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TEORIA DA COMUNICAÇÃO AULA 1 Prof. Alexandre Correia dos Santos 2 CONVERSA INICIAL Compreender os estudos diretamente nas suas fontes e origens é um trabalho interessante à medida que conhecemos os teóricos, as correntes de pensamentos e as principais teorias que surgiram dos debates travados dentro das principais escolas de comunicação. Nossa principal tarefa é aprender, ainda que linearmente, quais os ensinamentos e quem são os principais estudiosos que deram origem aos objetos comunicacionais e que são debatidos em larga escala até hoje, por todo o mundo. CONTEXTUALIZANDO Conhecer as escolas da comunicação é fazer regressar à origem dos principais conceitos comunicacionais, dentro do seu berço, dentro das salas centenárias das mais importantes universidades espalhadas pelo mundo. Nossa tarefa é reconhecer o caráter evolutivo das teorias e teses, percebendo qual a influência exercida por cada umas dessas escolas, e ainda, dando identidade e autoria para os pais de cada um dos conceitos mais conhecidos e utilizados até hoje pela comunicação. Procure guardar o nome de cada um desses pesquisadores e quais suas contribuições para a área da comunicação social. É uma tarefa gratificante pelo uso que deverão fazer dessas teorias na sua prática cotidiana. TEMA 1 – ESCOLA DE CHICAGO A Escola de Chicago, pelos seus registros, foi fundada em 1892, com a criação do Departamento de Antropologia e Sociologia em Chicago, Estados Unidos, que tinha como objetivo principal pesquisar empiricamente – e multidisciplinarmente – as relações sociais e seu entorno, buscando, assim, a compreensão da vida em sociedade. A Escola teve protagonistas na pesquisa comunicacional, grandes teóricos que tiveram seus trabalhos mais reconhecidos entre 1910 e 1930. Estes focaram principalmente a área de processos comunicacionais, porém, com forte preocupação sociológica, uma vez que seus estudos apontavam para os processos e seus efeitos sobre a população, a sociedade, mas com um viés predominante e exclusivamente focado na cidade de Chicago (1833), situada no estado de Illinois, Estados Unidos. 3 Assim, a cidade, seus habitantes e suas relações se tornariam um importante laboratório experimental, com suas próprias características, como a alta taxa de crescimento e conceitos urbanísticos, mas que (como toda grande cidade) também contava com mazelas, como as desigualdades sociais e todas as suas consequências. O Darwinismo, pelo seu sucesso nas ciências, foi a base dos primeiros estudos nessa Escola, contribuindo para o desenvolvimento de uma visão evolutiva que influenciava também práticas empíricas sobre os processos de adaptação. Outra forte característica da Escola de Chicago é o pragmatismo, que, estudado primeiro na Filosofia, preconiza que a ação é a fundadora do pensamento e, portanto, esse conceito não pode ser pensado isoladamente, descolado dos sentimentos que conduzem as ações humanas. O pragmatismo tem como principais pesquisadores e fundadores do conceito os filósofos Charles Sanders Pierce, William James e John Dewey. Pierce (filósofo, 1838- 1914) é considerado o pai da semiótica e James (filósofo, 1948-1910) é considerado o pai da filosofia norte-americana. A linha de pesquisa da Escola de Chicago também ficou marcada pela forte influência da sociologia, da filosofia e da antropologia (lembremos do caráter multidisciplinar), demonstrando assim sua tendência de Escola que buscava reunir diferentes áreas e ciências, não cabendo ou sendo razoáveis estudos isolados sem levar em consideração sua forte capacidade de análise da sociedade e do entorno, como fazia a igualmente descoberta Teoria da agulha hipodérmica. Essa prática as diferenciava. Em 1930, outros pesquisadores norte-americanos se uniram para trilhar novas pesquisas e descobertas na área da mass comunication research, afinal, a base de seus estudos empíricos – seu principal objetivo – também era a pesquisa de campo ou a análise de dados concretos da sociedade em que a instituição estivesse inserida. Assim, uma segunda grande Escola ganhou espaço por seus estudos mais positivistas, quantitativos e instrumentais, geridos por pesquisadores da Universidade de Colúmbia, porque seus resultados eram mais efetivos e práticos que a Escola de