino- americana teve de se dar conta da inviabilidade de esperar ou mesmo apoiar uma revolução burguesa no país, seja essa revolução burguesa sendo conduzida pela própria burguesia industrial, seja sendo conduzida pelo operariado, como de fato se dividiam internamente as opiniões e os apoios na esquerda. Esse debate atinge seu auge durante as décadas de 1950 e 1960, tendo seu ponto de inflexão com a incorporação da questão do capital internacional e do papel do imperialismo. A Teoria Marxista da Dependência (TMD) situa a evolução econômica latino- americana dentro da expansão do capitalismo mercantil europeu, particularmente português e espanhol, que se verá, posteriormente, substituído pelo capital manufatureiro e, logo depois, industrial holandês, francês, inglês e norte-americano. Segundo Dos Santos (2015, p. 78, grifo nosso): Foi necessária ainda uma revisão profunda no enfoque de nossa história, procurando mostrar que as relações escravistas e servis foram estabelecidas pelo capital comercial, que se combinou posteriormente com os interesses do capital industrial moderno, que necessitava de matérias-primas e de produtos agrícolas a preços baixos. Gerou-se então um tipo de servilismo e de escravismo modernos, muito diferente do escravismo clássico ou do regime servil feudal. Era necessária uma rediscussão profunda sobre o passado pretensamente feudal da região. André Gunder Frank, sociólogo e economista alemão, radicado nos Estados Unidos e teórico da dependência, por sua vez, elaborou o que pode ser considerada a crítica mais radical à visão de uma economia feudal na região, propondo no lugar que o que aqui houve foram modalidades de expansão do capitalismo comercial, e depois do capitalismo industrial. Formulando sua teoria dessas relações internacionais, propunha que a penetração do capital internacional na região, no lugar de colaborar com seu desenvolvimento econômico, aprofundava sua colonização através da brutal extração de excedentes para o exterior desde as regiões mais distantes, passando pelas centralizações locais, regionais e nacionais, para terminar nas mãos do capital internacional. Quanto aos autores da TMD, diz Luce (2018, p. 10, grifos nosso): Theotonio dos Santos descobriu a categoria dependência e cumpriu um papel de organizador do grupo e de elaboração do programa de investigação sobre a dependência, no período do Ceso [Centro de Estudios Socio-Económicos da Universidade do Chile]; Ruy Mauro Marini fez a apreensão original das leis tendenciais que regem o capitalismo dependente – a superexploração da força de trabalho, a transferência de valor e a cisão no ciclo do capital; Vânia Bambirra aprofundou o estudo da diferenciação das formações econômico-sociais, com sua tipologia da industrialização dependente; Orlando Caputo conferiu precisão ao conceito de economia mundial, além de ter desenvolvido metodologia para o estudo das transferências de valor; Jaime Osorio aprofundou a compreensão da categoria padrão de reprodução do capital, identificou seus padrões históricos na América Latina e trouxe novas formulações para a teoria do Estado [...]. Theotonio Dos Santos (2011, p. 364) nos fornece a compreensão da dependência, em âmbito mais geral, como uma situação condicionante, que é também histórica, na qual se “configura uma certa estrutura da economia mundial que favorece o desenvolvimento econômico de alguns países em detrimento de outros e que determina as possibilidades de desenvolvimento das economias internamente, as constituindo como realidades econômico-sociais”.Ruy Mauro Marini ([1973] 2011a, p. 134-135), por sua vez, de forma mais específica, diz que a dependência é “uma relação de subordinação entre nações formalmente independentes, em cujo marco as relações de produção das nações subordinadas são modificadas ou recriadas para assegurar a reprodução ampliada da dependência”. DA CATEGORIA DEPENDÊNCIA Ao lidarmos com a definição de dependência como ponto de partida de análise das economias latino-americanas, percebemos o avanço metodológico que a teoria que daí se desenvolve representa em comparação com as teses desenvolvimentistas. Se antes, para estas últimas, a dependência era vista como um elemento coercitivo externo que simplesmente influi de alguma forma na conformação das nações, com a inovação que a teoria da dependência traz, a dependência passa a ser elemento analítico explicativo fundamental nas relações centro- periferia e no desenvolvimento condicionado da estrutura política, econômica e social das nações ditas subdesenvolvidas e que passam a serem enxergadas agora como dependentes. DA CATEGORIA DEPENDÊNCIA REFERÊNCIAS BAMBIRRA, Vânia. O capitalismo dependente latino-americano. 2. ed. Florianópolis: Editora Insular, 2013. DOS SANTOS, Theotonio [1978]. Imperialismo y Dependencia. Caracas: Fundación Biblioteca Ayacucho, 2011. DOS SANTOS, T. Teoria da Dependência: balanços e perspectivas. Florianópolis: Editora Insular, 2015. LUCE, Mathias S. Teoria Marxista da Dependência: problemas e categorias. Uma visão histórica. São Paulo: Expressão Popular, 2018. MARINI, Ruy Mauro [1973]. Dialética da Dependência. In: STEDILE, João Pedro e TRASPADINI, Roberta (orgs). Ruy Mauro Marini: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2011a. p.131-172. MARINI, R. M. [1990]. Memória: por Ruy Mauro Marini. In: TRASPADINI, Roberta; STEDILE, João Pedro (org.). Ruy Mauro Marini: vida e obra. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2011b, p. 55-128 MARTINS, Carlos Eduardo. Globalização, dependência e neoliberalismo na América Latina. São Paulo: Boitempo Editorial, 2011