Chicago. Seu corpus (repertório de pesquisa) era a desorganização social, a marginalidade, a aculturação, entre outras características inerentes aos terrenos de observação praticados nos Estados Unidos. O estudo das concentrações 4 urbanas e industriais fascinava os pesquisadores das diferentes correntes das duas instituições. A pesquisa norte-americana, como um todo, também se notabilizou pela divisão de seus pesquisadores em grandes grupos, ou correntes, que originaram, entre outras, importantes teses e teorias, como a Teoria Matemática da Comunicação (ou Teoria da Informação), em que, para Wolf (1995, p. 19), a comunicação passa a ser entendida “como um processo de transmissão de uma mensagem por uma fonte de informação, através de um canal, a um destinatário”, transformando a comunicação em um sistema e não mais em um processo. Os autores dessa teoria são Claude Elwood Shannon (matemático, 1916-2001) e Warren Weaver (matemático, 1894-1978). Essa teoria defendia que o verdadeiro problema ou razão da comunicação é reproduzir em um ponto, de forma exata ou aproximada (sem ruídos), uma mensagem selecionada em outro ponto. Assim, as mensagens têm um significado e são emitidas por meio de um conjunto de mensagens possíveis. Ainda, mais tarde, em Chicago, influenciada pelas escolas das ciências biológicas, foram tratadas novas teses pela sua brilhante característica de interdisciplinaridade acerca da ecologia, posteriormente tratada pela Escola como Ecologia Humana, que visava aos estudos da segregação de grandes grupos sociais desfavorecidos (negros, imigrantes, jovens) e sua relação com o que chamavam de organismos sociais, direcionando as pesquisas para uma compreensão de como essas camadas sociais eram impactadas pelas funções da comunicação social. Ao proporem pesquisas relacionando diferentes áreas como biologia, sociologia e antropologia, sua aproximação com estudos focados nas pessoas, em cidades e na comunicação de massa fizeram com que a Escola se notabilizasse pelo abrangente escopo de análises e pesquisas. A Teoria Funcionalista advém justamente de uma segunda parte da Escola de Chicago, mais voltada para essas análises; assim, essa vertente tem sua motivação diretamente nas pesquisas e nas funções exercidas e originadas da comunicação de massa na sociedade, justamente porque os pesquisadores abordavam hipóteses e objetos sobre a relação entre os indivíduos, a sociedade e os meios. Suas preocupações estavam inicialmente voltadas para o equilíbrio da sociedade e de todos os seus componentes. Ainda, podemos identificar uma 5 terceira – e não menos importante – vertente ou corrente de estudos acerca da comunicação, que é aquela exclusivamente voltada aos estudos dos efeitos, em que estudos que datam da década de 1920 tinham como principal característica o lugar comum nas pesquisas. Audiências, efeitos de campanhas políticas, por exemplo, eram encomendados aos pesquisadores para fins de otimização e melhoria dos efeitos produzidos e alcançados. Aqui, a preocupação principal passou a ser o sujeito. 1.1 Behaviorismo É nessa fase que surgem estudos paralelos relacionados ao departamento de psicologia de Chicago, os quais tem profundo impacto nos estudos da comunicação: o behaviorismo ou estudos do comportamentalismo. De origem nas teorias norte-americanas, o Behaviorismo, que trata dos estudos relacionados ao comportamento do indivíduo, nega e refuta qualquer estudo que resuma a introspecção ou a psique humana a qualquertese que não possa ser comprovada empiricamente. Assim, o comportamentalismo refuta qualquer teoria que não possa ser comprovada cientificamente. Messagi (2018, p. 33) cita como exemplo o id, o ego, o superego, o inconsciente, o pré-consciente e o consciente, ou animus e anima (Jung), conceitos que não são ciência (sob o ponto de vista behaviorista) porque simplesmente não é possível observá-los diretamente, por se tratar de tentar compreender o que acontece dentro de uma “caixa preta”. Em outras palavras, sem o direto acesso aos sistemas, não existe a possibilidade de compreensão do funcionamento (neste caso, da nossa mente), não favorecendo um estudo empírico que seja comprovado cientificamente. O pesquisador John Broadus Watson (psicólogo, 1878-1958) é considerado o criador da Teoria do Comportamentalismo, ou como é mais conhecida, Behaviorismo. Como facilitador da compreensão do Comportamentalismo, basta dizermos que todos os indivíduos têm comportamentos específicos e que isso pode ser medido e virar dados estatísticos. Ou seja, nossos atos e ações podem virar matéria mensurável porque, se analisados, podem virar estatística e servir como embasamento para uma pesquisa de comportamento do consumidor, por exemplo. Assim, essa corrente defende tudo que seja externo à mente e que possa ser medido, aferido, contado. 6 Por fim, a Escola de Chicago é um dos berços mais importantes da comunicação porque é referência até hoje nos estudos de sociologia, filosofia e antropologia pelas inquestionáveis contribuições para o campo científico comunicacional. 1.2 Principais nomes da Escola de Chicago Harold Dwight Lasswell (sociólogo, 1902-1978): autor da Teoria da Agulha Hipodérmica, surgida entre a Primeira e Segunda Guerra Mundial, que apontava que a massa social era irracional, medíocre e manipulável e que, quando exposta a estímulos da mídia, reagia tal qual a uma injeção dada na hipoderme (subcutânea), e que reagia de forma homogênea, individual e direta – sem falhas, sendo todos os indivíduos impactados de uma mesma forma. Teoria também conhecida como Teoria da Bala Mágica. Herbert Blumer (sociólogo, 1900-1987): foi um dos primeiros críticos da Teoria da Agulha Hipodérmica, por acreditar que não era correto pensar os meios de comunicação isoladamente do seu contexto social e cultural. George Herbert Mead (filósofo, 1863-1931): autor do interacionismo simbólico, que, entre outros conceitos, prega que a comunicação é a maior e melhor forma de interação social entre os sujeitos, interação esta construída por meio de gestos significantes. Robert Ezra Park (sociólogo, 1864-1944): defendia que as lentes que analisavam a cidade de Chicago, por exemplo, deveriam ser copiadas ou baseadas nos estudos já realizados por antropólogos em tribos indígenas, tendo como princípio os estudos de caso. Especializou-se no comportamento humano e em suas relações no espaço urbano. Erving Goffman (sociólogo e antropólogo, 1922-1982): apesar de estar muito ligado ao interacionismo proposto pela Escola de Chicago, desenvolveu pesquisas singulares, mas influenciado pela visão humanística, de interação e qualitativa, marcas principais de estudos da Instituição. 7 1.3 Outros nomes importantes da pesquisa norte-americana Claude Elwood Shannon (matemático, 1916-2001): coautor da Teoria Matemática da Comunicação. A ele ainda são creditados o primeiro projeto de computador digital e a criação dos circuitos digitais. Warren Weaver (matemático, 1894-1978): coautor da Teoria Matemática da Comunicação. TEMA 2 – ESCOLA DE FRANKFURT Frankfurt fora formada essencialmente por pensadores independentes, não necessariamente alocados na escola da comunicação alemã ou originados dela, mas que alcançaram notoriedade por seus estudos em diversos campos do saber, não se restringindo apenas aos fenômenos comunicacionais. Como já falamos anteriormente, é fundamental a compreensão dos diferentes campos do conhecimento que abarcam teorias da sociologia, da antropologia, da filosofia etc. para a perfeita compreensão do todo. Tais estudiosos analisaram os diversos processos civilizadores modernos e versaram sobre eles, do histórico ao destino do indivíduo da técnica passando por diversos campos como política, arte, literatura. Assim, foram autores de diferentes teses acerca dos fenômenos da mídia, da cultura, do mercado e da vida contemporânea. Desde sempre, defendiam que os fenômenos comunicacionais não deveriam ser estudados isoladamente, mas sim enquanto um “todo social” por se identificarem, antes de mais nada, com mediações que precisam ser verificadas com a sociedade. Nietzsche, Marx e Freud foram as bases ou as referências, os marcos de início de pesquisas. Marx foi muito utilizado justamente pela sua tendência pessimista e crítica em relação aos meios de comunicação. A maioria dos pesquisadores era da corrente marxista. Com base nas ideias defendidas por esses pensadores, os pesquisadores da Escola de Frankfurt desenvolveram novas teorias, visando esclarecer as novas realidades surgidas com o desenvolvimento do capitalismo no início do século XX. Adorno e Horkheimer criariam juntos o conceito de indústria cultural, propondo uma leitura mais profunda naquilo que definiram como “Dialética do Iluminismo”. Wolf (2009) alerta que a pesquisa na área social, quando levada a 8 efeito pela Teoria Crítica, é proposta justamente como tese de uma sociedade compreendida pelo seu todo. O objetivo principal dessas análises era justamente não fazer verificações de partes ou setores da mídia, mas sim uma análise que englobasse os meios e o contexto social como todo. Para alcançar tais objetivos e intentos, os frankfurtianos defendiam a ideia de que a dominação da técnica principalmente viria a se transformar posteriormente na indústria cultural e, por consequência disso, se estabeleceria a massificação da informação e do conhecimento, levando a arte, a literatura e a cultura para o mesmo caminho, acabando assim com a força intrínseca de cada uma dessas práticas, não perpetuando os seus próprios significados, relegando todas as culturas a objetos de consumo. E aí o problema não é apenas o fato de o conhecimento, a literatura e a arte obstantes da própria figura do indivíduo, do ser humano, se tornarem um produto de consumo. Para a Escola, a arte, a literatura e o indivíduo hoje são criados, negociados e consumidos como bens não duráveis, descartáveis, levando em conta princípios que antigamente eram reservados apenas para às artes, às pessoas e aos pensamentos. Nesse caso, os maiores prejudicados são os indivíduos, justamente porque, em todos os casos, como já previam os frankfurtianos, os critérios econômicos sobrepujam todos os outros princípios. Tais conclusões advêm das máximas de Marx, de onde se origina também o conceito de indústria, visando compreender as produções culturais (que, na visão deles, era fruto de uma grande cadeia produtiva). O indivíduo também passou a ser manipulado como audiência até nos seus momentos de lazer e entretenimento. A comunicação, por exemplo, é um motor da indústria cultural – praticamente a sua essência – desde que percebamos que, em última instância, ferramentas contemporâneas como o marketing, por exemplo, fazem com excelência o uso do todo das ferramentas e meios de comunicação, incentivando o indivíduo ao consumo. Hepp (2005) menciona que a produção de mercadorias culturais procede de acordo com padrões, seu conteúdo derivando do mesmo modelo comum. Assim, a ideia é mostrar que essa indústria não é formada espontaneamente entre as massas ou a sociedade. 9 Conhecidos como os primeiros marxistas de Cátedra, os pesquisadores de Frankfurt, em 1934, precisaram realocar o Instituto de Pesquisa Social para a Universidade de Columbia, em NovaIorque (EUA). Isso porque o nazismo de Hitler se espalhava fortemente na Alemanha e, aos olhos do governo, a Escola de Frankfurt era “inimiga do Estado”. Em 1950, o Instituto encerrou definitivamente suas atividades. 2.1 Principais nomes da Escola de Frankfurt Walter Benjamin (filósofo e ensaísta, 1892-1940): autor de A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica (1936), que serviu como ponto de discussão e inflexão para as discussões correntes. Max Horkheimer (filósofo, 1895-1973): coautor de Dialética do esclarecimento. Foi o autor do conceito de que ciência deveria ser pensada como um sistema dedutivo, ou seja, uma nova teoria deveria sempre ser derivada da experimentação de diversas formas e teses, advindas de algumas poucas. Theodor Adorno (filósofo e sociólogo, 1903-1969): coautor de Dialética do esclarecimento. Maior crítico da sociedade de mercado, na qual sua única verdadeira razão é o progresso técnico em detrimento dos processos, da sua criação e da arte envolvidas. Herbert Marcuse (psicanalista, 1898-1979): defensor e admirador da obra de Freud, buscou sempre comprovar que o indivíduo humano está e estará sempre em busca da solução dos seus desejos, justamente por acreditar na satisfação dos desejos individuais das pessoas. Jurgen Habermas (filósofo e sociólogo, 1929): dedicou sua vida ao estudo da democracia e às teorias do agir comunicativo. TEMA 3 – INDÚSTRIA CULTURAL Como vimos anteriormente, os frankfurtianos Horkheimer e Adorno cunharam o conceito de indústria cultural, fortemente influenciados por estudos e teses de Carl Marx. Isso se dá após inúmeros anos de análises críticas da produção, que já defendiam como indústria de bens culturais, marcados principalmente como movimentos globais de produção cultural, fortemente identificados como mera mercadoria. 10 Ou seja, em resumo, toda e qualquer produção (fosse ela cultural, literária, artística) não passava de uma mercadoria, um mero produto, atingido um nível de padronização de conceitos e formatos nunca visto anteriormente. Na sua ótica, produtos culturais como revistas, filmes, programas, entre outros, possuem ou ilustram uma racionalidade técnica, com esquemas semelhantes de organização e planejamento econômicos. Por exemplo, automóveis que são fabricados em série nas suas montadoras. Previu-se algo para cada fim sem que ninguém pudesse escolher ou contestar. Os setores dessa produção passam a ser uniformizados, com um ar extremamente notável de semelhança. Bens passam a ser padronizados, para primeiramente satisfazer às numerosas demandas, que precisam responder às padronizações da industrialização, nesse caso, a própria indústria cultural. Adorno e Horkheimer (1985) já pregavam suas impressões: o terreno em que a técnica adquire seu poder sobre a sociedade é o terreno dos que a dominam economicamente. Nesse momento, ambos antecipavam uma clara tendência na análise dos fenômenos culturais: a conjunção entre a arte e a tecnologia. A reprodução da arte, por exemplo, para os autores, só tem razão de existir no estágio literal da reprodução (no cinema, por exemplo) e não na produção única. O modo industrial de produção da cultura corre o risco de padronização justamente pelos fins de rentabilidade econômica, e também, por tudo o que vimos até aqui, pelo controle social. Assim, nas sociedades capitalistas mais avançadas, Adorno e Horkheimer (1985) defendiam que a população passou a ser mobilizada e, por consequência, passou a se engajar nas tarefas necessárias para manter o sistema econômico e social por intermédio do consumo estético massificado, sempre articulado, planejado e aplicado pela então indústria cultural. Para evitar uma conceituação simplista exagerada do termo “indústria cultural”, cunhado em 1947 por Theodor Adorno, Messagi (2018) elenca mais algumas contribuições dessa teoria para a comunicação, a saber: a. Devemos enxergar a indústria cultural como parte do processo geral de antidesmistificação; b. Também como instrumento da repressão e da autorrepressão organizada; 11 c. Como agente principal da mercantilização da cultura; d. Como técnica extra-artística, em geral, estranha à técnica intra-artística; e. Finalmente, como causa, em última instância, do fim da autonomia estética. Antidesmistificação é um conceito que, em linhas gerais, impede que o indivíduo seja incapaz de ser formado autonomamente, com seus próprios valores e juízos, sendo, portanto, inapto a decidir conscientemente. A repressão vem como ferramenta de acuação do indivíduo, uma vez que sua capacidade de escolha estava limitada. A indústria cultural permitiria uma “mercantilização” de todos os processos artísticos, uma vez que seria uma espécie de extra-artística, fora das características inerentes ao fazer criativo ou artístico. Por fim, como resultado de toda essa mercantilização industrial da cultura, tal prática aniquilaria a autonomia estética e de criação dos indivíduos artistas, uma vez que estariam fadados e condenados a produzir segundo determinada prática conceitual de mercado padrão. As tendências às crises de sistema ou apelos e ações individuais eram combatidas por meio do mercantilismo da cultura, para a formação de uma consciência prática. Assim, o conteúdo livre, libertador, se vê completamente freado, engessado nas suas partes. Essas vertentes, porém, viviam e experimentavam grandes contradições à luz de suas teorias, porque muitos conflitos, crises econômicas, angústias sociais, desde então desconhecidos pela sociedade, foram de alguma maneira gerados pela necessidade de progresso econômico, científico e tecnológico. Isso serviu de contraponto para as discussões mais profundas em torno da indústria cultural, uma vez que se sabia que, para crescer, teriam que abrir mão de alguns preceitos, teorias e teses de manipulação e controle. Essas contradições ainda mais fortes acabaram por definir sociedades, conceitos sociais e culturais, ainda que beirassem à margem do que os especialistas da época denominavam barbárie tecnológica. TEMA 4 – ESCOLA CULTURAL BRITÂNICA Os estudos culturais britânicos ganham força após a Segunda Guerra Mundial, devido a uma profusão de meios de comunicação de massa, com clara 12 predominância da indústria cultural representada pelos seus derivados de cultura, indústria, democracia e arte, em que de fato o seu conhecido modo de aplicação gerava uma gigante desigualdade social e cultural por toda a Grã- Bretanha. Ainda com forte herança do pensamento frankfurtiano, e com pesada influência de teóricos como Gramsci – defensor da teoria da hegemonia –, seus primeiros estudos focam e centralizam as atenções em como a cultura se relacionava com a sociedade, sendo que os fenômenos sociais são abordados por esses teóricos como conjuntos hierárquicos – porém controversos ou antagônicos – de relações que abordam questões sociais e de sexo, raças, etnias etc. apesar de, no princípio, não se aprofundarem em estudos que fizessem distinção entre alta e baixa cultura, mas observando-a como um todo, por meio das relações dessa sociedade com o Estado, com a sociedade, enfim, com as questões socioculturais relevantes. Depois, já sedimentada e com grande experiência, a escola britânica passou a legitimar objetos menores, criando separações importantes que designavam o culto e o popular, por exemplo, além de pesquisarem profundamente o papel ativo da cultura na formação dos processos sociais, além da sua real função e relação com o poder e a hegemonia. Conhecida como Escola de Birmingham, dentro do Centro de Estudos da Cultura Contemporânea Britânica (CCCS), foi marcada pelo lançamento de obras dos seus três grandes pensadores: Raymond Willians, Richard Hoggart e Edward Palmer Thompson. É por intermédio das obras desses três pesquisadoresque os estudos culturais britânicos se aprofundam com orientação claramente marxista. No entanto, tiveram nomes ainda mais representativos na sua sequência, como Stuart Hall, que é considerado um dos maiores expoentes contemporâneos dos estudos culturais no mundo. Assim, a pesquisa sobre Gramsci (hegemonia), a política cultural e a cultura de massa ganham novas formas e contornos sob a ótica dessa importante escola. O contexto social e histórico britânico foi preponderante para alavancar os estudos. Muito embora suas pesquisas corroborassem com métodos e teses da Escola de Frankfurt, ambas divergiam, por exemplo, quando se tratava da abordagem ou na forma como a indústria cultural, ainda que a serviço 13 basicamente do capital, conseguia proporcionar oportunidades para a criatividade individual e coletiva. O próprio adjetivo “culto” que, em tese, separa a grande massa do exíguo número de pessoas “cultas”, contribuiu para o surgimento de novos conceitos como cultismo e cultura. Assim, fica claro que os conceitos contribuem para a análise da produção cultural e das mídias de forma completa, sendo o termo “cultura” o significado central da sua formação. Outro importante nome dos estudos britânicos é Raymond Willians, defensor da tese de que é imprescindível a compreensão no campo do projeto intelectual (no caso dos estudos culturais), mas principalmente entender como isso se deu e quais os processos de formação desse projeto, independentemente da origem (se de baixa ou alta) cultura. O próprio conceito de cultura, defendido por Raymond Willians, preconiza que a essa “comum ou ordinária” pode e deve ser vista como um modo de vida em condições de igualdade de existência com o mundo das artes, literatura e música. Assim, os britânicos, sobretudo, defendem tanto que a alta cultura quanto os diversos modos de baixa cultura devem ser analisados, entendendo que as mensagens podem e devem ser interpretadas pela audiência e pelo público em função dos seus aspectos culturais. O seu grande legado é o aprendizado de que o estudo da cultura é a compreensão dos significados que adquirem concretude, especialmente na experiência vivida. 4.1 Principais nomes da Escola Britânica – Escola de Birmingham Raymond Willians (sociólogo, 1921-1988): um dos mais importantes pesquisadores do conceito de cultura e do seu impacto social (das mudanças que a cultura pode causar em uma sociedade). Richard Hoggart (sociólogo, 1918-2014): contrário à industrialização da cultura e pesquisador de classe, cultura, indústria e democracia, era defensor também dos estudos relacionados com as classes trabalhadoras e da presença disruptiva da anarquia advinda dessas classes. Edward Palmer Thompson (historiador, 1924-1993): foi um ferrenho defensor da construção histórica baseada nas experiências, principalmente das classes trabalhadoras. 14 Stuart Hall (sociólogo, 1932-2014): um dos principais estudiosos a incluir raça e gênero nas pesquisas de cultura e reconhecido ao aceitar as contribuições da Escola Francesa diretamente nos fenômenos comunicacionais. TEMA 5 – PESQUISA NA AMÉRICA LATINA Seguindo ainda a mesma lógica da pesquisa nos Estados Unidos, por meio da mass communication research, a qual os objetos principais de estudos eram os impactos sociais dos meios de comunicação de massa, a pesquisa comunicacional na América Latina, na sua grande maioria, foram originadas da necessidade de se compreender e analisar todas as principais demandas políticas e sociais da região. Questões e tópicos como comunicação de massa, dominação, liberdade de informação e resistências são os principais objetos de pesquisa do que podemos chamar de Escola Latino-Americana de Comunicação. Questões culturais como o próprio processo de comunicação massiva passou a ser estudado segundo as características regionais do âmbito da escola, bem como o desenvolvimento cultural dos países que a compõem e sua relação direta com o capitalismo e com o mercado (expansão da televisão, do mercado publicitário, da indústria musical latino-americana). Em termos de marcas e registros históricos, as pesquisas ficaram marcadas pelo caráter de extrema submissão ao sistema, mas também é caracterizada pelos seus históricos de defesa e de luta pelos seus ideais. No Brasil, a pesquisa no campo da Comunicação começou a ganhar forma e corpo – além de reconhecimento – no início da década de 1990, pela qualidade de seus pesquisadores e autores e pelo crescente desenvolvimento da indústria midiática no país. Porém, de forma geral, os estudos ganharam de fato notoriedade a partir da segunda metade da década de 1980, tendo Néstor Garcia Canclini e Jesús Martin-Barbero como seus grandes expoentes de pesquisas, ganhando expressão mundial desde então. Foi Martin-Barbero quem propôs que as análises e pesquisas passassem a considerar as mediações (mais que as mídias) e que englobassem espaços de experiência das pessoas e seus respectivos espaços e contextos sociais, herança também da Escola de Chicago, em que compreender o indivíduo e seu 15 entorno passa a ser o grande objetivo de pesquisa dessas correntes latino- americanas. Já Canclini se aprofunda ao versar sobre a relevância do poder do mercado e de sua estruturação, segundo constituição e identidade local, fortalecendo estudos de recepção com forte base e escopo no consumo cultural, preconizando e adiantando que as mensagens e conteúdos veiculados pelos meios eram efetivamente adaptados pela audiência ou público, contextualizados pela sua própria realidade local. Congressos como o IAMCR, realizado em 1988, em Barcelona, serviram para “colocar na vitrine” pesquisadores nacionais até então pouco conhecidos, ora pela baixa produção, ora pelos contextos históricos nacionais, como o pós- 64, quando notadamente só podiam circular pelos eventos internacionais autores brasileiros que gozassem da simpatia dos militares. Outro grande centro de pesquisa pioneiro na comunicação foi o Ciespal, com sede em Quito, Equador, ou Centro Internacional de Estudos Superiores de Periodismo para a América Latina, que surgiu com fortes tendências e influências americanas por ter sido, na época, uma proposta de cooperação nos estudos de mídia. Durante mais de vinte anos, o Centro foi referência para especialistas, instituições e abrigou e sustentou importantes discussões acerca do tema. Das mais diversas entidades existentes para a pesquisa da Comunicação, podemos destacar: a Intercom – conhecida como a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação e considerada a organizadora dos maiores congressos regionais e nacionais da área; a Associação Boliviana de Investigadores da Comunicação (Aboic), que organiza há anos o Congresso Ibero-americano de Ciências da Comunicação; a Federação Argentina de Carreiras em Comunicação (Fadeccos); a Associação Mexicana de Investigadores da Comunicação (Amic); e a Associação Chilena de Investigadores da Comunicação (Acia). Podemos citar, ainda, a União Latino- Americana de Economia Política da Informação, Comunicação e Cultura (Ulepicc) e a Federação Latino-americana de Faculdades de Comunicação Social (Felafacs). Fazer parcerias com as entidades internacionais tem sido uma constante na atuação dessas entidades, pois quanto mais informações puderem ser trocadas, análises consolidadas e pesquisas realizadas, mais dados poderemos 16 gerar para o embasamento científico dos produtos, objetos e processos comunicacionais. A pesquisa no Brasil, que não acompanhou – infelizmente – o crescimento e o desenvolvimento da pesquisa em outro países latino-americanos, também conta com bons pesquisadores brasileiros que fazem parte do desenvolvimento desses centros citados anteriormente, contribuindo com suas pesquisas para a ampliação das teorias e tesesadvindas dessa Escola: Maria Lucia Santaella Braga, Margarida Kunsch, Maria Immacolata Vassallo Lopes, Carlos Eduardo Lins e Silva, Cicila Peruzzo, Mauro Wilton de Souza, Luiz Gonzaga Motta, José Marques de Melo, Marialva Barbosa e Maria Cristina Gobbi. Estes são alguns dos nomes que figuram entre os grandes destaques brasileiros na Escola Latino- Americana e que atualmente tem como base, aqui no Brasil, a cátedra Unesco, sediada na Universidade Metodista de São Bernardo do Campo, que se destaca como uma escola regional, mas que procura manter viva a memória dos estudos desenvolvidos no Brasil. Tais pesquisas exigem amadurecimento profissional e intelectual no mercado e no campo acadêmico, criando um legado de investigação que pode e deve gerar uma produção pragmática em torno dos movimentos sociais e culturais da região, criando e possibilitando, para as nações da Escola, novos e importantes canais de comunicação entre a sociedade e o Estado. TROCANDO IDEIAS O tema “escolas comunicacionais” é muito rico pela sua enorme contribuição nos Estudos Sociais. Todas as instituições, ou a sua maioria, com base no entorno ou na realidade social da comunidade à volta da Escola serviram de laboratório para importantes teses e pesquisas. Com base nisso, escolha um desses conceitos para discussão justamente para uma avaliação mais profunda da importância da voz da sociedade, na construção dos conceitos comunicacionais. NA PRÁTICA Os frankfurtianos sempre defenderam a ideia da “pasteurização” ou da transformação em linhas produtivas de peças ou obras de arte, espetáculos, livros, poesias, música, cinema etc., justamente pela necessidade de 17 comercializar ou transformar algo cultural em um produto vendável, massificado. Analise o cenário musical no seu estado (recorte menor que o do Brasil) e reflita como as bandas locais e o cenário em que estão inseridas reagem a essa massificação ou industrialização de suas obras musicais. Perceba como essas mesmas bandas trabalham, divulgam-se, transformam suas obras em algo conhecido do público. Veja até que ponto elas conseguem trabalhar independentemente, sem – literalmente – se vender aos donos do mercado musical no Brasil, à mídia, à grande audiência, ao mainstream. Ou ainda, se, para sobreviver, precisam fazer justamente o contrário. Procure perceber a influência da indústria cultural no cenário musical da sua cidade ou estado. FINALIZANDO Conhecer os principais teóricos e suas pesquisas, e suas contribuições para o mundo comunicacional é fundamental para a construção de um bom profissional. Memorize, realize fichamentos, resumos, de cada um desses autores. Certamente isso será imprescindível para os seus estudos futuros. 18 REFERÊNCIAS ADORNO, T.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1985. DEUFLEUR, M. Teorias da comunicação de massa. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. HALL, S. Cultura, mídia e linguagem. Nova Iorque: CCCS, 1980. _____. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003. HOHLFELDT, A.; MARTINO, L. C.; FRANÇA, V. V. Teorias da comunicação. Petrópolis: Vozes, 2008. MATTERLART, A. História das teorias da comunicação. São Paulo: Loyola, 2009. MCLUHAN, M. The medium is the message. New York: Bantam Books, 1967. MESSAGI, M. Teorias da comunicação. Curitiba: InterSaberes, 2018. WOLF, M. Teorias da comunicação de massa. Lisboa: Presença, 1995.